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Omissão e manipulação de notícia

O artista plástico e assinante do jornal O Globo denuncia: “ O jornal o Globo, em relação à denuncia do esquema do "Valerioduto" na campanha do ex-presidente do PSDB, Eduardo Azerêdo, omite e manipula informações”.

Segundo Santos, em nenhum momento nas matérias relacionadas a esse caso na edição de 27 de setembro do jornal, é citado o nome do PSDBista. “O mais grave é que soube na iternet que o Azerêdo declarou à Folha de São Paulo que verbas de sua campanha foram para as do Fernando Henrique Cardoso também”, informa o leitor.

Além disso, prossegue: “soube que numa lista de financiamento de campanha considerada verdadeira pela PF, consta que o dito Azerêdo teria recebido R$4.500.000, não explicados”.

“Como leitor e assinante do jornal o Globo me sinto desprespeitado no meu direito de ser informado, tendo que recorrer a outros meios de informação, quando pago a assinatura e quero um produto que me mantenha informado de assuntos relevantes como esse, o que não é caso do jornal O Globo”, conclui Santos.

Os bons resultados do Computador para Todos

O aumento na venda de microcomputadores em 2006, primeiro ano de vigência do programa Computador para Todos, lançado pelo governo federal no final de 2005, já permitia medir, de alguma forma, o sucesso da iniciativa. Mas os números se referem ao aumento global de micros vendidos– de 5,5 milhões, em 2005, para 8,2 milhões, em 2006 –, beneficiados pela redução da carga fiscal, e não só das máquinas comercializadas com o selo do programa, ou seja, com preço inferior a R$ 1.400,00, pacote de 27 aplicativos em software livre e financiamento público para o varejista e cliente final em condições especiais.

Por uma dessas ironias do capitalismo, o número de máquinas vendidas com o selo, no ano passado, é só estimado, porque o governo não exigiu, ao dar o benefício fiscal e o financiamento, que os fabricantes informassem o número de unidades vendidas. E eles, por questões de concorrência, se recusaram a abrir os dados. Este ano, a informação passou a ser obrigatória.

A divulgação dos dados da Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio – PNAD, relativos ao ano passado, revela que o programa Computador para Todos teve um efeito muito expressivo na ampliação no número de computadores nas casas dos brasileiros, especialmente nas das famílias de menor renda. Levantamento realizado pelo consultor Mario Ripper, junto à série histórica de dados da PNAD, mostra que o acréscimo de domicílios com computadores vinha sendo mais ou menos constante nos anos pré 2005 –aproximadamente 850 mil ao ano. Em 2004, 8,45 milhões de domicílios (16,3% do total) contavam com computadores. No entanto, em 2005 e, principalmente, em 2006, esse acréscimo se acelerou significativamente. A base de computadores domiciliares se ampliou em 1,4 milhão de máquinas, em 2005; em 2006, mais 2,21 milhões de micros foram incorporados às residências brasileiras, praticamente três vezes o acréscimo dos anos pré 2005. Com isso, 22,1% dos domicílios já dispõem de computadores, num total de 12,072 milhões.

Também chama a atenção o fato de que esse aumento do número de máquinas tem se dado, principalmente, em domicílios de menor renda. Em 2006, 89% dos novos domicílios com computadores se encontravam entre aqueles com renda abaixo de 10 salários mínimos.

No ano passado, 9,2 milhões de domicílios com computador, ou seja, 76% do total de casas com máquinas, tinham acesso à internet. Essa fatia correspondia a 16,9% do total de domicílios (12,2% em 2004, e 10,3% em 2002). Ou seja, dos 54,610 milhões de residências existentes em 2006, menos de um quinto estava conectado à internet.

