Arquivo da categoria: Notícias

Projeto de Lei favorece empresas, não usuário

Em debate realizado nesta terça-feira, dia 06, em Brasília, o 45º Encontro Tele.Síntese, representantes de empresas de telecomunicações, do governo federal e da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), além de companhias interessadas em investir na área, discutiram sobre a revisão do modelo de telecomunicações no Brasil.

No primeiro painel, que teve como tema “Visão do Poder Executivo e do Regulador”, o secretário de Telecomunicações do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, André Borges, destacou que o principal assunto em discussão na pasta é a tramitação do Projeto de Lei (PL) 3.453/2015. Caso aprovado na sua versão atual, o PL modificará a Lei Geral de Telecomunicações (LGT), tornado mais flexíveis as regras sobre as modalidades de outorga de serviços de telecomunicações. Na prática, isso significará que determinados serviços hoje outorgados na forma de concessão poderão no futuro ser outorgados na modalidade de autorização. Esta mudança fará com que as empresas tenham menos deveres e mais privilégios.

André Borges alegou que a mudança na legislação estará vinculada à exigência de adoção de algumas medidas compensatórias por parte das empresas, como a de investir em locais não tão atrativos em termos econômicos, como localidades rurais de pequena densidade demográfica. Segundo ele, a Anatel está negociando com as operadoras de telecomunicações os Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) – acordos que trocam os valores das multas aplicadas pela agência pela oferta de serviços e instalação de novas redes nestes locais inicialmente menos atrativos –, termos estes que, na opinião de Borges, trariam benefícios aos investimentos previstos no Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). “Os recursos dos TACs deverão ser até 50% maiores do que os calculados [para o PNBL pelas regras atuais] com a transformação da concessão em autorização”, declarou.

No entanto, o secretário não apresentou nenhum estudo que confirme essa estimativa feita por ele. Quando questionado por um participante do evento sobre o assunto, tangenciou e preferiu não reafirmar a questão. Já a respeito dos serviços Over The Top (OTTs), entre os quais se enquadram o WhatsApp e o Facebook entre outros, Borges disse que vêm sendo discutidos dentro do ministério. “Estamos desenvolvendo estudos e vendo o que o resto do mundo está fazendo em relação a essas atividades. Talvez tenhamos que impor algumas obrigações, já que são empresas que estão se beneficiando de negócios no Brasil”, afirmou ele. O secretário reconheceu, porém, que ainda não há propostas especificas, e indicou que está em estudo a possiblidade da tributação do setor, em um formato semelhante ao que ocorre nas telecomunicações.

Igor de Freitas, presidente-substituto da Anatel, fez coro às afirmações do secretário André Borges, alegando que “o formato de concessão não é adequado ao ambiente competitivo das telecomunicações”. Freitas utiliza o velho discurso neoliberal de que a regulamentação tira a competitividade das empresas para defender uma auto-regulamentação por parte do mercado, o que contraria os modelos de legislação e controle público implementados nas democracias consolidadas do mundo. Por fim, defendeu que a Anatel tenha autonomia, inclusive financeira, em relação ao governo. “A subordinação da agência reguladora à administração direta atrasa o setor”, pontuou.

Má vontade das operadoras

Na segunda mesa do evento, “A visão dos Players”, o PL 3.453/2015 voltou à cena. Representantes da Telefônica, Oi, América Móvil e Tim expressaram sua posição de desonerar o setor. Isso seria obtido com a diminuição da exigência de prestação de serviços obrigatórios e com o atendimento de investimentos em áreas socialmente vulneráveis, de pouca perspectiva de retorno financeiro para as empresas, com recursos de fundos setoriais. “Não se pode pensar em atendê-las [essas áreas] com recursos do saldo da troca da concessão pela autorização”, afirmou Camilla Tápias, diretora de Assuntos Regulatórios da Telefônica.

Francisco Matulovic, da Icatel, fez duras críticas às empresas operadoras de telecomunicações pelo posicionamento manifestado, questionando também a falta de investimentos do setor na telefonia fixa, em especial nos Telefones de Uso Público (TUPs). “No telefone móvel, houve investimento e a evolução do serviço. Mas, no público, não. Os pontos de orelhão estão hoje em locais muitas vezes inadequados, não atendendo às necessidades da sociedade atual”, ponderou. Matulovic lembrou que em vários países do mundo os orelhões foram transformados em pontos de internet wi-fi, com a possibilidade de constituírem também pontos para recarga de celular. “O que existe é uma má vontade das operadoras em investir nesse setor”, ressaltou.

Fundos de financiamento em disputa

No terceiro painel do encontro, denominado “A visão dos stakeholders”, Caio Bonilha, diretor da Futurion, defendeu que o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) fosse utilizado para a implantação da internet banda larga nas áreas sem interesse econômico por parte das empresas. “O governo precisa colocar a banda larga no centro da política pública e, desta forma, incentivar os pequenos provedores”, sugeriu.

Já o superintendente de Planejamento e Regulamentação da Anatel, José Alexandre Bicalho, apresentou uma proposta de Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU) para as concessionárias de telefonia fixa. Ele frisou que o PGMU apresentado traz indicadores e incentivos para melhoria dos serviços prestados como medidas prévias à aplicação de sanções. “Sairemos de 30 indicadores para 8, pois os usuários não percebem esses indicadores. Eles apenas prolongam ainda mais a dificuldade na fiscalização”, pontuou Bicalho.

Segundo o superintendente, a proposta apresenta mudanças nas regras de qualidade do serviço e da utilização de espectros, revisão do limite máximo de frequência, revisão do preço público e ajuste da tabela do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel). Na opinião dele, é preciso ampliar o entendimento sobre o Fistel, não sendo relevante contabilizar se haverá ou não desoneração das empresas, mas se as mudanças propostas estimulam uma melhor prestação de serviço e a ampliação dos investimentos no setor.

E os usuários e usuárias?
Uma ausência de representantes que defendam os usuários dos serviços de telecomunicações foi amplamente perceptível no evento. Em julho deste ano, o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) se posicionou a respeito do PL 3.453/2015, ressalvando que, por força do regime de concessão, o serviço de telefonia fixa é prestado em regime público e as concessionárias são obrigadas a seguir metas de universalização – ou seja, disponibilizar o serviço em todo o país –, a prestar o serviço de forma ininterrupta e a manter tarifas dentro dos critérios definidos pela Anatel. “Com o fim das outorgas, todas essas exigências podem acabar, o que resultaria em significativa perda de qualidade do serviço de telefonia fixa para o consumidor brasileiro”, destacou à época Rafael Zanatta, advogado pesquisador do Idec.

O estudo do Idec também aponta como consequência gravíssima da mudança do regime de concessão para o de autorização o fato de as empresas do setor poderem ficar com a infraestrutura instalada por elas para a prestação do serviço de telefonia fixa, as quais deveriam, pela legislação atual, ser repassadas à União ao final do período de concessão, em 2025 – a chamada reversibilidade dos bens. Para que pudessem fazer tais investimentos, as empresas receberam em troca, e continuam recebendo, uma série de incentivos fiscais. O Idec defende no estudo uma ampla revisão da Lei Geral de Telecomunicações, a fim de garantir a expansão dos serviços prestados e o respeito aos direitos dos usuários e usuárias, e não mudanças pontuais na legislação que objetivam apenas beneficiar as empresas concessionárias.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Governo Temer publica MP que ataca a comunicação pública e fragiliza a EBC

Como já havia sido denunciado por entidades da sociedade civil e defensores da democratização da comunicação, o governo de Michel Temer está disposto a desmontar a comunicação pública, a partir de mudanças na Empresa Brasil de Comunicação (EBC). É o que fica explicito com a publicação da Medida Provisória (MP) 744, hoje dia 02, no Diário Oficial da União (DOE).

