Nordeste debate a regionalização de conteúdo na comunicação pública

Qual a emissora que se dispõe a ouvir o que está sendo exibido em sua programação? A pergunta partiu da ouvidora da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Regina Lima, integrante da mesa de discussão, na audiência pública sobre Rede Pública de TV: programação e modelos de parceria entre a EBC e os veículos locais e regionais, realizada pelo Conselho Curador da EBC, no Recife, na última quarta (25).
 
Na primeira audiência pública da EBC fora do eixo Rio-São Paulo-Brasília ganharam foco questões como regionalização da produção, políticas de rede, maior espaço para a produção independente e para co-produções com emissoras públicas dos diversos estados. O debate que tomou lugar na Assembléia Legislativa de Pernambuco (ALEPE), teve duração de quatro horas e abriu 30 inscrições – feitas com antecedência pela Internet e presencialmente, com o objetivo de colher contribuições para apreciação da EBC.
 
Para o professor Cláudio Márcio, representante da Associação Brasileira de Televisão Universitária – ABTU, é importante que o conselho preste atenção ao papel do operador de rede. “Não queremos mais o ‘pacotaço’. Temos condições de contribuir e fazer o compartilhamento de conteúdos com TVs educativas, comunitárias, legislativas, através de parcerias nas várias regiões do país”, afirmou o professor. O modelo ‘cabeça-de-rede’, ainda adotado pela EBC, concentrada no eixo Rio-São Paulo–Brasília, também foi bastante discutido nas inscrições feitas pelos participantes, entre eles os integrantes do Fórum Pernambucano de Comunicação (Fopecom).
 
Patrick Torquato, representante da Associação de Rádios Públicas do Brasil – Arpub,  estendeu o foco da discussão para os programas de rádio. Segundo Torquato, faltaria às emissoras representatividade. “A EBC tem uma TV e oito emissoras de rádio, mas sentimos a falta de discussão nessa área. Essas rádios não são representativas, não representam a diversidade da sociedade com seus sotaques brasileiros”, disse
 
Mais programação local para o público infanto-juvenil que atente para a não reprodução de estereótipos de gênero, entre outros, estiveram entre as ponderações de Rosa Sampaio e Rosely Arantes da ONG Auçuba, organização que trabalha com criança e adolescente, ligada à rede Andi. Diversidade da cobertura esportiva com a transmissão de jogos dos campeonatos brasileiros das séries C e D, além da transmissão de esporte amador, não focado apenas no futebol, foi uma das sugestões do comunicador da rádio Alto Falante, Tarcísio Camêlo, também integrante do Fórum Pernambucano de Comunicação (Fopecom).
 
Nelson Breve, presidente da EBC, afirmou reconhecer muitas das deficiências pontuadas pelos participantes, principalmente em relação ao modelo de transmissão da TV. E, ressaltou que havia muito a ser feito, pois a empresa estaria “começando a dar seus passos para consolidar-se em alguns anos”.
 
Para o presidente da estatal, o principal entrave seria a falta de recursos, ou seja, orçamento. Segundo Breve, os recursos oriundos da arrecadação do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), que deveriam ser destinados à comunicação pública e poderiam ampliar a capacidade de atuação da EBC, estariam travados. “Pela legislação, deveríamos estar recebendo recursos do Fistel, mas as empresas de telecomunicações que são obrigadas a pagar conseguiram uma liminar na justiça e têm depositado esse recurso em juízo. Para que chegue até nós é preciso que este montante seja desbloqueado”, explicou.
 
Contudo, Breve afirmou estarem previstos diálogo com Ancine sobre linhas de financiamento para a produção independente e a retomada de parcerias com Ministério da Cultura em editais a exemplo do FIC TV e DOC TV, entre outras iniciativas. Também informou ter sido construído um planejamento estratégico para um horizonte de 10 anos da empresa. Segundo o presidente da EBC, o documento recebeu contribuições do conselho curador e administrativo. “A idéia é que este planejamento possa ser debatido em um fórum de discussão ou quem sabe, em uma nova audiência”, garantiu,
 
EPC e a rede EBC
 
A audiência pública contou com a participação de quatro membros do conselho curador: Ana Veloso (Fopecom/Intervozes), Maria da Penha (Associação de Parentes e Amigos Vítimas de Violência – Apavv), Guilherme Strozi (representante dos funcionários da EBC) e João Jorge Rodrigues (Olodum). Rodrigues coordenou os trabalhos da mesa, que contou a participação do deputado Luciano Siqueira (PC do B), representando a casa parlamentar, o secretário estadual de Ciência e Tecnologia Marcelino Granja, além de integrantes da diretoria da EBC. Participou do encontro ainda, a deputada federal Luciana Santos (PC do B), ex-secretaria estadual de Ciência e Tecnologia e integrante da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com participação popular (FrenteCom).
 
Por ser a primeira audiência a ser realizada pela EBC no Nordeste, a expectativa entre os diversos ativistas do movimento de comunicação se deu também, pelo anúncio a ser feito na data do evento, sobre a criação da Empresa Pernambuco de Comunicação (EPC).
 
O secretário estadual de Ciência e Tecnologia de Pernambuco Marcelino Granja informou que o Governo do Estado investirá, até 2013, R$ 25 milhões, para a consolidação da EPC. Os recursos, saudados por representantes dos movimentos sociais, segundo Granja, seriam destinados a contratação de profissionais, composição do conselho –  composto por representantes da sociedade civil e governo, mais a diretoria da empresa, além de recuperação da estrutura física e digitalização das torres de transmissão. No entanto, o secretário de governo não definiu prazos e datas para a criação formal da emissora de caráter público, não informando também qual a dotação orçamentária específica para a empresa.
 
“A criação da EPC é muito importante para o nosso estado e também para toda uma possível rede nacional de emissoras públicas que está em formação e precisa de unidade nesse momento. Este processo já dura mais de dois anos e já poderia ter sido concluído”, afirmou Ivan Moraes Filho, integrante do Centro de Cultura Luiz Freire e do Fopecom.
 
Em 2010, o governador Eduardo Campos acolheu uma das resoluções da Conferência de Comunicação, a proposta de reformulação da TV PE. Em março do mesmo ano, um Grupo de Trabalho (GT) composto por integrantes da sociedade civil pernambucana passou a debater e a construir coletivamente proposições que serviram de base para a elaboração do projeto de criação da EPC, aprovado na assembléia em 2011 (Lei nº 14.404, de 22 de setembro de 2011).
 
O presidente da EBC, Nelson Breve e a ouvidora da empresa nacional, Regina Lima, também se manifestaram sobre a iniciativa local. “Se as coisas demoram, não significa que não estejamos caminhando. A construção dessa rede levará tempo, mas precisamos perseverar”, disse Breve. Para Regina, mais que os recursos, a institucionalização deverá fortalecer a comunicação pública pernambucana. “Seja com um, dois, cinco milhões. A oficialização da EPC é o que mais importa nesse momento”.

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