Minicom abre seleção para rádios comunitárias em 75 municípios

Redação – Ministério das Comunicações

Mais 75 municípios brasileiros vão ser contemplados pela primeira vez com uma rádio comunitária. O Ministério das Comunicações publicou nesta quinta-feira, 17, o primeiro aviso de habilitação de 2013 para a inscrição das entidades que quiserem participar da seleção. Os interessados em ganhar a autorização para operar uma emissora comunitária terão o prazo de 60 dias para se inscrever.

O aviso de habilitação abrange cidades da Região Norte (Acre, Amazonas, Pará, Roraima, Rondônia e Tocantins), Nordeste (Bahia e Pernambuco) e Centro-Oeste (Goiás). Toda a tramitação dos processos deste aviso de habilitação ficará sob a responsabilidade da delegacia regional do ministério em São Paulo, único local onde inscrições deverão ser feitas, via postal ou diretamente no protocolo da delegacia. Confira aqui a relação completa dos municípios beneficiados neste aviso e os documentos exigidos das entidades.

As entidades que buscam a autorização para operar uma emissora comunitária podem ter acesso ao formulário de inscrição no próprio site do Ministério das Comunicações ou na Delegacia Regional do MiniCom em São Paulo. Neste ano, outros 12 avisos de habilitação serão abertos pelo MiniCom para autorizar novas rádios comunitárias.

A história de luta pela regulamentação da TV a Cabo no Brasil

A luta pela regulamentação da TV a cabo no Brasil fundamentou-se na possibilidade de se oferecer à população brasileira uma alternativa à TV aberta, oligopolizada por um número reduzido de emissoras. O ápice desta batalha se deu no início da década de 90, quando foi apresentado um projeto de lei na Câmara dos Deputados que, depois de muita negociação, foi aprovado no final de 1994 e converteu-se na Lei nº 8.977/1995, sancionada em 6 de janeiro de 1995 (a Lei do Cabo). Com a lei, foi regulamentado o funcionamento de canais privados no sistema de televisão por assinatura brasileiro e também dos canais básicos de utilização gratuita (comunitários, legislativos, universitários e educativo-culturais).

De acordo com o professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Murilo César Ramos, que participou ativamente das negociações da Lei do Cabo como representante da Academia, ver a TV a Cabo como alternativa à TV aberta era um sonho, já que as próprias experiências de TV paga no mundo sempre mostraram que eram uma opção elitizada, por conta do acesso restritivo. Mas foi este sonho que motivou o início da luta pela regulamentação e o desenho dos primeiros esboços desse modelo de televisão no Brasil.

Segundo relata o professor Murilo, a luta pela regulamentação da televisão a cabo no Brasil começou ainda na década de 70, com a criação da Associação para a Promoção da Cultura (APC), em 1973, pelo ativista gaúcho Daniel Herz, que faleceu em 2006. “Graças a encontros entre Daniel Herz, representando a APC, e o professor Romero Simon, do departamento de Engenharia da Universidade do Rio Grande do Sul (URGS), em meados da década de 70, foi elaborado um projeto-piloto de TV a cabo para o Rio Grande do Sul e entre o fim dos anos 70 e início dos anos 80 o Ministério das Comunicações chegou a ser provocado para regulamentar a TV a cabo no Brasil”, relembra Murilo Ramos.

Se a pressão dos radiodifusores fez com que a discussão não prosperasse naquela época, no início da década de 90 a discussão volta com força total, e encontra uma sociedade mais organizada. Entre outros atores, existia na época o Movimento Nacional pela Democratização da Comunicação, que atuou durante a Assembleia Constituinte  pela inclusão dos artigos referentes à Comunicação Social na Constituição Federal e que agregava várias entidades do setor. Em 1992 o Movimento se transformou no Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), que assumiu o protagonismo desta luta. Além disso, Daniel Herz, fundador da APC e grande entusiasta da ideia, ocupava a presidência da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), uma das entidades fortes do FNDC.
 
Em 1991 foi realizada em Brasília uma audiência pública organizada pela Secretaria Nacional de Comunicação (SNC) – órgão equivalente ao Ministério das Comunicações no governo Collor – sobre a consulta pública da portaria que criava o serviço de TV a Cabo no Brasil. “Na véspera da consulta, realizamos uma grande plenária na UnB e estavam presentes organizações da sociedade civil envolvidas com o tema na época: Fenaj, Sindicato dos Jornalistas, Radialistas, o pessoal da própria Faculdade de Comunicação da UnB, entre outras, para decidir como iríamos participar dessa audiência, como seria a intervenção. No dia da audiência, o auditório ficou tomado pelas organizações, que também fizeram faixas, e isso até causou grande surpresa nos participantes da audiência”, conta o professor.
 
Nesse período, a reivindicação da sociedade civil era principalmente em relação ao instrumento jurídico quer seria utilizado para regulamentar TV a Cabo no Brasil. “Dizíamos que se tratava de assunto tão importante, que uma mera portaria não poderia regulamentar. Nós queríamos uma lei, aprovada no Congresso, para fortalecer a política e para que houvesse um debate amplo e democrático no Congresso. E também porque não queríamos correr o risco de ver as outorgas entregues para as mesmas emissoras que já monopolizavam a TV aberta”, conta Murilo Ramos.
 
“Nós decidimos fazer um projeto de lei para parar a portaria. Um dia, fizemos uma reunião com Carlos Eduardo Zanata, assessor técnico para a comunicação da bancada do PT na Câmara,  e elaboramos uma proposta. Chamamos o Tilden Santiago, deputado federal pelo PT de Minas, jornalista ligado às lutas históricas pela democratização da comunicação e ele assinou o projeto. Estava pautada no Congresso a regulamentação da TV a cabo. Com o projeto tramitando, o Executivo ficou de mãos atadas. Ele não iria ter coragem de soltar a portaria se tinha um projeto em tramitação sobre o mesmo assunto”, explica o professor, referindo-se ao Projeto de Lei nº 2.120, que dispunha sobre o Serviço de “Cabodifusão” no Brasil e foi apresentado na Câmara em novembro de 1991 pelo então deputado federal Tilden Santiago.
 
Um ano após o projeto de lei ter sido apresentado na Câmara, aconteceu um fato inédito e positivo para as entidades do movimento nacional pela democratização da comunicação: a deputada federal Irma Passoni (PT-SP) assumiu a presidência da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, o que o professor Murilo Ramos qualifica de “acidente legislativo positivo para o nosso campo”, já que normalmente a comissão ficava sob comando de setores mais conservadores da sociedade. “Ela designou como relator do Projeto de Lei o deputado Koiyu Iha (PSDB-SP), num lance de mestre, porque não tinha como brigar com o PFL sem uma aliança maior na Câmara. Nós ajudamos a montar uma pauta para a comissão, que fazia reuniões formais e informais, audiências. Ela passou a comandar dentro do Congresso a discussão, a partir da visão de que não era um problema do parlamento, mas de que a lei tinha que ser feita pela sociedade”, rememora o professor Murilo.
 
Para o radialista e diretor do Sindicato dos Radialistas do Distrito Federal (SINRAD-DF) Chico Pereira, que na época era diretor do SINRAD-DF e integrante do Movimento Nacional de Radialistas – que mais tarde se transformaria na Federação Interestadual dos Trabalhadores em Rádio e TV (Fitert) –, a aprovação da Lei do Cabo foi resultado de uma “boa aliança entre movimentos sociais e alguns parlamentares”, referindo-se ao espaço para o diálogo que se estabeleceu entre a sociedade e a CCTCI. “Sem dúvida, a aprovação desta lei esta foi uma conquista da sociedade civil organizada em parceria com legisladores sérios, atuando conjuntamente por dentro da Comissão”, relata o radialista. “Nossa grande busca era garantir na Lei do Cabo um espaço aberto e patrocinado para as TVs comunitárias, legislativas, universitárias. Foi alcançado não o quanto queríamos, mas foi alguma coisa. Um dos pontos importantes, a meu ver, foi garantir que a TVs comunitárias tivessem canais no cabo com o mínimo de gasto possível”, conta Chico Pereira, que também comemora a garantia do espaço para os canais legislativos no cabo.

Divergências na negociação
 
A CCTCI havia sinalizado que acataria as sugestões que viessem da sociedade para fechar o texto da lei, mas a própria sociedade estava com dificuldades de fechar um texto comum, devido à intervenção dos empresários nas negociações. “Ainda vigia o monopólio estatal das telecomunicações e a Telebrás – e representantes da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações (Fittel), muitos deles trabalhadores da Telebrás – diziam que só ela poderia fazer e operar estas redes. Já as empresas privadas diziam que se tratava de um serviço privado e que não cabia o monopólio, destinado apenas para serviço público. E as forças hegemônicas do FNDC (representadas principalmente por Daniel Herz, presidente da Fenaj na época) defendiam que a rede podia ser privada, mas com estatuto público, inclusive eu também defendia essa posição”, relata o professor Murilo Ramos.
 
Ramos esclarece ainda que “aquela foi uma discussão presidida pela questão tecnológica e o grande impasse era o controle da rede. Sabia-se já naquela época que o futuro era a fibra ótica e a banda larga, as redes de alta velocidade e alta capacidade”, diz o professor. Ainda segundo ele, depois de intensas negociações, a proposta apresentada pelas hegemônicas do FNDC foi acolhida pelo relator do projeto. “A rede seria privada, mas o estatuto dela seria público, como são as redes das concessionárias hoje”, afirma o professor.
 
As últimas negociações entre a sociedade para deliberar sobre a Lei do Cabo ocorreram em uma plenária do FNDC que ocorreu em Salvador, no segundo semestre de 1994. “Era a plenária que fecharia o texto final da lei, claro, com as pré-condições postas”, conta o professor Murilo Ramos, que se lembra de outro ponto de discordância surgido na plenária: a questão da exclusividade na exploração do serviço. “Os empresários conseguiram aprovar que haveria exclusividade para exploração do serviço e houve forte reação contrária da sociedade em relação a este ponto. Fizemos um acordo para que houvesse competição e, finalmente, o deputado Koiyu Iha recebeu o texto que foi aprovado na nossa plenária da deputada Irma Passoni. Depois disso, foi feito um acordo de lideranças e o texto foi aprovado sem mudanças na Câmara e no Senado. Passou em outubro de 1994 no Congresso e foi a primeira lei sancionada pelo FHC, em janeiro de 1995”, finaliza o professor.
 
O jornalista, diretor da TV Comunitária de Brasília e vice-presidente da Fenaj na época das negociações da Lei do Cabo, Beto Almeida, afirma que foi contra alguns elementos do acordo feito entre a sociedade civil organizada, parlamentares e empresários para a aprovação da lei, mas foi voto vencido. “Nós gostaríamos de ver incluída a limitação à propriedade cruzada, para que não se reproduzisse no cabo o mesmo desequilíbrio do controle de espaços midiáticos por setores já poderosos no espaço aberto”, recorda Almeida.  “Outra questão que buscamos e fomos derrotados era a inclusão de uma forma de sustentabilidade às TVs comunitárias, porque os canais das instituições, como TV Senado, Câmara e TVs Assembleia têm sua forma de sustentabilidade, mas as TVs comunitárias não. Ademais, há uma proibição para que elas pratiquem a publicidade, então, como vai viver uma televisão comunitária? E tiveram outras propostas e projetos que tentamos incluir na negociação na época, mas que não fomos atendidos Nós queríamos que a Lei do Cabo tivesse um grau de democracia e pluralidade um pouco mais amplo. Houve a conquista possível”, relata.

Mobilização da sociedade: conquista alcançada e não continuidade
 
Para Murilo Ramos, esta foi, depois da Assembleia Nacional Constituinte, a mais importante mobilização que reuniu sociedade civil, empresas e Congresso, para discutir um tema de comunicação. “Depois da Constituinte foi a maior mobilização, fazendo-se uma ressalva apenas para a Confecom, que trouxe outros atores de fora do campo da comunicação para discutir o tema, e essa foi uma grande contribuição. As discussões da Constituinte e da Lei do Cabo ficaram no meio de especialistas”, argumenta o professor, que acredita ainda que as discussões e mobilizações em relação à Lei do Cabo fizeram com que a sociedade civil se organizasse melhor e acumulasse muito politicamente.
 
Entretanto, segundo o radialista Chico Pereira, a mobilização da sociedade, que neste caso da Lei do Cabo se deu de forma bastante ativa, esfriou. “A julgar pela mobilização e pela forma como as coisas vinham acontecendo, eu tinha a impressão de que outras coisas, como a regulamentação dos artigos da Constituição Federal relativos à comunicação, viriam com o mesmo grau de interesse e construção de consenso”, pontua. “Acredito que isto não se deu porque o perfil do Congresso Nacional piorou muito, na medida em que houve um derrame de concessões, inclusive de comunitárias, para os parlamentares. Isso passou a ser um dos grandes entraves para a regulamentação da comunicação no Brasil”, constata o radialista.
 
De qualquer forma, é consenso entre os representantes da sociedade civil que atuam no campo da comunicação que, embora o texto aprovado não tenha sido o ideal, a garantia dos canais básicos de utilização gratuita (comunitários, legislativos, universitários e educativo-culturais) no sistema de televisão a cabo brasileiro foi muito importante. “Marcou uma possibilidade, um potencial. E para mim, o grande legado são os canais legislativos, porque eles tinham recursos e conseguiram, progressivamente, montar seus canais no cabo, obter outorga e colocá-los no satélite. O acesso ainda é restrito, mas o sucesso desses canais é do ponto de vista de conteúdo, pelo fato de terem recursos e profissionais se dedicando a eles”, reflete o professor Murilo Ramos.

Lições do MEC ao MiniCom

Em 8 de janeiro último saiu publicado no Diário Oficial a lista de 38 cursos universitários reprovados pelo Ministério da Educação (MEC), o que contou com uma vasta cobertura jornalística. E se o Ministério das Comunicações fizesse o mesmo? Qual seria o tom das matérias?

Independentemente dos critérios adotados na avaliação do MEC e/ou dos equívocos de boa parte da imprensa em interpretar tais informações, todos reconhecem que, em nome do ensino de qualidade e do interesse público, o Estado cumpre seu papel constitucional em fiscalizar as universidades tanto em forma (laboratórios, bibliotecas, equipamentos…) como em conteúdo (projetos didáticos, capacidade do corpo docente, “provão” para os estudantes…).

No Jornal Nacional daquela noite (ver aqui), pelo lado das universidades mal pontuadas falaram o coordenador do curso de Arquitetura da Mackenzie, Paulo Correia, e a reitora da PUC, Ana Maria Marques Cintra, ambas instituições confessionais com sede em São Paulo. Nos dois casos, mesmo com a surpresa, as respostas foram semelhantes.

“Vamos nos debruçar sobre os dados para que a gente reverta isso da forma mais rápida. Numa escola com esse nível de tradição, nós devemos essa resposta à sociedade”, disse Correia. Já a reitora, falando que tomará providências o quanto antes, afirmou: “Até porque nós entendemos que a avaliação do MEC seja alguma coisa importante para a universidade”.

E a posição do ministro Aloizio Mercadante na sonora que encerra a matéria foi curta e grossa: “Não vai ter jeitinho, não tem colher de chá, e se o plano de melhorias não for muito bem elaborado não há a menor possibilidade de abertura de vestibular”.

A Constituição de 1988 diz em seu artigo 209 que “o ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I – cumprimento das normas gerais da educação nacional, e II – autorização e avaliação de qualidade pelo poder público”. São apenas duas exigências – muito pouco se comparadas aos princípios estabelecidos logo mais adiante, no artigo 221, ainda no título da Ordem Social, quando trata da programação das concessionárias de rádio e televisão:

“I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; e IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família”.

Qual a diferença entre a educação e a comunicação? Por que uma tem seu controle social legitimado e a outra, repudiado?

Discursos de conveniência

Vale lembrar a cobertura do mesmo Jornal Nacional em 16 de março de 2010, quando do lançamento do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), com a Rede Globo criticando a proposta da criação de uma regulamentação do artigo 221 da Constituição, prevendo sanções para concessionárias de rádio e TV que o violassem. Exatamente como o MEC faz com as escolas que autoriza a funcionar.

Havia ainda outra proposta no PNDH-3, esta falando mais fundo nos bolso das concessionárias: “suspender patrocínio e publicidade oficial em meios que veiculam programações atentatórias aos direitos humanos”. Para quem acha que “bandido bom é bandido morto”, banaliza o uso de câmeras escondidas e faz apologia cotidiana da violência, realmente, trata-se de uma grande ameaça.

Além dos discursos de conveniência adotados pela imprensa, vale também levantar o questionamento sobre os discursos do governo. Imaginemos a mesma fala de Aloizio Mercadante na boca do ministro das Comunicações Paulo Bernardo: “Não vai ter jeitinho, não tem colher de chá, e se o plano de melhorias não for muito bem elaborado não há a menor possibilidade de renovação da concessão”. Ou da ministra Helena Chagas, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência: “Não vai ter jeitinho, não tem colher de chá, e se o plano de melhorias não for muito bem elaborado não há a menor possibilidade de anúncios do Banco do Brasil, Caixa, Petrobras…”.

O que garante a tranquilidade dos radiodifusores é o fato de terem a certeza de que não serão tocados em seus privilégios. Além da fala presidencial de que o “único tipo de controle à mídia é o controle remoto”, as emissoras de rádio e TV ainda fazem questão de desconsiderarem que são concessionárias de serviço público. Mas nem precisariam, já que o artigo 41 da Lei nº 8.987/1995 – a chamada Lei de Concessões –, o primeiro das disposições transitórias, diz:

“O disposto nesta Lei não se aplica à concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens”.

Por que não?! Abro um parênteses aqui para dar a dica que valeria um bom estudo a respeito do lobby em torno desta lei sancionada por Fernando Henrique Cardoso.

A histórica inércia do MiniCom pode ser destacada com alguns casos recentes: a) a reforma na regulamentação sobre os conteúdos de TV por assinatura partiu da Ancine; b) os debates sobre o sistema público/estatal de TV foram provocados pelo Ministério da Cultura; c) o Programa Nacional de Banda Larga nasceu na Casa Civil; d) a classificação indicativa é proposta do Ministério da Justiça; e) a regulamentação da publicidade vem da Anvisa e do Ministério da Saúde; f) a Conferência Nacional de Comunicação só saiu do papel porque o então presidente Lula mandou, e isso aos 44 minutos do segundo tempo.

Já passou da hora de o Executivo e o Legislativo brasileiros deixarem de ser omissos em relação aos temas da comunicação. Há de chegar o tempo em que – a exemplo do que acontece nos Estados Unidos, Inglaterra, Canadá, França, Alemanha e outros países democráticos – a imprensa brasileira irá noticiar que empresas de mídia foram reprovadas em forma e/ou conteúdo; e seus dirigentes darão entrevistas para falar das mudanças que farão em prol do interesse público.

A Educação tem mesmo muito a ensinar.

Edgard Rebouças é jornalista, mestre e doutor em Comunicação na área de políticas de comunicações, professor na Universidade Federal do Espírito Santo e coordenador do Observatório da Mídia: direitos humanos, políticas e sistemas (www.ufes.br/observatoriodamidia)

Por que o governo deve apoiar a mídia alternativa

Em audiência pública na Comissão de Ciência & Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados, realizada em 12 de dezembro último, o presidente da Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação (Altercom), Renato Rovai, defendeu que 30% das verbas publicitárias do governo federal sejam destinadas às pequenas empresas de mídia.

Dirigentes da Altercom também estiveram em audiência com a ministra da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom-PR), Helena Chagas, para tratar da questão da publicidade governamental.

Eles argumentam que o investimento publicitário em veículos de pequenas empresas aquece toda a cadeia produtiva do setor. Quem contrata a pequena empresa de assessoria de imprensa, a pequena agência publicitária, a pequena produtora de vídeo, são os veículos que não estão vinculados aos oligopólios de mídia.

Além disso, ao reivindicar que 30% das verbas publicitárias sejam dirigidas às pequenas empresas de mídia, a Altercom lembra que o tratamento diferenciado já existe para outras atividades, inclusive está previsto na própria lei de licitações (Lei nº 8.666/1993).

Dois exemplos:

1.Na compra de alimentos para a merenda escolar, desde a Lei nº 11.947/2009, no mínimo 30% do valor destinado por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar, do Fundo de Desenvolvimento da Educação, do Ministério da Educação, gestor dessa política, deve ser utilizado na aquisição “de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas”.

2. No Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), destinado ao desenvolvimento da atividade audiovisual, criado pela Lei nº 11.437/2006 e regulamentado pelo Decreto nº 6.299/2007, a distribuição de recursos prevê cota de participação para as regiões onde o setor é mais frágil. Do total de recursos do FSA, 30% precisam ser destinados ao Norte, Nordeste e Centro Oeste. Vale dizer, não se podem destinar todos os recursos apenas aos estados que já estão mais bem estruturados (ver aqui, acesso em 11/1/2013).

