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PROJETO QUE PROÍBE LIMITAÇÃO DE DADOS NA INTERNET FIXA É APROVADO NO SENADO

Projeto proíbe as operadoras de internet de estabelecer franquias de dados em seus contratos de banda larga fixa 

O plenário do Senado aprovou na quarta-feira, dia 15, o Projeto de Lei do Senado (PLS 174/2016) que proíbe as operadoras de internet de estabelecer franquias de dados em seus contratos de banda larga fixa. O projeto altera o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) para vedar, expressamente, os planos de franquias de dados para esse tipo de serviço.

Na justificativa do projeto, o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) destacou que diversos aspectos do exercício da cidadania dependem da internet, como ensino à distância, declaração do imposto de renda e pagamento de obrigações tributárias, de modo que, a seu ver, não seria razoável limitar o tráfego de dados na rede. Segundo o senador, “limitar o uso da internet seria uma péssima novidade no Brasil, sendo somente repetida em países liderados por governos autoritários, que cerceiam o acesso à informação por parte de seus cidadãos”.

Responsável pelo relatório o senador Pedro Chaves (PSC-MS) diz que a internet tem papel fundamental na inclusão social, no exercício da cidadania e como indutora de inovação e avanço tecnológico. Para ele, é inadmissível que haja esse tipo de limitação na internet fixa, o que poderia prejudicar consumidores, empresas e ações governamentais.

A senadora Vanessa Grazziotin afirmou que a internet atualmente é sinônimo de acesso à informação e, cada vez mais, se configura como um bem de primeira necessidade para a população.

Ela lembrou que o Brasil viveu uma grande polêmica no ano passado porque as empresas operadoras de telecomunicações revelaram a intenção de passar a limitar o acesso à internet por banda larga fixa, de telefonia fixa. “Isso faria com que encarecesse enormemente o custo do serviço, que nós não podemos mais tratar como um serviço qualquer, como um serviço passível de ser escolhido para que a população acesse ou não, porque a internet hoje significa exatamente a informação, o acesso à informação”, destacou.

O senado chegou à conclusão de que o próprio Marco Civil da Internet não permite que haja essa limitação e essa cobrança. “Quando há a contratação do serviço de internet para a telefonia fixa, as famílias contratam uma velocidade, e não um conteúdo limitado. Elas estão contratando a velocidade, aliás, diga-se de passagem, nunca chegamos sequer perto da velocidade comprada”, reclamou Grazziotin.

O Brasil hoje conta com mais de 56 milhões de brasileiros conectados pela internet – algo em torno de 56% da população, mas ainda em um nível muito abaixo ao de vários outros países. E a mudança na forma de contratação de banda larga poderia criar um efeito de diminuir ainda mais o acesso da população ao serviço.

Uma pesquisa realizada pelo DataSenado, entre maio e junho do ano passado, revelou que 99% de um total de 608.470 internautas entrevistados são contrários à limitação de dados na internet de banda larga fixa.

Por meio do portal e-Cidadania, quase 35 mil internautas opinaram sobre o projeto que impede a limitação de dados. Praticamente a totalidade se manifestou a favor, já que apenas 308 votaram contra. Esse número representa menos de 1% do total de votos.

Debates
O tema também mobilizou o Senado em debates. No início de maio, uma audiência pública promovida em conjunto pela Comissão de CCT e pelas Comissões de Serviços de Infraestrutura (CI) e de Meio Ambiente e Defesa do Consumidor (CMA) trouxe representantes de empresas, de consumidores, da Anatel e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para discutir o problema. O presidente da OAB, Claudio Lamachia, também participou de uma reunião do Conselho de Comunicação em que o assunto foi debatido.

A matéria segue agora para análise da Câmara dos Deputados. A proposta não altera as regras dos planos de internet móvel.

O presidente do Senado, Eunício Oliveira, informou hoje, dia 16, que pediu ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, rapidez na tramitação do Projeto de Lei do Senado (PLS) 174/2016.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações da Agência Senado

Temer sanciona lei que ataca caráter público da EBC

Medida Provisória que acaba com Conselho Curador da emissora e com a independência do mandato diretivo recebeu vetos que resultam em falta de autonomia em relação ao governo

A Presidência da República sancionou nesta quinta-feira, dia 2, a Lei 13.417/2017, originada da Medida Provisória 744/2016 – lei que altera a estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), enfraquece seu caráter público e reforça a decisão do governo de transformá-la em uma emissora dedicada meramente à reprodução de conteúdo de assessoria governamental.