A MP apresenta alterações que atacam a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e a participação da sociedade civil nas decisões da empresa, acabando com o Conselho Curador e com o mandato do diretor-presidente – que até hoje só podia sair por dois votos de desconfiança do Conselho Curador. Essa medida faz com que o diretor-presidente fique subordinado a nomeações e exonerações da Presidência da República.

E é o que acontece no primeiro dia de sua publicação. O DOE ainda traz a exoneração de Ricardo Mello da presidência da e nomeia novamente Laerte Rimoli, que chegou a ocupar o cargo por algumas semanas, até uma decisão do Supremo Tribunal Federal cassar sua nomeação, pois feria o estatuto da EBC – mudança só foi possível devido à publicação da MP.

O texto dá total poder ao Conselho de Administração, que passa a ser composto por seis indicados do governo e um dos empregados (até agora, eram quatro do governo e um dos funcionários). Acaba com a autonomia em relação ao Governo Federal para definir produção, programação e distribuição de conteúdo no sistema público de radiodifusão.

Para Jonas Valente, coordenador-geral do Sindicato dos Jornalistas do DF, a medida, que chega com o discurso de “atacar o partidarismo e o aparelhamento pelo governo”, retira os principais mecanismos que protegiam a empresa. “Mesmo com todos os defeitos e limites, essas eram justamente as ferramentas para evitar o aparelhamento. Essas medidas acabam com a participação social na empresa e atacam os instrumentos concretos que configuravam o seu caráter público”, afirma.

Em nota divulgada ainda ontem, o secretário de comunicação da Central Única dos Trabalhadores, Roni Barbosa, expressava preocupação com o destino da comunicação pública e alternativa. “No próximo período, vamos ver os golpistas avançando contra as mídias que divergem da narrativa hegemônica, imposta pela grande mídia. A intenção é acabar com as vozes discordantes. Outra preocupação é com o destino da EBC, que pode abolir seus espaços de participação popular e ser usada como porta-voz dos golpistas”, previu Barbosa.

Opinião também compartilhada pela coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Renata Mielli, que, em entrevista ao portal Vermelho, afirmava que a mídia independente já estava sendo alvo de muitos ataques por parte do governo Temer, com a ofensiva colocada em prática com a suspensão de verbas publicitárias pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, prejudicando muitos veículos que contavam com os recursos acordados. Ela ainda lembra que o interesse de acabar com a EBC já foi explicitado em matéria publicada pela Folha de São Paulo em 2009, intitulada “Tela Fria”, que defendia o fechamento da EBC. “Os argumentos mudaram, mas os interesses continuam os mesmos”.

Rita Freire, presidenta do Conselho Curador da EBC, lamentou a notícia em mensagem que divulgou nas redes sociais. “A democracia brasileira acaba de sofrer mais um golpe com a publicação da Medida Provisória que acaba com o caráter público da nossa Empresa Brasil de Comunicação, ao derrubar seus instrumentos de autonomia: o Conselho Curador, que assegura a participação da sociedade na sua gestão, e o mandato do diretor-presidente, o mesmo que foi assegurado pela liminar do ministro do Supremo, Dias Tóffoli. A resistência aos desmandos não começa agora. Está nas ruas, sob repressão e violência do Estado, mas com a coragem necessária para defender o País das sombras trazidas pelos golpistas”.

A EBC já vinha passando por restruturações e mudanças por conta de cortes no orçamento e principalmente após o governo federal represar e contingenciar recursos que já haviam sido previstos e que estão em torno de R$ 700 milhões. Além deste valor, a empresa aguarda uma definição sobre a Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública, criada em 2008, que determina que 75% do Fundo de Fiscalização de Telecomunicações (Fistel) seja destinado à EBC. Porém, a verba está bloqueada desde 2009 devido a uma ação impetrada na Justiça pelas empresas de telefonia.

Empresa Brasil de Comunicação
A EBC é uma empresa pública criada em 2007 para fortalecer o sistema público de comunicação, previsto na Constituição Federal em complementaridade aos sistemas privado e estatal. É gestora da TV Brasil, Agência Brasil, Radioagência Nacional, das rádios Nacional AM do Rio, Nacional AM e FM de Brasília, Nacional OC da Amazônia e Nacional AM e FM do Alto Solimões, bem como das rádios AM e FM MEC do Rio de Janeiro. É também responsável pela Voz do Brasil e pelo canal de TV NBR, que veicula os atos do governo federal.

A empresa divulga conteúdos jornalísticos, educativos, culturais, esportivos e de entretenimento, tendo como objetivo expressar a diversidade e pluralidade brasileira. A sua estrutura prevista no decreto de criação contava com: Assembleia Geral; órgãos da administração, que são o Conselho de Administração e a Diretoria Executiva; e órgãos de fiscalização, que são o Conselho Curador e o Conselho Fiscal, mais Auditoria Interna.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

STF derruba classificação indicativa na TV

Enquanto emissoras de todo país se mobilizavam em torno do julgamento do processo de impeachment da presidenta eleita com cerca de 54 milhões de votos, Dilma Rousseff, outro julgamento que atinge também milhões de brasileiros estava prestes a acontecer no Supremo Tribunal Federal (STF). O Supremo definiu ontem, dia 31, que é inconstitucional o artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual estabelece multa e suspensão de programação às emissoras de rádio e TV que exibirem programas em horário não autorizado pela classificação indicativa.

A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 2404 que questionava a norma foi proposta pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) ainda em 2011. Inicialmente, a legenda interpelava sobre o pagamento da multa, prevista no artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para aquelas emissoras que transmitirem “espetáculo em horário diverso do autorizado ou sem aviso de sua classificação”. A classificação indicativa está prevista na Constituição.

A ação contou com o apoio da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). O julgamento começou em 2011, mas foi interrompido algumas vezes por pedidos de vista dos ministros. A Advocacia Geral da União (AGU) e o então procurador-geral da República Roberto Gurgel defenderam a legislação em vigor e lembraram que a Constituição lista entre os deveres do Estado a proteção à criança e ao adolescente. Por isso, o poder público tem obrigação de regular o acesso da audiência a programas inadequados para determinadas faixas etárias.

Porém, para o ministro Dias Toffoli, relator do processo, a possibilidade de multar o veículo de comunicação por desrespeito à regulamentação vigente é uma forma de censura. Toffoli sustentou que a classificação indicativa deve ser apenas uma referência para a família sobre a faixa etária para a qual o programa é direcionado, servindo como ferramenta para a decisão dos pais de permitir ou não o acesso à programação.

Edson Fachin, Rosa Weber e o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, votaram pela manutenção da multa às emissoras e ressaltaram o importante papel do Estado no apoio às famílias com relação à criação e educação das crianças. Afinal, os pais não têm como manter controle total sobre os que as crianças estão assistindo na TV.

“A grande massa não tem condições de controlar o que entra pelas suas casas. É preciso confiar minimamente no Estado. Classificação indicativa não se confunde com censura”, enfatizou Lewandowski em seu voto.

Votaram pelo fim da punição às emissoras — atendendo ao interesse das empresas e reduzindo ainda mais a já frágil regulamentação sobre o setor da comunicação existente no Brasil — os ministros Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Teori Zavascki, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto, este já aposentado.

O que é classificação indicativa?

É a avaliação sobre a faixa etária recomendada para assistir a determinada/o obra/produto audiovisual. São classificados produtos para a televisão, mercado de cinema e vídeo, jogos eletrônicos, aplicativos e jogos de interpretação (RPG). Na prática, a classificação indicativa é um instrumento que protege crianças e adolescentes de conteúdos impróprios na TV aberta.

Antes da decisão do STF, em caso de desobediência, o canal de televisão, por exemplo, ficava sujeito a punição. Agora, não existe mais a sanção. As emissoras continuam obrigadas a estampar o selo de recomendação etária do programa no início da transmissão, como está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Mas não há mais a determinação de horários pré-determinados para exibição de programação imprópria para crianças e adolescentes na TV aberta.

