A divulgação, nesta terça-feira (14), do parecer técnico do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) sobre a proposta de separação empresarial prevista no novo Plano Geral de Outorgas (PGO) começa a consolidar um cenário bastante favorável à que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) invista em outros métodos de separação no setor de telecomunicações. O “Diagnóstico e Balanço das Vantagens e Desvantagens da Separação Empresarial” acaba por concluir que esse sistema gerará impactos nocivos para o mercado. No entanto, para chegar a esta conclusão, os especialistas consultados mostram simpatia com outros métodos de separação, em especial a estrutural e a funcional, o que fica em linha de outras opiniões já manifestadas ao conselho diretor.
A conclusão de boa parte dos especialistas consultados pelo CGEE (órgão ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia) é que a separação empresarial proposta no PGO poderia ser substituída por uma separação funcional. O parecer da CGEE está disponível no site da Anatel ou na homepage do site TeleTime.
Seja empresarial ou funcional, essa ação tem sido vista como um primeiro passo para uma futura separação estrutural, o que é visto como algo positivo no campo econômico-concorrencial. "A separação funcional produz efeitos muito similares aos da separação empresarial, sem os seus efeitos mais negativos", constatam os especialistas no estudo.
Esta não é a primeira vez que um parecer contrário à proposta incluída no PGO acaba trazendo opiniões favoráveis aos outros métodos de separação praticados no mundo. Posição semelhante foi apresentada pela procuradoria especializada da Anatel. Em seu parecer, a procuradora Ana Luiza Valadares faz elogios a alguns sistemas, em especial a separação estrutural implementada na British Telecom e que, na opinião da procuradora, poderia trazer benefícios para o mercado brasileiro.
Fora do PGO
Não é apenas neste ponto que o parecer da CGEE segue a mesma linha da análise apresentada pela procuradoria da Anatel. Há entendimento comum sobre as restrições a inserção da separação empresarial no PGO. Para o especialista ouvido pela CGEE neste campo, um dos pontos a ser considerados na análise da legalidade é se o PGO é ou não o instrumento correto para a implementação da medida.
Assim como a procuradora, o jurista Márcio Iório Aranha, pesquisador da Universidade de Brasília, entende que a decisão sobre separar ou não elementos neste mercado é atribuição da Anatel. E, por isso mesmo, a questão não deveria estar colocada no PGO, que é um instrumento legal do Executivo. “O Plano Geral de Outorgas, como produção normativa presidencial de atribuição legal expressa, não tem a atribuição de tratamento da questão da separação empresarial, sendo, portanto, instrumento impróprio para essa decisão”, afirma Aranha.
Sem direito adquirido
Apesar de o parecer da CGEE, ao concluir que o PGO não deve conter artigo sobre a separação empresarial, favorecer a defesa das concessionárias contra a medida, em um aspecto o laudo choca-se frontalmente com o principal argumento dessas empresas. Trata-se da tese do direito adquirido. As concessionárias e boa parte dos técnicos da própria Anatel defendem que as concessionárias possuem um “direito adquirido” para prestar o STFC e o SCM sob o mesmo CNPJ por conta do artigo nº 207 da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), que ressalvou os serviços que já eram prestados pelas empresas antes da privatização. Mas para Aranha, não há direito adquirido algum neste caso.
“Se o Estado pode até mesmo extinguir a concessão por razões extraordinárias de interesse público, (LGT, art.113, caput) tanto mais lhe compete alterar as condições de prestação, inclusive mediante exigência de prestação exclusiva, assim autorizado pelo domínio que detém sobre os rumos do serviço como fulcro de cláusulas estatutárias do contrato de concessão”, avalia o parecerista. O ponto seria que, se há direito adquirido, ele não é “absoluto” por estar à mercê de mudanças de rumo nas regras que visem o interesse público.
O único alívio para as concessionárias, neste caso, é que, para mudar o curso das regras, a agência reguladora deve embasar fortemente os motivos da revisão. “É dever da Anatel comprovar que tal medida de separação empresarial não só resultaria benéfica aos usuários e ao interesse público de universalização e continuidade, como que os eventuais prejuízos seriam razoáveis ao se justificaram frente a um ganho social maior para o setor em sua dimensão futura de preservação de um serviço universal, essencial e contínuo”, diz o pesquisador.
Custos
O parecer da CGEE também chega a conclusão de que a manutenção da separação no PGO trará impactos negativos para o mercado brasileiro ao expandir a incidência de tributos – em destaque o PIS/Cofins – e, portanto, elevar o preço dos serviços para o consumidor. A separação também poderia trazer impactos na arrecadação nos casos em que as empresas resultantes acabem tendo receitas que justifiquem a mudança de faixa de pagamento da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL).
Outros aspectos destacados são a possibilidade de a ação mexer com os reajustes no setor. O primeiro impacto poderá aparecer com pedidos de revisão nos reajustes, argumentando mudanças nos custos internos trazidas pelo aumento relativo do valor dos tributos na cadeia. Outro impacto é a necessidade de alteração do Fator X estipulado para a revisão tarifária. Isso porque este índice, que funciona como um redutor dos reajustes, é calculado com base na eficiência de cada concessionária. Eficiência esta que mudará caso a empresa não preste mais sob o mesmo CNPJ serviços de telefonia e banda larga.
Comparações
Chama a atenção o fato de o estudo acabar não sendo conclusivo sobre a retirada ou não do artigo 9º da proposta, onde consta a separação. Ao invés de apresentar um posicionamento concreto sobre a manutenção ou retirada do artigo, o CGEE optou por montar tabelas mostrando prós e contras da medida com base nos pareceres solicitados a especialistas e nas contribuições feitas pela sociedade na consulta pública do PGO.
A falta de uma recomendação explícita para a retirada do artigo na conclusão do relatório cria novas dúvidas sobre o voto do relator Pedro Jaime Ziller, defensor da separação empresarial. Na Anatel, há a crença de que Ziller insistirá na medida e acabará sendo vencido pelos demais conselheiros na votação. Os votos dos conselheiros ainda estão sendo preparados e devem ser apresentados publicamente na sessão agendada para o dia 16, próxima quinta-feira.