Na última quinta-feira, 16 de abril, o bloco dos cursos de Jornalismo e Relações Públicas da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) recebeu o lançamento da pesquisa Vozes Silenciadas Mídia e protestos: a cobertura das manifestações de junho de 2013 nos jornais O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e O Globo. O idealizador da pesquisa, professor doutor Sivaldo Pereira da Silva, concedeu entrevista para a Assessoria de Comunicação – Jornalismo e Relações Públicas detalhando o processo desse estudo que conta com o auxilio de alguns estudantes de Jornalismo e do coletivo Intervozes, organização responsável pela publicação da pesquisa e que trabalha pela efetivação do direito humano à comunicação no Brasil.
Ascom – Jornalismo e Relações Públicas: Como surgiu a ideia de analisar a cobertura dos protestos ocorridos em 2013 e transforma-las em pesquisa?
S.P. – Eu tenho realizado estudos comparativos há algum tempo e também estudos sobre comunicação e política. O Intervozes, organização civil que atua no campo da democratização da comunicação e que publicou o trabalho, também tem desenvolvido estudos em parcerias com pesquisadores neste campo. Assim, a ideia de analisarmos protestos surge justamente porque se trata de um evento importante da história recente do país e queríamos compreender como os meios de comunicação, especialmente o jornalismo, fizeram a cobertura deste evento.
Como se deu a formação da equipe de pesquisa e o processo de apuração?
S.P. – Como se tratava de um grande volume de material, com mais de mil notícias, onde cada texto era analisado e seus dados colocados em uma planilha eletrônica, então precisávamos fazer double checking, isto é, confirmar o mesmo dado duas vezes, por duas pessoas diferentes. Para viabilizar isso, o Intervozes disponibilizou algumas bolsas para estudantes auxiliarem neste processo e assim pudemos contar com a participação de sete estudantes: Ariane Sapucaia, Beatriz Alexandrino, Eduardo Jorge, Filipe Rodrigues, Larissa Vasconcelos, Márcio Anastácio e Uiliana Lima. A maioria fazia parte do Coscentro, projeto de extensão que coordeno ou do GpoliTICs, grupo de pesquisa que também coordeno. Alguns bolsistas participaram no início da coleta, outros mais no final. Quanto ao processo de apuração dos dados, os pesquisadores recebiam informações e treinamento básico para entender as categorias da planilha e como operar a planilha eletrônica. Faziam aplicações testes para verificar se estavam aptos para continuar. E a partir daí, aplicava a planilha em cada matéria respondendo questões qualitativas e quantitativas solicitadas. Ao final do processo de coleta eu reuni as informações de todas as matérias e fiz a tabulação e análise, isto é, cruzamento de dados, identificação de padrões, produção de gráficos e texto com os resultados finais do estudo. Foi um trabalho que durou cerca de 6 meses sendo bastante árduo pelo volume de informações que trabalhamos.
A pesquisa possui um olhar objetivo apenas em função da análise ou toma forma critica a respeito do modo como as coberturas jornalísticas foram feitas na época?
S.P. – A metodologia foi desenvolvida para tentar analisar indicadores que pudessem esclarecer elementos importantes nas matérias, principalmente questões de cunho normativo e qualitativo. Por exemplo, como os manifestantes eram qualificados; se as matérias ouviam os dois lados quando traziam acusações; quem eram as fontes mais ouvidas; quem as matérias apontavam como causador de atos violentos nos protestos… Enfim, uma série de indicadores como esses. Por isso, buscamos fazer uma análise objetiva baseando-nos em números e qualificações objetivas. Justamente pelo fato do jornalismo ter um importante papel na construção da vida social, esses problemas têm impacto político e por isso a pesquisa nos permite tecer algumas críticas neste sentido. Portanto, podemos dizer que é um estudo crítico baseado nos resultados de uma análise objetiva.
Quais foram os resultados obtidos pela pesquisa?
S.P. – Os resultados demonstram uma série de problemas na cobertura dos jornais que envolvem qualidade da apuração jornalística; não cumprimento de princípios normativos e éticos. Por exemplo, cerca de 40% das matérias só ouvem uma fonte, sendo as autoridades governamentais e policiamento as únicas fontes mais ouvidas. Cerca de 77% das matérias trazem acusações, mas não ouvem os dois lados da questão, sendo os manifestantes aqueles que mais são acusados sem serem ouvidos. No geral, em 69% do total das matérias, os manifestantes não são ouvidos. Os números apontam que há um padrão na cobertura dos três jornais analisados: não se trata de casos isolados. Um cenário que implica não apenas na qualidade do texto noticioso, mas tem repercussões na vida real, pois demonstra que há pouca pluralidade de vozes na cobertura e um viés institucionalista no jornalismo brasileiro. Os resultados completos do estudo foram publicados em formato impresso e também em formato digital. Quem tiver interesse, pode baixar gratuitamente em PDF no site do Intervozes.
Link: http://goo.gl/ekiMbG
Entrevista concedida a Diogo Maia, publicada no portal da Universidade Federal de Alagoas – www.ufal.edu.br