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Justiça Federal cancela concessão de emissora de rádio gaúcha ligada a deputado federal

O deputado federal João Rodrigues integrava o quadro societário da Rádio Nonoai, situação vedada pela Constituição Federal. Ação pedindo cancelamento da concessão foi  ajuizada pelo MPF-RS

A 10ª Vara Federal de Porto Alegre (RS) cassou, na segunda-feira passada, dia 04, a concessão da rádio Nonoai, emissora localizada no município de Nonoai, no Rio Grande do Sul, em função do deputado federal João Rodrigues (PSD/SC) integrar o quadro societário.

A decisão, da juíza federal substituta Ana Maria Wickert Theisen, levou em consideração o fato de a autorização para serviços de radiodifusão ser vedado a congressistas e atende ao pedido formulado pelo procurador regional dos Direitos do Cidadão no Rio Grande do Sul, Fabiano de Moraes, em ação civil pública ajuizada em novembro do ano passado.

A ação, ajuizada pelo Ministério Público Federal do estado (MPF-RS), apontou que 90% do capital social da Rádio pertence ao deputado catarinense. De acordo o autor, a Constituição Federal proíbe a participação de detentores de mandato eletivo como sócios de empresas prestadoras de serviço público de radiodifusão.

Na justificativa a magistrada pontuou que a Constituição proíbe que parlamentares detenham concessão de serviços de radiodifusão. E reafirmou que a norma proibitiva serviria para garantir “a livre formação da opinião pública, afastando potenciais influências ou contaminação com o poder político”.

A juíza também relatou sobre o fato das cotas da empresa terem sido repassadas para a filha do deputado. Para ela, “mantido o capital social no âmbito da família do réu, não há, pelo menos em um juízo perfunctório, a garantia de que esteja fora de seu âmbito de influência” e acrescentou que “democracia não consiste apenas na submissão dos governantes à aprovação em sufrágios periódicos. Sem que haja liberdade de expressão e de crítica às políticas públicas, direito à informação e ampla possibilidade de debate de todos os temas relevantes para a formação da opinião pública, não há verdadeira democracia.”

Com a decisão a União também não poderá conceder novas outorgas à empresa enquanto tiver parlamentar em seu quadro societário. Cabe recurso da sentença ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).

O que diz a Constituição

A Constituição Federal, no artigo 54, inciso I, alínea a, proíbe deputados e senadores de celebrar ou manter contratos com concessionárias de serviço público, incluindo emissoras de rádio e televisão. Já o inciso II, a, do mesmo artigo veda aos congressistas serem proprietários, controladores ou diretores de empresas que recebam da União benefícios previstos em lei. Tal regra também impede a participação dos parlamentares em prestadoras de radiodifusão, visto que tais concessionárias possuem isenção fiscal concedida pela legislação.

A situação revela ainda um claro conflito de interesses, uma vez que cabe ao Congresso Nacional apreciar os atos de concessão e renovação das licenças de emissoras de rádio e TV, além de fiscalizar o serviço. Dessa forma, parlamentares inclusive já participaram de votações para a aprovação de outorgas e renovações de suas próprias empresas.

A posse de veículos de radiodifusão por políticos é um fenômeno presente em diversos países em desenvolvimento e identificado no Brasil pela expressão “coronelismo midiático”. Em junho de 2016, a ONG Repórteres Sem Fronteiras destacou em um relatório que critica a “parede invisível formada por dinheiro e conflitos de interesse” que afeta a liberdade de informação.

A investigação sobre a propriedade de emissoras de rádio e TV por políticos foi iniciada pelo MPF em São Paulo, a partir de um levantamento feito em todo o país das concessões de radiodifusão que tinham políticos como sócios. A partir disso, várias ações foram iniciadas em vários estados.

Já existem decisões judiciais em tribunais superiores retirando as concessões das mãos de parlamentares, seguindo o entendimento do Supremo Tribunal Federal – que também já se manifestou contrário ao controle de políticos sobre veículos de comunicação

Sendo assim o cancelamento das concessões visa a evitar o tráfico de influência e proteger os meios de comunicação da ingerência do poder político.

A rádio e o deputado divulgaram nota contestando e argumentando que, anterior ao ajuizamento do processo, a empresa alterou o quadro societário, tendo o congressista cedido integralmente suas cotas para terceiros. Sustentou ainda que, antes de ser parlamentar, já era dono do veículo e que seu mandato é em outro Estado. Segundo ele, a constituição prevê que deputados não podem ser diretores ou administradores de emissoras.

Suspensão de atividades de rádio de parlamentar paulista

No mesmo dia em que retirou a concessão da Rádio Nonoai, a 10ª VF de Porto Alegre (RS) concedeu liminar suspendendo as atividades da Rádio Cultura de Gravataí, cujo um dos sócios proprietários é o deputado federal Antonio Bulhões (PRB/SP).

A ação com pedido de tutela foi ajuizada pelo MPF, que se valeu de argumentos semelhantes aos utilizados na ação que envolveu o congressista catarinense. Bulhões, apresentou defesa na qual afirmou não ser sócio da rádio desde setembro de 2015, ocasião em que teve seu nome retirado do quadro social da empresa, dando lugar a outros dois homens.

Após avaliar as provas processuais, a juíza federal Ana Maria Wickert Theisen decidiu levar em consideração o fato de que a alegada alteração contratual não foi devidamente registrada junto ao Ministério das Comunicações.

A decisão é em caráter liminar. O mérito da ação ainda será julgado pela Justiça Federal.

Para livrarem-se de possível perda da concessão de radiodifusão, alguns parlamentares vem utilizando como estratégia a mudança no quadro societário das empresas, muitas vezes passando para um familiar com intuito de enganar a justiça, casos como do o senador Agripino Maia e seu filho, o deputado Felipe Maia e também da família Barbalho.

Denúncia – Na época do ajuizamento da ação, organizações da sociedade civil denunciaram à Procuradoria da República em São Paulo que 40 parlamentares de 19 estados brasileiros eram sócios de emissoras de rádio e televisão no país, segundo o Sistema de Acompanhamento de Controle Societário (Siacco), da Anatel. As entidades solicitavam a atuação do MPF para que essas empresas tivessem suas licenças canceladas, tendo em vista as proibições contidas na Constituição.

O documento entregue aos procuradores elencava 32 deputados federais e 8 senadores dos estados de Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins. A representação foi encaminhada às unidades do Ministério Público Federal em cada um dos estados para que os procuradores analisassem as medidas a serem tomadas localmente.

Coronéis da Mídia têm apoio do governo

A pedido de Michel Temer a Advocacia-Geral da União (AGU) requereu em outubro de 2016 ao ministro Gilmar Mendes, do STF, “medida cautelar incidental” com o objetivo de suspender o andamento de todos os processos e decisões judiciais que tenham relação com a outorga e a renovação de concessões de rádio e televisão mantidas por empresas de parlamentares. A medida pretende conter uma série de vitórias que as entidades do campo da democratização da comunicação estão obtendo nos estados.

Em resposta à ação da AGU, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), autor de duas ações no Supremo Tribunal Federal que tratam deste tema, em conjunto com representantes do Intervozes e da Artigo 19, organizações que solicitaram participar das ações como amicus curiae, entregaram ao ministro Gilmar Mendes, relator das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 246 e 379, uma petição solicitando que ele, antes de analisar o pedido da AGU, conceda as medidas liminares solicitadas em ambas as ADPFs.

As arguições ajuizadas no STF estão fundamentadas no fato de que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que políticos com mandato eletivo sejam beneficiados com a outorga de concessões de emissoras de rádio e de televisão. A ADPF 246 foi protocolada em dezembro de 2011, enquanto que a ADPF 379, em dezembro de 2015. Ambas contam com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República e aguardam pela apresentação de voto de Gilmar Mendes.

Por Ramênia Vieira, com informações do Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul

MPF/PE entra com ação contra parlamentares com participação em empresas de radiodifusão

Segundo o MPF, deputados Gonzaga Patriota (PSB) e Adalberto Cavalcanti (PTB) são sócios ou tem familiares sócios de duas empresas de radiodifusão com sede no interior de Pernambuco

O Ministério Público Federal em Pernambuco (MPF/PE) ajuizou ação civil pública solicitando a Justiça Federal com urgência a suspensão da concessão de serviço de radiodifusão da Rede Brasil de Comunicações Ltda, de Sertânia, e da Rádio Rio Pontal FM Ltda, de Afrânio, ambas no interior pernambucano. A ação foi ajuizada, pois o deputado federal Gonzaga Patriota (PSB) seria sócio da Rede Brasil e familiares do deputado federal Adalberto Cavalcanti (PTB) participariam do quadro societário da Rádio Pontal. A ação, de responsabilidade da procuradora da República Mona Lisa Ismail, foi ajuizada contra os parlamentares, as rádios e a União.

Na ação o MPF-PE destaca que a situação é inconstitucional, pois haveria o risco de violação do direito fundamental à liberdade de informação e expressão. Como tratam-se de parlamentares à frente de empresas de comunicação, haveria a possibilidade de se utilizarem das empresas em prol de interesses próprios ou de terceiros.

A procuradora Mona Lisa Ismail, se pronunciou na ação afirmando que a sócia-gerente da Rádio Sertânia, filiada a Rede Brasil de Comunicações Ltda, Geannedy Laureliza Leite Patriota, durante a investigação administrativa no MPF, afirmou que “a vedação não se aplica à participação do parlamentar Gonzaga Patriota na empresa de radiodifusão porque diz respeito à gestão da empresa. Ou seja: não haveria irregularidade na participação do deputado federal no quadro societário da rádio, uma vez que não exerce função de diretor/gerente e que o contrato de concessão em tela obedece a cláusulas uniformes”, diz trecho da ação civil pública.

O deputado federal Adalberto Cavalcanti, fez parte do quadro societário da Rádio Pontal até julho de 2016. Na época houve uma alteração no contrato, devido a uma notificação do então Ministério das Comunicações em que o parlamentar se retirou da sociedade, sendo substituído por sua filha Marília Mariana Cavalcanti. Para a procuradoria da República essa alteração indica que o parlamentar estaria simulando não ser mais sócio, porém ele continuaria no comando da empresa por meio de familiares. “Não se trata de contrato de cláusulas uniformes, que se refere a contratos de adesão de natureza consumerista, firmados entre congressistas e empresas prestados de serviços públicos, o que não é o caso da concessão do serviço de radiodifusão outorgado às rádios”, disse a procuradora, por meio de nota

A participação dos deputados nas emissoras, reforça o MPF, é inconstitucional, tendo em vista o potencial risco de se utilizarem do canal para defesa ou divulgação de interesses próprios ou de terceiros, violando o direito fundamental à liberdade de expressão e informação.

Conforme consta na ação, Adalberto Cavalcanti foi sócio da rádio até julho de 2016, quando houve alteração contratual após notificação pelo MPF. Segundo a procuradora da República, no entanto, a alteração indica a intenção de simular a regularização da sociedade, uma vez que o deputado continuaria a participar da empresa por meio de familiares.

Além da sispensão o MPF requer que a Justiça deixe de conceder novas outorgas de serviço de radiodifusão para as empresas Rede Brasil de Comunicações Ltda. e da Rádio Rio Pontal FM Ltda., ainda que por intermédio de pessoas jurídicas das quais sejam sócias. O MPF também pede que a a União seja condenada a realizar nova licitação do serviço outorgado as empresas.

O que diz a Constituição

A posse de veículos de radiodifusão por políticos é um fenômeno presente em diversos países em desenvolvimento e identificado no Brasil pela expressão “coronelismo midiático”. Em junho de 2016, a ONG Repórteres Sem Fronteiras destacou em um relatório que critica a “parede invisível formada por dinheiro e conflitos de interesse” que afeta a liberdade de informação.

A investigação sobre a propriedade de emissoras de rádio e TV por políticos foi iniciada pelo MPF em São Paulo, a partir de um levantamento feito em todo o país das concessões de radiodifusão que tinham políticos como sócios. A partir disso, várias ações foram iniciadas em vários estados.

Já existem decisões judiciais em tribunais superiores retirando as concessões das mãos de parlamentares, seguindo o entendimento do Supremo Tribunal Federal – que também já se manifestou contrário ao controle de políticos sobre veículos de comunicação

Segundo o artigo 54, inciso I, a, da Constituição Federal, deputados e senadores não podem celebrar ou manter contratos com concessionárias de serviço público, o que inclui as emissoras de rádio e TV. Já o inciso II, a, do mesmo artigo, veda aos parlamentares serem proprietários, controladores ou diretores de empresas que recebam da União benefícios previstos em lei.

Tal regra também impede a participação de congressistas em prestadoras de radiodifusão, visto que tais concessionárias possuem isenção fiscal concedida pela legislação.A situação revela ainda um claro conflito de interesses, uma vez que cabe ao Congresso Nacional apreciar os atos de concessão e renovação das licenças de emissoras de rádio e TV, além de fiscalizar o serviço. Dessa forma, parlamentares inclusive já participaram de votações para a aprovação de outorgas e renovações de suas próprias empresas.

Sendo assim o cancelamento das concessões visa a evitar o tráfico de influência e proteger os meios de comunicação da ingerência do poder político.

Coronéis da Mídia têm apoio do governo

A pedido de Michel Temer a Advocacia-Geral da União (AGU) requereu em outubro de 2016 ao ministro Gilmar Mendes, do STF, “medida cautelar incidental” com o objetivo de suspender o andamento de todos os processos e decisões judiciais que tenham relação com a outorga e a renovação de concessões de rádio e televisão mantidas por empresas de parlamentares. A medida pretende conter uma série de vitórias que as entidades do campo da democratização da comunicação estão obtendo nos estados.

Em resposta à ação da AGU, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), autor de duas ações no Supremo Tribunal Federal que tratam deste tema, em conjunto com representantes do Intervozes e da Artigo 19, organizações que solicitaram participar das ações como amicus curiae, entregaram ao ministro Gilmar Mendes, relator das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 246 e 379, uma petição solicitando que ele, antes de analisar o pedido da AGU, conceda as medidas liminares solicitadas em ambas as ADPFs.

As arguições ajuizadas no STF estão fundamentadas no fato de que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que políticos com mandato eletivo sejam beneficiados com a outorga de concessões de emissoras de rádio e de televisão. A ADPF 246 foi protocolada em dezembro de 2011, enquanto que a ADPF 379, em dezembro de 2015. Ambas contam com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República e aguardam pela apresentação de voto de Gilmar Mendes.

Coronéis da Mídia

O projeto “Excelências”, vinculado ao Transparência Brasil*, apontou que, na atual legislatura na Câmara dos Deputados (2015-2019), 43 deputados são concessionários de serviços de rádio ou TV, o que representa 8,4% do total dos membros da Casa. Proporcionalmente, o Senado Federal é ainda mais marcado por este fenômeno, já que 19 senadores são concessionários – o que representa 23,5% dos membros da Casa.

Os números revelam que, para além da vinculação juridicamente registrada de políticos com os serviços de radiodifusão, existe ainda casos em que os parlamentares mantêm influência sobre as empresas a partir de “laranjas” ou de parentes que ocupam posições no quadro societário dos veículos de comunicação.

O fato de concessões públicas estarem no poder de políticos resulta em falta de isonomia, em desrespeito ao pluralismo e em uma grave ameaça ao interesse público, pois o sistema brasileiro de regulação da radiodifusão não prevê a existência de um agente independente para deliberar sobre a distribuição do espectro eletromagnético. Deste modo, tal deliberação é realizada por um procedimento licitatório no qual os parlamentares do Congresso Nacional ocupam um papel central, analisando as outorgas realizadas pelo Poder Executivo. Assim, os parlamentares que mantém concessões de rádio e TV são responsáveis por apreciar os atos de outorga e renovação de suas próprias concessões e permissões de radiodifusão.

*retirado do ar por falta de financiamento

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações do MPF/PE

Globo ataca, mas mídia segue dividida sobre futuro de Temer

Enquanto a Globo segue na artilharia para desgastar o presidente, grupos como Estadão e Band parecem aliviados após denúncia da PGR ser barrada

Por Bia Barbosa e Camila Nóbrega*

O que quer a Rede Globo ao direcionar todo o seu jornalismo para desgastar Temer ao mesmo tempo em que outros grandes veículos preferem a suposta estabilidade que o governo traria à economia?

Essa é a pergunta de um milhão de dólares.

Desde as denúncias contra Michel Temer feitas pelos donos da JBS, em maio passado, uma das grandes questões que tem intrigado os que acompanham o noticiário político é por que o principal grupo de comunicação do país entrou de cabeça na derrubada do presidente enquanto outros parecem ainda apostar na sobrevivência da atual gestão.

Ninguém parece conseguir cravar uma resposta.

Mas uma análise da cobertura feita pela chamada grande mídia da votação realizada nesta quarta-feira 2 na Câmara dos Deputados pode dar algumas pistas.

É possível, por exemplo, afirmar que a denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) não foi suficiente para mexer de maneira significativa as peças do tabuleiro político.

Se, de um lado, a Globo e seus veículos usaram a votação no Congresso para fritar um pouco mais Temer, houve quem saísse quase que aliviado deste processo – mesmo que o resultado final, favorável ao Planalto, já estivesse previsto.

Como anunciado diversas vezes em sua programação, a TV Globo interrompeu sua programação normal para transmitir ao vivo, no canal aberto, a votação nominal dos deputados.

Foram quase quatro horas ininterruptas, que justificaram a não apresentação do Jornal Nacional e da novela Força do Querer, programas nobres da emissora, no período da noite.

A análise detalhada do resultado do plenário coube, então, ao “time de especialistas” – como gostam de se auto-denominar – do Jornal das Dez, na Globonews, canal pago da emissora.

Ao longo de uma hora de programa, eles fizeram questão de destacar como o Palácio jogou pesado para conseguir votos e como, apesar de ter barrado a continuidade das investigações, Temer não saiu vitorioso do processo.

“O governo trabalhou pesado, atendendo no atacado e no varejo, ao longo do dia, os pedidos de seus aliados. Até a última hora e durante a sessão, o Presidente trabalhou pessoalmente para barrar a investigação”, anunciou a âncora Renata LoPrete.

“Havia expectativa de poucos encontros hoje no Palácio. Mas ao longo do dia, pelo menos 21 deputados foram recebidos por Temer, além dos governadoras do Rio Grande do Norte e Tocantins e dos ministros Gilberto Kassab e Blairo Maggi”, completou o repórter Murilo Salviano, ao vivo do Planalto.

A reportagem que veio na sequência contou sobre os 10 ministros e dois secretários de governo que reassumiram seus mandatos na Câmara para votar com Temer.

Para a comentarista Cristiana Lobo, foi uma vitória “magra”.

“Temer se apresentou para ser um Presidente reformista e o número de votos que obteve não é suficiente pra isso. Vai ter que repactuar toda a sua base, o que não é tarefa fácil. Chamo atenção para o número de votos contra. O cálculo dos governistas chegava no máximo a 200. Mas a oposição teve 227 votos. Temer foi igualmente ruim de norte a sul do Brasil”, criticou.

Para Merval Pereira, o governo conseguiu escapar usando “os mesmos métodos de Dilma”: “Só conseguiu porque tem mais história, é mais simpático e conhece melhor os deputados. Mas foi mais uma vitória do clientelismo e da politicagem do baixo clero. O resultado mostra que, apesar da luta contra a corrupção, a política continua sendo feita da mesma maneira”.

Mais tensão nas costas do peemedebista foi colocada pela Globo com a entrevista, ao vivo, do presidente da Câmara Rodrigo Maia, que afirmou categoricamente : “Para o futuro, foi um resultado ruim, porque, com 263 votos, não emendaremos a Constituição para fazer a Reforma da Previdência”.

Maia ainda atacou o Planalto, que o acusou de estar atuando contra Temer nos bastidores: “Sempre fui fiel ao governo e nunca esperei que o entorno do presidente fosse jogar tão baixo comigo”.

Vale lembrar: há poucas semanas, foi na casa de um alto executivo da Globo que Rodrigo Maia se reuniu com deputados aliados.

Merval Pereira sentenciou: “O governo queria transformar essa votação em em vitória retumbante e Maia já saiu atacando. O deficit é imenso, a crise é gravíssima e o governo errou porque aumentou as despesas para obter essa vitória. Então vai ser uma parceria complicada”.

A mala e os áudios de Joesley 

A GloboNews exibiu ainda uma matéria específica sobre as acusações da PGR, colocando novamente no ar as imagens da mala de dinheiro carregada por Rocha Loures e trechos da transcrição da conversa do Presidente com Joesley Batista.

Lembrou que ainda há duas possíveis denúncias contra Temer na fila: por formação de organização criminosa, em casos de fraude na Petrobras junto com o PMDB, e por obstrução da Justiça, no caso de Cunha.

E questionou: será que o governo tem cacife e orçamento para enfrentar as outras que vierem agora?

No telejornal do canal aberto, mais tarde, William Waack lembrou que, em seu pronunciamento, feito logo após da votação, “Temer falou muito da economia e pouco das acusações. Fez questão de reiterar que agora teria condições de fazer as reformas que, todos sabemos, pararam diante da crise. Mas não falou nada sobre as denúncias ou sobre a JBS”, afirmou o âncora.

Outro destaque dos analistas da GloboNews, repetido depois no Jornal da Globo, foi o racha do PSDB na votação e os prejuízos que daí virão para Temer.

A fala do líder tucano na Câmara, Ricardo Tripoli, orientando a bancada a votar pela investigação, foi repetida inúmeras vezes: “os brasileiros estão cansados de tanta suspeita sobre seus representantes”.

Segundo a correspondente Andrea Sadi, o chamado centrão já quer os cargos ocupados pelo PSDB hoje no governo. Tanto no Jornal da Dez quanto no Jornal da Globo, os canais mostraram as manifestações e panelaços que aconteceram em 15 estados da federação contra Temer.

Portanto, a linha defendida no editoral de O Globo neste dia 2 de agosto, assim como nas manchetes online do jornal após a votação (“Com 263 votos, Câmara ignora provas e barra denuncia contra Temer”; “Com sorriso no rosto, Temer diz que resultado não é vitória pessoal”, “Deputado preso em regime semiaberto vota a favor de presidente”, “Internautas promovem vomitaço em rede social de Michel Temer”), seguirá a todo vapor.

Com menos sangue nos olhos, mas também no campo de ataque ao governo – certamente em busca da aproximação com os 81% da população que defendem que Temer seja investigado – a Folha de S.Paulo estampou nesta quinta 3: “Temer usa máquina, demonstra força e barra denúncia”.

Dentro, afirmou: “Balcão de negócios com o recurso público garante vitória governista”, e trouxe duas páginas centrais sob o título “Placar da Denúncia”, com fotos, nomes e partidos dos deputados e como cada um votou.

Na coluna de opinião, soltou o artigo de Bernardo Mello Franco com o título  “Vitória da mala”. “Ao blindá-lo, os deputados deixaram claro que provas não importam. O que mantém um presidente na cadeira é a sua capacidade de manter o Congresso no cabresto”, afirmou o colunista.

Em mais de uma reportagem, o jornal destacou o papel do ministro Antonio Imbassahy, flagrado negociando emendas no plenário da Câmara.

Na versão online, a Folha abriu espaço para o trabalho da Agência Lupa, que apurou quanto cada deputado recebeu de emendas nas duas últimas semanas. O Uol, do mesmo grupo, destacou: “Temer sobrevive” e “Em dia de votação de denúncia Governo libera R$ 658 mi para sete ministérios”.

Os aliados

Se saísse da Globo e mudasse de canal na TV, o telespectador teria encontrado uma cobertura bem mais favorável a Temer nas emissoras do Grupo Bandeirantes.

Uma das maiores beneficiadas pelo aumento de verbas publicitárias distribuídas pelo Planalto no último ano, a TV Bandeirantes tem dado pouco destaque à crise política em seu noticiário, e feito longas matérias em defesa da agenda das reformas.

Na noite desta quarta 2, não foi diferente. Encerrada a sessão na Câmara, a emissora logo mostrou a continuidade no alinhamento com presidente e a bancada governista. Colocações comedidas e até sorridentes deram o tom.

Ao vivo de Brasília, repórteres ressaltaram que a vitória de Temer foi muito comemorada nos bastidores. “Aqui no Planalto, o clima é de vida que segue, página virada”, dizia um dos repórteres, complementando que o pronunciamento do Presidente destacou a construção mais ampla da base aliada para a aprovação dasreformas.

Jornal da Noite, da Bandnews, destacou: “Mercado financeiro e empresários defendem continuidade de Michel Temer na Presidência”. Em seguida, uma longa reportagem ouviu empresários de diversos setores, especialmente da indústria (produção de aço, extração de petróleo, plástico, etc), dizendo o quão a permanência do Temer é bem vista porque as reformas vão continuar.

Em total alinhamento com as justificativas de voto dadas pouco tempo antes no plenário da Câmara, os entrevistados da Band declararam: “Essa instabilidade política atrapalha muito a economia”, a despeito da grave acusação ao Presidente.

Em toda a cobertura, quase nada se falou sobre a situação do país e o baixíssimo índice de aprovação do governo. Pós-discurso de Temer, a chamada foi: “Vitória é conquista do Estado Democrático de Direito”.

Aliado histórico da indústria paulista e do mercado financeiro, o jornal O Estado de S. Paulo também contribuiu para dar um ar de normalidade ao que se passou no Congresso.

Ao contrário da Globo – para quem “foi uma sessão inédita e histórica” –, o Estadão não deu qualquer destaque à denúncia em si da PGR.

Aliás, um leitor pouco informado teria dificuldades para entender as razões da consulta feita à Câmara.

Nenhuma menção direta ao fato de que Temer é acusado de destinatário de propina negociada entre o dono da JBS e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures.

Também não fizeram parte dos destaques matérias sobre as negociações e ofertas de recursos aos parlamentares para proteção do Presidente.

Quando o mínimo de votos necessários para barrar a denúncia foi atingido na Câmara, a chamada no site do Estadão era: “Temer já tem votos suficientes para barrar denúncia, acompanhe ao vivo”. Encerrada a votação, o destaque também foi o pronunciamento do Presidente: “Após barrar denúncia, Temer diz que é urgente pôr o país nos trilhos”.

Outras chamadas na capa compunham um cenário de apoio ao governo: “Em nome da economia, aliados votam para arquivar denúncia” e “Bolsa sobe 1% e volta ao nível de pré-crise política”.

O tom alinhado com o Planalto seguiu na versão online do jornal desta quinta 3: “Após vitória na Câmara, próxima batalha é a Previdência, diz Padilha”, em referência à reforma também apoiada pelo jornal. Já sumiu da página principal a matéria publicada na véspera, que dizia “Janot pede Temer, Padilha e Moreira Franco no quadrilhão do PMDB”. O texto principal de Opinião do site é “A política radical de Lula”.

Entender o jogo que a grande mídia tem feito não é tarefa, portanto, para principiantes.

O que importa todo leitor e telespectador considerar é que, nem de longe – assim como ocorreu com a cobertura do impeachment de Dilma Rousseff –, o que conduz a linha editorial dos veículos em relação a Temer se resume ao mero exercício do jornalismo.

Há muito mais por trás das câmeras, telas e páginas de jornal do que se pode imaginar.

Sigamos de olhos abertos.

* Bia Barbosa e Camila Nóbrega são jornalistas. Colaborou Cinthya Paiva, advogada. Todas integram o Intervozes.

Para derrubar Temer, Globo vai além do jornalismo

Alto executivo do Grupo oferece almoço a parlamentares em semana definidora para futuro de Temer, mas cobertura segue favorável à agenda das reformas

Por Daniel Fonsêca*

Desde o furo de O Globo sobre o envolvimento de Michel Temer em crimes como obstrução à Justiça e corrupção passiva, em maio passado, todo o jornalismo do Grupo Globo está focado em fortalecer e legitimar as denúncias contra o presidente. Nesta semana, a Globo decidiu, entretanto, incidir de forma mais direta na condução da crise que corrói a gestão do PMDB há quase dois meses.

Em pleno domingo 9 de Brasília, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), logo após conversar com Michel Temer, foi a uma casa no Lago Sul, em Brasília, para participar de um almoço. Era a residência de Paulo Tonet Camargo, vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo. A informação, veiculada pela Folha de S.Paulo, é a de que Maia estava acompanhado de outros cinco políticos, todos de partidos da base aliada de Temer, inclusive o ministro de Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho.

Os carros das autoridades, todos sem identificação oficial, só deixaram o local mais de cinco horas depois, já à noite. De acordo com o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), que passou de combatente a aliado dos governos petistas para depois apoiar a gestão de Michel Temer, tratou-se de um encontro agendado com mais de 30 dias de antecedência, sem nenhuma relação com a conjuntura atual. Acredite quem quiser.

Dias antes, cresciam as especulações de que Rodrigo Maia poderia ter apoio suficiente para assumir a Presidência da República no caso de afastamento de Temer. No dia seguinte, seria lida a relatoria sobre a denúncia contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ).

Não por acaso, o relator, Sergio Zveiter (PMDB-RJ), tem o Grupo Globo como cliente de serviços jurídicos há mais de 40 anos. No Congresso, Zveiter, também considerado próximo a Maia, chega a receber a alcunha de “advogado da Globo”.

Mas o papel de Zveiter é pequeno perto do desempenhado pelo anfitrião do almoço de comensais políticos do último domingo. Entre os anos 1990 e o começo dos 2000, um alto executivo da Globo chegou a ser apelidado em Brasília de “Senador Evandro”. Era Evandro Guimarães, que ocupava na época exatamente o mesmo cargo que hoje ocupa Paulo Tonet, dono da casa no Lago Sul.

Além de lobista oficial do grupo, Tonet acumula desde agosto a presidência da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). Tornou-se figura recorrente na proa das principais negociações em torno de decisões políticas e econômicas envolvendo o Executivo, o Congresso e mesmo o STF – onde a Abert tem conseguido vitórias importantes para alterar leis e normas regulatórias às quais se opõe, como a Classificação Indicativa.

Colega de trabalho de Paulo Tonet, após onze anos em diferentes cargos do Executivo Federal, Marcelo Bechara foi contratado como “Diretor de Regulação” do Grupo Globo, para tratar exclusivamente de questões jurídicas e legislativas. Secretário-executivo do Ministério das Comunicações de 2005 a 2010, nos dois governos de Luiz Inácio Lula da Silva, quando o órgão era comandado por Hélio Costa (PMDB-MG), e conselheiro da Anatel de 2011 a 2015, nas duas gestões de Dilma Rousseff, Bechara hoje transita no Congresso e na Esplanada com facilidade para defender os interesses da empresa.

Mas a reunião desta semana revela uma entrada ostensiva da família Marinho na operação política como há tempos não se via. Mesmo antes e durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff, os irmãos só chegaram a se posicionar em agosto de 2015 e, ainda assim, limitaram-se a dialogar com empresários no sentido de ponderar a impertinência da insistência em derrubar a presidenta. Para eles, isso geraria mais instabilidade política e insegurança jurídica, o que não era bom para os negócios num momento de grave crise econômica.

Meses antes, em junho de 2015, em meio a diversas batalhas com uma Câmara controlada por Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a ondas negativas da imprensa corporativa dirigidas contra o governo e a manifestações massivas das classes médias a favor do impedimento, Dilma Rousseff chegou a ir ao Rio de Janeiro prestigiar o encontro da não tão relevante Academia Internacional de Televisão e, ainda, homenagear os 50 anos da TV Globo, completados em abril daquele ano.

Agora, a “editorialização” excessiva do jornalismo de todo o Grupo Globo contra Michel Temer comprova, obviamente, que os irmãos Marinho querem a cabeça do presidente da República – e logo.

Fora Temer, mas não a sua agenda

No mercado de mídia, a Globo se antecipou ao dar as informações sobre as delações de Joesley e Wesley Batista, aparentemente sem poupar nomes do governo ou do próprio Aécio Neves (PSDB-MG), que costumava receber tratamento positivo dos Marinho.

À primeira vista, a intenção era não perder o controle da situação e manter a relevância do grupo numa possível nova transição de governo. Por fora do quadro político estrito, os mentores do Grupo Globo não costumam abrir mão de arbitrar e moderar os rumos da política e da economia nacionais, tarefa que sempre outorgaram a si mesmos, como se fosse uma missão do grupo desde a origem. Orbitam e tentam influenciar figuras do meio político, mas também do Judiciário, o poder mais impermeável e hermético, portanto bem menos “republicano”.

Os questionamentos, então, dizem respeito às razões que levaram o Grupo Globo a, ao embarcar no ataque contra Temer, pôr em risco a agenda programática das reformas, apoiada pelos donos do PIB nacional de forma quase unânime.

Afinal, o apoio editorial e as articulações políticas em torno da derrubada de Temer estão longe de significar uma discordância do Grupo Globo em relação às pautas encabeçadas por ele. Vale lembrar que frações ainda consideráveis do “mercado” seguem bem reticentes em abandonar totalmente a sustentação do governo.

Para ajudar a empurrar Temer e tentar salvar sua agenda, os telejornais globais têm feito uma ginástica retórica em separar a “necessária” aprovação das reformas da figura do presidente ilegítimo. Nessa operação, têm, como é de praxe, omitido informações relevantes, invisibilizado e condenado os argumentos e protestos contrários às reformas.

Na terça-feira 11, a matéria do Jornal Nacional sobre a aprovação da reforma trabalhista no Senado teve como foco a tentativa das senadoras de oposição de obstruir a votação: “O Senado registrou hoje uma cena que jamais tinha sido vista na história da Casa. Um grupo de senadoras da oposição decidiu simplesmente ocupar a mesa do Plenário para impedir a votação da reforma trabalhista. E lá ficaram interditando os trabalhos por mais de seis horas”, anunciou Renata Vasconcelos.

Segundo a matéria, “a atitude das senadoras foi condenada por colegas de diversos partidos”. “Protesto não se faz dessa forma”, ensinou o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB). Mais dois senadores foram ouvidos, todos contrários à ocupação da Mesa, sendo um deles José Medeiros (PSD-MT), que entrou com pedido contra elas, já aceito, no Conselho de Ética, por quebra de decoro parlamentar.

A informação veiculada sobre as mudanças aprovadas na CLT foi a seguinte: “A reforma trabalhista dá força de lei a acordos celebrados entre trabalhadores e patrões, respeitando os direitos assegurados pela Constituição, como FGTS e 13º salário; permite que férias possam ser divididas em até três períodos; acaba com a obrigatoriedade da contribuição sindical, equivalente a um dia de salário do trabalhador; permite que o intervalo de almoço possa ser reduzido para 30 minutos, diminuindo a jornada mediante negociação coletiva; e inclui a jornada intermitente: o trabalho em dias alternados ou por algumas horas, como o de trabalhadores de bares ou eventos”.

A construção retórica é clara. A atitude das senadoras teria sido antidemocrática e contra uma reforma que não representaria nenhuma perda de direitos. O que o Jornal Nacional se esqueceu de mencionar foi que a união das senadoras de oposição contra a votação da reforma teve um motivo especial: o texto da nova lei autoriza que grávidas e lactantes trabalhem em ambientes insalubres. O item misteriosamente sumiu da lista de alterações que o JN considerou relevante enumerar.

Nenhuma palavra foi dada às senadoras ou a qualquer outra fonte que as apoiasse. O fato de o presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE), ter mandado cortar a luz do Senado foi mencionado com naturalidade, ignorando seu caráter autoritário. As regras para a entrada no Senado naquele dia, que barraram a presença de centenas de trabalhadores e sindicalistas na Casa, sequer foram citadas.

Pouco ou nada se diz na Globo também sobre os protestos que, há meses, em diferentes cidades do país, rechaçam a reforma trabalhista. Como já havíamos mostrado neste blog, a cobertura dos atos e greves contrários às reformas deixa evidente o apoio da Grupo Globo às retiradas de direitos trabalhistas e previdenciários.

Hipóteses sobre as intenções do Grupo Globo

Diante do quadro de crise aguda e endêmica na política institucional, o Grupo Globo tenta agora catalisar a insatisfação geral da população com o governo e, em especial, a indignação das classes médias e altas com a corrupção. Quer capitalizar-se como a intérprete e a vocalizadora hegemônica desse pensamento diluído, apresentado como a síntese possivelmente unificadora do País. A um só tempo, portanto, a Globo opera em diversas instâncias.

No plano político, busca manter-se como âncora e bússola para gestores, parlamentares e outros agentes públicos, interferindo diretamente na orientação das decisões que vão definir o cenário a curto e médio prazos, inclusive no Judiciário, operando um dos braços da sua capacidade de direção cultural, complementada pela orientação em questões morais e identitárias.

No nível econômico, sustenta uma campanha proativa, que obviamente alcança e integra o jornalismo, em apoio às agendas liberalizantes, prescrevendo reformas regressivas, privatizações e ajuste fiscal como únicas soluções eficazes para a crise por que passa o Brasil desde 2012.