Entenda melhor

Antes da decisão do STF, a faixa “não recomendado para menores de 12 anos” só podia ser exibida a partir das 20 horas, podendo a emissora sofrer sanções em caso de descumprimento da norma. Agora, novelas e programas em geral podiam ser exibidos em qualquer horário na TV aberta, mesmo que seu conteúdo possua cenas de violência, de apelo sexual ou de uso de drogas, e a emissora não será multada nem terá problemas jurídicos.

A medida entrará em vigor após a publicação do acórdão no Diário Oficial da União, o que deve acontecer nos próximos dias. À ação não cabe recurso, tendo a mesma caráter definitivo — já que o STF é a mais alta corte na organização da Justiça Brasileira. A Abert, principal interessada na decisão do órgão, ainda não se pronunciou sobre o assunto, nem qualquer canal aberto de TV.

Clique aqui para ler o voto do relator.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações do STF.

Procuradoria-Geral da República defende que políticos não podem ter participação na radiodifusão

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) com parecer favorável à ação que questiona a possibilidade de políticos com mandato eletivo serem beneficiados com a outorga de concessão de emissoras de rádio e televisão, afirmando que políticos não podem ter participação, mesmo que indireta, em empresas de radiodifusão. Para Janot, essa participação “confere poder de influência indevida sobre a imprensa”.

O posicionamento responde à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 379, protocolada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em dezembro de 2015 e relatada pelo ministro Gilmar Mendes. O partido defende que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que parlamentares sejam sócios de concessionárias de rádio e televisão, tendo em vista a liberdade de expressão e o direito à informação. Viola também o artigo 54 da Constituição, que proíbe a deputados e senadores “firmar ou manter contrato com (…) empresa concessionária de serviço público”.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) manifestou-se também pela concessão da cautelar, já que há realização periódica de eleições no país, “com sucessiva renovação do quadro de lesão a preceitos fundamentais”.

Na Ação Penal 530, o STF já havia se posicionado sobre o assunto. A ministra Rosa Weber afirmou, em seu voto, que “a proibição específica de que parlamentares detenham o controle sobre empresas de (…) radiodifusão” visou evitar o “risco de que o veículo de comunicação, ao invés de servir para o livre debate e informação, fosse utilizado apenas em benefício do parlamentar, deturpando a esfera do discurso público”.

Segundo a ministra do STF, “democracia não consiste apenas na submissão dos governantes à aprovação em sufrágios periódicos. Sem que haja liberdade de expressão e de crítica às políticas públicas, direito à informação e ampla possibilidade de debate de todos os temas relevantes para a formação da opinião pública, não há verdadeira democracia”. Continua Rosa Weber: “para garantir esse espaço livre para o debate público, não é suficiente coibir a censura, mas é necessário igualmente evitar distorções provenientes de indevido uso do poder econômico ou político”.

Na manifestação dirigida ao STF, Janot ainda pede que a Presidência da República e o Ministério das Comunicações não outorguem ou renovem concessões, permissões e autorizações de radiodifusão a políticos. O pedido se estende ao Congresso Nacional, para que se abstenha de aprovar as outorgas, e também ao Judiciário, para não que não diplome políticos que participem desse tipo de empresa. Segundo o procurador-geral, a prática viola a isonomia, o pluralismo político e a soberania popular. Atualmente, conforme dados cruzados da Agência Nacional de Telecomunicações e do Tribunal Superior Eleitoral, cerca de 30 deputados federais e oito senadores são sócios de pessoas jurídicas que exploram atividades de radiodifusão.

Para Janot, a radiodifusão é essencial para efetivar a liberdade de expressão e o direito à informação. Segundo ele, quem controla canal de radiodifusão tem poder de exercer influência sobre a opinião pública. Sendo assim, a manifestação aponta “potencial risco da utilização de canais de radiodifusão para defesa de interesses próprios ou de terceiros”.

Serviço público

No documento, o procurador-geral ainda menciona que a Constituição Federal e o STF reconhecem a radiodifusão como serviço público. A Constituição estabelece que deputados e senadores, desde o momento em que são diplomados, não podem firmar ou manter contrato com empresa concessionária de serviço público. No momento da posse, os parlamentares também não podem ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que usufrua de favor decorrente de contrato com o poder público. Além disso, é vedado que os parlamentares sejam sócios de pessoas jurídicas prestadoras ou exploradoras de serviço público de radiodifusão.

Desta forma, com todas as vedações e jurisprudências apresentadas no parecer, o procurador-geralconclui que a participação direta ou indireta de titulares de mandato eletivo como sócios ou associados de pessoas jurídicas concessionárias, permissionárias ou autorizatárias de radiodifusão, viola a Constituição.

“Pessoas jurídicas controladas ou compostas por detentores de mandato parlamentar podem interferir, e de fato interferem, na medida do interesse de seus sócios e associados, na divulgação de opiniões e de informações, e impedem que meios de comunicação cumpram seu dever de divulgar notícias e pontos de vista socialmente relevantes e diversificados e de fiscalizar o exercício do poder público e as atividades da iniciativa privada”, destacou Janot.

No relato, o procurador-geral ainda lembra que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania daCâmara dos Deputados, em 2011, aprovou 38 concessões de radiodifusão e a renovação de outras 65 em apenas três minutos, com apenas um deputado no Plenário. Outra situação grave é a de que os parlamentares votem pela aprovação de suas próprias outorgas e renovações, havendo, nesta caso, conflito entre os interesses público e privado.

Em pesquisa realizada em 2013 pelo Instituto Patrícia Galvão e pelo DataPopular, apesar de 35% das pessoas ouvidas acharem que a concessão a parlamentares é permitida, 63% dos entrevistados se mostraram contrários à propriedade de meios por políticos. O mesmo estudo mostrou que 69% consideram que ser dono de TV ou rádio dá mais chances para que o candidato seja eleito. O estudo também revela que 44% da população não sabe que, para se ter uma emissora de rádio ou televisão, é necessária a autorização do Estado.

Confira abaixo a relação dos 40 deputados federais e senadores sócios de empresas prestadoras de serviços de radiodifusão que aparecem no Sistema de Acompanhamento de Controle Societário (Siacco), da Anatel:

Deputados Federais

  1. Adalberto Cavalcanti Rodrigues, PTB-PE
  2. Afonso Antunes da Motta, PDT-RS
  3. Aníbal Ferreira Gomes, PMDB-CE
  4. Antônio Carlos Martins de Bulhões, PRB-SP
  5. Átila Freitas Lira, PSB-PI
  6. Bonifácio José Tamm de Andrada, PSDB-MG
  7. Carlos Victor Guterres Mendes, PMB-MA
  8. César Hanna Halum, PRB-TO
  9. Damião Feliciano da Silva, PDT-PB
  10. Dâmina de Carvalho Pereira, PMN-MG
  11. Domingos Gomes de Aguiar Neto, PMB-CE
  12. Elcione Therezinha Zahluth Barbalho, PMDB-PA
  13. Fábio Salustino Mesquita de Faria, PSD-RN
  14. Felipe Catalão Maia, DEM-RN
  15. Felix de Almeida Mendonça Júnior, PDT-BA
  16. Jaime Martins Filho, PSD-MG
  17. João Henrique Holanda Caldas, PSB-AL
  18. João Rodrigues, PSD-SC
  19. Jorginho dos Santos Mello, PR-SC
  20. José Alves Rocha, PR-BA
  21. José Nunes Soares, PSD-BA
  22. José Sarney Filho, PV-MA
  23. Júlio César de Carvalho Lima, PSD-PI
  24. Luiz Felipe Baleia Tenuto Rossi, PMDB-SP
  25. Luiz Gionilson Pinheiro Borges, PMDB – AP
  26. Luiz Gonzaga Patriota, PSB-PE
  27. Magda Mofatto Hon, PR-GO
  28. Paulo Roberto Gomes Mansur, PRB-SP
  29. Ricardo José Magalhães Barros, PP-PR
  30. Rodrigo Batista de Castro, PSDB-MG
  31. Rubens Bueno, PPS-PR
  32. Soraya Alencar dos Santos, PMDB-RJ