Apesar dos avanços registrados especialmente nos dois últimos anos, o acesso a computadores nos domicílios continua limitado pela renda. Mas, entre os que conseguem comprar um micro, verifica-se uma forte motivação de manter o computador conectado à internet. Tanto que vem aumentando a porcentagem dos computadores conectados em todas as faixas de renda. Os dados da PNAD mostram que, em 2006, 87% dos domicílios com mais de 20 salários mínimos tinham computador e, deles, 95% com acesso a internet; na faixa entre 10 e 20 salários mínimos, cai para 75% o percentual das casas com computador, mas a taxa de conexão à internet é de 87%; abaixo de 10 salários mínimos, só 15,6% têm computador, dos quais 68% com acesso à internet.

Se cai a presença de computador na residência à medida em que diminue a faixa de renda, o gap entre as regiões geográficas do país é ainda mais acentuado. Enquanto 42,2% dos domicílios do Distrito Federal têm computadores, eles só estavam presentes, no ano passado, em 6,5% das residências do Piauí.

O vencimento das concessões da TV Globo

O dia 5 de outubro terá enorme significado para todos os que lutam contra a ditadura da mídia no país e pela democratização dos meios de comunicação. Nesta data vence o prazo das concessões públicas de várias emissoras privadas da televisão brasileira, entre elas de cinco transmissoras da Rede Globo – São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Recife e Belo Horizonte. A Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), que reúne as principais entidades populares e sindicais do país, já decidiu aproveitar o simbolismo desta data para realizar manifestações em todo o país contra as ilegalidades existentes no processo de concessão e renovação das outorgas de televisão no Brasil.

De acordo com a Constituição de 1988, a concessão pública de TV tem validade de 15 anos. Para que ela seja renovada, o governo precisa encaminhar pedido ao Senado, que pode aprová-lo com o voto de 3/5 dos senadores. No caso de rejeição, a votação é mais difícil. A proposta do governo deve ser submetida ao Congresso Nacional, que pode acatar a não renovação da concessão da emissora com os votos de 2/5 dos deputados e senadores. Antes da Constituição de 1988, esta decisão cabia exclusivamente ao governo federal. A medida democratizante, porém, não superou a verdadeira “caixa-preta” vigente neste processo, sempre feito na surdina e sem transparência.

Baixarias e lixo importado

Como explica o professor e jornalista Hamilton Octávio de Souza, “os processos de concessão e de renovação têm conseguido, ao longo das últimas décadas, uma tramitação silenciosa e aparentemente tranqüila, com acertos apenas nos bastidores – especialmente porque muitos dos deputados e senadores também são concessionários públicos da radiodifusão, sócios e afiliados das grandes redes e defendem o controle do sistema de comunicação nas mãos de empresários conservadores e das oligarquias e caciques políticos regionais – os novos ‘coronéis’ eletrônicos”. Na prática, Executivo e Legislativo não levam em conta nem as próprias normas constitucionais.

Entre outros itens, a Constituição de 1988 proíbe a monopolização neste setor, mas as principais redes atuam como poderosos oligopólios privados. Além disso, exige que a comunicação social promova a produção da cultura nacional e regional e a difusão da produção independente, mas as redes – em especial a Globo – impõem uma programação centralizada e importada da indústria cultural estrangeira. Ela também exige que a TV tenha finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, mas as emissoras produzem e veiculam programas que não atendem esse preceito constitucional. “Elas despejam em cima da população programas de baixaria e o lixo importado, que nada têm a ver com a identidade, os valores e a cultura nacional”, observa Hamilton.

Manipulação e deformação da sociedade

Além de deformar comportamentos, com efeitos danosos na psicologia social, a mídia é hoje um instrumento político a serviço dos interesses das corporações capitalistas. Como decorrência do intenso processo de monopolização do setor, ela se tornou um verdadeiro “partido do capital”, conforme a clássica síntese do intelectual italiano Antonio Gramsci. Ela manipula informações, utilizando requintadas técnicas de edição, com o intento de satanizar seus inimigos de classe e endeusar os aliados. A defesa do “caçador de marajás” Fernando Collor, a cumplicidade diante dos crimes de FHC e a oposição ferrenha ao governo Lula confirmam esta brutal manipulação.

Estas e outras aberrações da mídia – monopolizada, desnacionalizada e manipuladora – ficaram patentes no ano passado. Vários institutos independentes de pesquisa provaram que a cobertura da sucessão presidencial foi distorcida, “partidarizada”. O livro “A mídia nas eleições de 2006”, organizado pelo professor Venício de Lima, apresenta tabelas demonstrando que ela beneficiou o candidato da direita liberal, Geraldo Alckmin, ao editar três vezes mais notícias negativas contra o candidato Lula. “A grave crise política de 2005 e a eleição presidencial de 2006 marcam uma ruptura na relação histórica entre a grande mídia e a política eleitoral no Brasil”, afirma Venício.

Tentativa de golpe na eleição

Neste violento processo de manipulação caiu a máscara da TV Globo – que até então ainda iludia alguns ingênuos, inclusive no interior do governo Lula. A sua cobertura na reta final das eleições foi decisiva para levar o pleito ao segundo turno. Conforme demonstrou histórica reportagem da revista Carta Capital, uma operação foi montada entre o delegado da Polícia Federal Edmilson Bruno e a equipe da Rede Globo para criar um factóide político na véspera do primeiro turno. Após vazar ilegalmente fotos do dinheiro apreendido na tentativa desastrada de compra do dossiê da “máfia das sanguessugas”, que incriminava o partido de Geraldo Alckmin, o policial corrupto ordenou que a difusão das imagens fosse feita no Jornal Nacional da noite anterior ao pleito.

A criminosa negociação foi gravada, mas a TV Globo preferiu ocultá-la. Além disso, escondeu o trágico acidente com o avião da Gol para não ofuscar sua operação contra o candidato Lula. Para Marcos Coimbra, diretor do instituto de pesquisas Vox Populi, a solerte manipulação desnorteou todas as sondagens eleitorais, que davam a folgada vitória de Lula, o que evitou sua reeleição já no primeiro turno. “Os eleitores brasileiros foram votar no dia 1º de outubro sob um bombardeio que nunca tinha visto, nem mesmo em 1989… Em nossa experiência eleitoral, não tínhamos visto nada parecido em matéria de interferência da mídia”, garante o veterano Coimbra.

Um debate estratégico

Diante deste e de tantos outros fatos tenebrosos, que aviltam a democracia e mancham a história do próprio jornalismo, ficam as perguntas: é justa a renovação da concessão pública da poderosa TV Globo? Ela ajuda a formar ou a deformar a sociedade brasileira? Ela informa ou manipula as informações? Ela atende os preceitos constitucionais que proíbe o monopólio da mídia e exige que a comunicação social promova a produção da cultura nacional e regional e a difusão da produção independente e que tenha finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas? Estas e outras questões estarão em debate nas semanas que antecedem o simbólico 5 de outubro.

À CMS caberá levar esta discussão estratégica às suas bases. Já o governo e o parlamento, que devem zelar pela Constituição, não poderão ficar omissos diante deste tema. “Antes de propor a renovação automática da concessão, os órgãos de governo deveriam proceder à análise cuidadosa dos serviços prestados, com a devida divulgação para a sociedade. Antes de votar novos períodos de concessão, o Senado Federal deveria, em primeiro lugar, estabelecer o impedimento ético aos parlamentares envolvidos com a radiodifusão e, em segundo lugar, só aprovar a renovação que esteja de acordo com a Constituição, a começar pelo fim do oligopólio – já que o objetivo maior deve ser o da democratização da comunicação social”, pondera o professor Hamilton de Souza.

* Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi).

Tribunal Superior Eleitoral: o poder da mídia em julgamento

O plenário do Tribunal Superior Eleitoral julgou improcedente, na terça-feira (18/9), o pedido de cassação do mandato da senadora Rosalba Ciarlini (DEM-RN), que havia sido acusada por seu principal adversário nas eleições de 2006, o empresário Fernando Bezerra (PTB-RN), ex-ministro e ex-líder do governo no Senado, de abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação.

A senadora elegeu-se com 645.869 votos, equivalentes a 44,184% da votação. O empresário obteve 634.738 votos, ou 43,423%. A diferença foi de 11.131 votos, equivalente a 0,76% do total.