A regionalização das verbas oficiais

A reivindicação da Altercom é consequência da aparente alteração do comportamento da Secom-PR em relação à chamada mídia alternativa.

A regionalização constitui diretriz de comunicação da Secom-PR, instituída pelo Decreto n° 4.799/2003 e reiterada pelo Decreto n° 6.555/ 2008, conforme seu art. 2°, X:

“Art. 2º – No desenvolvimento e na execução das ações de comunicação previstas neste Decreto, serão observadas as seguintes diretrizes, de acordo com as características da ação:

“X – Valorização de estratégias de comunicação regionalizada.”

Dentre outros, a regionalização tem como objetivos “diversificar e desconcentrar os investimentos em mídia”.

De fato, seguindo essa orientação a Secom-PRtem ampliado continuamente o número de veículos e de municípios aptos a serem incluídos nos seus planos de mídia. Os quadros abaixo mostram essa evolução.

(Fonte: Núcleo de Mídia da Secom, acesso em 11/1/2013)

Trata-se certamente de uma importante reorientação histórica na alocação dos recursos publicitários oficiais, de vez que o número de municípios potencialmente cobertos pulou de 182, em 2003, para 3.450, em 2011, e o número de veículos de comunicação que podem ser programados subiu de 499 para 8.519, no mesmo período.

Duas observações, todavia, precisam ser feitas.

Primeiro, há de se lembrar que “estar cadastrado” não é a mesma coisa que “ser programado”. Em apresentação que fez na Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), São Paulo, em 16 de julho de 2009, o ex-secretário executivo da Secom-PR Ottoni Fernandes Júnior, recentemente falecido, citou como exemplo de regionalização campanha publicitária em que chegaram a ser programados 1.220 jornais e 2.593 emissoras de rádio – 64% e 92%, respectivamente, dos veículos cadastrados.

Segundo e, mais importante, levantamento realizado pelo jornal Folha de S.Paulo, a partir de dados da própria Secom-PR, publicado em setembro de 2012, revela que nos primeiros 18 meses de governo Dilma Rousseff (entre janeiro de 2011 e julho de 2012), apesar da distribuição dos investimentos de mídia ter sido feita para mais de 3.000 veículos, 70% do total dos recursos foram destinados a apenas dez grupos empresariais (ver “Globo concentra verba publicitária federal”, CartaCapital, 13/9/2012, acesso em 12/1/2013).

Vale dizer, o aumento no número de veículos programados não corresponde, pelo menos neste período, a uma real descentralização dos recursos. Ao contrário, os investimentos oficiais fortalecem e consolidam os oligopólios do setor em afronta direta ao parágrafo 5º do artigo 220 da Constituição Federal de 1988, que reza:

“Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de oligopólio ou monopólio”.

Democracia em jogo

A mídia alternativa, por óbvio, não tem condições de competir com a grande mídia se aplicados apenas os chamados “critérios técnicos” de audiência e CPM (custo por mil). A prevalecerem esses critérios, ela estará sufocada financeiramente, no curto prazo.

Trata-se, na verdade, da observância (ou não) dos princípios liberais da pluralidadee da diversidadeimplícitos na Constituição por intermédio do direito universal à liberdade de expressão, condição para a existência de uma opinião pública republicana e democrática.

Se cumpridos esses princípios (muitos ainda não regulamentados), o critério de investimentos publicitários por parte da Secom-PR deve ser “a máxima dispersão da propriedade” (Edwin Baker), isto é, a garantia de que mais vozes sejam ouvidas e participem ativamente do espaço público.

Como diz a Altercom, há justiça em tratar os desiguais de forma desigual e há de se aplicar, nas comunicações, práticas que já vêm sendo adotadas com sucesso em outros setores. Considerada a centralidade social e política da mídia, todavia, o que está em jogo é a própria democracia na qual vivemos.

Não seria essa uma razão suficiente para o governo federal apoiar a mídia alternativa?

Venício A. de Lima é jornalista e sociólogo, pesquisador visitante no Departamento de Ciência Política da UFMG (2012-2013), professor de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor de Política de Comunicações: um Balanço dos Governos Lula (2003-2010), Editora Publisher Brasil, 2012, entre outros livros

As rádios suspeitas de Renan

O filho do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), o deputado federal Renan Filho (PMDB-AL), diz ser sócio de uma rádio que, oficialmente, nos registros do Ministério das Comunicações, nunca o teve como cotista e está em nome de um funcionário do gabinete de seu pai, Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta. Além disso, o parlamentar se apresenta como cotista da Rádio Correio de Alagoas. No entanto, essa emissora não existe no cadastro do ministério, que está atualizado até 14 de janeiro deste ano e cujo conteúdo foi confirmado pela assessoria da pasta. O deputado informou, por meio de sua assessoria, que todas suas emissoras estão registradas em seu Imposto de Renda.

Em 2007, no auge da crise no Senado, quando corria o risco de perder o mandato, o senador Renan Calheiros veio a público negar que utilizasse laranjas para esconder uma suposta sociedade em rádios em Alagoas. Porém, passados cinco anos, a situação continua a mesma: o Sistema Alagoano de Radiodifusão, que aparece na declaração de bens entregue por Renan Filho à Justiça Eleitoral em 2010, está registrado oficialmente em nome de Santa Ritta e de José Carlos Pacheco Paes.

Em 2008, quando concorreu à reeleição à prefeitura de Murici, o filho do senador informou que detinha apenas 40 mil cotas, no valor de R$ 40 mil, do Sistema Costa Dourada de Radiodifusão. Em dois anos, passou a ser sócio, juntamente com o primo do senador, Ildefonso Tito Uchoa, de mais duas rádios com retransmissoras em cidades do interior – além do Sistema Alagoano, no qual possui participação de R$ 25 mil, há também a Rádio Correio de Alagoas Ltda, com R$ 49.709.

Santa Ritta está no Senado desde 2008

O assistente técnico Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta está no Senado desde 22 de outubro de 2008. Santa Ritta, na verdade, voltou ao posto que já ocupava depois de ser derrotado para a prefeitura de Jequiá da Praia (AL). Embora ele apareça como sócio do Sistema Alagoano de Rádio, Santa Ritta não informou à Justiça Eleitoral esse vínculo.

O Sistema de Acompanhamento de Controle Societário informou que Renan Filho e Tito Uchoa são sócios na Costa Dourada nos municípios de Coqueiro Seco, Delmiro Gouveia e Matriz de Camaragibe. Outra retransmissora, em Maragogi, está em nome do ex-secretário de Educação de Maceió Nilton Tadeu Lira Neto (PSD) e de um funcionário da prefeitura de Ibateguara, Francisco Lopes Alves Pinto.

De acordo com o Ministério das Comunicações, Renan Filho e Tito Uchoa pagaram R$ 788.232 pelas concessões. Ainda falta uma parcela, de R$ 110.561, a ser paga em 16 de março deste ano. O ministério informou que não é possível saber o valor da comercialização depois que a concessão foi outorgada.

Em julho de 2011, um site de Maceió noticiou que passaria a transmitir com exclusividade toda a programação da Rádio Correio, de Renan Filho e Tito Uchoa, aquela que não consta nos registros do Ministério das Comunicações. O primo de Renan, classificado como diretor-geral da emissora, adiantava que a potência da rádio iria dobrar e que seria possível ouvi-la não apenas em Alagoas, mas em estados vizinhos. Para o Ministério das Comunicações, a única emissora do grupo que ainda não está no ar fica em Delmiro Gouveia.

Deputado: cotas são anteriores ao mandato

O deputado Renan Filho informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que todas as rádios dele estão declaradas no Imposto de Renda – não disse quais. De acordo com a assessoria, Renan Filho não é fundador das rádios, mas tornou-se sócio delas depois. Ele também não especificou quando. O parlamentar disse que já entrou com um processo no Ministério das Comunicações para regularizar a sociedade, mas o processo não andou. O deputado afirmou, ainda, que comprou as cotas das rádios "muito antes" de ser deputado.

O GLOBO procurou falar com o senador Renan Calheiros, mas sua assessoria disse que não fazia contato com ele havia alguns dias e sugeriu que o jornal tentasse contato por celular, o que não foi possível. Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta, funcionário de Renan que aparece como sócio do Sistema Alagoano, atendeu a um telefonema do GLOBO, mas, ao ser informado do que se tratava, a ligação caiu e não foi possível novo contato.