Senadores

  1. Acir Marcos Gurgacz, PDT-RO
  2. Aécio Neves da Cunha, PSDB-MG
  3. Edison Lobão, PMDB-MA
  4. Fernando Affonso Collor de Mello, PTB-AL
  5. Jader Fontenelle Barbalho, PMDB-PA
  6. José Agripino Maia, DEM-RN
  7. Roberto Coelho Rocha, PSB-MA
  8. Tasso Ribeiro Jereissati, PSDB-CE

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações do JOTA.

Entidades cobram mais transparência e participação social no Congresso

Entidades da sociedade civil estiveram reunidas nesta quarta-feira, dia 24, na Câmara dos Deputados, em Brasília, para apresentar ao presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ), uma carta com propostas de inovação institucional que promovam o aperfeiçoamento dos instrumentos de acompanhamento das atividades da Câmara pela sociedade civil. As entidades também reivindicaram a adoção de sistemas que promovam uma maior participação social nas decisões.

A carta entregue define pontos essenciais para que se alcance a transparência desejada pela sociedade civil organizada. Na reunião desta quarta-feira, as entidades destacaram a necessidade de criação de um mecanismo oficial e público de contagem das sessões ordinárias da Câmara para que se possa fazer o acompanhamento dos prazos de análise de projetos de lei nas comissões temáticas. “Desta forma, o deputado poderá ser cobrado no cumprimento de entrega dos projetos que estão sob sua responsabilidade. E, em caso de descumprimento do prazo, esse projeto seja encaminhado para outro parlamentar”, ponderou Paula Johns, diretora-executiva da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT).

Outros temas que foram ressaltados pelas entidades na reunião: a criação de um sistema de busca e classificação temática de novos projetos de lei e dos pareceres apresentados durante a tramitação; justificativa de voto dos parlamentares por meio da Lei de Acesso à Informação; e o chamado “Amicus Legis”, que é um mecanismo de contribuição oficial das organizações da sociedade civil nas propostas legislativas. Maia designou o deputado Carlos Sampaio (PSDB/SP) para trabalhar juntamente com a Diretoria-Geral da Câmara no estudo das propostas.

Audiência Pública

Após a reunião, as entidades participaram de uma audiência pública sobre o tema: “Por mais transparência e participação social”. No debate, Cristiano Ferri, servidor da Câmara, apresentou aos presentes o Laboratório Hacker, que também serve como ferramenta de transparência. Segundo Ferri, o laboratório “é um espaço para promover o desenvolvimento colaborativo de projetos inovadores em cidadania relacionados ao Poder Legislativo”.

Outro instrumento de interação com o cidadão apresentado foi o e-democracia, que é uma ferramenta de participação popular no processo legislativo. “Essa ferramenta é muito utilizada quando o relator de um projeto quer ideias e opiniões para aperfeiçoamento deste projeto”, destacou Ferri.

Para Pétala Brandão, da Rede Conectas, as propostas são fruto do trabalho legítimo e bem articulado de entidadesque representam o interesse público. “Diante da atual conjuntura, precisamos garantir que não haja retrocessos no  campo dos direitos humanos”, afirmou.

Estiveram presentes nas atividades as seguintes entidades: Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec); Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação; Aliança de Controle  de Tabagismo e de Promoção da Saúde (ACT);Transparência Internacional; Rede Justiça Criminal e Conectas Direitos Humanos; Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc); Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE); Instituto Sou da Paz; Avaaz e Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim).

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação