Após a má repercussão da declaração do diretor-executivo do Ministério das Comunicações, Cezar Alvarez, sobre a questão do novo marco regulatório das comunicações, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e o Partido dos Trabalhadores (PT) se manifestaram na semana passada exigindo urgência no avanço da democratização das comunicações no Brasil. As afirmações feitas nos documentos dos partidos reforçam o ponto de vista expresso na nota pública lançada pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), no qual se critica a postura do governo de não discutir a regulamentação do setor e se conclama à mobilização popular.
Tanto a nota pública do setorial de comunicação e cultura do PSOL quanto a resolução do diretório nacional do PT destacam a mobilização da sociedade em torno da campanha “Para expressar a liberdade”, coordenada pelo FNDC, que reivindica um novo marco regulatório e propõe atualmente a elaboração de um projeto de lei de iniciativa popular para o setor.
A declaração de Alvarez suscitou também imediatamente reações individuais de deputados federais. Para Luiza Erundina (PSB-SP), “os governos Lula e Dilma pouco avançaram na democratização das comunicações no Brasil" e “a legislação precisa ser atualizada para garantir a democratização dos meios, assegurar a liberdade de expressão – o que é diferente da liberdade de empresa – e a eliminação de monopólios e oligopólios”. Segundo Jorge Bittar (PT-RJ), a atualização da lei é necessária principalmente para rever as regras para as concessões de radiodifusão, sobretudo diante da chegada da TV digital e da convergência de mídias. Ivan Valente afirma que "de maneira previsível, Dilma segue com sua política de acomodação de interesses, segue ignorando as resoluções aprovadas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação realizada em 2009".
Segue abaixo as declarações dos partidos.
A democratização da comunicação não pode esperar pelo projeto de poder do PT
Nota pública do Setorial de Comunicação e Cultura do PSOL
No dia 20 de fevereiro, o secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Cezar Alvarez, fez uma declaração diante de uma plateia de cerca de 400 representantes das grandes empresas do setor no país com a qual reafirmou o que se torna cada vez mais evidente: a falta de compromisso do Governo Federal com qualquer avanço relevante no sentido da democratização dos meios de comunicação.
Colocando interesses eleitoreiros como prioridade, preocupado em apaziguar os ânimos das elites conservadoras do país e, ao mesmo tempo, garantindo privilégios comerciais aos “donos da mídia”, o representante do governo defendeu ser impossível colocar um novo marco regulatório das comunicações em discussão de forma ampla em um ano pré-eleitoral
O mau fundamento da justificativa, haja vista que anos pré-eleitorais e eleitorais se alternam no Brasil, expressa a lógica que se perpetua no projeto político do atual governo, que não rompe com a dos que o precederam: assegurar a própria permanência nos altos postos do poder ao preço de bloquear anseios de ampliação dos espaços democráticos por parte da população.
A presidenta Dilma, o ministro Paulo Bernardo e o PT desconsideram, em nome de mais vitórias eleitorais e de acordos tácitos com o capital da radiodifusão, a urgência de uma atualização da legislação de comunicação no país que leve em conta avanços democráticos, como a desconcentração da propriedade, a exploração da radiodifusão como verdadeira concessão pública (e não como bem de uso privado para fins particulares) e a garantia do direito à comunicação como um direito que efetiva outros direitos.
O PT, ainda que se esforce para se apresentar como partido compromissado com o avanço da democratização da comunicação e que muitos de seus filiados realmente acreditem e lutem por essa bandeira, é desacreditado pelo governo Dilma, que prorroga a vigência de um quadro legal assentado em leis como a Lei Geral de Telecomunicações, que já comemora seus 50 anos e antecede o lançamento do primeiro satélite no espaço. O atual marco jurídico tem beneficiado o desenvolvimento e manutenção do oligopólio nacional de empresas como Globo, Record, SBT e Band e da concentração de poder por parte de grandes grupos internacionais como América Móvil, Telefônica da Espanha e Portugal Telecom.
A sociedade civil, por um lado, se organiza em torno de uma campanha nacional para exigir a garantia da liberdade de expressão e do direito à comunicação, materializados em uma lei ampla. O governo petista, por outro, faz vista grossa e se fecha ao diálogo com esse setor, tocando em frente um conjunto de pequenas reformas fragmentadas que remendam as leis de acordo com as reivindicações mais imediatistas do capital do setor. Sinalizou e assumiu o compromisso com as entidades que lutam pela democratização da comunicação de que em algum momento colocaria em consulta pública o tema, mas fez-se de rogado, e simplesmente não cumpriu com sua palavra sem maiores explicações.
Comunicadores populares, enquanto isso, sofrem a perseguição da Anatel. Esta, sob pressão da burguesia radiodifusora dirigida pela Abert, fecha violentamente, com auxílio da polícia federal, rádios comunitárias e garante a festa da radiodifusão comercial, que não recebe a devida e necessária fiscalização. Reforçam-se, assim, as evidências de que o Governo Federal preferiu compor com os setores dominantes do que fazer avançar o poder popular e as instâncias de efetivação da democracia.
O setorial de comunicação e cultura do PSOL repudia a postura do governo de se fechar ao diálogo com aqueles que lutam pela efetivação de direitos e por protelar o desencadeamento de um processo tão urgente como a atualização do marco regulatório das comunicações. Reafirmamos, assim, a necessidade de uma atualização do quadro legal, com ampla discussão por parte da sociedade brasileira, que garanta a desconcentração do poder político-econômico, a pluralidade e a diversidade, o direito à comunicação, a liberdade de expressão, o fim da perseguição ao comunicadores populares, o apoio à radiodifusão comunitária e a estruturação de espaços permanentes e participativos de formulação e implementação de políticas de comunicação e cultura.
Democratização da mídia é urgente e inadiável
Resolução do Diretório Nacional do PT
O Diretório Nacional do PT, reunido em Fortaleza nos dias 1 e 2/3/2013, levando em consideração:
1. A decisão do governo federal de adiar a implantação de um novo marco regulatório das comunicações, anunciada em 20 de fevereiro pelo Ministério das Comunicações;
2. A isenção fiscal, no montante de R$ 60 bilhões, concedida às empresas de telecomunicações, no contexto do novo Plano Nacional de Banda Larga;
3. A necessidade de que as deliberações democraticamente aprovadas pela Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), convocada e organizada pelo governo federal e realizada em Brasília em 2009 — em especial aquelas que determinam a reforma do marco regulatório das comunicações, mudanças no regime de concessões de rádio e TV,adequação da produção e difusão de conteúdos às normas da Constituição Federal, e anistia às rádios comunitárias — sejam implementadas pela União;
4. Por fim, mas não menos importante, que o oligopólio que controla o sistema de mídia no Brasil é um dos mais fortes obstáculos, nos dias de hoje, à transformação da realidade do nosso país.
RESOLVE:
I. Conclamar o governo Dilma a reconsiderar a atitude do Ministério das Comunicações, dando início à reforma do marco regulatório das comunicações, bem como a abrir diálogo com os movimentos sociais e grupos da sociedade civil que lutam para democratizar as mídias no país;
II. No mesmo sentido, conclamar o governo a rever o pacote de isenções concedido às empresas de telecomunicações; a reiniciar o processo de recuperação da Telebrás; e a manter a neutralidade da Internet (igualdade de acesso, ameaçada por grandes interesses comerciais);
III. Apoiar a iniciativa de um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para um novo marco regulatório das comunicações, proposto pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), pela CUT e outras entidades, conclamando a militância do Partido dos Trabalhadores a se juntar decididamente a essa campanha;
IV. Convocar a Conferência Nacional Extraordinária de Comunicação do PT, a ser realizada ainda em 2013, com o tema “Democratizar a Mídia e ampliar a liberdade de expressão, para Democratizar o Brasil”.