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Adultização da infância

Talvez você não se dê conta, mas, com certeza, já viu várias propagandas, dos mais variados produtos, que utilizam crianças nos papéis de adultos. Publicidades bem feitas, às vezes, engraçadas e que acabam mexendo com o emocional. Pois bem, esse é o objetivo. Porém, você já parou para pensar no efeito que isso tem na infância? O que essas imagens acabam impactando no universo, na formação das crianças? Essas práticas acabam contribuindo, de certa forma, para a adultização de meninos e meninas, para o que diversas pesquisas destacam como o encurtamento da infância.

Intrigada com o tema, a professora assistente da Universidade do Estado da Bahia, Cristhiane Ferreguett, resolveu pesquisar mais sobre o assunto. Descobriu que as crianças desenvolveram certo grau de ceticismo com relação à publicidade, boa parte sabe que tudo é imaginário, não real. Mas por outro lado identificou que “o discurso publicitário passou a se camuflar e a se inserir em diversos gêneros do discurso, especialmente nas reportagens das revistas infantis”.

Relações dialógicas em revista infantil:o processo de adultização de meninas foi o título da tese de doutorado da professora, defendida em agosto deste ano, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Em entrevista à revistapontocom, Cristhiane traz mais dados do estudo e avalia o contexto da adultização nos dias de hoje.

Acompanhe:

A sua tese tem o objetivo de discutir a questão da adultização das crianças, correto?

Cristhiane Ferreguett – Sim. O título da minha tese é Relações dialógicas em revista infantil: o processo de adultização de meninas; um trabalho de doutorado em letras defendido, em agosto deste ano, na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Trata-se de um estudo sobre o discurso midiático dirigido às crianças, em especial às meninas, na faixa etária dos 6 aos 11 anos de idade. Tomei conhecimento de pesquisas que constataram que a criança desenvolveu certo grau de ceticismo em relação à publicidade. A criança sabe que o intuito da propaganda é vender e que para isso ela apresenta um discurso persuasivo que, na maioria das vezes, não corresponde à realidade. Para vencer esta resistência, o discurso publicitário passou a se camuflar e a se inserir em diversos gêneros do discurso, especialmente nas reportagens das revistas infantis. Inserido em reportagens, o discurso publicitário passa a ser mais aceito pela criança. Portanto, na minha tese, analisei como o discurso publicitário se engendra na tessitura discursiva de reportagens de uma revista infantil da Editora Abril, a Revista Recreio Girls, e que efeitos de sentidos produz no que se refere à adultização precoce da menina.

E o que você observou?

C.F. – Após analisar detalhadamente três reportagens de diferentes exemplares, constatei que as reportagens apresentam diversas características do discurso publicitário, como apresentação de marcas e preços de produtos. A adultização precoce da menina é construída discursivamente e pode ser observada pelos modelos adultos apresentados como referência de como a menina deve se vestir, maquiar, pentear e do modo como ela deve agir e ser, a fim de promover e incentivar o consumo de produtos normalmente desnecessários para uma criança.

E a adultização da infância se constitui num problema, certo?

C.F. – Sim. A inserção precoce da criança no mundo do adulto encurta sua infância. Existem estudos que comprovam um encurtamento da infância no plano fisiológico, as meninas estão entrando mais cedo no período da puberdade. Na contramão da queda da fertilidade entre as mulheres adultas, aumenta o número de gravidez na adolescência.

O fato é que essa adultização, muitas vezes, é compreendida como ‘algo normal’.

C.F. – Adultizar uma criança significa inseri-la precocemente no mundo adulto. Isso pode acontecer de diversas formas. Por exemplo, no inicio do processo de industrialização do nosso país a criança era inserida no trabalho das fábricas e era exigido delas a produtividade e a responsabilidade de um adulto. Hoje o trabalho infantil não é mais aceito. A adultização está acontecendo de outras formas, através do incentivo de comportamento e aquisição de produtos desnecessários a criança. Já é possível encontrar e comprar sutiãs com bojo para meninas a partir de 2 anos de idade. Meninas pequenas usam maquiagem e sandálias de salto alto, comprometendo a saúde da sua pele e da sua coluna. Para a indústria e o comércio isso é muito bom, no sentido em que uma criança que vive sua infância com comportamento de criança consome muito menos do que uma criança adultizada. E, sim, existe uma banalização deste comportamento no sentido que a sociedade passa a aceitar isso como normal e adequado.

