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Sorria, você está sendo vigiado

Jornalista e escritor especialista em agências de inteligência estadunidenses, James Bamford mostrou na Cryptorave 2017 que o país monitora as comunicações em todo o mundo

Num mundo em que a espionagem eletrônica é cada vez mais divulgada, especialistas e ativistas se reuniram, em São Paulo, para conversar sobre proteção de dados e divulgar formas de defesa da privacidade na rede. A Cryptorave 2017 chegou neste ano à quarta edição e mais de mil pessoas participaram do evento. O encontro teve como um dos principais objetivos difundir os conceitos fundamentais e softwares básicos de criptografia, e assim educar sobre o seu uso e a segurança na internet.

Foram 24 horas de atividades initerruptas, iniciadas às 20 horas da sexta-feira, dia 6, e finalizadas às 20 horas do sábado, dia 7. James Bamford, jornalista e escritor especialista em agências de inteligência estadunidenses, foi o responsável pela abertura do encontro e era um de seus convidados mais esperados. Ele mostrou em sua palestra como uma suposta teoria da conspiração, segundo a qual os Estados Unidos monitoram as comunicações de todas as pessoas do mundo, se concretizou.

Durante sua apresentação, Bamford demonstrou, por meio de informações da Agência Nacional de Vigilância (NSA) dos Estados Unidos, vazadas por Edward Snowden e obtidas pelo painelista em viagem à Rússia para se encontrar o denunciante, que os EUA utilizam malwares para coletar informações em pontos específicos do globo, sendo o local mais importante desta coleta no âmbito da América Latina a cidade de São Paulo.

Bamford falou também sobre a iniciativa brasileira de construir um cabo submarino para que o tráfego de dados do país siga direto para a Europa sem ter que passar pelos Estados Unidos — a primeira obra deste tipo e sem contar com a participação estadunidense. Apesar de elogiar a iniciativa, o jornalista destacou que os EUA possuem um submarino que pode interceptar a captação de dados no meio do oceano, além de fazer acordos com outros países para obter tal interceptação em outra ponta. Com isso, ele quis frisar que o país deve fazer a inspeção do cabo de ponta a ponta, para tentar evitar espionagens.

Sobre o satélite brasileiro, ele reforçou a importância para a soberania nacional da construção e operação sem a participação da indústria estadunidense, e lembrou que empresas de telecomunicação muitas vezes cooperam com a espionagem. “Fui procurado pela então presidenta Dilma Rousseff, que estava preocupada com a soberania do país e a espionagem que podia estar acontecendo. Expliquei a ela que todos os cabos que saíam daqui iam primeiro para Miami [nos EUA], e não só os cabos, mas também os satélites, pois a NSA consegue captar as comunicações dos satélites estrangeiros que passem perto da Flórida. Foi dessa conversa que surgiram os primeiros passos para a construção do satélite e também dos cabos ligando o país diretamente à Europa”, relatou.

Bamford afirmou aos presentes que atualmente a grande fortaleza para a proteção das informações e dados pessoais está na utilização da criptografia de ponta a ponta. Por isso, os EUA e as empresas que usam a coleta de dados em benefício próprio querem afastar qualquer possibilidade de criptografia.

Satélite

O Satélite Geoestacionário Brasileiro  foi lançado ao espaço no dia 4 de maio, na teoria o satélite permitirá o aumento da cobertura de banda larga no território nacional.  Porém, a realidade não é tão bonita como faz parecer o governo federal. O projeto, que recebeu investimento de 2,7 bilhões de reais e cujo objetivo era levar banda larga às escolas, postos de saúde, hospitais, postos de fronteira, etc., deve ser leiloado pelo Governo Federal para grandes operadoras de telecomunicação que não têm interesse em levar conexão a locais de baixa densidade demográfica ou de baixa renda.

No projeto original do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), 70% da capacidade do satélite estaria vinculada à implementação de políticas públicas. Mas, após as mudanças implementadas pela gestão atual, 80% da capacidade do satélite destinada para uso civil será privatizada.

O edital de venda não exige das empresas nenhuma meta de cobertura, universalização ou preço mínimo do serviço prestado. Exige apenas “cumprir as metas do PNBL”. Aliás, o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL) já foi considerado um fracasso exatamente porque as operadoras não cumpriram com sua parte no acordo de oferecer velocidade mínima por um preço mínimo, permitindo assim o acesso da população com baixa renda.

Navegação com mais privacidade

A Cryptorave não é um evento dirigido apenas a pessoas como conhecimento técnico em transmissão de dados e em redes. A programação diversificada do evento conseguiu atrair e agradar desde pessoas com conhecimento avançado no assunto até pessoas que não tinham até então nenhum contato com os temas da privacidade e da proteção de dados.

Uma das oficinas, intitulada Navegação com privacidade para iniciantes, apresentou o funcionamento da navegação na internet e quais são as ferramentas e técnicas que podem ser usadas para a navegação com mais privacidade. O desenvolvedor web, jornalista e pesquisador Leo Germani foi o oficineiro e trouxe para o debate com os participantes conceitos básicos de criptografia.