A lei extingue o Conselho Curador, põe fim à independência do mandato do presidente da empresa, que poderá ser substituído a qualquer momento pelo governo de turno, e cria um Conselho de Administração e uma diretoria-executiva como novos órgãos gestores.

Entre os vetos apresentados, Michel Temer retirou da lei a prerrogativa do Comitê Editorial e de Programação de deliberar sobre planos editoriais propostos pela diretoria-executiva para os veículos da EBC, de deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela EBC e de convocar audiências e consultas públicas sobre os conteúdos produzidos. Ou seja, da nova lei resulta a existência de um comitê figurativo, sem força para atuar como representante da sociedade civil na empresa.

No texto que saiu do Legislativo, caberia ao Comitê deliberar sobre questões relativas aos planos editoriais propostos pela diretoria, “na perspectiva da observância dos princípios da radiodifusão pública”, e também “deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela empresa”. Agora, tais deliberações são exclusivas da diretoria-executiva, cuja gestão estará subordinada completamente aos interesses do governo. Do que resulta a transformação da EBC em uma empresa dedicada à comunicação estatal, e não mais à comunicação pública.

Temer ainda vetou o dispositivo que previa mandato máximo de quatro anos para os membros da diretoria-executiva da EBC e rejeitou um outro que determinava a nomeação do diretor-presidente da estatal somente após aprovação de sua indicação pelo Senado Federal. Portanto, na versão final da lei, caberá ao ocupante do cargo de presidente da República a decisão soberana sobre quem comandará a empresa de comunicação e por quanto tempo permanecerá no cargo.

Censura e silenciamento

Durante a votação da MP 744/2016 no Senado Federal, a senadora Fátima Bezerra (PT-PI) lembrou que, em outubro de 2016, o Ministério Público Federal apresentou uma nota técnica sobre a Medida Provisória, apontando que esta poderia trazer como consequência a fragilização estrutural da EBC, com “a subordinação da empresa às diretrizes do governo e o seu condicionamento às regras estritas de mercado”. Abrindo-se, desta forma, espaço para a prática da “censura de natureza política, ideológica e artística”, tanto pela definição da linha editorial da empresa e da programação na perspectiva dos interesses dos governantes quanto pelo silenciamento das vozes divergentes ao governo.

“Teremos um comitê editorial que será chapa branca, pois terá que atender às demandas vindas do governo e sempre estará à mercê do humor de quem está na direção”, lamentou Fátima Bezerra, sem saber à época que os futuros vetos presidenciais acabariam de vez com qualquer participação social na empresa.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), por sua vez, enfatiza que o governo comete um ato inconstitucional com a MP, pois a existência de um sistema de comunicação pública não-governamental faz parte de algo que já está previsto na Constituição, em seu artigo 223, que é a complementaridade entre os sistemas público, estatal e privado de comunicação. Essa complementaridade teria por objetivo assegurar a efetiva realização da liberdade de manifestação do pensamento, pela possibilidade de serem ouvidas outras vozes, além daquelas emitidas pelos ocupantes de cargos públicos e pelas forças que controlam o mercado.

“A EBC foi criada para preencher uma lacuna que estava aberta na comunicação com a sociedade. O objetivo dessa empresa não deve ser o lucro, e sim a comunicação independente, educativa e cultural. E é isso que tanto incomoda ao governo: a liberdade para mostrar um lado diferente do que predomina na mídia nativa”, reforçava Gleisi Hoffmann à época.

Desmonte da comunicação pública

A Lei 13.417/2017 foi sancionada depois de um ato arbitrário do governo envolvendo o jornalista Ricardo Pereira de Melo, ex-presidente da empresa. Ele foi afastado pelo então presidente interino Michel Temer (PMDB) em maio de 2016, logo depois do afastamento provisório de Dilma Rousseff.

Um dia após sua demissão, Melo protocolou mandado de segurança (nº 34.205) no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando sua exoneração, já que tinha estabilidade no cargo. Na antiga estrutura da EBC, organizada pela Lei 11.652/2008, o presidente da estatal tinha um mandato de quatro anos, independentemente de quem ocupava o cargo de presidente da República.

