Emissoras articulam regulamentação no Congresso

No dia 28 de maio, as emissoras do Campo Público de Televisão apresentaram, no encerramente do II Fórum Nacional de TVs Públicas, realizado em Brasília, um conjunto de propostas sintetizado na “Carta de Brasília”. Entre as signatárias estavam a  Associação Brasileira de Emissoras Educativas, Públicas e Culturais (Abepec), Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (Astral), Associações Brasileira de Canais Comunitários (ABCcom) e a Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU).

O pleito principal do setor foi a mudança do Decreto-Lei 236, de 1967, que regulamenta o serviço de televisão educativa. A Carta defende uma reforma na norma para regulamentar a complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal prevista no Artigo 223 da Constituição Federal. Segundo a definição do documento, as emissoras públicas seriam aquelas com controle social efetuado por órgãos colegiados, como conselhos, e pelo respeito aos princípios e objetivos da Lei 11.652, de 2008, que criou a Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Outra característica distintiva destes veículos seria o modelo de financiamento, que se apoiaria em verbas orçamentárias, permitiria a publicidade institucional e o patrocínio mas proibiria a veiculação de anúncios de produtos ou serviços. Na prática, a proposta de regulamentação prevê estender às TVs públicas o modelo da TV Brasil, emissora mantida pela EBC.

Passado o II Fórum, os representantes do Campo Público se mobilizam para tirar a idéia do papel. Nessa terça-feira (16), uma delegação se reuniu com o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), para debater a melhor forma de encaminhar a revisão da legislação do setor.

Ao final do encontro, chegou-se à conclusão de que o melhor caminho seria o envio de um projeto de lei pelo Executivo cuja tramitação seria articulada junto aos líderes partidários para ocorrer em regime de "urgência urgentíssima", o que confere prazo de até 45 dias para votação da matéria na casa. "Agora vamos no governo conversar com o Ministério das Comunicações e com a Secretaria de Comunicação do governo federal (Secom) para avaliar a possibilidade de encaminharmos a mudança desta maneira", conta Marco Antônio Coelho, diretor-executivo da Abepec.

Públicas e estatais

A intenção das associações é que o projeto de lei não regulamente apenas as emissoras públicas mas também as estatais. Estas últimas seriam aquelas que obedeceriam, exclusivamente, os princípios da Constituição Federal constantes no artigo 221 e seriam exploradas por entes estatais (assembléias, governos, Judiciário). "A diferença é o controle da população", explica Coelho. A regulamentação das duas modalidades aconteceria por meio de uma Portaria Ministerial, que fixaria regras referentes a itens como gestão e formas de financiamento.

Na proposta das associações, as televisões educativas em funcionamento hoje seriam forçadas a optar entre a modalidade pública ou estatal. "Seria uma pressão para todo mundo migrar para algum controle social. Se conseguirmos fazer com que todas cheguem ao modelo da EBC seria avanço brutal", afirma o diretor-executivo da Abepec.

Para viabilizar a revisão, as entidades devem procurar o governo federal para tentar convencê-lo sobre a relevância da estratégia. “É fundamental que o Ministério das Comunicações assuma esta pauta, pois ela vai demandar uma grande negociação e se não tiver empenho do governo é bem provável que todo o debate fique para a Conferência”, analisa Coelho.

Migração ao digital

Outra grande pauta expressa na Carta de Brasília é a migração das emissoras do Campo Público ao Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (SBTVD-T). Dentro desse tema, a principal ação será também no Congresso Nacional: a luta pela aprovação do Projeto de Lei 277, de 2007, que assegura espaço para TVs do Campo Público no sinal digital terrestre.

A única alteração proposta pelas associações é a inclusão do canal universitário entre aqueles que seriam contemplados na nova plataforma. “A lei de TV a cabo foi muito importante como espaço para os canais universitários, mas precisamos concretizar a participação no canal digital”, afirma Cláudio Magalhães, presidente da Associação Brasileira das TVs Universitárias (ABTU).

O pleito foi uma forma de contornar a exclusão destes canais dentre as programações que serão transmitidas no canal da educação, a ser implantado na plataforma digital terrestre pelo Ministério da Educação (MEC). No II Fórum Nacional de TVs Públicas, o secretário de educação à distância da pasta, Carlos Eduardo Bielchowsky, afirmou a intenção de convocar as universidades para contribuir na gestão do canal da educação, mas não reservaria um espaço específico aos canais universitário do cabo.

Além do PL 277, as emissoras do Campo Público apostam no projeto de Operador de Rede Único para viabilizar sua presença no sinal digital. Atualmente, apenas as TVs ligadas aos poderes da União e a a ministérios são contempladas. “As TVs públicas da União estão adiantadas por conta do protocolo [assinado em novembro de 2008]. Essas TVs estão aqui em Brasília, isso facilita a integração. Foi até um cuidado de, em nossa proposta, pensar na inclusão de todas as TVs no processo”, comenta Evelin Maciel, presidente da Astral.

Mas a intenção é conseguir que o operador seja comum a todas as emissoras do Campo Público. A idéia é que cada TV pública pague pelos seus custos no operador. "Isso ainda deve ser debatido, não está pronta a idéia. Mais adiante precisaremos também de apoio do governo para levá-la a cabo", informa Evelin.

O problema da multiprogramação

Quanto à transmissão de várias programações em um canal (multiprogramação), as associações fazem previsões mais cuidadosas. "O ministro Hélio Costa remeteu o problema ao Congresso. Vamos ver como lidar com isso, pois o tema é complexo já que a lei diz que a União de fato outorga um canal e toda modificação de lei deve passar pelo Congresso", diz Marco Antônio Coelho.

A proposta das associações será a defesa da isonomia entre o conjunto das emissoras públicas e aquelas de nível federal, que hoje podem realizar multiprogramação. O problema é que esta permissão existe pelo fato destas TVs serem da União – que é o próprio poder concedente. Desta maneira, a consignação de uma nova programação a uma emissora controlada pela União significa que o Poder concedente está concedendo a si mesmo.

Já as outras emissoras são outorgadas são obrigadas a obedecer a legislação, inclusive a proibição de explorarem o mesmo serviço (de televisão educativa ou de radiodifusão de sons e imagens) em uma mesma localidade. Isso faz com que, atualmente, a multiprogramação para operadoras outorgadas seja ilegal. “Nós fazemos questão de não abrir mão dela e vamos defendê-la a todo custo. Isso já é em parte o chamado modelo de negócios das TVs Públicas. Queremos prestar serviços para políticas públicas e ter acesso à tecnologia para isso”, enfatiza Antônio Achilis, presidente da Abepec.

Para Póla Ribeiro, diretor-presidente do Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (IRDEB), é preciso não apenas "pensar em modelos de negócios, mas também em modelos de programação, em grades que reflitam a identidade da TV Pública". Estes modelos, segundo Ribeiro, podem ser a oportunidade da TV pública se apresentar como espaço privilegiado para a veiculação dos conteúdos produzidos regionalmente e pelos centros universitários, além da possibilidade de se criar um código de ética.

0

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *