O escárnio de Temer com as concessões de rádio e TV

Governo altera regras para outorgas de radiodifusão via MP e retira obrigações básicas das empresas na prestação do serviço. Empresariado comemora

Por Bia Barbosa*

A imprensa toda noticiou e o empresariado de radiodifusão comemorou as mudanças no marco regulatório do setor, publicadas na quarta-feira 29 no Diário Oficial da União. Para a Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV (Abert), foi “a maior vitória dos últimos 50 anos”.

Quem quiser entender de fato o que mudou nas normas que as concessionárias devem respeitar – as poucas em vigor no país – não vai achar muita explicação nas matérias e reportagens. O discurso que prevaleceu foi o da “desburocratização para apoiar as empresas”.

O ministro Gilberto Kassab falou em “liberdade para os empreendimentos”. E Michel Temer, na cerimônia de sanção da lei no Palácio do Planalto, chegou a afirmar que as novas regras são uma “contribuição à imprensa livre”. Com o perdão do trocadilho infame, só se for “livre de obrigações”.

Uma simples leitura do texto da Medida Provisória sancionada – que agora já é lei – revela o tamanho do escárnio com que este governo passa a tratar o serviço de radiodifusão. Entre o envio para o Congresso Nacional no final de 2016 e a sanção nesta terça-feira, a MP 747 ganhou requintes de crueldade para qualquer um que acredita que o interesse público deveria ser o condutor dos processos de licenciamento das outorgas de rádio e TV no Brasil.

Por incrível que pareça, num país em que as concessões sempre foram usadas como moeda de troca política, foi possível piorar o procedimento das licenças. E agora não é nenhum exagero afirmar que o empresariado da radiodifusão pode fazer o que bem entender com este bem que, vale lembrar, é público.

Vejamos:

1. Anistia nos prazos para renovação

Pelas novas regras, todo concessionário que tenha perdido o prazo para renovar suas outorgas ganha de presente 90 dias para fazê-lo. Não interessa se o atraso foi de um mês ou de dois anos. Todo mundo poderá fazer o pedido agora. Aquelas emissoras que já pediram a renovação, mas o fizeram fora do prazo – inclusive as que o Executivo já tinha revogado a licença justamente pelo atraso na solicitação da renovação –, também ganham mais uma chance para recolocar seus canais em funcionamento, caso o Congresso Nacional ainda não tenha se manifestado sobre o caso.

E, daqui pra frente, se mais alguém se esquecer de pedir para renovar suas outorgas dentro do prazo, caberá ao Estado brasileiro a tarefa de avisar as empresas sobre isso.

Ou seja, em vez de retomar as outorgas que foram abandonadas pelas empresas que não pediram sua renovação e abrir novos processos de licitação, para que outras empresas ou atores possam participar da disputa por um espaço no espectro eletromagnético, o governo Temer “facilitará” a vida de antigos radiodifusores, para que eles voltem a operar, agora “dentro da lei”.

A mesma anistia foi concedida às rádios comunitárias, depois de muita pressão, sobretudo da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), porque a proposta inicial de Temer era conceder o benefício apenas às comerciais.

2. Renovação mais do que automática

Foi excluído do texto da lei a previsão de cumprimento de “todas as obrigações legais e contratuais” e o atendimento “ao interesse público” como requisito para o direito à renovação das outorgas. Já se sabe que o processo de renovação das licenças de rádio e TV no Brasil é quase automático, sendo necessário o voto aberto de dois quintos dos deputados e senadores, em sessão conjunta do Parlamento, para que uma concessão não seja renovada.

Agora, as obrigações que tinham de ser respeitadas – pelo menos segundo a letra da lei – desapareceram. Se o (antigo) Ministério das Comunicações (hoje Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) já pouco fiscalizava o cumprimento dessas “obrigações legais e contratuais” e nada olhava para o atendimento “ao interesse público” no momento de renovar licenças, agora isso nem mais será solicitado.

Pelas mudanças que entraram em vigor, as empresas também não precisam mais demonstrar ou comprovar que possuem recursos técnicos e financeiros para participar de um edital de concessão de outorgas Tudo em nome da “desburocratização” dos processos…

3. Cotas pra quem quiser

Pela regra em vigor antes da edição da Medida Provisória, qualquer alteração nos objetivos sociais das empresas concessionárias, assim como cessões de cotas e ações que alterassem o controle societário das empresas, deveria ser previamente autorizada pelo Executivo.

Isso porque, em teoria, há (mínimas) regras anti-concentração na propriedade dos canais que devem ser respeitadas no País. Mas isso também caiu com a nova lei de Temer. Agora, basta que as empresas informem o governo sobre as alterações feitas.

A cereja do bolo é que aquelas que fizeram alterações ilegalmente sem a autorização prévia do ministério, quando a lei anterior ainda valia, ganham agora 60 dias para informar o governo das mudanças, sem qualquer prejuízo para continuarem funcionando normalmente.

O que segue dependendo de autorização prévia do Estado é somente a transferência total e integral da concessão para outra empresa, numa prática já bastante conhecida, chamada “comércio de outorgas”. Na avaliação de procuradores do Ministério Público Federal, a venda e transferência total de licenças de rádio e TV para terceiros viola totalmente a legislação brasileira, ao ignorar processos licitatórios e permitir o enriquecimento ilícito de empresários da radiodifusão com a comercialização de um bem (a frequência eletromagnética) que é público.

Mas o governo federal sempre autorizou as transferências diretas e indiretas, e nada nunca foi feito. Isso continua como está, claro. Mas os radiodifusores também ganharam uma ajudinha: a transferência agora está liberada inclusive para as outorgas que estiverem funcionando em caráter precário, ou seja, que ainda não tiverem seus processos de renovação concluídos dentro do Estado brasileiro.

Ação entre amigos

É essa a “liberdade para empreender” que o ministro Kassab defende; é essa “a maior vitória dos últimos 50 anos” para a Abert: oficializar o uso e exploração privada e particular das outorgas por meio do mercado, reduzindo as obrigações que os concessionários devem respeitar, anistiando todos aqueles que não tiveram a mínima capacidade de solicitar a renovação de suas licenças dentro dos prazos e legalizando um verdadeiro balcão de negócios das concessões de rádio e TV.

Para não dizer que não falamos do único veto de Temer às normas que o Congresso pariu a partir de sua MP 747, segue o informe: por orientação da Casa Civil, foi excluído do texto sancionado a autorização para que políticos detentores de foro privilegiado pudessem ser diretores ou gerentes de rádios comunitárias.

Hoje a lei proíbe que eles exerçam essa função em qualquer tipo de emissora. O Congresso queria liberar os cargos em emissoras comunitárias – afinal, várias delas são de propriedade de políticos. O governo não concordou e manteve a proibição para todas, provavelmente atendendo a um pedido de sua aliada de primeira hora, a Abert, que sempre combateu ferozmente a concorrência das comunitárias.

E tem gente que ainda diz que não foi golpe.

*Bia Barbosa é jornalista, mestre em Políticas Públicas (FGV), coordenadora do Intervozes e Secretária Geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação.  

Violação do sigilo da fonte: atentado ao direito à comunicação

Condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães é o caso mais emblemático das perseguições contra quem tenta exercer a liberdade de expressão

Frente a mais uma violação à liberdade de expressão e ao direito à comunicação, o Intervozes convidou a advogada Tatiana Stroppa para analisar o caso Eduardo Guimarães.

Por Tatiana Stroppa*

Na terça-feira, 21, o blogueiro Eduardo Guimarães, autor do Blog da Cidadania, foi conduzido coercitivamente para prestar depoimento na Superintendência da Polícia Federal de São Paulo, além de ter computadores e celulares apreendidos por ordem do juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, em inquérito que apura o suposto vazamento de informações da 24ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada em março de 2016.

Na época, Eduardo Guimarães antecipou informações sobre a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e acerca de diligências de busca e apreensão na sede do Instituto Lula.

A Justiça Federal no Paraná, como os membros do Ministério Público Federal, que atuam na Lava Jato, emitiram notas para explicar a situação. Segundo a JF, “Eduardo Guimarães não é jornalista e seu blog destina-se apenas a permitir o exercício de sua própria liberdade de expressão e a veicular propaganda político-partidária”; “não é necessário diploma para ser jornalista, mas também não é suficiente ter um blog para sê-lo” e “a proteção constitucional ao sigilo de fonte protege apenas quem exerce a profissão de jornalista, com ou sem diploma”.

Já a nota do MPF menciona que a investigação pretende descobrir “se informações sigilosas foram repassadas a investigados por Guimarães antes de ele ter publicado em seu blog” e que “portanto, a diligência não foi motivada pela divulgação das informações à sociedade.”

Por outro lado, a defesa de Eduardo Guimarães rebateu defendendo que: “condicionar a qualificação de ‘informação jornalística’ ao conteúdo das manifestações não tem outro nome: é censura” e que “é inquestionável que o fato em apuração (divulgação pública de uma informação) foi praticado no exercício de atividade jornalística”.

Essas defesas remetem a um antigo imbróglio: o da regulamentação da profissão de jornalista. Em junho de 2009, o Supremo Tribunal Federal considerou que não era necessária a exigência do diploma de jornalista e a obrigatoriedade de registro profissional para exercer a profissão.

O ministro Gilmar Mendes entendeu que o artigo 4º, inciso V, do Decreto-Lei 972/1969, baixado durante a ditadura militar, estava em desacordo com a Constituição Federal (CF) de 1988 e que “o jornalismo e a liberdade de expressão são atividades que estão imbricadas por sua própria natureza e não podem ser pensados e tratados de forma separada”. Portanto, com a decisão do STF operou-se a desregulamentação da profissão de jornalista e, dessa forma, fixou-se que qualquer pessoa, mesmo sem o diploma, pode exercer a atividade jornalística.

Liberdade de imprensa x liberdade de expressão

O professor Venício Lima discute uma das questões mais polêmicas do atual debate público das comunicações: as diferenças entre os conceitos de liberdade de expressão e de liberdade de imprensa.

A partir da análise de textos históricos sobre o tema, explica que há uma diferença óbvia entre três palavras que não foi preservada em suas traduções: press (imprensa), print (impressão) e speech (fala). Neste sentido, afirma que a liberdade de imprensa não tem hoje o mesmo significado que tinha na Inglaterra do século XVII em que “the press” era apenas a tipografia onde indivíduos livres para imprimir e divulgar suas ideais estariam mais preparados para o autogoverno.

Diante disso, conclui que faz tempo que a velha “imprensa” se transformou em uma poderosa instituição – na mídia, que é o coletivo dos diferentes meios impressos e eletrônicos – e não tem mais qualquer relação direta com a liberdade individual de expressão dos cidadãos.

Assim, não se pode dizer que no Brasil a construção histórica do sistema de mídia, privatizado, concentrado e oligopolizado, apesar da vedação contida na Constituição Federal, tenha contribuído efetivamente para a formatação de uma comunicação democratizada e de um espaço público participativo.

Por consequência, é inegável a contribuição da evolução digital. Abriram-se novos espaços de interlocução na arena pública, permitindo que vozes que antes não tinham espaço nos meios de comunicação convencionais passassem a ter expressão. O acesso à internet – embora ainda limitado – pode permitir às pessoas assumir uma posição ativa na relação comunicacional ao saírem da posição de receptores da informação e passarem à posição de criadoras de conteúdos, os quais podem ser divulgados de maneira instantânea e com acentuada velocidade de propagação.

Segredo x publicidade

A leitura da Constituição Federal revela a preferência pela publicidade e transparência na política de informações, acessível a todos os cidadãos, que permita o controle da atividade governativa e o acompanhamento do exercício do poder. Esse direito, portanto, somente pode ser restrito quando o sigilo for imprescindível à segurança da sociedade e do Estado, conforme incisos XIV e XXXIII do Art. 5º, Art. 37, e inciso IX do Art. 93.

A ideia era vencer a cultura do sigilo, impondo a divulgação das informações de caráter público que estão sob a guarda e gestão de órgãos e entidades governamentais. O acesso é a regra, e o sigilo, a exceção. Aliás, a existência de uma política de informações totalmente transparente e pública é essencial em uma democracia.

O sigilo da fonte é reguardado, por exemplo, quando necessário ao exercício profissional (Art. 5º, XIV). Mas essa garantia precisa ser interpretada a partir de duas mudanças radicais: a) a retirada da exigência do diploma para o exercício da atividade jornalística; b) a utilização dos potenciais democratizantes que a internet oferece para tornar públicas notícias e críticas.

Nesse cenário, deve-se compreender que o que está constitucionalmente protegido é o exercício da atividade jornalística, e não do jornalista. Em outras palavras, o sigilo da fonte é uma garantia fundamental para o exercício do direito à informação e, por isso, estão protegidas tanto a emissão de notícias como as críticas a elas correlacionadas, independentemente do meio utilizado e da forma de recepção das mensagens.

Entendemos também que o sigilo da fonte, além de permitir a ampliação das possibilidades de recolhimento de informação, é uma verdadeira proteção constitucional para pessoa (informante) que revela os fatos e as informações, permitindo que tragam ao conhecimento público acontecimentos que nunca revelariam se soubessem que poderiam sofrer represálias ou ser sujeitos de responsabilidades perante eventuais denúncias.

Portanto, o sigilo da fonte protege tanto o exercício da atividade jornalística ao permitir que aquele que divulgue as notícias e críticas não seja punido por não revelar a identidade da fonte, como garantia para as pessoas que fornecem as informações sob a condição de não serem identificadas.

É evidente que constitucionalização do sigilo da fonte não isenta aquele que exerce a liberdade de informação jornalística de responsabilidade pelo que divulgue, diante da vedação, também constitucional, do anonimato (Art. 5º, IV). Agora, impossível pretender justificar a quebra do sigilo daqueles que estão exercendo atividade jornalística para que as instituições judiciais, administrativas e policiais consigam sucesso em suas investigações, sob pena de assistirmos ao esvaziamento deste direito, com consequências bastante negativas para a própria sociedade, já que tais relativizações afetam o pluralismo de informações e o conhecimento de assuntos de interesse público sem os quais impossível caracterizar uma sociedade democrática.

É preciso avançar na análise e entender a importância do sigilo da fonte para o exercício da liberdade de informação jornalística que não pode ficar dependendo de qualificações arbitrárias sobre o seu significado e a sua abrangência.

Calar jamais

Em tempos de golpe, ameaças e perseguições a comunicadores populares e jornalistas fazem parte da agenda do retrocesso. Na semana passada, o repórter Caio Barbosa foi demitido do jornal O Dia por exigência do bispo Marcelo Crivella, prefeito do Rio de Janeiro. O prefeito desmente o jornalista em nota que mistura, como é sua prática, política e fé religiosa. A convite do Intervozes, Barbosa vai compartilhar seu relato hoje, às 19h, na Casa Pública (Rua Dona Mariana , 81 – Botafogo – Rio de Janeiro), durante o lançamento do relatório Direito à Comunicação no Brasil 2016. O caso se soma a um cenário sombrio que está sendo denunciado pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação através da campanha Calar Jamais.

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Nota de esclarecimento da defesa de Eduardo Guimarães

Informamos que o juiz Sérgio Moro acabou de publicar uma decisão por meio da qual reconhece que Eduardo Guimarães é jornalista e, em tom de arrependimento, afirma ser “o caso de rever o posicionamento anterior e melhor delimitar o objeto do processo”.

Como consequência, determinou a exclusão de “qualquer elemento probatório relativo à identificação da fonte de informação”.

Dessa forma, o magistrado voltou atrás e reconheceu a tese alegada pela Defesa desde o início dessa investigação, admitindo ter tomado medidas ilegais.

Após o levantamento do sigilo dos autos, cumpre-nos informar fato extremamente grave. 

Antes de ser conduzido coercitivamente, o jornalista Eduardo Guimarães teve o sigilo de suas ligações telefônicas violado. O magistrado determinou que a operadora de celular informasse seu extrato telefônico, com o objetivo claro de identificar a fonte que teria passado a informação divulgada no blog.

É importante ressaltar que a fonte jornalística foi identificada mediante quebra de sigilo dos extratos telefônicos do Eduardo Guimarães.

Portanto, a decisão não corresponde à realidade ao afirmar que Eduardo “revelou, de pronto, ao ser indagado pela autoridade policial e sem qualquer espécie de coação, quem seria a sua fonte de informação”.

Basta perceber que o próprio juiz Sérgio Moro agora reconhece a ilegalidade das medidas tomadas visando à obtenção prévia da fonte de informação, para concluir que houve nítida coação ilegal no ato de seu depoimento.

Está devidamente comprovado que, na ocasião do depoimento, as autoridades já tinham conhecimento da sua fonte de informação, obtido mediante o emprego de meios que o próprio magistrado agora assume serem ilegais.

Não bastasse tamanha arbitrariedade, a autoridade policial sequer aguardou a chegada deste advogado para iniciar o depoimento.

Assim, é evidente a ilegalidade deste depoimento, cuja anulação será oportunamente requerida pela Defesa, bem como a restituição de todos os equipamentos eletrônicos ilegalmente apreendidos.

Caso se julgue necessário, estaremos à inteira disposição para prestar novos esclarecimentos, pois não há dúvida de que o jornalista Eduardo Guimarães agiu de acordo com a ética de sua profissão.

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*Tatiana Stroppa é doutoranda em Direito Constitucional, professora e pesquisadora do Centro Universitário de Bauru (ITE).democratizaçã

Proteção de dados pessoais é tema de audiência pública na Câmara dos Deputados

Atividade realizada na Comissão Especial sobre Tratamento e Proteção de Dados Pessoais debateu uma definição para “dados pessoais, sensíveis e anonimizados” nesta quarta, dia 22

Apesar de a privacidade ser um direito garantido pela Constituição brasileira e de o tema ser tratado pela Lei de Cadastro Positivo, pela Lei de Acesso à Informação e pelo Marco Civil da Internet, o país é um dos poucos no mundo que não tem uma lei específica para proteção de dados pessoais. A informação foi dada por Luiz Fernando Martins Castro, conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil – CGI.br; Paulo Rená, representante do Instituto Beta para Internet e Democracia – IBIDEM; e Laura Schertel, representante do Centro de Direito, Internet e Sociedade do Instituto Brasiliense de Direito Público – Cedis/IDP-DF, que participaram da audiência.

Paulo Rená, advogado e chefe de pesquisa do Instituto Beta, entende que dado pessoal é qualquer um que sirva para identificar alguém. “Estamos falando em dados que identifiquem, ou mesmo que permitam a identificação de uma pessoa. Um exemplo é a divulgação de uma lista com números de CPF. Ela não necessariamente identifica uma pessoa, mas a associação desses números com outras informações podem vir a identificar alguém”, aponta.

A falta de legislação mais abrangente sobre a proteção de dados permite hoje que o que está registrado seja utilizado para discriminar uma pessoa, seja por uma questão econômica, política, racial, religiosa, ou outra. Até por isso, Rená defende que a legislação explicite que o dado pessoal é privado, e não público. “Isso significa que não pode haver o entendimento de que um dado, porque é tornado público, vira público”, destaca. Outra questão levantada por ele é de que o projeto de lei elaborado a partir da comissão tenha como princípio o consentimento da pessoa para qualquer divulgação destes dados, e de que tal divulgação possa ser revogada a qualquer momento.

A professora Laura Schertel, do Cedis/IDP, afirma que o dado pessoal é uma das principais moedas hoje em todos os segmentos da economia, porém alerta para o fato de que a manipulação desses dados pode trazer riscos ao cidadão. Portanto, eles precisam ser protegidos. “O objetivo aqui não é impedir o fluxo de dados, mas regulamentar o fluxo, para que o processamento desses dados não seja usados para discriminar nem para cercear direitos do cidadão”, argumenta ela, propondo uma lei geral de proteção de dados que englobe todos os setores da sociedade, nas esferas pública e privada. Schertel frisa também a importância da lei brasileira dialogar com outras leis no mundo e que preveja a ação de uma autoridade de enforcement capaz de garantir a aplicação desta lei.

Para o advogado Luiz Fernando Castro, do CGI.br, não é mais possível evitar o fluxo de dados, mas é necessária uma norma legal que seja transparente, que garanta o direito à portabilidade e que garanta ainda o direito de proteção. “O importante é criar um ambiente minimamente seguro, pois há um grande perigo de continuarmos sem regra nenhuma”, pondera. Castro ressalta a importância da lei não estar formulada genericamente sobre os temas que pretende regular. “O Brasil está muito atrasado nessa questão. Precisamos elaborar uma lei que se adeque ao panorama internacional e, ao mesmo tempo, que possa apontar novos caminhos para a proteção de dados no mundo”, avalia.

Sendo assim, Castro sugere que o texto a ser proposto pelo relator da Comissão Especial sobre Tratamento e Proteção de Dados Pessoais se concentre em princípios defendidos por leis europeias, como a transparência na coleta de dados, a lealdade à finalidade descrita de uso dos respectivos dados e o tratamento de trais informações em prazo limitado.

Na outra ponta do debate, a diretora da Associação Nacional de Birôs de Crédito (ANBC), Vanessa Butalla, defende que o conceito de dado pessoal não ultrapasse o aspecto da pessoa identificada ou razoavelmente identificável. Para ela, deve haver uma flexibilização do acesso a dados pessoais cadastrais, como nome, filiação, data de nascimento e dados biométricos. “Se usados com a simples finalidade de identificação, esses dados não demandam o consentimento do cidadão”, opina. Os demais participantes da audiência não compactuam com esta posição.

Durante o debate, o relator do projeto na comissão, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), questionou Butalla sobre o que ela entendia por “razoavelmente identificável”, conforme sua proposta de conceituação para dados pessoais. Ao responder, Butalla disse que sua proposta é de que a lei defina justamente quais dados se enquadram nesta condição de identificação razoável de uma pessoa. “Se não é possível identificar a pessoa, então o uso do dado não é capaz de gerar prejuízos a essa pessoa. E se não é passível de gerar prejuízos, não deve estar protegido”, argumenta ela.

O que diz a Constituição

O direito à privacidade é garantido pela Constituição Federal de 1988 em seu Art. 5, inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

A privacidade é fundamental para a democracia, porque garante, por exemplo, a liberdade de organização política, a liberdade de pensamento, a liberdade religiosa, entre tantas outras. Pessoas sob vigilância tendem a se comportar de acordo com o padrão de comportamento vigente e a não questionar regras.

Tal direito, entretanto, é um desafio cada vez maior para as democracias modernas. O desenvolvimento tecnológico criou uma capacidade nunca antes vista de vigiar massivamente as comunicações entre pessoas e de interceptar e armazenar dados.

A Comissão Especial sobre Tratamento e Proteção de Dados Pessoais analisa os projetos de lei 4060/2012, do deputado Milton Monti (PR-SP), e 5276/2016, do Executivo, que tramitam apensados e tratam, entre outros assuntos, da definição de “dados pessoais, sensíveis e anônimos”. O texto do PL 5276/2016 define dado pessoal como aquele que identifica ou pode vir a identificar alguém. A comissão é presidida pela deputada Bruna Furlan (PSDB-SP).

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Carne Fraca: porque a grande mídia não se importa com a sua comida

Para além da operação, o agronegócio é um dos maiores causadores de conflitos agrários e má alimentação no mundo, mas mídia ignora o assunto

Por Camila Nobrega*

O tom de “a gente avisou” dominou as redes depois do anúncio da Operação Carne Fraca, da Polícia Federal, que descobriu um esquema de venda ilegal de carnes por frigoríficos no Brasil.

Desde a sexta-feira 17, as redes sociais se tornaram terreno de disputa. De um lado, vegetarianos e veganos, do outro, pessoas que comem carne.

Memes brincavam com o estarrecimento da maior parte da população brasileira ao descobrir que está comendo carne apodrecida, maquiada por excesso de ácido ascórbico, vulgo Vitamina C.

A operação da PF parece ter deixado o país em estado de choque, ao tocar exatamente no assunto carne, item consumido indiscriminadamente, variando apenas de acordo com a situação socioeconômica de cada família.

No entanto, a situação revelou algo que vai além do esquema de propinas e fraudes. O nível de informação de brasileiras e brasileiros sobre a comida que chega à mesa é irrisório.

E isso se agrava em um panorama mais amplo, pois também é pouco o acesso à informação sobre a dinâmica do agronegócio – ou seja, a produção da pecuária e agricultura em escala industrial – por parte da população a partir dos veículos de mídia tradicionais.

E essa violação no direito à informação e à comunicação tem muito mais a ver com o escândalo dos frigoríficos do que as escolhas individuais de comer ou não carne.

O agronegócio movimenta mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e recebe vultosas quantias de investimento do governo brasileiro.

Não por coincidência, é dono da maior bancada no Congresso, a chamada bancada ruralista, que rapidamente saiu em defesa da indústria nacional e do ministro da Justiça, Osmar Serraglio, flagrado em ligação para um fiscal agropecuário apontado como um dos chefes do esquema de propinas no Ministério da Agricultura.

Tudo isso faz parte de um contexto no qual o Brasil permanece alimentando o robusto mercado interno, já que as pessoas comem mais carne do que o necessário, e mantém a posição de exportador de alimentos e matérias-primas, como minérios, nesse ritmo industrial.

Mas, claro, centralizar o problema do agronegócio mundial no Brasil é miopia e, de fato, tentativa de não deixar o escândalo chegar à fonte do problema.

O que estamos vendo por aqui é conseqüência de um sistema mundial de produção e consumo de alimentos muito danoso, onde quantidade e lucro são lema e a qualidade deixou de ser prioridade faz tempo, combinada com os fatores locais, ou seja, esse imenso poder político do agronegócio.

É inegável que existem, nas atuais denúncias sobre a qualidade da carne dos principais frigoríficos brasileiros, novidades que justificam a enorme repercussão dos primeiros resultados da Operação Carne Fraca.

Entre elas, o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura que recebiam propina para não fiscalizar carnes de alguns frigoríficos, em um esquema que envolve empresários do agronegócio e partidos políticos – especialmente PP e PMDB, de acordo com a Polícia Federal.

No entanto, por trás da Operação, existe um longo caminho e uma série de informações de interesse público que continuam sendo ocultadas de maior parte da população.

E só por isso o choque foi tão grande, quando as pessoas começaram a ler sobre uso de carnes de baixa qualidade e ácido ascórbico nos alimentos, carcaças de animais, além de entrevistas sobre usos exacerbados de antibióticos, entre outras coisas.

A questão é que a maior parte disso tudo não é surpresa. Muito além de parte das pessoas que não consomem carne dizendo “eu já sabia”, centenas de movimentos sociais e organizações que acompanham há anos o tema na prática, além de alguns veículos de mídias alternativas e comunitárias, travam uma batalha diária para levar informação à população sobre o assunto.

Há décadas já se sabe que a produção de alimentos em escala industrial está afetando a saúde no país. E muito mais do que isso.

O agronegócio, ao lado da mineração, é um dos principais causadores de conflitos agrários no Brasil, que hoje é o país com mais assassinatos de ativistas ambientais no mundo, segundo levantamento da ONG Global Witness, que repercutiu muito no ano passado.

Já de acordo com a Comissão Pastoral da Terra, em publicação lançada no dia 17 de janeiro de 2017, 59 pessoas foram mortas no Brasil em consequência da atuação em defesa de territórios tradicionais, demarcação de terras, reforma agrária e pelos direitos das populações envolvidas nesses conflitos em 2016.

Segundo o Atlas Global dos Conflitos Ambientais, organizado pela Universidade Autônoma de Barcelona, o país tem o terceiro maior número de conflitos ambientais no mundo, com tendência de crescimento acelerado.

Essas informações costumam ser reportadas de forma pontual na mídia tradicional, de maneira a não constituir um alarde na população.

Vozes dos movimentos e organizações que trabalham com o tema são abafadas, ao contrário de ícones do agronegócio, tais quais o atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi, empresário dono de extensa produção de soja, e a ex-ministra Kátia Abreu.

Bom lembrar que a JBS (Friboi, entre outras marcas) e a BRF (incluindo Sadia, Perdigão e Seara) aparecem entre as dez empresas que mais compraram espaço para publicidade na mídia no Brasil, com dados referentes ao ano de 2005, segundo o ranking Agências & Anunciantes.

Personalidades como Fátima Bernardes, Ana Maria Braga, Roberto Carlos e Tony Ramos estão entre os famosos que emprestaram seus rostos – e depoimentos – para gerar confiança nas propagandas destes frigoríficos.

Não à toa, grande parte dos jornais brasileiros têm dado amplo espaço para a defesa das empresas envolvidas no escândalo e para representantes do setor, que se esforçam em tentar convencer a população e os compradores no exterior de que se tratam de casos isolados, o que não parece ter surtido efeito.

Na linha do alarde provocado pela Polícia Federal e sem dar muitas explicações, China e Hong Kong já suspenderam temporariamente a entrada de carne brasileira nos países.

Isso não quer dizer que não exista informação de qualidade sobre o tema sendo produzida. Em 2012, a Repórter Brasil lançou o site Moendo Gente, que denunciava as condições insalubres de trabalho nos frigoríficos brasileiros.

No ano anterior, essas denúncias já haviam sido divulgadas pela mesma instituição através do documentário Carne e Osso.

Foi também naquele ano que o cineasta Silvio Tendler lançou O Veneno Está na Mesa, mostrando o uso de agrotóxicos e suas consequências. Até mesmo a edição II do filme já foi lançada, com grande impacto nacional e internacional.

O Instituto Alana denuncia a relação perniciosa entre publicidade e consumo de alimentos não saudáveis por crianças há quase dez anos, quando lançou, em 2008, o documentário Criança, a Alma do Negócio.

Embora não focasse apenas no consumo de comida (o que veio a acontecer em 2012, com o Muito Além do Peso), o filme mostrava, por exemplo, o quanto a propaganda de alimentos voltada para crianças tem sido eficaz em fazê-las conhecer mais as marcas de comida industrializada do que os nomes de frutas e verduras.

Vale lembrar que desde 2001 tramita na Câmara Federal um Projeto de Lei para estabelecer regras à publicidade voltada para pessoas de até 12 anos e que o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), em sua Resolução 163, considera que toda publicidade para crianças é abusiva.

Mais especificamente sobre agronegócio, crescem blogs e projetos jornalísticos falando sobre o tema, mas com muita dificuldade de atingir audiência. Um deles é o De Olho nos Ruralistas, que traz a questão política e o poder dos ruralistas no Congresso como elemento central na questão.

Desde os anos 1970, quando a produção industrial de carne foi iniciada no Brasil, organizações e movimentos sociais buscam espaço para conscientizar a população sobre o tema.

Hoje em dia, o Brasil é uma das principais referências mundiais sobre a agroecologia, um movimento que tem como objetivo a transformação do sistema alimentar, a partir do comércio feito em circuitos locais, com valorização de pequenos produtores, sem agrotóxicos e sem o uso de antibióticos e outras coisas nos animais, com o objetivo de garantir uma alimentação saudável e socialmente justa.

A Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) é uma das principais referências no tema, não apenas no Brasil, mas em toda a América Latina. Além dela, o Fórum Brasileiro de Segurança e Soberania Alimentar e Nutricional (FBSSAN) também tem uma atuação na política nacional, além de produção de informação, assim como na campanha Comida é Patrimônio, que tem o objetivo de informar sobre a perda da diversidade de alimentos, em função da expansão do agronegócio no país.

O Movimento Sem Terra (MST) é referência na garantia do direito à terra como forma também de garantir outros direitos e alimentação saudável no país.

Mas nada disso repercutiu na grande mídia como a Operação Carne Fraca. P

arece que descobrimos só agora o quanto comemos mal, como se a Polícia Federal tivesse se tornado especialista em todos os temas do país.

Seguindo a tendência de cenário quase hollywoodiano para revelar as operações policiais, a mídia esteve a postos, denúncias de corrupção vieram à tona e as pessoas chocadas com a qualidade da carne que compram no supermercado.

No entanto, para além da fraude em si, que essa sim é notícia, continuam preferindo não nos contar que o modus operandi da produção massiva de carne envolve imensas áreas de terra do país, eleva conflitos agrários que levam à morte de ativistas ambientais, especialmente na região Norte, é um dos principais responsáveis pela emissão de gases de feito estufa e é bastante propenso a trazer riscos à saúde.

Com ou sem operação Carne Fraca, essa é a realidade.

E não apenas no Brasil. A produção de carnes da maneira como é feita atualmente é um problema em todo o mundo. Levou às ruas em uma manifestação chamada Wir Haben es Satt 100 mil pessoas na Alemanha em janeiro deste ano contra o agronegócio, não à toa logo no país onde salsicha é componente popular da alimentação desde a Segunda Guerra Mundial. Menos sensacionalismo e mais informação, esse é o maior desafio nessa história. Porque sobre os riscos à saúde, muita gente de fato já sabia.

*Camila Nobrega é jornalista e integrante do Coletivo Intervozes, mestre em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e integrante do Coletivo Intervozes. Colaboraram Marina Pita e Mônica Mourão, jornalistas e integrantes do Conselho Diretor do Intervozes

Polícia Federal tenta intimidar blogueiro que denunciou vazamento de informações

Blogueiro já havia denunciado o juiz Sergio Moro ao Conselho Nacional de Justiça por ter mandado prender uma cidadã de forma equivocada

O blogueiro Eduardo Guimarães foi vítima de condução coercitiva da Polícia Federal (PF) na manhã desta terça-feira, dia 21. Agentes federais estiveram na residência do representante comercial e editor doBlog da Cidadania e o conduziram coercitivamente até a sede da Superintendência Regional da PF em São Paulo, no bairro da Lapa.

Segundo as primeiras informações divulgadas pelo Jornalistas Livres, Eduardo Guimarães foi levado pelos policiais para falar sobre a denúncia publicada por ele de possíveis vazamentos de informações quando da condução coercitiva do ex-presidente Lula, em março do ano passado. À época, o Ministério Público Federal informou que o fato seria investigado. Jornalistas de veículos tradicionais anteciparam informações a respeito e as divulgaram nas respectivas empresas de comunicação.

Vazamentos de notícias são práticas recorrentes desde o início da operação Lava Jato. A grande imprensa “vaza informações, delações, dados todos os dias há dois anos, desde o início da Operação Lava Jato, mas quando aparece o primeiro vazamento que mostra o jogo armado entre Polícia Federal, Ministério Público e mídia, os meganhas correm para censurar, intimidar e, agora, violentar a liberdade de um cidadão brasileiro, jornalista e blogueiro”, desabafa Miguel Rosário, do blog O Cafezinho.

Sobre o motivo da condução coercitiva, o próprio Eduardo Guimarães afirmou: “Recebi de uma fonte as informações antes, e eles queriam saber se tenho alguma ligação com a pessoa que vazou. Não conheço essa pessoa. Divulguei porque é o meu trabalho jornalístico. Sou blogueiro e o meu trabalho é divulgar”, declarou. Ele questionou a motivação da condução, já que não teria se recusado a prestar depoimento. Na saída da Superintendência da PF, Eduardo também reclamou da apreensão de seus equipamentos. “Sou agora um blogueiro sem equipamento nenhum”. Os agentes ficaram com celulares, inclusive de sua mulher, notebook e pen drive.

Às 14h30, Eduardo Guimarães fez uma transmissão ao vivo pelas redes sociais, informando que estava bem e tranquilo, que nada deve à Justiça e que estava pronto para o depoimento, que era sobre a “fonte” responsável pela informação publicada em seu blog. O blogueiro se queixou da ação desnecessária da Polícia Federal. “Minha casa é uma ‘home care’, uma casa com ambiente hospitalar, pois precisamos dessa estrutura para nossa filha, e de repente chegam policiais armados na minha casa… Que perigo posso oferecer à sociedade? Não precisava disso”, ponderou. Eduardo ressalva que a lei está sendo usada para intimidar as pessoas: “Eu cresci numa ditadura e, do jeito que as coisas estão, vou morrer numa ditadura”.

O deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) classificou a ação da PF contra o blogueiro como um fato de “extrema gravidade”. “É uma restrição à liberdade de imprensa e informação. É censura. É uma tentativa de constranger aqueles que questionam a postura do Judiciário e do próprio juiz (Sérgio) Moro”, afirmou. Em audiência por videoconferência da qual participou como testemunha de defesa em um dos processos da Lava Jato, também realizada nesta terça-feira, o deputado questionou diretamente o juiz Sérgio Moro sobre a condução coercitiva de Eduardo Guimarães. “Disse a ele que a constituição garante o segredo da fonte. Ele afirmou que o Eduardo Guimarães não é jornalista. Eu respondi que no Brasil não precisa ser jornalista para exercer o jornalismo”.

Segundo o parlamentar, a assessoria de imprensa da Superintendência Regional da PF em São Paulo afirmou que a ordem de condução coercitiva foi dada pela Justiça Federal do Paraná. “Ou seja, é de Sergio Moro mesmo. Que São Paulo só cumpriu a ordem”, enfatizou Paulo Teixeira.

Guimarães x Moro

O blogueiro Eduardo Guimarães terá de voltar à Superintendência da PF em 3 de abril por causa de outra publicação, de 2015, desta vez em sua conta no Twitter, em que criticou o juiz Sérgio Moro por este estar prejudicando a economia brasileira. Devido à publicação, foi acionado judicialmente pela Associação Paranaense dos Juízes Federais. No final de fevereiro, o blogueiro recebeu uma intimação da Polícia Federal para que compareça perante um delegado para “prestar esclarecimentos no interesse da Justiça”.

O advogado de Eduardo buscou informações na PF e foi informado de que seu cliente estava sendo acusado de “ameaçar” o juiz Sergio Moro. O blogueiro nega ter feito qualquer tipo de ameaça ao juiz federal em questão. Em 4 de maio de 2015, o blogueiro representou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o juiz Sergio Moro por ter prendido uma cidadã por engano. A representação foi arquivada. A condução coercitiva de Eduardo ocorrida nesta terça tem fortes indícios de retaliação por parte de Sergio Moro.

O advogado Fernando Hideo Lacerda relata uma “série de arbitrariedades” na decisão judicial e em sua execução. “Em primeiro lugar, não faz sentido conduzir coercitivamente alguém que não foi chamado a depor anteriormente e jamais se recusou a prestar esclarecimentos. Segundo ponto: iniciaram o depoimento sem a presença de seu advogado. Além disso, confiscaram celulares e computadores com o claro objetivo de identificar a fonte das informações do jornalista. Por fim, Moro é suspeito para determinar tal medida contra ele, pois ambos possuem contendas na Justiça”.

Calar Jamais

Em solidariedade a Eduardo Guimarães, e pela liberdade de expressão, será realizado um ato hoje, às 19h, no Sindicato dos Engenheiros, que fica na Rua Genebra, 25, no Centro de São Paulo.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação com informações de Jornalistas Livres