Melo retornou à presidência da EBC em liminar proferida pelo ministro Dias Toffoli, do STF. Na decisão, o magistrado reconheceu que o artigo 19, parágrafo 2º, da Lei 11.652/2008 determinava claramente que o mandato do presidente da EBC era de quatro anos e só poderia ser interrompido por decisão do Conselho Diretor da empresa.

Segundo Toffoli, essa condição mostrava o “nítido intuito legislativo de assegurar autonomia à gestão da diretoria-executiva da EBC, inclusive ao seu diretor-presidente”. “Em análise precária, portanto, me parece que seria esvaziar o cerne normativo dos dispositivos interpretá-los — tal qual propõe a autoridade impetrada — no sentido da existência de mandato apenas na expressão, mas não em seu conteúdo”, afirmava o ministro do STF em sua decisão.

Governo impôs decretos sobre leis

Entre o afastamento arbitrário de Melo por Michel Temer e a liminar proferida por Dias Toffoli no dia 2 de junho de 2016, a presidência da EBC foi ocupada pelo também jornalista Laerte Rímoli. Para reverter a decisão do STF, Michel Temer alterou em setembro, por decreto, o estatuto da EBC, garantindo a nomeação de Rímoli como presidente da empresa. A mudança estatutária transformou a presidência da EBC em um cargo de livre nomeação do presidente da República.

Por meio de outro decreto, o governo demitiu então Ricardo Melo, nomeando Laerte Rímoli para o cargo. Rímoli chefiou o setor de comunicação da Câmara dos Deputados durante parte da gestão do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e também integrou a campanha do senador Aécio Neves (PSDB-MG) à Presidência da República em 2014, quando o tucano foi derrotado por Dilma Rousseff nas urnas.

Segundo a Lei das Estatais, portanto, Rímoli não poderia ocupar o cargo de presidente da EBC. Mas Temer preferiu ignorar também essa lei. Ao mesmo tempo, o governo editou a Medida Provisória 744/2016 para alterar a Lei 11.652/2008 e tornar o cargo de diretor-presidente de livre nomeação e exoneração do ministro-chefe da Casa Civil, “oficializando” o que já havia feito por meio de decreto.

A MP 744 e os decretos foram questionados por Ricardo Melo sob o argumento de que os atos de Temer violaram a soberania da Justiça e o ato jurídico perfeito. A ação fez com que o governo federal voltasse atrás e editasse um terceiro decreto, tornando sem efeito a exoneração do jornalista. Essa mudança fez com que Dias Toffoli declarasse a perda de objeto do mandado de segurança apresentado por Melo logo após a sua exoneração.

Entretanto, é certo que as mudanças trazidas neste terceiro decreto de Temer não resolveram os problemas ocasionados na gestão da EBC pelas medidas arbitrárias do atual governo. Pelo contrário, apenas reforçam que, com a nova estrutura, a empresa responderá ainda mais às demandas do governo de turno, deixando de fazer uma comunicação de caráter público e inviabilizando a complementariedade entre os sistemas privado, público e estatal prevista na Constituição Federal.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações da Agência Senado

MPF PEDE SUSPENSÃO DA OUTORGA DE RÁDIO PERTENCENTE A FAMÍLIA DE AÉCIO NEVES

Procuradores afirmam que o senador “violou, durante quase seis anos, dispositivo expresso da Constituição, deturpando o princípio democrático dos meios de comunicação”

O Ministério Público Federal (MPF) de Minas Gerais ajuizou, nesta quarta-feira, dia 22, uma ação pública na qual pede o cancelamento da permissão de funcionamento da Rádio Arco Íris, que opera em Belo Horizonte como Jovem Pan FM e que, por quase seis anos, teve como um dos sócios o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

A ação  civil pública ajuizada pela pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), órgão do MPF recorre ao artigo 54 da Constituição que “proíbe que parlamentares firmem ou mantenham contrato com empresas concessionárias de serviço público”, segundo nota divulgada pelo MPF, em Belo Horizonte. “Por isso, deputados e senadores não podem figurar como sócios de pessoas jurídicas concessionárias do serviço público de radiodifusão”, segue a nota.