Sempre que uma voz ecoa contra abusos da adultização vem à tona o discurso do direito de informação/comunicação, da liberdade da imprensa e a questão da censura.

C.F. – Compreendo que é dever do Estado e da sociedade civil organizada proteger a criança e sua infância. A liberdade da imprensa não deve comprometer o bem estar e a formação das nossas crianças, nossos futuros cidadãos. Recentemente uma resolução (Resolução n.º 163/2014 – aprovada por unanimidade pela plenária realizada no dia 13/03/2014) do Conanda proibiu “a prática do direcionamento de publicidade e comunicação mercadológica à criança com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço”. Essa resolução precisa ser respeitada, precisamos da adesão dos pais, da escola e da sociedade como um todo para isso é preciso debater o assunto em diversas instâncias.

Como as crianças interpretam/analisam a adultização?

C.F. – A mídia apresenta a criança adultizada com uma conotação positiva, de uma criança que tem/faz sucesso e é feliz graças a um comportamento pautado no consumismo. Se a mídia só mostra a criança adultizada como o modelo ideal, esse modelo passa a ser um modelo idealizado e copiado pelas crianças. Daí a necessidade de um debate com os adultos que cuidam da educação das crianças. As crianças precisam ter um olhar crítico sobre o modelo que a mídia lhe apresenta.

Você acredita que é possível reverter este quadro de banalização da adultização da infância?

C.F. – Sou professora de cursos de licenciatura na Universidade do Estado da Bahia e sempre percebi a ausência da leitura e discussão de textos midiáticos por parte do professor do Ensino Fundamental e Médio. Gostaria que meu estudo servisse de apoio para o trabalho do professor do Ensino Fundamental junto às crianças no processo de discussão de textos midiáticos – em especial o texto publicitário – e para o embasamento de uma leitura crítica de revistas que circulam em nosso meio social. O diálogo e o debate permanente dentro dos diversos espaços sociais da criança é o caminho mais adequado para que ela tenha um olhar crítico sobre os diversos discursos que circulam no meio midiático.

Entrevista concedida a Marcus Tavares, publicada na revistapontocom e reproduzida do Observatório da Imprensa – www.observatoriodaimprensa.com.br

Crianças e redes sociais: estudo indica novas relações e desafios

A professora Nélia Mara defendeu, em fevereiro deste ano, sua tese de doutorado, em Educação, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Com o título Você tem face?, o estudo pesquisou as experiências infantis com as redes sociais online, tendo como plataformas de investigação o Orkut e o Facebook.

“Em 2009, meus alunos de seis anos, na classe alfabetização, perguntavam frequentemente se eu tinha Orkut e revelavam, com frequência, novidades sobre seus perfis. Enquanto isso, o grupo de pesquisa do qual faço parte desde 2005, Grupo de Pesquisa Infância e Cultura Contemporânea, coordenado pela professora Rita Ribes, na UERJ, voltava seu foco de estudos para a relação das crianças com as mídias digitais, oportunizando a sistematização teórica e metodológica das minhas questões nascidas na escola. Buscava entender porque as crianças estavam no Orkut, como acessavam e o que gostavam de fazer nas redes sociais online. Dois anos depois, as crianças migraram para o Facebook e, em pouco tempo, muitas tinham suas primeiras experiências com as redes sociais nele. Por isso, os dois sites foram as principais plataformas de análise”, conta.

Segundo Nélia, o grande desafio foi conseguir construir uma metodologia que não desprezasse a dimensão técnica do fenômeno que pretendia estudar e que conseguisse captar, de alguma forma, a fugacidade das relações online e, em última instância, a dinâmica da cultura contemporânea. “Foi assim que nasceu uma pesquisa online, em que eu conversei com crianças entre oito e onze anos através dos chats, além de observar constantemente todas as atualizações nos perfis infantis”, destaca.

Em entrevista à revistapontocom, Nélia conta detalhes do estudo e suas principais conclusões sobre a relação das crianças com as redes sociais online. “Desejo que a entrevista seja o começo de uma conversa com quem se interesse pelo tema e que traduza também num convite para a leitura da tese”, afirma.

O que leva as crianças a participarem, cada vez mais, das redes sociais?

Nélia Mara – As redes sociais despontam na fase atual da cibercultura como uma potência que inaugura novas experiências nas formas de se relacionar, aprender, conviver, se expressar… Quando me interessei pelo tema, busquei selecionar os sites que as crianças mais acessavam, como forma de conhecer suas experiências e preferências na internet. Queria ir onde elas estivessem. E apesar de, em 2009, época em que surgiram os primeiros movimentos da pesquisa, eu ter conhecido alguns sites de rede social voltados especialmente para crianças, estes não eram sequer citados pelas crianças quando as indagava sobre o que faziam na internet. Talvez esse seja um bom exemplo para pensar que as crianças não vivem num mundo apartado dos adultos, mas estão inseridas na cultura e dela participam ativamente. As crianças querem estar onde todos estão.

Como podemos definir as crianças que participam das redes sociais?

N.M. – São crianças que inauguram experiências que situam a infância em um lugar social inédito na cultura. A pesquisa me permite afirmar que a presença e a participação das crianças nas redes sociais online possibilitam que as vozes das crianças habitem o ciberespaço numa relação de horizontalidade com as vozes dos adultos. Estão todos lá, convivendo, interagindo, comunicando. Isto quer dizer que a possibilidade de as crianças serem emissoras de conteúdo guarda uma potência que liberta a infância dos estatutos modernos calcados na ideia de menoridade e inferiorização em relação ao adulto. São crianças que burlam os protocolos dos sites – que é bom lembrar, ostentam uma proibição hipócrita, visto que atraem as crianças de forma velada –, criam e se apropriam cada vez mais de novas linguagens, novas formas de ser criança e de viver a infância. Para essas crianças, as redes sociais representam hoje, sobretudo, novas formas de interação e sociabilização. Elas jogam, brincam, conversam, assistem a vídeos, produzem vídeos, se informam, aprendem coisas novas, consomem. No entanto, é importante não perder de vista que a cibercultura, essa cultura em rede que vivemos hoje, nos afeta não só materialmente, mas, sobretudo, simbolicamente. Está em jogo a produção de novas linguagens, subjetividades, de novas formas de aprender, de se relacionar, novas relações com o tempo e com o espaço, o que é também vivido por quem não tem, necessariamente, um perfil no Facebook.

São grandes as diferenças de formação, oportunidade, experiência e conhecimento entre crianças que acessam e as que não acessam as redes?

N.M. – Pesquisas oficiais de cunho quantitativo sobre crianças e internet, como as realizadas pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CETIC) em todo o território nacional, têm demonstrado o quanto a condição socioeconômica é fator que determina o acesso à internet, a frequência com que ocorre, bem como a posse de aparatos técnicos. Renda familiar, classe social e região do país – dada desigualdade no investimento das condições técnicas para a distribuição da conexão, se compararmos os dados da região norte com a sudeste, por exemplo – são elementos que interferem de maneira decisiva para a participação das crianças nas redes sociais. No caso específico da pesquisa que realizei, é importante dizer que não se adotou um recorte de classe, pois se buscou, inicialmente, dialogar com crianças que já possuíam perfis em sites de redes sociais e, num segundo momento, crianças que fizessem parte da minha rede de contatos. Dito isto, a pesquisa que realizei não se debruçou sobre um estudo comparativo entre as crianças que têm acesso e as que não têm. No entanto, se aceitamos a ideia de que a cibercultura nos afeta simbolicamente, a questão se complexifica e exige aprofundamento. Mas é inegável que a oportunidade de entrar em contato com o mundo através do seu próprio celular posiciona a criança no mundo de maneira diferente daquela que, sequer, tem o que comer. São, sem dúvida, experiências de infância distintas qualitativamente. Penso que autonomia e criatividade estão no centro da participação nas redes sociais online. Inclusive, as crianças precisam, muitas vezes, criar datas de nascimento fictícias para terem acesso a uma conta no site. Precisam criar um perfil com inúmeras informações sobre si. O próprio ato de apenas “curtir”, no Facebook, alguma postagem, já evidencia uma expressão. Solidariedade e ética são noções por demais subjetivas para serem definidas aqui como algo propiciado pelas redes sociais. As crianças que estão nas redes sociais estão em diálogo com o mundo – elas têm acesso à informação, são encorajadas a se mostrar, a emitir opiniões, a compartilhar o que gostam, a conversar. Mas a formação se dá a todo momento: para a leitura, para a escrita, para a relação com o outro, para a construção da própria identidade, para a construção das noções de privacidade, formação para o consumo… Por isso, ao mesmo tempo em que é indiscutível reconhecer a centralidade que ocupam hoje as redes sociais na vida de muitas crianças, é indispensável pensar em formas articuladas de oferecer uma mediação que possam amplificar e qualificar todas estas fontes de in(formação).

Quando falamos de mediação pensamos no papel dos adultos. As crianças estão sozinhas na rede?

N.M. – Não, elas não estão sozinhas, ainda que acessem a internet sem ninguém por perto fisicamente. Penso que o grande desafio, hoje, para pais, professores e pesquisadores é pensar em novas formas de mediação online. Dado o caráter diferenciado das tecnologias digitais, a mediação não pode ser pensada sobre as mesmas bases, já consolidadas, das mídias eletrônicas. A mobilidade, por exemplo, é uma realidade e uma tendência também entre as crianças, já que a miniaturização dos aparelhos produz também condições para um uso mais individualizado. Se, por um lado, a impossibilidade de acompanhar fisicamente os acessos das crianças à rede pode sugerir menos possibilidade de acompanhamento dos adultos ao que as crianças acessam, há que se compreender que, online, as crianças nunca estão sozinhas. Estar nas redes sociais pressupõe estar em diálogo com alguém, seja um amigo, um familiar, um estranho ou mesmo uma empresa. O “estar com” é a essência do “estar em rede”. Por isso, friso, nosso papel enquanto adultos é buscar o diálogo com as crianças também online, fazendo-se presente também nas redes sociais. Há responsáveis que, sim, marcam sua presença de diferentes formas nos perfis de seus filhos; outros não. Há uma diversidade nas formas como a permissão do acesso às redes sociais acontece nas casas das crianças: há pais que criam os perfis dos filhos, incentivando que coexistam em rede; também há filhos que criam contas para seus pais, em busca de “atualizá-los”. Há famílias, por exemplo, que impõem uma idade mínima para que a criança conquiste o direito de estar numa rede social online, entendendo que é preciso crescer para ganhar novas responsabilidades, mesmo que não seja uma idade inferior à recomendada por sites como o Facebook ou o Orkut. Há pais que usam seus perfis com os filhos, um uso compartilhado. Em outros casos, e aqui já me posiciono como forma de dizer que penso ser a postura mais interessante, cada indivíduo da família possui um perfil, mas os pais e demais adultos interagem online com a criança frequentemente, além de conversarem em casa sobre o assunto. É uma forma de estar junto em rede, de acompanhar o que a criança faz, com quem interage, o que comunica, mas permitindo que ela tenha seu espaço, que ela construa seu perfil com suas características, preferências, fotos que gosta, podendo expressar a singularidade da sua identidade na internet.

E quanto à escola?

N.M. – A escola, de maneira geral, ainda não consegue ocupar o espaço de quem pode e deve colocar esse assunto como questão curricular porque ainda se baseia na lógica da vigilância, da proibição ou mesmo da didatização das tecnologias sob um viés, algumas vezes, empobrecedor e distante dos usos que as crianças fazem fora das salas de aula. Há instituições que, inclusive, proíbem o uso de aparelhos em suas dependências, parecendo fechar-se a uma realidade que está posta. Em paralelo, crianças postam, em seus perfis, fotos na escola em tempo real, o que denuncia que, a despeito de normas meramente burocráticas, as crianças estão em rede, se conectam de seus dispositivos móveis e, na maioria das vezes, a escola não se oferece para o diálogo.

E ao contrário do que se pensa, as crianças têm conhecimento dos perigos da internet, não é isso?

N.M. – As crianças demonstram ter muita informação sobre os perigos a que, possivelmente, estamos todos expostos na internet e nas redes sociais. Essas informações e ressalvas chegam de variadas fontes: a família conversa e instrui, a televisão noticia casos variados sobre o assunto e, mais timidamente, mas progressivamente, a escola também vai se envolvendo neste debate, ainda que o uso de sites de redes sociais seja comumente proibido em seus espaços. As crianças mostraram que elegem critérios para aceitar ou recusar pedidos de amizade e eu fui, inclusive, recusada por muitas quando busquei realizar a pesquisa com crianças indicadas por amigos, desconhecidas para mim. As recusas me obrigaram a redesenhar os critérios de escolha dos interlocutores e foram fundamentais no percurso da pesquisa. Ao longo do processo, também me dei conta, em diálogo com outras pesquisas a que fui tendo acesso, que as redes sociais são espaços de encontro entre pessoas que têm ou já tiveram algum tipo de relação face a face. Assim, sob esta lógica, as recomendações dos pais aos filhos sobre os perigos de dar atenção a pessoas estranhas é incorporada também para a vida online. É possível que esta constatação na minha tese, que nem sempre emerge em outros estudos, tenha a ver com a abordagem teórico-metodológica que adotei na pesquisa. A minha premissa foi de que as crianças estão de forma ativa e autônoma nos sites de redes sociais e me interessou ver o que fazem, como usam, por que usam e, em última instância, o que comunicam sobre suas experiências quando estão em rede, enquanto sujeitos criativos e produtores de cultura que são. Há outros estudos que, embora se detenham em temática similar, se fundamentam em concepções de infância que remetem aos pilares modernos de vulnerabilidade, inabilidade e menoridade, já elencando como premissa que há perigos, há uma proibição burocrática e, portanto, as crianças não deveriam estar lá. Penso que falamos, portanto, de lugares distintos; logo, nos posicionamos de formas diferentes em relação às crianças e às experiências de infância, conduzindo as pesquisas por caminhos que, nem sempre, se encontram. É preciso enfatizar aqui que reconhecer que as crianças entendem os perigos a que estamos expostos na internet não representa ignorar a importância do adulto no que diz respeito ao seu papel de proteção da criança. Friso que é fundamental que o adulto assuma o seu lugar de quem se oferece ao diálogo e aponta o caminho seguro. No entanto, me preocupa observar como essa relação se traveste, muitas vezes, em controle e vigilância por parte dos pais. Se é certo admitir que estamos todos, adultos e crianças, aprendendo a viver em rede, também é preciso compreender que a produção compartilhada de sentidos sobre o que nos desafia é um processo que se dá em diálogo.

A participação de crianças e adultos no ambiente online vem estabelecendo um novo tipo de relacionamento?

N.M. – Essa pergunta conduz ao debate pertinente em torno da questão geracional que marca os estudos sobre crianças e tecnologias digitais. Quando nos espantamos com a intimidade dos bebês com um tablet nas mãos, evidenciamos que a questão geracional está posta. Mas é importante não perder de vista que a relação com as mídias sempre esteve atravessada por essa tensão. O que parece complexificar a questão no contexto cibercultura é que a velocidade das transformações e a obsolescência como marca dessa era nos coloca, enquanto adultos, num lugar frágil de quem também se vê inseguro e rendido pelas constantes novidades, tão bem recebidas e incorporadas pelas crianças. Elas lidam com os aparatos de forma lúdica, criativa e desbravadora, enquanto o adulto, com um olhar mais cristalizado para a realidade, se relaciona de forma menos espontânea. Mas, se as redes sociais podem ser concebidas como lugares de encontro, podemos percebê-las na potência do encontro entre adultos e crianças, e não como algo que produz algum tipo de impacto negativo, ou que gera um abismo geracional.

Entrevista concedida a Marcus Tavares, publicada na revistapontocom e reproduzida do Observatório da Imprensa – www.observatoriodaimprensa.com.br

Projeto protege crianças que trabalham em propagandas

Tramita na Câmara o Projeto de Lei 5867/09, do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que regulamenta a participação de crianças menores de 14 anos na promoção ou divulgação de produtos e serviços em veículos de comunicação. A contratação na condição de aprendiz só poderá ser feita mediante comprovante de matrícula na escola e a fiscalização de comparecimento ficará a cargo da empresa, sob pena de suspensão do contrato no caso de excesso de faltas.

As empresas deverão manter, no local de trabalho, instalações e recursos humanos compatíveis com as necessidades e idades dos aprendizes. Deverá haver, por exemplo, psicólogos, atendimento médico e salas de repouso e de alimentação.

Jornadas

O parlamentar lembra que o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90) tem importantes mecanismos de proteção à infância. No entanto, segundo ele, em determinadas ocasiões empresas de comunicação, agências de publicidade e produtoras de TV submetem crianças a longas jornadas, em sessões de fotos ou gravações, para diminuir custos. Isso, afirma, provoca um grande número de faltas às escolas.

O parlamentar alerta que é prática comum a contratação para apenas uma foto, que é usada em diversas campanhas por tempo indefinido. Por isso, a proposta prevê que no contrato deverá constar a duração da cessão de direito de uso da imagem da criança, que não poderá exceder o período de dois anos após o término do contrato.

Tramitação

O projeto, que tem caráter conclusivo, será analisado pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática; de Trabalho, de Administração e Serviço Público; de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Íntegra da proposta:
PL-5867/2009

MiniCom se recusa a cumprir recomendação do MPF

Na última sexta-feira (26/06), o Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP), através da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, recomendou que o Ministério das Comunicações instaurasse um procedimento administrativo para apurar a exposição de Maisa Silva no "Programa Silvio Santos", exibido pelo SBT, nos dias 10 e 17 de maio desse ano.

Nas duas ocasiões, Maisa passou por situações de "pranto convulsivo e aparente estado de desespero, enquanto o apresentador e animador de auditório Senor Abravanel aparentava extrema tranquilidade e alegria com o desenrolar dos fatos", segundo a Assessoria de Comunicação Procuradoria da República no Estado de S. Paulo.

No dia 10, Maisa foi trancada em uma mala e se assustou. Depois, entrou em aparente desespero com a exibição de um menino mascarado. Depois, a criança ficou nervosa ao ser provocada pelo apresentador, desesperou-se e chorou ao bater a cabeça em uma câmera.

O Ministério, no entanto, se recusou a instaurar o procedimento, alegando que não há na legislação de Serviços de Radiodifusão atual nada que o obrigue a atuar no caso. O Procurador Regional dos Direitos do Cidadão, Jefferson Aparecido Dias, discordou, afirmando que "o artigo 114 do Regimento Interno do Ministério das Comunicações coloca como obrigação do órgão promover instauração de procedimento administrativo visando apurar infrações de qualquer natureza referentes aos serviços de radiodifusão".

Para o MPF, caso o órgão não apure a exposição de Maísa no SBT, pode cometer improbidade administrativa por omissão. "A omissão dos representantes do Ministério das Comunicações no presente caso poderá acarretar, em tese, a configuração de ato de improbidade administrativa e o MPF adotará as medidas cabíveis caso isso ocorra", declarou Dias.

Caso o Ministério das Comunicações acate a recomendação, o MPF pede que órgão envie, a cada 30 dias, as medidas que estão sendo adotadas dentro do procedimento administrativo instaurado.

MP quer que SBT pague R$ 1 mi de indenização à Maisa

O Ministério Público do Trabalho de Osasco (MPT) abriu ação civil pública contra o SBT para investigar possíveis irregularidades na exposição da apresentadora-mirim Maisa na grade da emissora. No processo, o procurador Orlando Schiavon Júnior pede ao canal de Sílvio Santos o pagamento de indenização no valor de R$ 1 milhão a Maisa, por lesão aos direitos coletivos e danos morais.

"Entende o Ministério Público ser bastante razoável a fixação da indenização pela lesão a direitos coletivos no valor de R$ 1 milhão em virtude do desrespeito a normas que protegem os menores de idade e à exposição pública da criança a medo, susto, pânico e até mesmo de dor física – ao bater com a sua pequena cabeça em uma câmera – que em nada contribuem para a sua formação", diz o pedido de liminar impetrado por Schiavon.

Segundo noticiou o site G1, o Ministério Público do Trabalho também solicita à Justiça que vete a admissão de menores de 16 anos na emissora, salvo na condição de aprendiz. Caso seja descumprida a medida, o MP pleiteia o pagamento de multa diária de R$ 10 mil por cada exposição.

A polêmica do caso Maisa ganhou contornos judiciais após a procuradora Mariane Josviak ter aberto inquérito contra a emissora na Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região. O objetivo é investigar possíveis irregularidades na atividade da jovem profissional na grade de programação do SBT.

O SBT informa que, até o momento, não foi notificado sobre a ação civil e que não irá se pronunciar sobre a medida.