Por fim – como causa e consequência dos outros dos níveis –, procura se (re)posicionar como o único agente da indústria cultural com capacidade produtiva (técnica e estética), lastro socioeconômico, influência política e estabilidade financeira para, ao menos aparentemente, defender linhas de atuação próprias e autônomas (a governos e empresas corruptoras) que funcionem como balizadoras para a unificação nacional.

A chave de análise sobre a postura da Globo, nos últimos e provavelmente nos próximos anos, reside na visão/missão que o grupo tem consolidado: a partir da condição de qualificada produtora de conteúdo nacional, mostrar-se como o único agente de mercado que reúne as condições para interpretar, organizar e expressar a cultura brasileira, aqui entendida no sentido mais ampliado possível. E isso também é um perigo para a nossa democracia.

*Daniel Fonsêca é jornalista e integrante do Intervozes. Colaborou Mônica Mourão, jornalista, coordenadora executiva do Intervozes

Conselho de Comunicação faz recomendação ao Congresso sobre critérios de escolha dos representantes da sociedade civil

Proposta do colegiado é de que os representantes sejam indicados por organizações de âmbito nacional de segmentos expressivos da sociedade e por instituições de pesquisa sobre comunicação social, entre outras

O Conselho de Comunicação Social (CCS) do Congresso Nacional realizou nesta segunda-feira, dia 3, a última reunião do biênio 2015/2017, aprovando na ocasião a Recomendação 1/2017, sobre a eleição dos representantes da sociedade civil no colegiado. A recomendação será encaminhada à Mesa Diretora do Congresso Nacional.

A proposta aprovada propõe que os representantes da sociedade civil no Conselho sejam indicados por organizações de âmbito nacional de segmentos expressivos da sociedade, como de defesa dos direitos das mulheres, de negras e negros e de jovens; por instituições de pesquisa sobre comunicação; por organizações que atuam na comunicação social e que não estejam representadas nas vagas destinadas às empresas privadas; por organizações de âmbito nacional que comprovadamente atuem no campo jurídico e por organizações que atuam na área da comunicação social.

A decisão do CCS vem ao encontro de uma preocupação levantada pela Frente Parlamentar Pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular (FrenteCom), a de que, na atual gestão do órgão, foram indicados em vagas da sociedade civil nomes que não representam esta parcela social. As últimas indicações feitas pelo CCS foram criticadas por incluírem até mesmo ministros de Estado, que não compareceram sequer a uma só das reuniões agendadas.

A FrenteCom também criticou o fato de a Mesa Diretora do Congresso Nacional, no último dia 30 de maio, ter apresentado uma lista de nomes para a composição da próxima gestão do Conselho sem que este debate tivesse avançado no próprio CCS. A lista, cuja apresentação não constava na pauta, só não foi submetida à votação dos parlamentares devido ao questionamento de alguns partidos políticos.

Maria José Braga, conselheira responsável pela relatoria da reunião, reforçou que a Recomendação 1/2017 do CCS é imprescindível, pois faz proposições de encaminhamentos que dizem respeito à discussão da composição do Conselho. “O interesse foi balizar minimamente os critérios, para que não se cometam erros como os cometidos para a indicação da atual composição. E para que não se cometam erros que já estão mais ou menos configurados na lista que foi tornada pública na última reunião do Conselho, que tem indicações de pessoas e de entidades para a representação da sociedade civil que não são representativas da sociedade civil”, enfatizou.

A relatora também destacou que acatou as sugestões encaminhadas pela FrenteCom, mas se absteve de opinar sobre o PLS 111/2017 por haver um consenso entre os membros do Conselho de que, diante da complexidade do tema, o debate sobre a escolha dos representantes do CCS deve ser aprofundado por meio de audiências públicas e seminários para que, somente depois disso, o órgão emita um parecer conclusivo. O PLS 111/2017, de autoria do senador Paulo Rocha (PT-PA), dispõe justamente sobre a composição e o processo de escolha dos membros do Conselho de Comunicação.

Durante a reunião do CCS, ainda foram encaminhadas as sugestões dos conselheiros Davi Emerich e Walter Ceneviva para os debates posteriores sobre a composição do CCS. O primeiro quer evitar reserva de mercado para entidades, enquanto o segundo sugere a introdução no colegiado de representantes da academia e de pessoas com notório saber sobre a comunicação social.

Composição e funcionamento
O texto aprovado pelo CCS estabelece que os 13 membros titulares do Conselho e seus respectivos suplentes sejam eleitos em sessão conjunta do Congresso, a partir de indicações das entidades representadas no órgão, para cumprirem um mandato de dois anos, permitida uma recondução.

Atualmente, o colegiado é composto por representantes das empresas de rádio, de televisão e da imprensa escrita; das categorias profissionais dos jornalistas, radialistas, artistas e do cinema e vídeo; por cinco representantes da sociedade civil e por um engenheiro com notórios conhecimentos na área de comunicação social.

O Conselho de Comunicação elabora estudos, pareceres e atende solicitações encaminhadas pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal sobre assuntos que digam respeito à comunicação social. Entre eles, a liberdade de manifestação do pensamento; publicidade, diversões e espetáculos públicos; produção e programação das emissoras; monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação; e outorga e renovação de concessão, permissão e autorização de serviços de radiodifusão.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação