Seminário debate democratização e Canal da Cidadania

“O Canal da Cidadania pode se constituir como marco revolucionário da sociedade brasileira, a oportunidade dela intervir e andar a passos largos”, afirmou confiante o vereador petista Reimont durante o III Seminário Livre pela “Democratização da Mídia”. O evento foi promovido pela Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) no dia 10 de março e teve como principais temas “Perspectivas para democratizar a mídia” e “Canal da Cidadania”.

O movimento em defesa da democratização da comunicação no Rio de Janeiro tem se mobilizado em torno da luta para garantir que o município tenha duas emissoras comunitárias de TV aberta, o que pode ser viabilizado por meio da implementação do Canal da Cidadania. Daniel Fonseca, representante da Frente Ampla pela Liberdade de Expressão (Fale-Rio) e do Intervozes, destacou que o canal é um ponto da resistência da sociedade civil no modelo de TV digital adotado no país que beneficiou basicamente os interesses comerciais. Alerta, porém, que mesmo com a implementação dessa política de diversificação, é preciso se precaver contra práticas como a do “coronelismo eletrônico”, em que chefes políticos locais se utilizam do poder de mando para interferir no funcionamento da comunicação.

Integrante da TV Comunitária de Niterói, Rafael Duarte contou um pouco do histórico de luta das TVs não-comerciais e afirmou que a complementaridade dos sistemas prevista na Constituição Federal nunca foi cumprida de forma efetiva.

O deputado federal Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) considera que “a democratização da comunicação já acontece por meio da mídia alternativa” e questionou a destinação da verba publicitária governamental para conglomerados de mídia como a Globo que “devem mais de 2 bilhões de reais ao fisco”.

Representante do Brasil de Fato no Rio de Janeiro, Joaquim Pinheiro defendeu o direito dos meios populares terem acesso ao dinheiro público que financia a mídia por meio dos governos e que isso seja feito mantendo-se a garantia da autonomia do veículo.

Rádio indígena retoma atividades na Bahia

O I Ciclo de Oficinas do Projeto Rádio Kiriri marcou a retomada das atividades da rádio indígena Kiriri FM. Ao longo dos dias de formação, que aconteceu entre 2 e 8 de março, indígenas Kiriris da Aldeia Mirandela, localizada no município de Banzaê, na Bahia, participaram de atividades formativas para a manutenção e operação da Rádio que funciona na aldeia desde 2012.

As atividades colaboraram com a retomada das transmissões da rádio que haviam sido paralisadas por motivos técnicos e operacionais. Os aparelhos de transmissão e os computadores, microfones e mesa de som passaram por manutenção corretiva e preventiva; alguns equipamentos foram substituídos, um novo computador para edição foi instalado e a rádio voltou a ocupar a faixa da frequência, para alegria dos indígenas que estavam sentindo muita falta da “rádio dos índios”, como também é conhecida na região.

Para seu Lôro, artesão indígena que vive na aldeia Mirandela, o retorno da transmissão agradou muito a todos que já estavam acostumados com a rádio. “Além das músicas que fizeram falta, sem a rádio perdemos a forma de nos comunicar com os parentes que ficam nas outras aldeias. Com a rádio é mais fácil. Se precisar dar uma notícia, avisar de uma reunião, é mais rápido que ir de casa em casa”, afirma.

Durante as atividades, uma nova forma de organização, de funcionamento e programação para rádio foi pensada, levando em consideração o período em que a rádio funcionou na aldeia, a integração de novos programadores e locutores e os novos objetivos traçados durante a reunião que discutiu a gestão da rádio, entre a equipe do projeto e as principais lideranças da Aldeia. Ficou decidido que os novos programadores terão a função de estimular ainda mais a cultura e a história indígena e da aldeia, com a inserção de programas ao vivo, produções gravadas e mais músicas indígenas.

Para isso, a equipe de programadores passou por um intensivo processo de formação para a produção de conteúdos de áudio. Com o apoio da equipe técnica do projeto, apoiado pela Assessoria de Juventude e Culturas Digitais da Secretaria de Cultura da Bahia, os indígenas conheceram e foram orientados para a utilização dos principais equipamentos de transmissão e gravação, e para o uso de Softwares Livres de edição.

Gilberto Kiriri, um dos indígenas que participou das oficinas, destaca as novidades que aprendeu. “Aprendemos a fazer vinhetas, a gravar uma entrevista, cortar o que não ficou muito bom e juntar as partes para dar sentido nas histórias. Com isso, o funcionamento da rádio vai ficar melhor. Vamos poder gravar uma propaganda, um aviso e deixar tocando automaticamente. Antes tinha que ficar falando toda hora.” Gilberto não esconde que “mexer” com a tecnologia ainda assusta, principalmente para ele que tem dificuldades com a leitura. Ainda assim, faz questão de reforçar que aprendeu tudo, e que na hora de falar, “se os outros tem vergonha, pode me chamar que eu falo e o pessoal gosta muito”.