Os procuradores pedem o cancelamento da outorga do direito de prestação de serviço de radiodifusão porque a rádio, ao ter Aécio Neves como sócio da empresa, entre 28 de dezembro de 2010 a 21 de setembro de 2016, “violou, durante quase seis anos, dispositivo expresso da Constituição, deturpando o princípio democrático no tocante aos meios de comunicação”. Nesse período o tucano tinha 44% do capital social da empresa. Hoje, 95% das cotas estão com sua irmã, Andrea Neves, e 5% com sua mãe, de acordo com a procuradoria.

A defesa dos procuradores é que a União seja “obrigada a determinar a suspensão da outorga do serviço de radiodifusão sonora da Rádio Arco Íris”, em caráter definitivo e abstendo-se ainda de renová-la e que a rádio seja condenada a não mais operar na frequência FM 99,1 MHz.

A ação ainda faz menção a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reforçou que deputados e senadores não podem ser sócios de empresas de radiofusão. O argumento seria prevenir riscos de uso de meios comunicação de massa para atender a interesses de um ou outro político como foi levantado pelo Supremo no julgamento a Ação Penal 530, confirmando que os artigos 54, I, “a” e 54, II, “a” da Constituição contém uma proibição clara que impede deputados e senadores de serem sócios de pessoas jurídicas titulares de concessão, permissão ou autorização de radiodifusão.

Alegação da Defesa

O advogado da Rádio Arco-Íris, José Saad Júnior se pronunciou através de nota afirmando que a iniciativa dos procuradores contraria um entendimento baseado na Lei das Telecomunicações e que “prevalece há décadas”, segundo o qual, deputados e senadores “estão impedidos apenas de exercer função de direção nas respectivas empresas”.

Ainda segundo o texto, “a questão está superada porque o senador Aécio Neves não faz mais parte da sociedade, tendo nela permanecido por menos de seis anos. Tanto assim que o senador não é réu na ação proposta”.

Ele ainda alegou que a Advocacia Geral da União (AGU) já se manifestou em sentido contrário ao postulado pelo MPF.

AGU tenta barrar as vitórias contra as concessões de políticos

A Advocacia-Geral da União (AGU) requereu em outubro ao ministro Gilmar Mendes, do STF, “medida cautelar incidental” com o objetivo de suspender o andamento de todos os processos e decisões judiciais que tenham relação com a outorga e a renovação de concessões de rádio e televisão mantidas por empresas de parlamentares. A medida pretende conter uma série de vitórias que as entidades do campo da democratização da comunicação estão obtendo nos estados, como por exemplo a decisão  por meio de liminar que determinou a interrupção das transmissões da Rádio Metropolitana Santista Ltda (1.240 MHz) de propriedade de Antônio Carlos Bulhões (PRB-SP), em agosto passado.

Em resposta à ação da AGU, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), autor de duas ações no Supremo que tratam deste tema, em conjunto com representantes do Intervozes e da Artigo 19, organizações que solicitaram participar das ações na figura de amicus curiae, se reuniram a época com o ministro Gilmar Mendes. O PSOL e as entidades entregaram ao relator das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 246 e 379 uma petição solicitando que ele, antes de analisar o pedido da AGU, conceda as medidas liminares solicitadas nas ADPFs.

As arguições ajuizadas no STF estão fundamentadas sobre o fato de que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que políticos com mandato eletivo sejam beneficiados com a outorga de concessões de emissoras de rádio e de televisão. A ADPF 246 foi protocolada em dezembro de 2011, enquanto que a ADPF 379, em dezembro de 2015. Ambas contam com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República e aguardam a apresentação de voto de um mesmo ministro, Gilmar Mendes.

Conflito de Interesses

Em março de 2012 o Ministério Público Estadual (MPE) de Minas Gerais instaurou inquérito civil para investigar repasses feitos pelo governo daquele estado à Rádio Arco-Íris entre 2003 e 2010, época em que o tucano Aécio Neves comandou o governo mineiro.

Além do ex-governador, também foi citada no inquérito civil MPMG-0024.12.001113-5 sua irmã, Andrea Neves, responsável pelo controle do gasto com comunicação, inclusive a publicidade oficial, durante a gestão do irmão.

Entre 2003 e 2014, foi repassado um total R$ 1,2 milhão a três rádios e um jornal ligados à família de Aécio Neves (PSDB-MG).

Segundo levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo, a maior fatia foi direcionada a rádios e jornais controlados por Aécio Neves e sua família. A parte que coube à Arco-Íris chegou a R$ 1,06 milhão, frente a R$ 51,8 mil e R$ 45,5 mil investidos nas rádios São João Del Rey e Vertentes FM, respectivamente – ambas de São João Del Rei (MG).

Arquivamento

O caso deflagrou uma briga interna no MPE de Minas. Depois de o então procurador-geral de Justiça do Estado, Alceu José Torres Marques, arquivar representação para verificar se a Arco-Íris recebia recursos do governo durante a gestão dele – e em que Andrea presidia o grupo técnico de comunicação da gestão estadual. A representação contra o senador do PSDB de Minas Gerais foi apresentada à Procuradoria-Geral da República em maio de 2011, por deputados da oposição.

O promotor João Medeiros, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, chegou a instaurar inquérito civil para apurar repasses publicitários do Executivo, mas Marques novamente arquivou a denúncia. O caso foi parar no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que”confirmou o engavetamento”.

Os Neves receberam a outorga do Ministério das Comunicações e a a concessão da emissora de rádio em 1987.

Coronéis da Mídia

O projeto “Excelências”, vinculado ao Transparência Brasil, aponta que, na atual legislatura (2015-2019), 43 deputados são concessionários de serviços de rádio ou TV, o que representa 8,4% do total dos membros da Câmara dos Deputados. Proporcionalmente, o Senado Federal é ainda mais marcado por este fenômeno, já que 19 senadores são concessionários – o que representa 23,5% dos membros da Casa. Entre estes senadores, figuram ainda Edison Lobão (PMDB-MA), Fernando Collor de Mello (PTB-AL), Agripino Maia* (DEM-RN), Tasso Jereissati (PSDB-CE), Jader Barbalho (PMDB-PA), Acir Gurcacz (PDT-RO) e Roberto Coelho Rocha (PSDB-MA).

Os números apresentados pelo projeto “Excelências” revelam que, para além da vinculação juridicamente registrada de políticos com os serviços de radiodifusão, existe ainda os casos em que os parlamentares mantêm influência sobre as empresas a partir de laranjas ou de parentes que ocupam posições no quadro societário dos veículos.

O domínio político sobre os meios de comunicação expõe um grave conflito de interesses, uma vez que o próprio Congresso Nacional é responsável pela apreciação dos atos de outorga e renovação de concessões e permissões de radiodifusão.

O fato de concessões públicas estarem no poder de políticos resulta em falta de isonomia, em desrespeito ao pluralismo e em uma grave ameaça ao interesse público, pois o sistema brasileiro de regulação de radiodifusão não prevê a existência de um agente independente para deliberar sobre a distribuição do espectro eletromagnético. Deste modo, tal deliberação é realizada por um procedimento licitatório no qual os parlamentares do Congresso Nacional ocupam um papel central, analisando as outorgas realizadas pelo Poder Executivo.

*Para livrarem-se de possível perda da concessão de radiodifusão, o senador Agripino Maia e seu filho, o deputado Felipe Maia, venderam a participação no Sistema Tropical de Comunicação, porém a concessão continua nas mãos de familiares.

Por: Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação com informações da Rede Brasil Atual

Câmara dos Deputados teve pressa para aprovar anistia a rádios e TVs

Medida Provisória entrou em votação no plenário apenas algumas horas depois do assunto ter sido analisado pela comissão mista responsável

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira, dia 21, a Medida Provisória (MP) 747/2016, que altera as regras do processo de renovação de outorga dos serviços de rádio e televisão previstas na Lei 5.785/1972. O relatório, de autoria do deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT), havia sido aprovado na tarde do mesmo dia na comissão mista da MP.

A MP 747 altera o processo de concessão de rádios e TVs, determinando que interessados em renovar a concessão ou a permissão devem apresentar requerimento nos 12 meses anteriores ao término do respectivo prazo da outorga. As entidades que não fizerem o pedido de renovação no tempo previsto serão notificadas para que se manifestem em até 90 dias. Também será possível regularizar permissões que já estejam vencidas. Estas determinações “afrouxam” os deveres das emissoras, que prestam serviço por meio de uma concessão pública.

