Gilmar Mendes se pronuncia sobre pedido da Abert menos de 48 horas após receber manifestação

Requerimentos de amicus curiae da Artigo 19 para ADPF 246 e do FNDC para a ADPF 379 ficaram mais de um ano na gaveta do ministro do STF e só foram analisados agora na carona do pedido dos empresários

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes aceitou três pedidos de amicus curiae protocolados na Corte para a Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 246), de dezembro de 2011, que tramita junto com a APDF 379, de dezembro de 2015. As arguições ajuizadas no STF têm Mendes como relator e estão fundamentadas sobre o fato de que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que políticos com mandato eletivo sejam beneficiados com a outorga de concessões de emissoras de rádio e de televisão. Ambas as arguições contam com parecer favorável da Procuradoria-Geral da República.

As entidades que apresentaram os amicus curiae foram a organização não-governamental Artigo 19 e o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), que protocolaram, a primeira entidade em 2012 e a segunda em julho do ano passado, além da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) que havia protocolado o pedido no último dia 20 de junho. Ou seja, o mesmo ministro que permanecia em silêncio há cinco anos sobre os pedidos da sociedade civil levou apenas dois dias para se manifestar após ser demandado por representantes dos empresários – Mendes se pronunciou no dia 22. Um indicativo forte de que o ministro Gilmar Mendes se pauta pelos interesses de um segmento social em especial, e não pelos da coletividade.

Os amicus curiae permitirão que as entidades sejam ouvidas no processo que tenta barrar a posse de veículos de comunicação por políticos. Nas duas arguições, ambas protocoladas pelo PSOL, é sustentado que as concessões, permissões e autorizações de radiodifusão controladas por políticos violam a liberdade de expressão, o direito à informação, a divisão entre os sistemas estatal, público e privado de radiodifusão, o direito à realização de eleições livres, a soberania popular, o pluralismo político, o princípio da isonomia, o direito à cidadania, o direito de fiscalizar e controlar o exercício do poder estatal e a própria democracia. Resumindo, violam preceitos fundamentais da Constituição Federal de 1988.

Para manter a independência e autonomia e cumprir seu papel na democracia, diz o PSOL, os órgãos de imprensa não podem ter entre seus associados ou controladores pessoas que exercem o poder estatal. Afinal, conforme o partido, “se a função da imprensa é fiscalizar os que exercem os poderes estatais, então estes não podem ser controladores dos veículos da imprensa – não pode a imprensa ser controlada por quem ela deve controlar”. Ainda de acordo com o partido, “a importância da imprensa para a democracia é tal que não pode haver conflito de interesses real nem potencial no interior de seus órgãos”.

AGU saiu em defesa dos políticos

O governo federal, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), havia ingressado com a ADPF 429 no STF em novembro de 2016 para tentar barrar os processos judiciais contra políticos, numa tentativa de favorecer um grupo de parlamentares. Nesta ADPF, constava um pedido de liminar no qual a Presidência da República solicitava aos ministros que suspendessem e julgassem inconstitucionais decisões judiciais que contrariavam os interesses dos deputados e senadores que detinham concessões públicas de rádio e TV, com o falso argumento de que tais decisões judiciais faziam “interpretações equivocadas da Constituição”.

A medida de Temer pretendia conter uma série de vitórias que as entidades dedicadas à democratização da comunicação estão obtendo nos estados, como, por exemplo, a decisão por meio de liminar que determinou a interrupção de operação de concessões concedidas às famílias de Jader Barbalho e de Aécio Neves, entre outros.

Apesar de não entrar com amicus curiae nessa ADPF, a solicitação da Abert requer do STF a interrupção de ações sobre o tema em instâncias inferiores, até que a Corte analise o mérito. “Há insegurança jurídica. Já foram cinco decisões para tirar rádios do ar”, disse Cristiano Flores, da Abert, à coluna da jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, demonstrando a posição da entidade.

Procuradoria da República apóia ADPFs

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em manifestação expressada em agosto de 2016, apoiou a iniciativa das ADPFs 246 e 379, considerando que a participação de parlamentares em empresas de radiodifusão “confere a políticos poder de influência indevida sobre importantes funções da imprensa, relativas à divulgação de informações ao eleitorado e à fiscalização de atos do poder público”.

De acordo com levantamento do Intervozes, 40 parlamentares, sendo 32 deputados federais e oito senadores, são donos de concessões de emissoras de rádio e TV no país e podem ser beneficiados pela iniciativa de Temer. Entre eles, estão os senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Agripino Maia (DEM-RN), Fernando Collor (PTC-AL) e Jader Barbalho (PMDB-PA) e os ministros José Sarney Filho (Meio Ambiente) e Ricardo Barros (Saúde) – os dois últimos são deputados federais licenciados. Alguns parlamentares alegam que não têm mais participações em empresas de radiodifusão, porém continuam aparecendo nos quadros societários das respectivas empresas.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

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