Aaron Swartz, guerrilheiro da internet livre

O (suposto) suicídio do gênio da programação e ativista Aaron Swartz não é somente uma tragédia, mas um sinal da enorme dimensão do conflito político e ideológico envolvendo defensores de uma Internet livre e emancipatória, de um lado, e grupos organizados dentro do sistema que pretendem privatizar e limitar o acesso à produção intelectual humana, de outro. Neste sábado (12/01), colunistas de cultura digital de diversos jornais escreveram sobre a morte do jovem Swartz, aos 26 anos, encontrado morto em um apartamento de Nova Iorque (ler os textos de John Schwartz, para o New York Times; Glenn Greenwald, para o The Guardian; Virginia Heffernan, para o Yahoo News; e Tatiana Mello Dias, para o Estadão). Diante da turbulenta vida do jovem Swartz e seu projeto político de luta pela socialização do conhecimento, difícil crer que o suicídio tenha motivações estritamente pessoais, como uma crise depressiva. A morte de Swartz pode significar um alarme para uma ameaça inédita ao projeto emancipatório da revolução informacional. O sistema jurídico está sendo moldado por grupos de interesse para limitação da liberdade de cidadãos engajados com a luta de uma Internet livre. Tais cidadãos são projetados midiaticamente como inimigos desestabilizadores da ordem (hackers). Os usuários da Internet, sedados e dominados pela nova indústria cultural, pouco sabem sobre o que, de fato, está acontecendo mundo afora.

A visão pública da Internet do wiz-kid Swartz: os anos de formação

Nascido em novembro de 1986 em Chicago, Aaron Swartz passou a infância e juventude estudando computação e programação por influência de seu pai, proprietário de uma companhia de software. Aos 13 anos de idade, foi vencedor do prêmio ArsDigita, uma competição para websites não-comerciais “úteis, educacionais e colaborativos”. Com a vitória no prêmio, Swartz visitou o Massachusetts Institute of Technology (MIT), onde conheceu pesquisadores da área de Internet. Aos 14 anos, ingressou no grupo de trabalho de elaboração do versão 1.0 do Rich Site Summary (RSS), formato de publicação que permite que o usuário subscreva conteúdos de blogs e páginas (feeds), lendos-o através de computadores e celulares.

Aos 16 anos frequentou e abandonou a Universidade de Stanford, dedicando-se a fundação de novas companhias, como a Infogami. Aos 17 anos, Aaron ingressou na equipe do Creative Commons, participando de importantes debates sobre propriedade intelectual e licenças open-sources (ver a participação de Swartz em um debate de 2003). Em 2006, ingressou na equipe de programadores da Reddit, plataforma aberta que permite que membros votem em histórias e discussões importantes. No mesmo ano, tornou-se colaborador da Wikipedia e realizou pesquisas importantes sobre o modo de funcionamento da plataforma colaborativa (ler ‘Who Writes Wikipedia?‘). Em 2007, fundou a Jottit, ferramenta que permite a criação colaborativa de websites de forma extremamente simplificada (aqui). Em pouco tempo, Swartz tornou-se uma figura conhecida entre os programadores e grupos de financiamento dedicados a start-ups de tecnologia. Entretanto, sua inteligência e o brilhantismo pareciam não servir para empreendimentos capitalistas. Tornar-se rico não era seu objetivo, mas sim desenvolver ferramentas e instrumentos, através da linguagem de programação virtual, para aprofundar a experiência colaborativa e de cooperação da sociedade.

Aos 21 anos, Aaron ingressou em círculos acadêmicos (como o Harvard University’s Center for Ethics) e não-acadêmicos de discussão sobre as transformações sociais e econômicas provocadas pela Internet, tornando-se, aos poucos, uma figura pública e um expert no debate sobre a “sociedade em rede”. O vídeo abaixo, gravado em São Francisco em 2007, mostra o raciocínio rápido e preciso de Swartz sobre a arquitetura do poder na rede e as mudanças fundamentais da transição da mídia antes e depois da Internet.