Na prática, a medida concede anistia ampla e geral às emissoras que estavam com suas concessões vencidas ou que não tinham solicitado a renovação no prazo legal. Quase a metade das emissoras de rádio de todo o país estão nesta situação, além de um grande número de emissoras de TV.

Rádios Comunitárias

Durante a apresentação do parecer do relator da MP 747/2016, os deputados e senadores presentes acordaram em incluir as rádios comunitárias na mesma anistia. Porém o deputado André Figueiredo (PDT-CE) alertou em plenário para o fato de o texto da Medida Provisória 747 separar em artigos diferentes a renovação de concessões, permissões e autorizações de radiodifusão. Ele questionou as intenções do relator em separar os artigos. “O texto poderia fazer menção a concessões, permissões e autorizações de serviços de radiodifusão no mesmo artigo, e não deixar as autorizações que regem as rádios comunitárias em artigos diferentes. Isso sinaliza uma intenção de veto [posterior]”, destacou.

André Figueiredo apresentou destaque de emenda ao relatório, pretendendo incluir as rádios comunitárias no mesmo artigo da MP que trata das concessões, mas a proposta foi rejeitada por 184 votos a 160 pelo plenário.

Texto Aprovado

As rádios comunitárias que não renovaram suas concessões dentro do prazo serão atendidas em suas reivindicações, e aquelas que ainda não deram entrada no processo terão um período adicional de 60 dias para regularização.

Na votação em plenário, deputados retiraram do projeto o trecho que previa que concessionários só poderiam renovar os prazos de concessão, permissão e autorização se tivessem cumprido todas as “obrigações legais e contratuais, mantido a mesma idoneidade técnica, financeira e moral, e atendido o interesse público”.

A MP aprovada manteve os prazos de concessão, permissão e autorização em 10 anos para rádios e em 15 anos para TVs. O novo texto diz que os prazos poderão ser renovados por períodos sucessivos e iguais, mas não prevê mais como requisito para renovação que os concessionários cumpram obrigações legais e mantenham idoneidade técnica, financeira e moral.

Comissão Mista

Durante a tramitação, a MP 747/2016 recebeu 41 emendas. O relator acolheu integralmente duas delas, e uma terceira de forma parcial.

Uma das emendas acolhidas integralmente, de autoria do deputado Sandro Alex (PSD-PR), tratava sobre “ocupações e multifuncionalidades geradas pela digitalização das emissoras de radiodifusão, novas tecnologias, equipamentos e meios de informação e comunicação”. Essa emenda abre espaço à regulação da multifuncionalidade, caracterizando uma possível precarização do trabalho.

Já a emenda apresentada pelo deputado Esperidião Amin (PP-SC) foi parcialmente recebida. Ela listava uma série de questões a se levar em consideração para atestar a idoneidade moral prevista no projeto.

Mas a principal alteração no texto foi motivada pela emenda 27, de autoria do deputado André Figueiredo, que estende o mesmo benefício de anistia às rádios comunitárias e educativas. O texto segue agora para o Senado. Caso não seja votado até o dia 12 de março, os efeitos da medida perdem validade e ela será arquivada.

Uso indevido de MPs

O governo vem recebendo críticas por não oferecer tempo aos necessários debates sobre os temas de seu interesse, o que ocorreria durante a tramitação dos respectivos projetos no Legislativo. Ao invés disso, tem governado mediante a edição de uma série de medidas provisórias (MPs).

Ao contrário dos demais projetos discutidos no Congresso, que precisam ser aprovados para ter validade, as medidas provisórias têm efeito de lei e aplicação imediata já a partir de sua publicação. Depois de entrar em vigor é que a MP vai ser analisada pelo Congresso Nacional para ser transformada definitivamente em lei.

Desde que assumiu o cargo, Michel Temer já encaminhou para análise dos parlamentares um total de 41 MPs, sendo duas delas na primeira semana deste ano.

De acordo com alguns técnicos legislativos do Senado, responsáveis por acompanhar a correta tramitação dos projetos e medidas na Casa, o que está ocorrendo é “uma banalização das MPs”. A Medida Provisória é um instrumento com força de lei elaborado em casos de relevância e urgência, dizem os técnicos, e a maioria das medidas editadas no governo de Michel Temer não seguem esse critério.

Por: Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

INFORMAÇÕES MAL APURADAS CONTRIBUEM PARA SENSAÇÃO DE CAOS NO ES

Relações entre a mídia e governos locais ainda são entrave ao direito à informação; violência no Espírito Santo é caso singular desta situação

Por Cinthya Paiva e Augusto Cesar Brandão*

O Espírito Santo vive uma de suas maiores crises de segurança pública. Embora boa parte dos policiais militares que estava aquartelada tenha retornado aos postos de trabalho no início desta semana, as informações sobre o fim da paralisação e sobre os acordos feitos entre os policiais militares e o governo estadual ainda são desencontradas e confusas.

Desencontro e confusão na apuração e publicização das informações, aliás, marcaram todo o período, mostrando mais uma vez a incapacidade da imprensa capixaba em produzir informações contundentes sobre o que estava acontecendo de fato no Estado.

Muito do que chegou ao conhecimento do público nacional foram boatos, a maioria divulgados via redes sociais como Facebook e Whatsapp e sem muita garantia de procedência. Não se sabe, por exemplo, se alguns vídeos postados foram produzidos pelos próprios policiais para difundir o clima de insegurança e pressionar o governo a abrir negociação.

Esta falta de informação não ocorre por acaso. Assim como na maioria dos estados do País, no Espírito Santo grupos de mídia possuem relação muito estreita com o poder institucionalizado, ora em função das relações interpessoais construídas, ora porque os governos estaduais são grandes financiadores da imprensa local, por meio de anúncios publicitários.

Tudo isto acaba dificultando processos de apuração da notícia quando esta envolve denúncias de corrupção ou pressão de grupos sobre governos. Basta lembrar que, no início dos anos 2000, quando acontecia a CPI do Narcotráfico – que acabou na prisão do presidente da Assembleia Legislativa do Estado, José Carlos Gratz – os primeiros veículos de imprensa a repercutir o assunto foram os nacionais como Veja, Época e IstoÉ, sendo seguidas depois pela imprensa local.

No episódio recente do aquartelamento dos PMs, as informações também foram pouco apuradas.  Para se ter uma ideia, na sexta-feira 10, o Jornal Nacional noticiou que o governo estadual havia realizado um acordo com as Associações de Policiais Militares para encerrar a suposta “greve”. Informação que não foi confirmada minutos depois pelo Secretário Estadual de Direitos Humanos, Julio Pompeu, em entrevista coletiva transmitida ao vivo por algumas cadeias de TV.

Vale lembrar que um dos principais grupos de mídia capixaba, a Rede Gazeta, é afiliada da TV Globo, logo, deve ter sido a origem da informação equivocada emitida pelo JN.

Não bastasse isto, logo após a entrevista coletiva do representante do governo, foi iniciada outra entrevista coletiva, desta vez com as Associações dos Policiais Militares, interlocutores do acordo que encerrou a suposta “greve”.

Apesar do interesse público desta entrevista, que poderia esclarecer parte do que estava acontecendo no estado, ela não teve transmissão ao vivo pela grande imprensa local, nem tampouco apareceu como informe em plantões de notícia, sendo acessível apenas por um link no Facebook, colocado pelos próprios PMs e reproduzido nas páginas da imprensa na internet.

É importante destacar que as Associações dos Policiais Militares, que supostamente entraram em acordo com o governo, não eram, até então, protagonistas do movimento de reivindicações de ajuste salarial e melhores condições de trabalho – que estava sendo protagonizado por mulheres, amigos e familiares dos PMs, que cercaram os portões dos quartéis.

E não houve, por parte da imprensa local, qualquer questionamento sobre esta nova interlocução, nem sobre o fato de ela ter gerado o “acordo” firmado com a categoria – o que coloca o próprio acordo em cheque. Também não foi questionado o uso de helicópteros da Polícia Militar para retirar dos quartéis os policiais que aparentemente queriam voltar ao trabalho, mas estavam sendo impedidos de sair.

Aumento da criminalidade

Outro ponto-chave em toda a crise capixaba foi a cobertura sobre o aumento da criminalidade. É claro que a maior parte dos vídeos divulgados com cenas de assaltos à mão armada, saques e tiroteios não teve os grandes meios como principais divulgadores.

A maior parte circulou pelas redes sociais, especialmente, o Whatsapp. Porém, é questionável o papel da imprensa tradicional de não apurar a origem destes vídeos e apenas reproduzi-los em suas reportagens, o que, certamente, contribuiu para o aumento da sensação de insegurança e de falta de ordem.

Todos os dias, a imprensa local divulgava os dados “extraoficiais” dos assassinatos de pessoas – que passou de 140 em 10 dias de paralisação –, tendo como fonte o Sindicato da Polícia Civil.

Organizações de direitos humanos questionaram estes números e denunciaram possível participação de PMs nestas mortes chamadas, até então, de “acertos de contas” entre bandidos. Esta possibilidade encontra eco no histórico comprometimento da PM capixaba com grupos paramilitares e esquadrões de extermínio, mas quase nada se apurou sobre isto.

Depois de muita cobrança da sociedade, os veículos de imprensa locais começaram a destacar repórteres para apurar quem eram os mortos. Ainda assim, é preciso pesquisar com maior profundidade as circunstancias de cada morte e acompanhar os inquéritos que serão abertos pela Polícia Civil para investigar os casos.

Criminalização do movimento

A Constituição veda aos policiais militares o direito de fazer greve, uma vez que a função da manutenção da ordem e segurança pública por meio de armas de poder letal é indelegável, motivo pelo qual a categoria optou por fazer um movimento de aquartelamento amparado nos familiares, que impediam a entrada e a saída de viaturas e dos próprios PMs dos quartéis. As reivindicações do movimento eram melhores salários, bonificações e melhores condições de trabalho.

O enfoque maior da imprensa, no entanto, foi na ilegitimidade do papel das mulheres dos policiais aquartelados e a responsabilização da própria PM pela insegurança nas ruas. Em nenhum momento o governador do estado, Paulo Hartung, foi questionado por não ter aberto diálogo imediato com a categoria de policiais – como se não houvesse responsabilidade da gestão estadual no atual estado de caos pelo qual passou o Espírito Santo.

Além disso, o governo também já declarou que vai abrir processo administrativo disciplinar contra mais de 700 PMs para apurar se houve crime de motim e já foram indiciados 155 policiais, que após passarem por um processo administrativo disciplinar, poderão ser demitidos.

Valeria questionar ao governador e secretários estaduais – papel da imprensa fazer tais questionamentos – se, na conjuntura de suposto aumento da criminalidade e de falta de recursos para o reajuste de salário (justificativa do Governo para não fazer negociação), é acertada a decisão de punir os insurgentes. Mas, até agora, sobre isto, segue prevalecendo o silêncio.

O suposto acordo firmado previa que os policiais militares deveriam comparecer ao trabalho às 07 horas da manhã seguinte (sábado, dia 11). Ainda assim, na segunda-feira, dia 13, ônibus de algumas linhas não passaram por certos bairros e outras linhas ficaram desativadas.

As atividades de ônibus e shoppings foram suspensas às 21h. Algumas escolas não tiveram atividades regulares como anunciado. Ainda, três ônibus foram queimados e em Vila Velha, cidade da Grande Vitória, e o Convento da Penha, ponto turístico da cidade, foi assaltado.

Com o fim da paralisação noticiada na última sexta-feira, aos poucos policiais militares estão retornando às ruas. Informe da assessoria da Secretaria de Estado da Segurança (Sesp) disse na terça, dia 14, que 2.351 policiais militares responderam ao chamado operacional feito pelo comando geral da PMES em todo o Estado. E que o policiamento ostensivo durante aquele dia contou com 157 viaturas. O chamado operacional começou no último sábado com cerca de 600 policiais retornando aos seus pontos de trabalho.

A mídia noticiou a volta das atividades normais após o acordo, mais uma vez, cumprindo o papel de correia de transmissão de informações oficiais do governo. O que se tem observado, no entanto, é que algumas mulheres de PMs ainda seguem movimentando as portas dos quartéis. Não se sabe ao certo se houve um acordo de fato com a categoria ou se o próprio movimento foi minado por dentro. Pode ser que o “acordo” feito com a categoria não esteja tão selado assim.

Cinthya Andrade de Paiva Gonçalves é advogada e membro do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. Augusto Cesar Coutinho Brandão é gestor de projetos e neurolinguista.

Publicado originalmente no blog do Intervozes na Carta Capital em 16 de fevereiro de 2017.