Conferência de Comunicação da Bahia chega a etapa final

A primeira Conferência Estadual de Comunicação do país terá em Salvador, de hoje (14/8) a sábado (16/8), a sua etapa derradeira. Dando continuidade ao processo iniciado em 4 de junho com o lançamento do processo na capital baiana, espera-se agora que o acúmulo de idéias e discussões construídas em 8 plenárias locais concretize-se em ações por parte das instâncias governamentais no estado. Para além das fronteiras baianas, também se espera que a experiência estadual impulsione de vez a Conferência Nacional de Comunicação.

Em um estado marcado pela relação ostensiva entre o poder político local e a concentração da propriedade das mídias, em especial o espólio de Antônio Carlos Magalhães, as expectativas não são poucas. Antes do início da etapa final, mais de 2 mil pessoas envolveram-se no processo, participando dos debates locais.

A conferência vem sendo conduzida por um grupo de trabalho montado há alguns meses por iniciativa do governo baiano. Integram o GT organizações como os sindicatos dos jornalistas e dos radialistas, a Associação Bahiana de Imprensa, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço-BA), a Cipó, o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e a Universidade Federal da Bahia (UFBA), entre outras.

“Essa é a primeira vez que um governo se propõe a discutir com a sociedade a democratização da comunicação”, afirma Rosely Arantes, da Assessoria Geral de Comunicação Social do Governo da Bahia (Agecom) e coordenadora da conferência. “A nossa leitura é de que a comunicação é um direito que, mesmo garantido pela lei, não é respeitado.”

Diagnóstico

A etapas locais abrangeram as 24 regiões do estado, de maneira a demonstrar, segundo Rosely, “certos paradoxos” criados pelas diferenças regionais. Enquanto muitos debates foram bastante “embrionários”, outros contaram com sujeitos altamente politizados. “O nosso diagnóstico é que houve propostas bastante avançadas e, ao mesmo tempo, muitas questões primárias.”

A participação também foi bastante desigual, se comparada a alta concentração da mídia na Bahia. Para Gislene Moreira, coordenadora da Cipó Comunicação Interativa, o tema principal – o direito à comunicação – “causou um estranhamento, principalmente entre os empresários, que compareceram pouco”. O resultado foi a significativa ausência dos meios de comunicação baianos nas etapas locais.

Além da ausência do empresariado, algumas entidades apontaram uma presença excessiva de membros do governo estadual nas plenárias e também a baixa adesão dos profissionais de comunicação. Por outro lado, estudantes, rádios comunitárias, organizações do movimento negro, movimentos sociais, indígenas, professores universitários e ONGs tiveram participação importante nos eventos.

Rosely conta que os eixos mais procurados nas plenárias foram justamente os de políticas públicas e de desenvolvimento territorial, o que afirma a necessidade de espalhar a discussão sobre direito à comunicação para as áreas onde faltam opções de veículos regionais e locais. Outra conclusão importante dos debates foi a de que a valorização da “formação não-acadêmica” nas experiências de comunicação tem sido importante no sentido de aproveitar o conhecimento popular e compreender a diversidade regional. A formação do Conselho Estadual de Comunicação Social e a instalação de uma Secretaria de Comunicação também foram questões abordadas e que merecem destaque.

Para Sivaldo Pereira, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, a conferência, em geral, cumpriu seu papel. “Houve uma articulação importante entre sociedade civil e governo, e o governo acatou e chamou para a articulação”, avalia.

Pereira também faz ponderações a respeito da realização da conferência. Para ele, existem problemas na organização, mas que são compreensíveis por ser a primeira experiência. “Ainda faltam critérios objetivos e claros. Em um ambiente maior, esse método não seria adequado. Funcionou dessa vez, mas tem que rever para o futuro.”

“O debate foi muito centrado na regulamentação dos meios comunitários. Foi um processo de construção positivo nesse sentido, pois discutimos formas de descentralização e desburocratização”, afirmou Gislene que, no entanto, também demonstrou preocupação com a possibilidade de regulamentação das propostas por parte do Estado. “O GT vai se dissolver após a conferência. Ficamos na dúvida se as propostas serão implementadas e como se dará a relação com o Estado.”

Conferência Nacional

A preocupação se justifica, pois, mesmo que o governo estadual esteja comprometido com o processo, algumas propostas devem incidir sobre a legislação federal, como as que envolvem a radiodifusão. “A sociedade civil se organizou, e o governo cumpriu o papel correto, foi democrático, apesar de alguns excessos, como uma presença demasiada nas plenárias”, aponta Pereira, que acredita que, para atingir a plenitude do processo, é necessário caminhar para a realização da Conferência Nacional de Comunicação. Para ele, a experiência na Bahia é o primeiro passo nesse sentido.

Para Rosely, à medida em que forem acontecendo outras conferências estaduais será possível “forçar a barra” pela realização da Conferência Nacional. “Entendemos que este foi um grande passo e uma grande ousadia. Estava faltando isso: sair do plano do discurso e ir para a prática.”

A coordenadora da conferência lamenta apenas que a sociedade não tenha se envolvido de maneira mais efetiva, mas revela que o boicote das grandes empresas de mídia do estado à cobertura do evento dificultou a sua divulgação. “Estamos tendo dificuldades, pois nadamos contra a corrente”, comenta. Gislene, da Cipó, concorda, mas assume um tom confiante na viabilização das propostas. “Este estado tem uma tradição autoritária enorme. Os enfrentamentos foram muitos, mas é importante confiar e não perder a utopia de vista.”

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