O julgamento do TSE, na verdade, decidiu que a vitória de Rosalba Ciarlini não podia ser atribuída às 64 entrevistas concedidas por ela, entre janeiro e junho de 2006 (média de uma a cada 2,34 dias) na emissora TV Tropical, retransmissora da Rede Record, que alcança cerca de 80% do eleitorado potiguar.

Os quatro ministros que votaram contra o provimento do recurso alegaram, dentre outras razões, que não é possível medir a influência da veiculação das entrevistas no resultado das eleições e que elas foram concedidas antes do registro da candidatura.

Horário gratuito resolve?

Houve, no entanto, dois votos a favor da cassação – e vale registrar o do ministro Cezar Peluso. Ele se valeu de, pelo menos, dois argumentos fundados nos estudos de mídia. Primeiro, colocou em dúvida o critério de noticiabilidade da TV Tropical ao afirmar que as qualidades da candidata – três vezes prefeita de Mossoró, segunda maior cidade do estado – "não explicam ou justificam a exposição sistemática", isto é, 64 vezes em cinco meses, na mesma emissora. Segundo, reconheceu a capacidade da TV de influir na formação da opinião pública. Disse ele: "Seria preciso negar a força extraordinária do meio de comunicação mais poderoso, que é a televisão, para se dizer que não tivesse a potencialidade de alterar seis mil votos". E concluiu: "Houve o uso indevido e estudado dos meios de comunicação".

Independente de qual tenha sido a utilização da mídia pelos dois candidatos a senador no Rio Grande do Norte em 2006, a decisão do TSE e os votos de seus ministros oferecem uma interessante oportunidade de se refletir sobre duas questões que, aparentemente, estarão cada vez mais sendo objeto de decisão nas cortes de Justiça: a legalidade de políticos no exercício de mandato eletivo controlarem concessões do serviço público de radiodifusão e a influência da mídia no processo eleitoral.

Seria democrática a disputa entre um candidato que não tem ou tem pouco acesso à mídia e outro que conta com o apoio maciço da mídia controlada por ele próprio ou por seus correligionários? O horário gratuito de propaganda eleitoral, garantido por lei, seria suficiente para corrigir essa assimetria, sobretudo em eleições para cargos majoritários, como os de senador, governador e presidente da República?

Normas legais e reflexão crítica

Apesar do acórdão ainda não ter sido publicado, é de se supor que, no caso em tela, os ministros do TSE tenham levado em conta outros fatos relativos à mídia no Rio Grande do Norte que poderiam também ter influído no resultado da disputa pela vaga no Senado Federal.

Vale lembrar, por exemplo, que a TV Tropical – onde a ainda não-candidata Rosalba Ciarlini deu as 64 entrevistas – faz parte da rede Tropical de Comunicação, composta não só pela TV Tropical Canal 08, Natal, mas também pela FM Tropical, 103.9, Natal, a CBN Natal, 1.190 AM, a Rádio Salinas, 1.510 AM, Macau, a Rádio A Voz do Seridó, 1.100 AM, Caicó, a Rádio Cultura, 1.560 AM, Pau dos Ferros, a Rádio Curimataú,1.530 AM, Nova Cruz, a Rádio Libertadora, 1.430 AM, Mossoró e a Rádio Ouro Branco, 1.360 AM, Currais Novos.

Um dos sócios da Rede Tropical, conforme dados do SIACCO da Anatel, é o senador José Agripino Maia (DEM-RN), líder do DEM no Senado Federal e correligionário da senadora.

Outro correligionário da senadora, o senador Garibaldi Alves (DEM-RN), segundo estudo do Epcom, controla direta ou indiretamente sete emissoras de rádio FM e AM no estado; as duas emissoras de televisão afiliadas às redes nacionais Globo e SBT em Natal e ainda a operadora local de TV a cabo da NET.

Em outra ocasião lamentei aqui, data venia, o incrível descolamento existente entre as normas legais e o pensamento jurídico vis-à-vis a reflexão crítica contemporânea sobre a mídia na academia e nos observatórios da imprensa, tanto no Brasil como no exterior.

Excluídos do processo

Não há dúvida de que a questão permanece atual e há sinais, embora ainda tímidos, de que alguns ministros começam a levar em conta décadas de pesquisa no campo da mídia.

Por outro lado, as rápidas transformações tecnológicas não indicam que diminuirá a centralidade que a mídia ocupa na vida contemporânea e nem que haverá mudanças de curto prazo no histórico vínculo entre ela e as oligarquias políticas regionais no Brasil.

A crescente consciência em relação ao direito à comunicação faz crer que, cada vez mais, a Justiça será chamada a decidir sobre o poder de influência da mídia. Isso vale tanto para as disputas eleitorais entre membros das oligarquias, como para disputas entre elas e cidadãos excluídos do acesso democrático ao serviço público de comunicações.

Conselho Consultivo da Anatel não pode mais ficar incompleto

A Lei Geral de Telecomunicações, ao definir a estrutura da Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel, determinou que este órgão contaria com um Conselho Consultivo (CC), com o objetivo de garantir a “participação institucionalizada da sociedade” no processo de regulação do setor. Têm representação no Conselho o Senado, a Câmara dos Deputados, o Poder Executivo, as entidades representativas das prestadoras de serviços de telecomunicações, dos usuários e da sociedade, sendo duas vagas para cada segmento, num total de doze vagas.

No organograma da agência, o CC está ao lado do Conselho Diretor e da Ouvidoria, o que autoriza a conclusão de que o legislador pretendeu que os diversos segmentos da sociedade tivessem papel preponderante no processo de edição de normas pela agência. Vejamos algumas das competências do CC: “opinar, antes de seu encaminhamento ao Ministério das Comunicações, sobre o plano geral de outorgas, o plano geral de metas para universalização de serviços prestados no regime público e demais políticas governamentais de telecomunicações; aconselhar quanto à instituição ou eliminação da prestação de serviço no regime público; apreciar os relatórios anuais do CD; requerer informação e fazer proposição a respeito de toda matéria atribuída ao poder decisório do Conselho Diretor”.

Ainda que as posições adotadas pelo CC não vinculem o CD, o peso político e técnico de suas recomendações deve ser levado em conta no momento de edição de normas pela agência, sendo este o mecanismo de viabilizar que os pleitos e expectativas dos diversos agentes do setor sejam devidamente sopesados e, portanto, trata-se do canal que propicia certa dose de democracia à atuação do órgão regulador, já que seus diretores são indicados diretamente pelo Presidente da República.

Descaso

Contrasta com a importância que a LGT atribuiu ao CC o descaso que as instituições responsáveis pela indicação e nomeação de seus membros – o Ministério das Comunicações e a Casa Civil – ao longo do tempo têm dispensado ao preenchimento das vagas.

Um exemplo histórico dessa afirmação é o fato de o primeiro presidente do CC ter sido indicado, em fevereiro de 1998, pelo então Presidente da Telefonica – Fernando Xavier Ferreira, também integrante do CC; tratava-se do Conselheiro Wilson Lazzarini, que preenchia a vaga de representante dos usuários, mas que não tinha qualquer relação com entidades de defesa dos consumidores, pois ligado aos interesses das empresas de telecomunicações, assim como quase a totalidade dos demais integrantes do Conselho àquela época, entre eles Sávio Pinheiro, que já exerceu dois mandatos – o primeiro de três anos em nome das operadoras e o segundo de um ano e meio em nome do Senado – e que atua como consultor na SP Communications para as principais empresas de telecomunicações do país – entre elas a superpoderosa Telefonica. 

Mas os fatos mais gritantes foram as nomeações, ainda em 2001 e 2002, de dois diretores de concessionárias de telecomunicações, para ocupar as duas vagas reservadas aos consumidores.Esta aberração levou o Ministério Público Federal de Pernambuco, recebendo denúncia apresentada pela Associação Brasileira dos Consumidores de Telecomunicações – ABCTEL, a mover Ação Civil Pública, julgada procedente, para obrigar os ilustres e resistentes conselheiros, representantes na verdade das empresas de telecomunicações, a “largarem o osso”.

Ou seja, houve tempos no CC em que as empresas ocupavam quatro vagas, em absoluta violação à finalidade da lei de garantir ampla participação da sociedade. São fatos como este que explicam a imagem de clube fechado, órgão capturado e antidemocrático que o CC sempre passou para a sociedade.

Fazendo uma retrospectiva em sua breve história, verificamos que nunca houve um período em que as duas vagas destinadas aos consumidores e à sociedade estivessem preenchidas todas ao mesmo tempo por membros que de fato representassem aqueles dois segmentos.

Sem indicação

É certo que, depois da atuação do Poder Judiciário, o processo de indicação e nomeação para preenchimento de vagas recebeu mais atenção. Porém, o problema passou a ser outro: a falta de indicação. Por exemplo, há mais de dois anos não há preenchimento completo de todas as vagas destinadas duas aos consumidores e duas à sociedade. Hoje, especificamente, apenas uma das vagas destinadas aos usuários está preenchida pela subscritora deste artigo, sendo que as duas vagas reservadas à sociedade estão vazias.

Pior, o Conselho Consultivo está, desde fevereiro deste ano, sem se reunir por falta de quorum, pois restaram com mandatos vigentes apenas cinco conselheiros. Dia 06 de setembro último, a Casa Civil fez publicar no Diário Oficial da União a nomeação de apenas dois membros para preencher duas das sete vagas até então desocupadas: Igor Vilas Boas de Freitas, como representante do Poder Executivo, e Amadeu de Paula Castro Neto, como representante do Senado Federal, valendo considerar que ambos têm forte histórico e competência técnica no campo das telecomunicações, mas, por suas atividades profissionais, estão ligados às empresas que atuam no setor.

Atual configuração:

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Parece bastante significativo o atual cenário do CC na conjuntura de redefinição do modelo das telecomunicações, que vem ocorrendo em função das conseqüências da convergência digital, que já começa a mostrar seus impactos em áreas de grande interesse como reestruturação societária das empresas que atuam no setor, alteração da estrutura e classificação das modalidades de serviços, alteração no plano de metas de universalização, licitação de freqüências, preocupações com a universalização de banda larga, entre outros temas determinantes para o futuro do país.

Diante das grandes questões que estão pendentes de definição, é razoável perguntarmos: qual a razão de o CC estar preenchido por seis representantes das esferas de governo – e alguns deles estreitamente ligados a concessionárias – e apenas, e por razões circunstanciais, um representante dos consumidores?

Interpretações subjetivas à parte a respeito da real representatividade dos atuais Conselheiros, é indiscutível que a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) e os princípios democráticos estão sendo desrespeitados. Urge a nomeação das demais vagas no CC, pois matérias fundamentais estão para ser reguladas e os interesses dos diversos agentes do mercado devem estar representados no processo regulatório.

A reforma da LGT está em pleno debate. A partir do ano que vem se iniciará a consulta pública para a primeira revisão dos novos contratos de concessão firmados em 2005, que passará a viger a partir de 2010; a resolução que fixará o conceito de Poder Significativo de Mercado deve ser preparada ainda neste ano; fusões de grandes empresas estão sendo decididas, entre outros assuntos cruciais, como a volta da participação acionária do Estado nas empresas de telecomunicações.

Aguardamos, assim, dos ilustres governantes que indicam e nomeiam os membros do CC da Anatel, que ouçam o clamor das entidades que vêm buscando a indicação de seus representantes, especialmente em virtude da importância histórica do atual cenário, e assumam um compromisso verdadeiro com a democracia, abrindo oportunidade para que a sociedade possa lutar de forma legítima e equilibrada por seus interesses econômicos e sociais dentro do ambiente institucional.

*Flávia Lefèvre Guimarães é coordenadora da Frente dos Consumidores de Telecomunicações – FCT e membro do Conselho Consultivo da ANATEL (representante das Entidades Representativas dos Usuários).