Confecom pauta simpósio do ObservaNordeste

“Mídia, política e democracia” foi o tema do XI Simpósio ObservaNordeste realizado no Recife nos últimos dias 25, 26 e 27, pela Fundação Joaquim Nabuco, em parceria com os sindicatos dos Jornalistas, dos Radialistas e dos Publicitários de Pernambuco. O evento, apesar da importância do tema, teve um público pequeno durante os três dias em que se discutiu as relações midiáticas com o poder, bem como seus reflexos para a democracia.

O Observatório Social do Nordeste (ObservaNordeste) é um fórum permanente de acompanhamento, reflexão e debates sobre a realidade social da região nordeste. Apesar de estar voltado para uma região do país, segundo os organizadores, o observatório não tem seus debates comprometidos por uma distorção “regionalista” ou estreita. Para tanto, as edições dos simpósios contam também com participação de professores e pesquisadores de outros lugares do país, a fim de enriquecer o debate mesmo quando presente a questão regional.

O tema desta edição foi escolhido por conta da convocação da 1ª Conferência Nacional de Comunicação. Foram convidados professores, pesquisadores, gestores de veículos de comunicação e militantes da democratização da comunicação.

Estiveram presente, dentre outras personalidades, os professores Venício Lima (UnB), Laurindo Lalo Leal Filho (USP), Michel Zaidan (UFPE) e José Emanuel Evangelista (UFRN), os pesquisadores Sivaldo Pereira (Intervozes/UFBA) e Rubens Figueiredo (Centro de Pesquisa e Análise e de Comunicação – CEPAC), além de gestores de veículos de mídia como Beto Almeida (TeleSul), Indira Amaral (TV Aperipê/SE) e Luiz Lourenço (TVU/PE) e o editor da Revista Fórum, Renato Rovai.

Liberdade de Imprensa x Liberdade de Expressão

A abertura do evento foi feita por Venício Lima com uma conferência que colocou em perspectiva a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa. Segundo o pesquisador, uma das mais problemáticas questões que envolve este tema é justamente a privatização da liberdade de expressão promovida pelos concessionários e proprietários de meios de comunicação. “Os concessionários de radiodifusão aliados aos proprietários da mídia imprensa conseguiram transformar seus interesses privados em ‘liberdade de expressão’ e transformar qualquer questionamento a esta construção como recondutora da censura. Dessa forma eles impediram a existência de um debate público sobre o tema”, afirmou Venício.

Ainda segundo o professor da UnB, sequer as universidades de comunicação têm nos seus currículos disciplinas voltadas para a temática. Assim, pouco debatidos, os conceitos são facilmente assimilados da forma como são passados pela grande imprensa, ou seja, quase como sinônimos.

Publicados há poucos dias, os acórdãos de duas recentes decisões do Supremo Tribunal Federal – uma sobre a derrubada total da Lei de Imprensa e a outra que torna legal o exercício profissional do jornalismo sem ser necessário o diploma de formação superior – trazem, segundo Venício, uma compreensão totalmente distorcida da relação entre liberdade de expressão e liberdade de impressão.

Liberdade de imprensa e liberdade de expressão são duas coisas bem diferentes e que não podem nem devem ser confundidas, por mais que a grande imprensa tente fazer isso cotidianamente. A primeira é concedida a empresas e a segunda refere-se a um direito individual, um direito humano. Para haver de fato uma liberdade de expressão, esta deve ser garantida universalmente aos indivíduos. Já a liberdade de imprensa, na forma como foi estruturada no Brasil, funciona como liberdade de empresa: tem sido usada para defender a visão dos donos dos veículos de mídia e não necessariamente abarca a instituição imprensa.

Contrariando grande parte das teorias, mesmo as teorias liberais do “livre fluxo das idéias”, o Supremo Tribunal Federal colocou nos referidos acórdãos a liberdade de imprensa como sendo superior à liberdade de expressão, o que para Venício Lima representa uma versão equivocada do que significa garantir esses direitos.

Mídia e Poder Político

No dia seguinte, o debate foi dedicado ao tema “Mídia e Poder Político”. Laurindo Lalo Leal Filho, um dos expositores da mesa, lembrou que desde meados da década de 70 a comunicação adquiriu a lógica de mercadoria e essa é a tônica que se tem até hoje. Reforçou ainda que, no Brasil, com a redemocratização e com a ascensão do neoliberalismo, a idéia da censura como algo ligado à ditadura legitimou a retirada do Estado das políticas de comunicação. “Elegeram o mercado como definidor das escolhas para as políticas de comunicação”, denuncia.

A saída, para Lalo, está na discussão de um novo marco regulatório. Estes debates devem ter como exemplo as mudanças nas políticas de comunicação em curso na América Latina, que podem ser total ou parcialmente aplicadas no Brasil. Como exemplo o professor sugere um estudo da chamada “Ley de Medios” da Argentina, que revisa o marco legal dos serviços audiovisuais naquele país, ou a Lei de Responsabilidade Social do Rádio e da TV (Resort) da Venezuela.

Já o editor da Revista Fórum, Renato Rovai, aposta as fichas em mudanças nas políticas relativas às novas tecnologias, incentivando novas mídias. Para o também blogueiro Rovai, a palavra de ordem da Conferência Nacional de Comunicação é “Banda Larga Pública e garantia de acesso à internet ao maior número de pessoas, com neutralidade de rede”.

O blogueiro acredita que a “velha mídia”, que ele diz ser toda aquela ligada a antiga lógica de produção verticalizada e fechada do rádio, da TV e dos jornais e revistas, está fadada ao fracasso. A nova mídia, pautada pela horizontalidade, pelo compartilhamento e pelo livre acesso, será a forma de comunicação do futuro e as leis devem se preocupar com isso.

Rovai deu exemplos de articulações que aconteceram quase que exclusivamente pela internet como o 1º Fórum Social Mundial de Porto Alegre e a revolução indígena de Chiapas no México em 1994, ainda no início da rede. Com números de uma recente pesquisa, Rovai lembrou que a internet é atualmente uma das principais fontes de informação do brasileiro e já é a mais confiável.

Sem discordar na essência com Rovai com relação às novas mídias, Lalo acredita, contudo, que é impossível discutir a era digital sem equalizar o déficit que existe com relação as políticas de radiodifusão, que como bem lembra o professor da USP, é normatizada por uma lei de 1962 que “não legisla mais praticamente nada”.

Experiências e desafios

As demais mesas trataram de experiências de mídia e suas interfaces com as relações de poder. A primeira delas foi dirigida às questões relativas às televisões do campo público, exposta por gestores como Beto Almeida, da TeleSul, Indira Amaral, da TV Aperipê, educativa de Sergipe e Luiz Lourenço, da TV Universitária de Pernambuco e pelo pesquisador Sivaldo Pereira, um dos autores do livro “Sistemas Públicos de Comunicação no Mundo” , lançado pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação no meio do ano.

Ao final, a discussão foi sobre as experiências das etapas estaduais da Conferência Nacional de Comunicação, tentando fazer um panorama das propostas que estarão em Brasília nos próximos dias 14 a 17 de dezembro. A mesa composta pela Federação Nacional dos Jornalistas, Intervozes e Federação Nacional dos Radialistas fez um apanhado sobre as perspectivas e desafios para a Confecom.

Todo o evento foi transmitido ao vivo pela internet e terá uma versão editada disponível para download na página da Fundação Joaquim Nabuco .

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