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Abraço promove Congresso para discutir espaço comunitário

As rádios comunitárias constituem uma das mais significativas formas práticas de se fazer comunicação pública no Brasil. Com essa visão, a Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), chega ao seu sexto Congresso Nacional – de 14 a 16 de dezembro em Brasília. Durante os três dias de debates, serão definidas a reorganização da estrutura orgânica da entidade, a participação do segmento no rádio digital e a repressão às comunitárias. No último dia do encontro, haverá eleição para a Direção Nacional da instituição.

Apenas metade dos municípios brasileiros tem uma rádio comunitária outorgada, uma vez que o processo de legalização é moroso – a duração média é de quatro anos. Também a repressão a essas rádios é constante, com apreensão de equipamentos e prisões de comunicadores populares.

Para José Sóter, dirigente Abraço, o congresso acontece num momento muito importante na questão da radiodifusão brasileira, como a implantação da TV digital e posteriormente da conversão da rádio também para o sistema digital. Sóter acredita que a partir daí haverá uma remarcação geopolítica da atuação dos comunicadores comunitários. “A discussão é muito importante para a criação de um sistema público de comunicação mais democrático”, argumenta.

Na avaliação de José Guilherme Castro, Secretário-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e dirigente da Abraço, as rádios comunitárias são dos poucos espaços que mantêm um diálogo permanente com a sociedade, contribuindo para a ampliação da cidadania e para a democratização da comunicação. Segundo ele, apesar da tentativa dos grandes donos da mídia de “acabar” com a radiodifusão comunitária, a realização desse sexto congresso nacional da Abraço é uma prova da sua resistência. “O sistema de comunicação no Brasil foi montado para atender à ditadura militar e é o principal entulho daqueles tempos que temos até hoje. Esse evento pode mostrar que um outro país está sendo construído”, aponta.

Resgate histórico

Em 1995, o Brasil descobriu as rádios comunitárias, então chamadas de rádios livres. De acordo com o artigo Participação nas Rádios Comunitárias no Brasil, da professora Cicília M.Krohling Peruzzo, da Universidade Metodista de São Paulo, as rádios livres começaram a surgir na década de 1970, na vigência do regime militar. Época que, segundo o artigo, os meios de comunicação de massa estavam predominantemente nas mãos de pessoas ou grupos privilegiados com a concessão de canais, por decisão unilateral do Poder Executivo.

A professora também lembra a importância do FNDC na construção e elaboração de políticas democráticas para os meios de comunicação. Celso Augusto Schröder, coordenador geral do Fórum, explica essa contribuição: Através do Daniel Herz, a instituição participou decisivamente de um intenso debate, nos anos 1990, que resultou no conceito de rádio comunitária. Naquele momento, havia importado, como é da tradição da esquerda mundial, a idéia das rádios livres, piratas, com origem na Inglaterra, na França, dos movimentos contestatórios dos anos 1960.

No Brasil, lembra Schröder, a conceituação partiu da seguinte idéia: se não é um direito individual – porque não é possível que todas as pessoas tenham rádios – é preciso "organizar-se em associações que representem um pensamento de determinado tipo e interesse, em torno do qual se reúnam". Assim, de acordo com o coordenador, resultou a lei nº 9.612/ 1998, que instituiu o serviço de Radiodifusão Comunitária no país, que também teve contribuição do FNDC.

Para Schröder, a lei 9.612 está muito longe, porém, de atender a sociedade – em especial os radiodifusores comunitários, na medida em que ela é muito tensionada e pressionada pelas rádios comerciais (que vêem nas comunitárias uma ameaça à sua existência). Por outro lado, ela tem uma grande vantagem, que é a de incorporar o conceito de rádio comunitária. “Essa incorporação foi uma grande vitória, que de alguma maneira determina a sua existência hoje no espectro brasileiro e permite que, mesmo marginalizadas, criminalizadas pela Anatel e perseguidas de uma maneira inexplicável ainda pela Polícia Federal, consigam inclusive, em muitos locais, concorrer diretamente com as comerciais em termos de audiência", analisa o coordenador-geral do FNDC.

Sobre o Congresso

O VI Congresso Nacional da Abraço será realizado no auditório da Escola Nacional de Administração Pública – ENAP, em Brasília. A organização do evento inscreveu cerca de 200 delegados, representantes de rádios comunitárias de 25 estados brasileiros e o Distrito Federal. A solenidade de abertura será às 20h, no Auditório da ENAP, com a presença de representantes das principais entidades nacionais dos movimentos sociais.

Audiência em Belo Horizonte debate a democratização dos meios

Sob a premissa Democratização dos Meios de Comunicação, o poder Legislativo e  entidades da sociedade civil se reuniram no último dia 9, em audiência pública realizada em Minas Gerais. O evento fez parte da Jornada pela Democratização da Mídia, iniciada no dia 5 de outubro. Temas como o fortalecimento das TVs públicas, critérios de renovação de concessões e formulação de políticas direcionadas a TVs e rádios comunitárias estiveram presentes no diálogo.

Proposto pelo deputado Carlim Moura (PCdoB), a Comissão de Participação Popular da Assembléia de Minas (ALMG) o evento destracou a importância da participação da sociedade nas questões tocantes aos meios de comunicação. Com uma platéia estimada em 100 pessoas, os palestrantes expuseram a atual situação dos meios. O evento foi transmitido ao vivo pela TV Assembléia do Estado.

Durante a audiência, os convidados e pediram a realização de Conferência Nacional que debata o sistema de comunicação no Brasil e a formação de uma comissão de acompanhamento dos contratos de renovação das concessões. “Com grande participação da comunidade, discutimos o monopólio das comunicações no Brasil, o atraso da legislação que versa sobre o sistema", comentou o deputado Carlim Moura.

Diretor de relações institucionaisda Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Aloísio Lopes, lembrou que a democratização depende inicialmente de iniciativas concretas do governo federal, poder Legislativo, governo estadual, mas também da pressão da sociedade. “Os movimentos que existem no Brasil desde a década de 80 precisam ser revitalizados, com participação mais ativa dos demais, como os dos estudantes, das entidades comunitárias, dos grupos culturais”, afirmou. Para Lopes, esses organismos devem participar não apenas de reuniões, mas cobrar das emissoras de rádio e TV uma postura mais aberta e democrática.

Já a cineasta e membro da Coordenação Executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Berenice Mendes, acredita que começa a abrir mais o campo e a participação das pessoas. “A questão da divulgação de luta pela democratização dos meios efetivamente começa a acontecer. Estamos vivendo um momento de descoberta da sociedade civil para as questões das comunicações”, analisou.

Para José Guilherme Castro, Secretário-geral do FNDC e membro da Associação Nacional de Radiodifusão Comunitária (Abraço) a questão da mídia no Brasil ainda é resquício do regime militar. Ele dá como exemplo a falta de critérios para o fechamento das rádios comunitárias. “Do mesmo jeito que esse país foi o último a acabar com a escravidão formal, está sendo um dos últimos a repensar as rádios comunitárias”, observou. Segundo ele, os movimentos sociais são sistematicamente criminalizados pelos grandes meios de comunicação, as concessões de radiodifusão são renovadas sem critério e nenhuma discussão pública. Nos últimos cinco anos, a Polícia Federal fechou mais de 15 mil rádios comunitárias, destacou Castro.

Os meios de comunicação servem, ou deveriam servir como porta-vozes do povo que representam, mas isso nem sempre acontece. A liberdade de expressão acaba se perdendo nos discursos dos grandes monopólios das telecomunicações. Essa contestação se faz presente na fala do deputado Moura, que critica a atuação desses veículos. “É preciso fazer com que o espectro de freqüência que hoje está concentrado em mão de poucas famílias possa ser melhor distribuído”, alertou.

Um objetivo comum

Belo Horizonte foi, assim como outras 12 cidades, palco de manifestações do dia de Mobilização Nacional por Democracia e Transparência e nas Concessões de Rádio e TV. A Jornada pela democratização da Mídia, organizada pela Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) foi uma continuação desse movimento: quatro dias de debates voltados para a conscientização da sociedade sobre a importância de se repensar os caminhos que a comunicação toma no país.

Psicólogos protagonizaram debate sobre mídia

O Seminário Nacional de Mídia e Psicologia: Produção de Subjetividade e Coletividade reuniu especialistas em psicologia e em comunicação, que durante três dias (de 28 a 30 de junho) travaram calorosos debates sobre a relação da mídia com a produção de subjetividades e a necessidade de se promover a democratização da comunicação.

O encontro foi um “sucesso absoluto”, segundo a psicóloga Vera Canabrava, uma das organizadoras do seminário, membro da direção do Conselho Federal de Psicologia (CFP) e também da Executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Ela ressalta que o público presente ao encontro se envolveu significativamente com os ideais do Fórum (um dos apoiadores do evento) de democratização da comunicação, e que têm muito a contribuir com essa luta.

Para Vera, o público qualificado e altamente questionador contribuiu significativamente para o desenvolvimento dos temas propostos, abordados por atores diferenciados, que garantiram ainda a multidisciplinaridade necessária ao debate. “Um dos pontos que não saiu da pauta durante todo o seminário, foi a convocação para a Conferência Nacional de Comunicação”, lembra a psicóloga. A Conferência é um dos itens propostos na Carta do Rio de Janeiro, produzida ao final do seminário.

Dentre os diversos painéis do evento, Vera Canabrava destaca, por exemplo, o que abordou o tema "mídia e poder". Segundo ela, os psicólogos fazem o reconhecimento da importância da mídia na produção das subjetividades, mas não atribuem à mídia todo o poder sobre esse campo. “A influência é grande, mas não é completa. Os cidadãos respondem a muitos outros fenômenos e refletem sobre o que vêem”, assegurou Vera, garantindo que o “poder é relativo”.

Debate qualificado

“Todo mundo que chegou ali não foi à toa. Eram estudantes, graduados, pós-graduados, gente que tem estudo e foi lá puxar do conferencista uma reflexão. Eles conseguiram promover desafios muito interessantes”, relatou Roseli Goffman, psicóloga, membro da comissão organizadora do evento. O assunto atrai, segundo a psicóloga, “porque a produção de conhecimento e a comunicação se darão, cada vez mais, em âmbito interdisciplinar. O evento tratou, além da produção de subjetividades no mundo da comunicação, da inclusão digital, internet. A gente quer participar, estimular, realizar trocas importantes para todos”, atesta Roseli.

O jornalista Celso Schröder, coordenador-geral do FNDC, palestrante da última mesa de debates, relatou que o seminário representa o preenchimento do “enorme espaço” pensado desde o início da luta pela democratização da comunicação no Brasil – nos idos anos 1980 – de que essa era uma luta para ser encampada pela sociedade brasileira. “A entrada dos psicólogos, através do CFP, CRPs e Abep, vem firmar essa idéia”, constata Schröder, lembrando que esses profissionais chegam à discussão com seus conceitos elaborados em discursos novos do ponto de vista do profissional da área da comunicação social, “enriquecendo a nossa luta”.

O coordenador-geral do Fórum destaca que, ao entrar na agenda dos psicólogos, “a discussão sobre a mídia nos remete a outro patamar, uma forma de ver a sociedade por outro ângulo”. Schröder observou que o seminário foi muito denso, rico e participativo, trouxe novas perspectivas e um importante olhar – preocupado – com a fragmentação da informação.

O evento foi promovido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP) em parceria com o Conselho Regional de Psicologia (CRP) do RJ, com o apoio do CRP de SP, da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (Abep), da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e do Instituto de Psicologia da UFRJ. O CFP prepara os anais do seminário e deverá imprimir uma publicação com o conteúdo das conferências. O farto material gerado pelo e para o seminário também está sendo organizado para posteriormente ser disponibilizado no site do Conselho: http://www.pol.org.br

A Rede Abraço de radiodifusão comunitária fez cobertura do evento. Ouça as entrevistas realizadas pala Rede em: http://redeabraco.org/rede/index.html

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Canais públicos presentes na TV a cabo podem desaparecer

O anúncio da Anatel, na última semana, de que criará um grupo de estudos destinado à elaboração de uma nova licença para o serviço de TV por assinatura, põe em risco a existência dos canais comunitários, universitários, legislativos e outros previstos na lei do cabo. Desconsidera os debates sobre o marco regulatório e abre caminhos para as operadoras de telefonia e o capital estrangeiro.

Se as operadoras já existentes de TV por assinatura migrarem para o Serviço de Comunicação Eletrônica de Massa (SCEMa) – a nova licença anunciada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) na última semana -, os canais comunitários e os demais canais previstos na lei do cabo podem estar com os dias contados, considera James Görgen, coordenador de projetos do Instituto de Estudos e Pesquisas em Comunicação (Epcom). Conforme a Anatel, a licença pretende abranger qualquer serviço de TV por assinatura, independentemente da tecnologia utilizada – DTH, MMDS ou cabo – e abarcar finalmente as empresas de telecomunicações.

Segundo Görgen, por pressão das empresas, dificilmente o novo serviço incluiria a obrigatoriedade de carregar os canais universitários, legislativos e comunitários, e antes que se consolide a televisão pública em canal aberto, os canais públicos já poderão ter sumido. "Este é um dos assuntos mais sérios dos últimos anos. É comum a Anatel legislar por portarias e normas, enquanto o Congresso discute uma legislação mais abrangente. Foi exatamente o que ocorreu com a lei do cabo e as normas que regem o DTH e o MDS entre 95 e 97, e que, por sinal, deixaram de fora os canais públicos", lembra Görgen, salientando que agora pode ocorrer o mesmo.

Anatel deveria aguardar a Conferência

Gabriel Priolli, presidente da Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU), acredita que qualquer medida assemelhada à que foi anunciada pela Anatel deve aguardar a realização da Conferência Nacional de Comunicação. Segundo Priolli, tal como foi recomendado para a implantação da rede pública de televisão – que aguardasse o Fórum Nacional de TVs Públicas e fossem implementados os resultados e orientações dele surgidas – também no âmbito da TV por assinatura qualquer resolução não pode se antecipar à Conferência.

"Essa Conferência deve ser ampla, massiva, democrática, com a participação do maior número possível da população e de segmentos sociais. Não apoiamos uma conferência de cúpula, restritiva, apressada, feita a toque de caixa, em agosto, porque esta certamente não vai produzir o que se espera", defende o presidente da ABTU. Ele salienta que a Conferência precisa ser construída da forma mais plural possível, porque, de outra forma, "dificilmente conseguirá resultar num anteprojeto de regulamentação geral eletrônica que atenda a multiplicidade de demandas", considera.

Agência ignora debates do marco regulatório

Preparadas tecnologicamente para prestar os serviços, operadoras de telefonia encontram na legislação brasileira impedimentos ao ingresso nos serviços de TV por assinatura. A nova licença poderá resolver conflitos como os de IPTV (bom para as teles) e restrições ao capital estrangeiro (bom para as operadoras a cabo), mas atropela um processo de discussão que necessita envolver bem mais do que os dois setores econômicos e deveria culminar em novo marco regulatório para o setor.

O novo serviço, segundo a Anatel, não acabaria com as outras licenças de TV por assinatura. O grupo de estudos verificará a existência de conflitos legais em relação aos outros serviços de TV a cabo já existentes, além de flexibilizar as amarras regulatórias. Entretanto, ao anunciá-lo, a agência reguladora antecipa-se à parte das discussões que se estabelecem entre sociedade civil e governo para a construção de um novo marco regulatório da Comunicação.

Procurada pelo e-Fórum para detalhar as características do novo serviço e do grupo de estudos, a Anatel não se manifestou. Em matérias divulgadas pela imprensa  especializada durante a semana, a Agência afirma que os detentores de licenças antigas poderão se transportar para a nova.

Abertura para teles e capital estrangeiro

Para Alexandre Annenberg, presidente da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), esse novo serviço tem o objetivo explícito de contornar os problemas decorrentes da lei do cabo. Entretanto, o empresário considera difícil que um novo regulamento surja para elidir uma lei. "É um caminho muito tortuoso. Talvez fosse muito mais fácil, mais direto, modificar a lei. Claro que isso tem outras implicações e barreiras, que também não são fáceis, mas, neste caso, está se colocando o carro na frente dos bois, criando a regulamentação para depois criar a lei", analisa.

Para as operadoras de TV a cabo, segundo Annenberg, o que interessa nesta proposta é a ausência de restrição ao capital estrangeiro, item que incomoda na Lei do Cabo. "As outras tecnologias e as teles não têm restrições neste sentido, enquanto as TVs a cabo têm. Isso cria uma desigualdade competitiva que tem que ser corrigida, porque para mesmos serviços temos que ter regras iguais, que preservem a competição e respeitem os investimentos já feitos", avalia. Para isso, o empresário considera necessário rever a própria lei (do cabo) que estabeleceu essas regras.

Ciente de que ao anunciar o novo serviço (ainda por ser estudado) a intenção da Anatel é a de abrir o mercado para a entrada das teles como operadoras também dos serviços de TV por assinatura, Annenberg reconhece o caminho sugerido como inexorável. "Sem dúvida, no mundo inteiro as teles começam a oferecer esses serviços. O problema é como isso deve acontecer. O risco é que se a agência reguladora não estabelecer certas regras, as empresas com maior poder de mercado acabam eliminando qualquer possibilidade de concorrência. Esse é um detalhe fundamental que tem mais a ver com uma análise de mercado do que burocrática", observa.

Annenberg lembra ainda que as teles já têm a enorme vantagem de possuírem uma infra-estrutura amortizada, capilarizada, extremamente vasta e, portanto, se entrarem sem o cuidado referido, "elas simplesmente asfixiam as TVs a cabo".

 Active Image reprodução autorizada, desde que citada a fonte original.

 

A nova cara da Radiobrás

Publicada originalmente pelo e-forum. CLique aqui para ter acesso ao link original.

O jornalista José Roberto Garcez, novo presidente da Radiobrás, acredita que, passados quase 20 anos da luta por uma Constituição democrática, o país possui “maturidade” para, através da sociedade, apropriar-se de um sistema de comunicação público e fazê-lo o seu porta-voz. Em tempo de transição dos sistemas para a tecnologia digital, o dirigente assume a empresa respaldado por um período de preparação estrutural, quando a Radiobrás se atualizou tanto em máquinas quanto em capital humano. Garcez foi entrevistado pelo e-Fórum.

O jornalista José Roberto Garcez assumiu no último dia 20 a presidência da Radiobrás, da qual era diretor de Jornalismo. Gaúcho, 54 anos, iniciou sua carreira em 1974, quando entrou no curso de Jornalismo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e logo começou a trabalhar em um jornal da região metropolitana de Porto Alegre. No final do primeiro semestre de faculdade, Garcez já atuava num dos principais grupos de comunicação do RS. Atuou em jornal, rádio e TV. Foi dirigente do sindicato dos jornalistas gaúchos.

Na prefeitura de Porto Alegre, na primeira gestão de Tarso Genro como prefeito (entre 1993 e 1996), Garcez teve a primeira experiência com a comunicação para o fortalecimento de um projeto político. Em seguida, foi secretário de Comunicação no governo Raul Pont, na capital gaúcha, e em 1998 se tornou diretor da Fundação Piratini (TVE RS).

No cargo atual, Garcez tem o desafio de chefiar todo o sistema Radiobrás — que compreende uma agência de notícias, uma rádio-agência, duas emissoras de televisão e cinco emissoras de rádio — fazendo com que esta empresa pública de comunicação cumpra sua missão de "universalizar o acesso à informação".

O que mudou na Radiobrás, na última gestão, como o senhor a recebe?
Garcez
– Acho que a principal mudança nos quatro anos da gestão em que o Eugênio Bucci foi presidente e eu fui diretor de jornalismo é o aprofundamento do caráter público da Radiobrás. Nesse período, nós aprofundamos o serviço que a Radiobrás oferece à população brasileira como um serviço que atende um direito do cidadão e não a uma necessidade do governo de expressar a sua versão dos fatos.

A Radiobrás passou a ser muito mais uma empresa voltada para atender o direito do cidadão de ter uma informação sobre o governo, sobre o Estado, sobre as políticas públicas que são aplicadas pelo governo. O nosso foco passou a ser o cidadão e não o governante. Se tivesse que escolher uma mudança fundamental, seria essa.

Nós, hoje, produzimos muito mais do que produzíamos há quatro anos, temos mais veículos, nos atualizamos nas questões tecnológicas, profissionalizamos cada vez mais o corpo de funcionários. Hoje temos mais funcionários concursados e menos funcionários contratados por regime de confiança. Todas as mudanças sempre buscaram que a Radiobrás seja, cada vez mais, uma prestadora de serviço público.

Quais as virtudes e limitações na estrutura da Radiobrás hoje?
Garcez – Eu acho que a grande virtude da Radiobrás hoje é que seu corpo funcional está consciente da importância do nosso trabalho. Nosso trabalho não é apenas veicular notícias de interesse do governo, e sim prestar um serviço. Essa eu acho que á a grande virtude; é uma empresa madura na sua relação com a sociedade.

As limitações são de ordem mais material. É um momento em que vivemos uma fase de transição para a tecnologia digital, é preciso ter recursos adequados para fazer a migração. Temos processos internos que ainda não estão suficientemente abertos à sociedade, e nós entendemos que a sociedade deve ter uma participação mais intensa no dia-a-dia da empresa. Eu diria que hoje a Radiobrás está preparada para a evolução que teremos a seguir na área da comunicação pública do Brasil.

Qual sua compreensão sobre comunicação estatal e pública?
Garcez – Se tivesse que escolher uma diferença entre comunicação pública e comunicação estatal, seria onde está o controle. Esse é um objetivo a atingir ainda. “Onde está o controle” significa se o controle é da sociedade ou do estado; na comunicação estatal, o controle é do estado e na comunicação pública, o controle é da sociedade. Nós ainda temos que percorrer um caminho para que a gente consiga ter efetivamente veículos públicos sob o controle da sociedade.

O que temos hoje, não apenas no governo federal, mas também em muitos estados, é a consciência de que o Estado existe para atender ao público e, portanto, os veículos que ele opera devem estar voltados para esse interesse, para o interesse público e não para o interesse do governante. Eu acho que nós estamos percorrendo este caminho.

Pela primeira vez, passados quase 20 anos da construção da Constituição, estamos atingindo alguma maturidade para que a sociedade realmente se aproprie de um sistema de comunicação, que deve ser na verdade seu porta-voz. Mas os veículos de comunicação estatal, na minha opinião, são fundamentais dentro de um sistema de equilíbrio entre a iniciativa privada, a sociedade e os governos.

Como a Radiobrás vem se preparando para a digitalização?
Garcez – Esse é o desafio do momento, junto com esse processo de definição do que seria a comunicação pública no Brasil, uma oportunidade para que ela realize plenamente a sua vocação. A revolução tecnológica que estamos vivendo cria oportunidades para que nossos veículos ofereçam possibilidades de acesso da população à produção, a mais fontes de informação. Portanto, o caráter que a comunicação deve ter de pluralidade e de expressão da diversidade, vai se concretizar. É nessa perspectiva que a Radiobrás se coloca, de ser o agente que dará maiores condições ao cidadão de se expressar, de ter veículos e canais onde ele possa viver a sua realidade cotidiana.

Militantes ligados à radiodifusão comunitária consideram que a Radiobrás, no governo Lula, não abriu espaço para as radicom. Qual o relacionamento cabível com as comunitárias, na estrutura legal e administrativa da empresa, e qual o relacionamento ideal?
Garcez – Acho que aí tem uma pequena imprecisão. A Radiobrás não existe para definir uma política pública para a radiodifusão comunitária. Não é nosso papel, mas de outras estruturas do governo.

Dentro do que nos cabe, de ter um relacionamento efetivo com os canais comunitários, por exemplo, temos convênios com a Abccom (Associação Brasileira de Canais Comunitários) para troca de programação, temos também muito intercâmbio com rádios comunitárias, desde troca de conteúdo até formação e capacitação de pessoal.

A Radiobrás tem um grande interesse e uma necessidade profunda, inclusive, de ter uma relação com a radiodifusão comunitária, mas entendemos que nós, de maneira alguma, devemos avançar sobre a autonomia que a radiodifusão comunitária deve ter. A Radcom no Brasil é um dos exemplos mais acabados do que deve ser uma comunicação pública. O que a Radiobrás tem que fazer é estabelecer laços para a troca de conteúdo, de experiências, mas jamais absorver a radiodifusão comunitária. A Racom deve continuar absolutamente autônoma em relação às estruturas de governo.

Qual sua expectativa sobre o I Fórum de TVs Públicas?
Garcez – Em primeiro lugar, o Fórum já é um grande sucesso só pelo fato de nós termos hoje uma plataforma comum das entidades ligadas ao assunto. Todas elas discutindo e apresentando ao governo suas propostas já é um grande avanço, pois nós não tínhamos um ambiente único para discutir qual é o futuro da TV Pública no Brasil.

Na próxima semana, eu acho que nós conseguiremos atingir um nível bastante profundo de consenso entre as várias áreas do público, onde deveremos esquecer pequenas divergências e buscar as grandes convergências.

 

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