Ativismo cívico e projetos políticos na rede: para além de empresas e lucros

A partir de 2008, Aaron Swartz – um “sociólogo aplicado“, como ele se autodenominava – engajou-se em uma série de projetos de cunho político, voltados ao ativismo cívico de base (grassroots) e ao compartilhamento de conteúdo on-line. Dentre eles, destacam-se três projetos específicos: (i) Watchdog, (ii) Open Library e (iii) Demand Progress.

O Watchdog é um website que permite a criação de petições públicas que possam circular on-line. Trata-se de um projeto não lucrativo, cujo mote é Win your campaign for change. O objetivo é fomentar a prática cidadã de monitoramento de condutas ilícitas, como se todos fossem “cães de guarda” da democracia. O segundo projeto, Open Library, pretende criar uma página da web para cada livro já publicado no mundo. O objetivo é criar uma espécie de “biblioteca universal” com bibliotecários voluntários, sendo possível o empréstimo on-line de e-books. Trata-se de um projeto sem fins lucrativos, nos quais programadores são responsáveis pelo registro e criação das páginas (em códigos abertos) para todos os livros (como diz o site: “Open Library é um projeto aberto: software, dados e documentações são abertos, e sua contribuição é bem-vinda. Você pode corrigir um erro, acrescentar um livro ou escrever um widget [programa complementar]. Temos uma equipe de programadores fantástico, que avançaram muito, mas não podemos fazer tudo sozinhos!” (1) . O terceiro e mais interessante projeto é o Demand Progress, plataforma criada por Swartz para conquistar mudanças progressistas em políticas públicas (envolvendo liberdades civis, direitos civis e reformas governamentais) para pessoas comuns através do lobbying organizado de base. A atuação do DP se dá de duas formas: através de campanhas on-line para chamar atenção das pessoas e contatar líderes do Congresso, e através do trabalho de advocacia pública em Washington “nas decisões por trás das salas que afetam nossas vidas”.

Em 2008, indignado com a passividade dos cientistas com relação ao controle das informações por grandes corporações, Swartz publicou um manifesto intitulado Guerilla Open Access Manifesto (Manifesto da Guerrilha pelo Acesso Livre). Trata-se de um texto altamente revolucionário, que encerra-se com um chamado: “Não há justiça em seguir leis injustas. É hora de vir à luz e, na grande tradição da desobediência civil, declarar nossa oposição a este roubo privado da cultura pública. Precisamos levar informação, onde quer que ela esteja armazenada, fazer nossas cópias e compartilhá-la com o mundo. Precisamos levar material que está protegido por direitos autorais e adicioná-lo ao arquivo. Precisamos comprar bancos de dados secretos e colocá-los na Web. Precisamos baixar revistas científicas e subi-las para redes de compartilhamento de arquivos. Precisamos lutar pela Guerilla Open Access. Se somarmos muitos de nós, não vamos apenas enviar uma forte mensagem de oposição à privatização do conhecimento – vamos transformar essa privatização em algo do passado” (cf. ‘Aaron Swartz e o manifesto da Guerrila Open Acess‘).

A força criadora do jovem Aaron Swartz residia em um profundo espírito crítico e questionador. Nesta entrevista abaixo (sobre o Progressive Change Campaign), Swartz explica como seu ativismo começou: “Eu sinto fortemente que não é suficiente simplesmente viver no mundo como ele é e fazer o que os adultos disseram o que você deve fazer, ou o que a sociedade diz o que você deve fazer. Eu acredito que você deve sempre estar questionando. Eu levo muito a sério essa atitude científica de que tudo que você aprende é provisório, tudo é aberto ao questionamento e à refutação. O mesmo se aplica à sociedade. Eu cresci e através de um lento processo percebi que o discurso de que nada pode ser mudado e que as coisas são naturalmente como são é falso. Elas não são naturais. As coisas podem ser mudadas. E mais importante: há coisas que são erradas e devem ser mudadas. Depois que eu percebi isso, não havia como voltar atrás. Eu não poderia me enganar e dizer ‘Ok, agora vou trabalhar para uma empresa’. Depois que percebi que havia problemas fundamentais os quais eu poderia enfrentar, eu não podia mais esquecer isso”. Nesta entrevista, Aaron (aos 22 anos), esclarece que livros como Understanding Power (de Noam Chomsky) foram fundamentais para compreender os problemas sistêmicos da sociedade contemporânea. Todavia, a situação não é imodificável. O primeiro passo é acreditar que é possível fazer algo.

A luta e a resposta do sistema: do movimento Anti-SOPA à batalha judicial do JSTOR

No final de 2010, Aaron Swartz identificou uma anomalia procedimental com relação a uma nova lei de copyright, proposta por integrantes dos partidos republicanos e democratas em setembro daquele ano. A lei havia sido introduzida com apoio majoritário, com um lapso de poucas semanas para votação. Obviamente, segundo o olhar crítico de Swartz, havia algo por trás desta lei. O objetivo camuflado era a censura da Internet.

A partir da união de três amigos, Swartz formulou uma petição on-line para chamar a atenção dos usuários da Internet e de grupos políticos dos Estados Unidos. Em dias, a petição ganhou 10 mil assinaturas. Em semanas, mais de 500 mil. Com a circulação da petição, os democratas adiaram a votação do projeto de lei para uma analise mais profunda do documento. Ao mesmo tempo, empresas da Internet como Reddit, Google e Tumblr iniciaram uma campanha maciça para conscientização sobre os efeitos da legislação (a lei autorizaria o “Departamento de Justiça dos Estados Unidos e os detentores de direitos autorais a obter ordens judiciais contra sites que estejam facilitando ou infringindo os direitos de autor ou cometendo outros delitos e estejam fora da jurisdição estadunidense. O procurador-geral dos Estados Unidos poderia também requerer que empresas estadunidenses parem de negociar com estes sites, incluindo pedidos para que mecanismos de busca retirem referências a eles e os domínios destes sites sejam filtrados para que sejam dados como não existentes”, como consta do Wikipedia).

Em outubro de 2011, o projeto foi reapresentado por Lamar Smith com o nome de Stop Online Piracy Act. Em janeiro de 2012, após um intenso debate promovido na rede, a mobilização de base entre ativistas chamou a atenção de diversas organizações, como Facebook, Twitter, Google, Zynga, 9GAG, entre outros. Em 18 de janeiro, a Wikipedia realizou um blecaute na versão anglófona, simulando como seria se o website fosse retirado do ar (cf. ‘Quem apagou as luzes em protesto à SOPA?‘ e ‘O apagão da Wikipedia‘). A reação no Congresso foi imediata e culminou na suspensão do projeto de lei. Vitória do novo ativismo cívico? Para Swartz, sim. Uma vitória inédita que mostrou a força da população e da mobilização possível na Internet. Mas não por muito tempo. Em um discurso feito em maio de 2012 — que merece ser visto com muita atenção –, Aaron foi claro: o projeto de lei para controlar a Internet irá voltar, com outro nome e outro formato, mas irá voltar…

Mas não foi somente através da liderança no movimento de peticionamento on-line que culminou nos protestos contra o SOPA que Swartz chamou a atenção das autoridades estadunidenses. Em 2008, ele foi investigado pelo FBI por ter baixado milhões de documentos públicos do Judiciário mantidos pela empresa Pacer (que cobra pelo acesso a documentos públicos!). A investigação, entretanto, não resultou em processo criminal ou civil.

O processo kafkiano que pode estar relacionado com a morte de Swartz teve início em julho de 2011, quando o ativista foi processado por “fraude eletrônica, fraude de computador, de obtenção ilegal de informações a partir de um computador protegido”, a partir de uma acusação da companhia JSTOR – uma das maiores organizações de compilação e acesso pago a artigos científicos. Aaron programara um dos computadores públicos do Massachussets Institute of Technology (MIT) para acessar o banco de dados da JSTOR e fazer download de artigos científicos de diversas áreas do conhecimento. Em poucos dias, baixou mais de 4 milhões de artigos científicos (e não se sabe qual era seu plano inicial, ou seja, de que modo ele pretendia publicar esses documentos de acordo com a tese do open acess movement). Pelo fato de Swartz ter feito o download de muitos documentos ao mesmo tempo (mas o acesso pelo computador da instituição não permite isso?), foi processado por fraude eletrônica e obtenção ilegal de informações.

O sentido de um processo kafkiano (referente ao Processo da obra literária de Franz Kafka) deve ser melhor explicado. A questão é que Aaron Swartz não cometeu, a princípio, nenhum ato ilícito (ele poderia fazer o download de artigos científicos como qualquer acadêmico logado a uma máquina com acesso ao JSTOR pode). E mesmo depois de acusado, entregou-se à Justiça e afirmou que não tinha intenção de lucrar com o ato. Diante do aviso de que a distribuição dos arquivos infringiria leis nacionais, Aaron devolveu os arquivos digitalizados para a JSTOR, que retirou a ação judicial de caráter civil. Ou seja: caso encerrado, correto?

Errado. Após o acordo entre Aaron e a JSTOR, a Promotoria de Justiça de Boston, através da US Attorney Carmen Ortiz, indiciou Aaron Swartz por diversas ofensas criminais, pedindo a condenação do ativista em 35 anos de prisão (sic!) e o pagamento de 1 bilhão de dólares de multa. O processo penal teve início, sendo oferecida a Swartz a oportunidade de fazer um acordo penal que reconhecesse sua culpa (plead guilty). Irredutivelmente — mesmo sendo aconselhado por alguns advogados a agir em sentido contrário –, Swartz recusou-se a declarar-se culpado, por não considerar seus atos como ilícitos. Mesmo com a intervenção da JSTOR, que reconheceu não se sentir prejudicada pelos atos de Swartz, a Promotoria continuou a amedrontá-lo. O processo penal — extremamente custoso nos Estados Unidos — esvaziou suas poucas reservas financeiras e gerou um enorme trauma psicológico. O julgamento da ação penal estava marcado para abril de 2013 e Aaron Swartz recusava-se a comentar o assunto em entrevistas, palestras e eventos. Alguns especulam que o suicídio está ligado com o processo penal, considerado por muitos como uma resposta do governo dos Estados Unidos contra o ativismo libertário de Aaron. Na opinião de Greenwald, o colunista do Guardian, ele “foi destruído por um sistema de ‘justiça’ que dá proteção integral aos criminosos mais ilustres — desde que sejam integrantes dos grupos mais poderosos do país, ou úteis para estes –, mas que pune sem piedade e com dureza incomparável que não tem poder e, em especial, quem desafia o poder”. (2)

Até o momento, não há cartas ou posts de Swartz sobre o assunto. Não há, aliás, confirmação concreta de que houve suicídio (ou se foi uma morte herzogiana, comum na história brasileira). Trata-se de um grande mistério. Para a família de Swartz, uma coisa é clara: se houve suicídio, o bullying judicial realizado pelo Judiciário estadunidense foi um fator que levou o jovem ativista a encerrar a própria vida, em um sinal de protesto contra todo o injusto sistema.

As lições de um jovem revolucionário

Há muito o que extrair das falas, dos textos e das ações do gênio da informática Aaron Swartz. Ativista político, sociólogo aplicado, defensor da Internet livre, criador de mecanismos de compartilhamento de dados e crítico da forma como a sociedade global está se estruturando contra as liberdades básicas, Swartz deixa aos jovens da era da Internet um forte recado revolucionário: a mudança começa em cada um. Todo indivíduo possui autonomia para pensar e contestar o que está posto. Além de contestar, a ação colaborativa pode modificar as instituições existentes em uma perspectiva pós-capitalista. O conhecimento pode ser compartilhado, softwares podem ser desenvolvidos em conjunto e projetos podem ser executados com o financiamento coletivo.

Informação é poder. Swartz enxergou muito além do que seus contemporâneos e tentou mobilizar os usuários de Internet para construção de um outro mundo. Infelizmente, não foi apoiado da forma como precisava. A reverberação de suas ideias e suas ações ainda é muito fraca. Mas isso não é motivo para desistência. A brevíssima vida deste jovem estadunidense pode inspirar corações e mentes. Em tempos de discussão no Brasil sobre o Marco Civil da Internet, corrupção da política e agigantamento do Judicário, o resgate a seu pensamento é necessário. Ainda mais em um país que conta com mais de 80 milhões de usuários de Internet. A questão é saber se as pessoas terão curiosidade e interesse em compreender o projeto de vida de Swartz ou se irão continuar lendo matérias produzidas por corporações interessadas na limitação da liberdade na Internet.

Eu fico com o projeto de Swartz. Aliás, fique livre para copiar esse texto.

Rafael A. F. Zanatta, mestrando em sociologia jurídica (FD/USP), pesquisador (Direito GV), professor universitário e advogado. Editor do blog E-mancipação.

(1) Open Library is an open project: the software is open, the data are open, the documentation is open, and we welcome your contribution. Whether you fix a typo, add a book, or write a widget–it’s all welcome. We have a small team of fantastic programmers who have accomplished a lot, but we can’t do it alone!”

(2) “Swartz was destroyed by a “justice” system that fully protects the most egregious criminals as long as they are members of or useful to the nation’s most powerful factions, but punishes with incomparable mercilessness and harshness those who lack power and, most of all, those who challenge power“

Bernardo confirma para o início de fevereiro decisão sobre destinação da faixa de 700 MHz

Até o início de fevereiro, o governo deve bater o martelo sobre a destinação da faixa de 700 MHz para a banda larga móvel, antecipando o dividendo digital da TV brasileira. Depois disso, a Anatel elaborará a proposta, que será colocada em consulta pública e o edital de licitação sairá já no segundo semestre deste ano. O cronograma foi confirmado nesta sexta-feira (25) pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, após receber o estudo sobre a ocupação da faixa do presidente da Anatel, João Rezende. A decisão, segundo ele, dependerá de uma conversa com a presidente da República, Dilma Rousseff.

O ministro disse que o modelo de canalização a ser adotado é igual ao asiático, que permite a atuação de até cinco competidores, em quatro blocos de 10+10 e um de 5+5, atendendo a cinco operadoras.   “A área técnica da Anatel acha que esse modelo se coaduna mais com a nossa realidade, que eu também concordo”, disse Bernardo.
 
Na opinião do ministro, o modelo adotado pelos EUA é muito diferente e enfrenta dificuldades. “Lá quatro empresas oferecem o serviço em LTE, mas não há conexão entre os assinantes de empresas diferentes”, disse. “A regra é essa, não tem obrigação de possibilitar a comunicação entre usuários de empresas diferentes”, assinalou.

Bernardo confirma que a decisão sobre a destinação depende também de a elaboração de um plano para migração dos canais para outra faixa em mais de 400 cidades. “Na verdade, o prazo é até 2016, quando será desligado o sinal analógico da TV, mas queremos ver se podemos antecipar”, afirmou. Ele informou que desde o ano passado o ministério não está mais autorizando a instalação de canais de TV na faixa.

Banda larga: Anatel nega pedido do NIC.br e mantém modelo de medição

A PriceWaterhouseCoopers, em parceria com a inglesa SamKnows, vencedora da licitação realizada pelas teles para ser a entidade aferidora da qualidade da Internet, seguirá como responsável pelo processo de medição da qualidade da banda larga no Brasil.

A Anatel, com relatoria do conselheiro, Marcelo Bechara, até aceitou a análise do pedido de revisão feito, em abril, pelo NIC.br, órgão sem fins lucrativos, que contestava o processo de seleção, mas descartou a existência de irregularidades. Mas negou a possibilidade de mudar o modelo.

De acordo com o conselheiro Marcelo Bechara, na reunião semanal do Conselho Diretor da Anatel, realizada nesta quinta-feira, 24/01, as teles realizaram a contratação por meio de RFP – termo de referência para contratação de fornecedor, com as regras publicadas e respondidas aos interessados.

Bechara admitiu que o NIC.br contestou as informações considerando-as 'furtivas e inconclusivas", mas alegou que a área técnica da agência e a própria Procuradoria do órgão regulador consideraram as respostas dadas como corretas para o processo. "A importância do NIC.br nos fez acatar o pedido de revisão, mas julgamos improcedente o pedido", concluiu Bechara. A decisão de manter o modelo e a fornecedora selecionada pelas teles foi aprovada por unanimidade pelos demais conselheiros.

Em novembro do ano passado, a medição da velocidade – as teles têm de entregar, em média, 60% da que foi contratada pelo consumidor – começou a ser feita em em 11 estados, entre eles, Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal. As medições avaliarão as prestadoras do Serviço de Comunicação Multimídia com mais de 50 mil acessos: Oi, NET, Telefônica/Vivo, GVT, Algar (CTBC), Embratel, Sercomtel e Cabo Telecom. Passados dois meses e meio, até o momento, nenhum relatório foi divulgado pela agência.

Para entender o processo de medição: na contratação de um plano de 10Mbps, a média mensal de velocidade deve ser de, no mínimo, 6Mbps. A velocidade instantânea – aquela aferida pontualmente em uma medição – deve ser de, no mínimo, 20% do contratado, ou seja, 2Mbps. Com isso, caso a prestadora entregue apenas 20% da velocidade contratada por vários dias, terá de, no restante do mês, entregar uma velocidade alta ao usuário para atingir a meta mensal de 60%.Esses percentuais valem até novembro, quando serão ampliados.

Além da medição nos consumidores, a Anatel manteve também a aferição nos PTTs( pontos de troca de tráfego). Eles já estão sendo feitas – apesar do protesto das teles – com equipamentos de medição de redes sendo instalados nos 20 PTTs existentes no Brasil – todos eles administrados pelo CGI.br: Americana-SP, Belém-PA, Belo Horizonte-MG, Brasília-DF, Campina Grande-PB, Campinas-SP, Caxias do Sul-RS, Curitiba-PR, Florianópolis-SC, Fortaleza-CE, Goiânia-GO, Londrina-PR, Natal-RN, Porto Alegre-RS, Recife-PE, Rio de Janeiro-RJ, Salvador-BA, São Paulo-SP, São José dos Campos-SP, e Vitória-ES.

Histórico

O Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) fez sérias críticas à interpretação dada pelo Grupo de Implantação de Processos de Aferição de Qualidade (Gipaq) – responsável pelo processo de medição da banda larga – formado por representantes das principais operadoras e da Anatel, sobre até onde será feita a medição. Da forma como foi colocada no processo de seleção da aferidora, sustentava o órgão, a medição se dará dentro do sistema autônomo das prestadoras, o que permitiria às fiscalizadas interferir no resultado.

O NIC.Br também questionou o software que está sendo utilizado para aferir os parâmetros de qualidade -o Speedtest (www.speedtest.net). Sozinho, alega a entidade, ele não atende o que está previsto na regulamentação da agência. Embora informe as velocidades de download e upload, além da latência bidirecional, é preciso rodar outro programa para que sejam medidos elementos como jitter e a taxa de perda de pacotes.

Telefonia celular é o maior alvo de queixas nos Procons do país

Os brasileiros fizeram 169 mil reclamações por mês nos órgãos de defesa do consumidor no ano passado. Destas, segundo os dados divulgados ontem pelo Ministério da Justiça, a maior parte era relativa à telefonia celular: foram 9,17% dos 2,03 milhões de atendimentos realizados pelos 236 Procons ligados ao Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec). Em seguida, informou a secretária Nacional do Consumidor, Juliana Pereira, vieram queixas sobre bancos comerciais (9,02%), cartão de crédito (8,23%), telefonia fixa (6,68%) e financeiras (5,17%).

O número de atendimentos nos Procons cresceu 19,7% em relação a 2011. As queixas diziam respeito, sobretudo, a cobranças indevidas, oferta de bens e serviços, contratos e má qualidade dos produtos. Entre as empresas, a operadora de telefonia Oi respondeu pelo maior número de reclamações, com 120.374 demandas. Em seguida, estão Claro/Embratel (102.682), Itaú (97.578), Bradesco (61.257) e Vivo/Telefônica (44.022).

Na análise por setores, o que teve mais registros foi o financeiro (banco comercial, cartão de crédito, financeira e cartão de loja), com 23,85%. O segmento de telecomunicações (telefonia celular e fixa, TV por assinatura e internet) passou de 17,46% dos registros em 2011 para 21,7% no ano passado. O de produtos (como aparelho celular, móveis e eletrodomésticos) respondeu por 16,2% das queixas.

Juliana destacou que, juntos, esses três setores foram responsáveis por 61,7% da agenda dos Procons ao longo de 2012 e, portanto, serão prioridade na formulação de políticas públicas da secretaria ao longo deste ano. Ela afirmou, ainda, que encaminhará os dados ao Banco Central (BC) e à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), para que sejam estudadas medidas a serem tomadas em parceria com estes.

– Entendemos que respeitar o consumidor não é só uma obrigação do sistema de defesa do consumidor, mas de todos, até porque a proteção do consumidor é um direito constitucional.

A secretária atribuiu o aumento no número de reclamações não apenas ao fato de os brasileiros procurarem mais seus direitos, mas à ampliação da base da pesquisa: o número de Procons que integram o Sindec passou de 162 para 236.

"Enquanto não doer no bolso, atenderão mal"

Maria Inês Dolcci, coordenadora institucional da Proteste, diz que falta mais pressão para que as empresas mudem seu comportamento:

– Enquanto não doer no bolso, as empresas vão continuar atendendo mal.

A Oi informou que prevê investimentos de R$ 24 bilhões de 2012 a 2015, com foco na qualidade de serviços. A Claro/Embratel disse estar "atendendo no prazo praticamente a totalidade das demandas" apresentadas aos Procons. A Vivo/Telefônica disse ter "o melhor índice de acordos em atendimentos às demandas". A TIM destacou que, em 2012, foi a operadora de celular "menos demandada nos Procons".

A Sky informou estar adotando medidas para reduzir as reclamações. A Via Varejo, controladora de Ponto Frio e Casas Bahia, disse investir "constantemente na qualidade de atendimento". A Ricardo Eletro informou que em 2012, frente ao ano anterior, reduziu em 19% o volume de reclamações.

O Itaú disse que o índice de solução de reclamações é de 85%, "o melhor de todo o setor bancário". Já o Bradesco informou que reduzir os índices de reclamação é seu foco permanente. O Santander não retornou o contato.

Portugal: ‘Corremos o risco de não ter jornais impressos dentro de alguns meses’, avisa presidente d

Portugal corre o risco de perder jornais impressos nos próximos meses devido a problemas sérios no sector gráfico, alertou o presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) nesta quinta-feira.

“Corremos o risco de não ter jornais impressos tradicionais – jornais em papel – dentro de alguns meses em Portugal. Há problema sérios com o sector gráfico, com as gráficas que produzem jornais e revistas”, comentou Carlos Magno à margem da conferência “Motores de Busca – o seu a seu dono”, organizada pela Confederação Portuguesa dos Meios de Comunicação Social, em Lisboa.

“Estamos num momento de grande revolução tecnológica, de grandes migrações [para as plataformas digitais] e transformações”, afirmou o presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, acrescentando a preocupação do regulador com os “sérios riscos” que a imprensa portuguesa corre actualmente.

Tendo em conta que a conferência se debruça sobre o aproveitamento dos conteúdos – jornalísticos, incluídos – pelos motores de busca, Magno defendeu que “o jornalismo tem que ser protegido, porque custa dinheiro a produzir". "É uma indústria extractiva e transformadora: transforma os factos em notícias e as notícias em actualidade. Esse trabalho de selecção, de síntese e de pesquisa é um trabalho que tem que ser remunerado", defendeu.

“Não se pode desperdiçar esse capital. Se alguém pirateia [conteúdos jornalísticos], a médio prazo é a qualidade do jornalismo na Net que está em causa”, acrescentou ainda o presidente da ERC.

“É importante perceber que todos estes movimentos [digitais e tradicionais] se interligam”, considera Carlos Magno. “Estamos a falar de pirataria na Internet, mas estamos também a falar de um futuro de uma indústria – da imprensa – que é preciso salvaguardar.” Por enquanto a ERC limitou-se a dar o seu apoio à discussão, mas o presidente promete fazer um pouco mais.

Magno diz que o debate no regulador terá que ser feito tendo em conta a actual situação da indústria das notícias, mas também a questão da “protecção da língua portuguesa”, que tem que ser olhada no âmbito de um mercado alargado. O presidente da ERC deixou mesmo no ar que estará a haver uma guerra à língua portuguesa, instigada por línguas estrangeiras, que cobiçam o vasto mercado luso.