Na opinião de Ricardo, que também faz parte da equipe da Kiriri FM, as oficinas foram muito boas pois reforçaram o que ele havia aprendido nas oficinas anteriores e o que vinha praticando, depois que adquiriu um computador e instalou a internet em sua casa. “Com essas oficinas fiquei mais preparado para mexer na rádio. Já sabia gravar e colocar para tocar, mas essa parte nova da edição foi muito boa. Eu gosto de tocar e cantar e agora posso dar uma melhoradas nas minhas músicas antes de colocar na rádio”.

Conselho de comunicação é dominado por interesses empresariais

Por Vilson Vieira*

Como sempre ocorreu desde a sua instalação, em 2002, a formação do Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional tende a gerar polêmica mais uma vez, em 2014. Isso porque, no dia 19 de fevereiro, o Senado Federal emitiu ofício a entidades de sua escolha, solicitando a indicação de representantes para compor o conselho.

Mas uma breve consulta à lei nº 8389/91 torna a atitude da Mesa-Diretora do Senado, no mínimo, questionável. No § 2° do artigo 4º, consta que “Os membros do conselho e seus respectivos suplentes serão eleitos em sessão conjunta do Congresso Nacional, podendo as entidades representativas dos setores mencionados nos incisos I a IX deste artigo sugerir nomes à mesa do Congresso Nacional”.

Ou seja, não cabe ao Senado, por meio de sua Mesa-Diretora, tomar a iniciativa de escolha de entidades. No entanto, nem o Regimento Interno – aprovado por ato da Mesa-Diretora em 2013 – nem a lei do CCS trazem quaisquer critérios detalhados sobre como o Senado deve proceder em torno da escolha dos membros que irão representar a sociedade civil naquele órgão, nem mesmo sobre quais entidades estariam aptas a ocupar um dos cinco assentos.

Tal situação tornou-se a senha para que, em mandatos anteriores, as cadeiras reservadas às organizações da sociedade civil fossem ocupadas por pessoas ligadas a empresas de comunicação, a denominações religiosas e a atores com vínculos muito próximos a senadores. Isso contribuiu para que diversas organizações da sociedade civil com atuação reconhecida pela democratização da comunicação fossem alijadas dos debates em torno de temas importantes do setor que ocorreram no órgão.

A lei que criou o Conselho de Comunicação Social estabelece em seu artigo 4º que o órgão será composto por cinco membros representantes da sociedade civil. Para o empresariado da comunicação, há vagas destinadas a três representantes: um das empresas de rádio, um das de TV e outro da imprensa escrita. Os profissionais do setor também têm direito à representação no CCS. São quatro vagas ao todo: uma para a categoria dos jornalistas; uma para os radialistas; uma para os artistas; e, por fim, uma vaga para os profissionais de cinema e vídeo. Completando as 13 vagas a serem preenchidas por membros titulares, uma é também garantida a um engenheiro com notórios conhecimentos na área de comunicação social. Cada titular tem direito a um suplente.

Em julho de 2012, quando se deu a última eleição para compor o CCS, após seis anos desativado, o Congresso Nacional havia aprovado o processo sem considerar a lista de entidades da sociedade civil proposta à presidência do Senado, ainda em fevereiro daquele ano, pela Frentecom (Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito a Comunicação com Participação Popular).

Entre o período em que foi regulamentado por lei, em 1991, até 2002, o Conselho de Comunicação Social não foi instalado pelo Senado Federal – poder responsável por convocar a eleição dos membros bem como suas nomeações – numa clara demonstração de inconstitucionalidade e ilegalidade. Isso porque o CCS está previsto no artigo 224 da Constituição Federal e também por lei. O órgão funcionou de 2002 a 2006, o que compreendeu dois mandatos; porém, voltou a cessar suas atividades desde então, para retornar apenas em 2012.

Embora tenha apenas atribuições consultivas, conforme determina o artigo 224 da Constituição, o Conselho de Comunicação Social é um espaço com a função de debater e aprovar resoluções, estudos e pareceres acerca de assuntos referentes ao campo das comunicações demandados pelo Congresso Nacional, poder Executivo e também pela sociedade civil.

Assuntos esses previstos na Carta Magna, como: liberdade de expressão; monopólio e oligopólio dos meios de comunicação; produção e programação de emissoras de rádio e TV; propaganda de bebida alcoólica, de medicamentos e de cigarros; complementaridade dos sistemas público, privado e estatal de comunicação; finalidades educativas, artísticas, informativas e culturais dos meios de comunicação; regionalização da programação e produção independente, entre outros princípios constitucionais.

Apesar de ser apenas um órgão consultivo do Congresso, o CCS nasceu da luta por uma comunicação mais democrática e inclusiva no Brasil liderada por diversos movimentos sociais. Tal fato o credencia a ampliar seu espaço à participação de entidades que efetivamente atuam em prol do direito à comunicação, ao invés de continuar refém de interesses escusos, sejam empresariais ou políticos.

* Vilson Vieira Jr. é jornalista, mestrando em Ciências Sociais (UFES) e integrante do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Anatel e a criminalização das rádios comunitárias

Por Arthur William*

A FIFA e seus parceiros comerciais vêm conseguindo impor seus interesses​ ​ ao Brasil. A Lei Geral da Copa e a proposta de Lei Antiterrorismo são mostras de que o poder público tem sido subserviente ao poder econômico dessas corporações. Mais um caso flagrante disso é a recente carta (veja a íntegra aqui) que a Anatel enviou às associações de rádios comunitárias, na qual informa que vai aumentar a repressão por conta da “Copa​ ​do Mundo ​ ​FIFA”.

Todos sabemos que a Lei de Rádios Comunitárias (Lei 9612/98) foi criada para que elas não existam. Das mais de 4.600 rádios legalizadas no Brasil, 99% podem ser apontadas como infratoras​ ​por conta das armadilhas da lei (isso sem falar nas cerca de 10 mil que esperam há mais de dez anos pela legalização). Para exercerem o direito humano à comunicação, as rádios comunitárias são obrigadas a cair na ilegalidade, desde a operação em outra frequência, já que a ​referida lei as coloca fora da faixa de FM, até a veiculação de publicidade do pequeno comércio local, pois não possuem outra forma de sobrevivência.

Agora, a Anatel quer que as infrações acabem por conta da Copa do Mundo, sob a alegativa “de utilização intensa do espectro radioelétrico durante a realização de eventos de grande magnitude”, conforme a carta destinada às rádios. De acordo com o texto, “Para o uso adequado do espectro de radiofrequência é impreterível o cumprimento​ ​das características técnicas autorizadas para o funcionamento de suas estações, além da ​ ​utilização de todos seus equipamentos com a devida certificação/homologação”.

Como a Anatel sabe que essas condições não podem ser cumpridas pela maior parte das rádios do país, a carta deixa claro que a agência vai aumentar a perseguição a quem cumpre voluntariamente um papel fundamental para a sociedade: “Ademais, destacamos que no primeiro semestre de 2014 as fiscalizações serão​ ​reforçadas em todo o Brasil e como de praxe as entidades atuando em descordo com a ​ ​regulamentação em vigor por este órgão serão autuadas”. Trata-se de uma criminalização anunciada.

Na Rio+20 foi diferente

A Agência Nacional de Telecomunicações e o Ministério das Comunicações provavelmente dirão que devem cumprir a lei e pronto. Só que sabemos que quando há interesse político, a história pode ser diferente. Durante a Rio+20, em 2012, a Anatel já ensaia​v​a ​ ​sua atuação para a Copa. Com novos equipamentos, funcionários chegaram à Rádio Cúpula dos Povos, que funcionava no Aterro do Flamengo.​ Neste caso, o automático ato de fechar uma emissora foi substituído pela alternativa mais sensata:​ ​contribuir para a prática do direito à comunicação.

Buscando a garantia da liberdade de expressão, Ministério das Comunicações e Empresa Brasil de Comunicação (EBC) aturam e, em 24 horas, aquela rádio comunitária foi legalizada com a ajuda do poder público. Foram pelo menos dois os ganhos: a rádio passou a funcionar dentro da ​ ​legalidade e o direito humano não foi violado.

Anatel e Ministério devem auxiliar e não reprimir

Atender reivindicações é mais​ ​inteligente ​ do que reprimir. Já passou da hora de o Brasil ​ ​regulamentar sua Comunicação do ponto de vista da democracia. Fechar uma rádio comunitária não resolve nada. No outro dia, mais outras rádios estarão funcionando, porque a população quer fazer sua própria mídia e não apenas consumir os conteúdos já existentes.

Ao contrário de criminalizar, a ação correta é entender​ ​a importância​ ​da comunicação comunitária (como fez Lula no último mês de seu mandato, ao chamar as rádios para reunião em que reconheceu sua importância para a democracia e prometeu que no governo Dilma iria cobrar a valorização do setor) e criar políticas públicas que garantam, dentre outras questões, mais​ ​frequências, financiamento​ ​público,​ ​mais​ ​potência e menos burocracia (que FHC, Lula e Dilma não fizeram), contribuindo para que​ ​esses meios possam ​cumprir​ ​seu papel de multiplicar as vozes que circulam pelos meios de comunicação.

Rádio comunitária não é caso de polícia. Rádio Comunitária é um direito humano!

* Arthur William é integrante do Conselho Diretor do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.