Desde o último sábado (9/11), a Rede 21 transmite em sua programação os programas produzidos pela IURD TV, produtora da Igreja Universal do Reino de Deus, substituindo a WS Music, da Igreja Mundial do Poder de Deus. A substituição aconteceu também no espaço que o grupo possuía nas madrugadas da Band.As mudanças são apenas mais um capítulo da briga entre o bispo Edir Macedo e o apóstolo Valdemiro Santiago por espaço na mídia brasileira.
Mundial e Universal têm disputado nos últimos meses o contrato com o grupo Bandeirantes e, no fim das contas, o apóstolo Valdemiro Santiago foi desbancado pelo bispo Edir Macedo. Especula-se que o despejado tenha uma dívida de R$ 21 milhões e a inadimplência teria gerado o rompimento do contrato. O líder religioso,despejadado estaria pedindo R$ 200 milhões em indenização. Negocia-se também um retorno à grade em janeiro, no lugar do programa Claquete, de Otávio Mesquita. Dessa forma, as duas igrejas passariam a dividir o espaço da programação.
Até antes do rompimento do contrato, a Igreja Mundial controlava 21 horas diárias de programação na Rede 21, e as madrugadas (3h-6h) da Band. Estas últimas teriam sido negociadas em 2011, em uma jogada que retirou o pastor Silas Malafaia (Igreja Assembléia de Deus Vitória em Cristo) da emissora paulista. As noites da emissora são divididas também com a Igreja Internacional da Graça de Deus (do pastor R.R. Soares).
As movimentações atingiram a RedeTV!. A Igreja Mundial, defenestrada pelo grupo Bandeirantes, voltou à rede TV no dia 1º de novembro, pegando de surpresa funcionários, que tiveram que ajustar às pressas a grade para receber de volta os programas de Valdemiro Santiago.São Paulo perde, assim, as transmissões ao vivo da Copa Paulista. Entre as 2 horas da Mundial e as 2 horas da Universal (também transmitida pela emissora) estão sendo inseridos 15 minutos de televendas (Polishop) “para não dar choque”, segundo teria comentado um funcionário.
Há relatos de que os funcionários da IURD TV estariam trabalhando até 15 horas diárias, em más condições de trabalho (sem água), devido a substituição repentina na Rede 21, que teria disponibilizado praticamente um dia inteiro de programação ao grupo do bispo Edir Macedo. A produtora é responsável por 83 horas de programação diárias, distribuídas entre Record, Rede TV!, Rede 21, Band e Gazeta.
Ameaça ao direito à comunicação
O monopólio de um determinado discurso religioso é criticado por especialistas. Adilson Cabral, professor do Programa de Pós Graduação em Política Social da Universidade Federal Fluminense, vê um “desvio do conceito constitucional de diversidade” na forma como o espaço televisivo vem sendo ocupado pelas religiões no país. Segundo ele, o sistema de comunicação, conjunto de emissoras, deveria ser organizado a partir de valores, e não ser entregue às leis do mercado.
Gésio Passos, um dos coordenadores do Intervozes, também aponta incompatibilidades na ocupação do espaço de TV por grupos religiosos. Sendo a programação de televisão aberta finita, não haveria possibilidade de contemplar as 142 possibilidades de enquadramento religioso previstas pelo censo. Além disso, pelo caráter de concessão pública das emissoras, o fenômeno estaria ferindo o artigo 19 da Constituição que proíbe o Estado de subvencionar ou manter com igrejas ou cultos relações de dependência ou aliança.
Segundo Passos, “a retirada destes programas religiosos do ar não significa que o fenômeno religioso estará ausente dos veículos de comunicação de massa. Ao se constituir como uma fenômeno cultural de evidente relevância, a religiosidade deve está presente, de forma direta e indireta, no conjunto da programação das emissoras de rádio e TV, prioritariamente nos programas de cunho jornalístico, cultural e educativo, ou mesmo nos programas sobre comportamento, musicais, filmes, documentários e demais conteúdos dramatúrgicos.”. Para garantir a diversidade e democracia, ele considera que “se teria que apresentar as diversas crenças religiosas, como também o agnosticismo e o ateísmo, em uma abordagem não proselitista e de interesse geral”.
Segundo o monitoramento da programação das redes de TV aberta da ANCINE, a religião foi o principal gênero de programação na TV aberta brasileira em 2012 – chegando a 13,55% da programação, a frente dos gêneros variedades (10,45%), telejornais (10,43%), musical (8,48%) e o telecompras (7,51%). Em alguns casos, o problema é mais grave, como na Bandeirantes (17%), CNT (37%), Record (23%), Rede TV (38%) e Gazeta (15%).
O Projeto de Lei de Mídia Democrática , defendido pelo movimento de democratização da comunicação, prevê a proibição de arrendamentos de horários em concessões públicas TV, veda a outorga a instituições religiosas e limita o tempo de veiculação de conteúdos religiosos.