 

O que é criptografia

Cryptografia é o nome que se dá a técnicas que transformam informação inteligível em algo que um agente externo seja incapaz de compreender. De forma mais simples, a criptografia funciona como um código: sem ela, uma pessoa ou máquina poderia interceptar, por exemplo, a senha de e-mail durante o login. Com a criptografia, caso a informação seja interceptada durante o acesso, mas sem a chave correta de leitura, será obtida pelo invasor apenas uma lista desordenada e aparentemente confusa de caracteres, sem interpretação lógica aparente.

Segundo Leo Germani, a criptografia é um método de proteção e privacidade de dados cada vez mais necessário. “As informações do navegador vão para o roteador e de lá para a nuvem. Na verdade, esse conceito de nuvem é um conceito comercial. O que eles chamam de nuvem está guardado em algum computador no mundo”, reforçou.

Germani explicou que toda conexão passa por um roteador e vai para o provedor de internet. Para estar conectado com a internet, tem que passar necessariamente por servidores. E aí começam as vulnerabilidades, pois os provedores “sabem quem você é e para onde você foi”. “Quando você acessa um provedor, ele sempre sabe o que você está fazendo. Esses dados estão sendo armazenados e são possíveis de serem acessados por outras pessoas? A resposta é sim!”, frisou.

Medidas básicas de privacidade

Leo Germani ainda destacou que muitas pessoas usam a mudança do proxy como medida para tentar barrar esses problemas, mas alertou para o fato de que estas pessoas podem ser enganadas e acabar desviadas para sites maliciosos. O pesquisador reforçou que existem medidas básicas para evitar algumas violações da privacidade. Confira algumas delas:

  • Não acesse páginas na web enquanto estiver logado em seu e-.mail ou em redes sociais.
  • Use senha forte no roteador do Wifi. Ela criptografa as mensagens do seu computador até o roteador.
  • Utilize sempre páginas https. Ela criptografa a mensagem desde o momento em que sai do computador até o servidor de aplicação, protegendo seu conteúdo.
  • O ideal é usar um sistema operacional livre e manter o antivírus sempre atualizado. (Você nunca vai estar seguro em um sistema proprietário).
  • A navegação anônima só dá proteção contra acessos no próprio computador. Ela não protege os dados de serem interceptados por agentes externos.
  • Para proteção contra malwares e a garantia de uma navegação segura na internet, o melhor é navegar pelo Tor Browser. Ele “anonimiza” a navegação completamente, não o identificando e o livrando de ser rastreado.
  • Use senhas fortes e não use a mesma senha para tudo. Nunca esqueça que o e-mail é a chave para todos os perfis. Use um gerenciador de senhas para facilitar.
  • Nas redes sociais, evite informar todos os dados. Não autorize aplicativos a acessar sua conta. Evite se expor demais, crie grupos e use sempre as configurações de privacidade para se proteger.

Marco Civil estabelece direitos do usuário

A internet permite aos usuários o exercício de direitos básicos e suas ferramentas tornam publicações em meio virtual acessíveis a qualquer público de forma rápida e prática, com todas as vantagens e também os riscos das relações sociais. Mas a aprovação do Marco Civil da Internet resguarda os cidadãos dos excessos praticados pelas empresas.

Os incisos VI a X do artigo 7º do Marco Civil estabelecem que a coleta de dados pessoais e o uso que se fará dos mesmos precisam ser informados previamente ao usuário. Determina ainda que os dados coletados só poderão ser utilizados para aquele fim e que não poderão ser repassados a terceiros sem o consentimento do usuário. Esses direitos são básicos e impedem que empresas coletem dados para fins outros que não o da prestação do serviço ou da apresentação de publicidade. O artigo ainda reserva ao usuário o direito de solicitar a destruição dos dados quando deixar de usar um serviço.

Já o artigo 16 proíbe que um serviço monitore o acesso a outros serviços sem o consentimento do usuário — por exemplo, que uma vez conectado ao Facebook ou ao Google, o acesso a outros sites parceiros dessas empresas seja monitorado e os dados enviados para elas sem o consentimento do usuário. Por outro lado, a regulação adicional como a que dispõe sobre a interconexão de bancos de dados foi deixada para a tão aguardada Lei de Proteção de Dados Pessoais, que está em discussão em comissão especial da Câmara dos Deputados.

Sobre a CryptoRave

Inspirada no movimento das CryptoParties – eventos para a troca de chaves de criptografia –, a CryptoRave surgiu no Brasil como um esforço coletivo para difundir os conceitos, a cultura e as ferramentas relacionadas à privacidade e liberdade na internet. O evento se consolidou como o maior encontro aberto e gratuito deste tipo no mundo e visa aprofundar e qualificar o debate sobre proteção da privacidade na internet como um direito e um dos fundamentos à democracia.

É um evento organizado de forma voluntária, encabeçado pelos coletivos Actantes, Escola de Ativismo, Encripta Tudo, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e Saravá, e realizado colaborativamente por muitos indivíduos. Para o sociólogo, doutor em Ciência Política e militante do Actantes Sérgio Amadeu, a Cryptorave cumpre um papel fundamental ao reunir movimentos sociais, ativistas e outras pessoas interessadas “em tomar contato com as tecnologias disponíveis e que possam defender sua privacidade na internet”.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Encontro em São Paulo discute ativismo e liberdade nas redes

Entre os dias 5 e 6 de maio acontece a quarta edição da CryptoRave, evento que tem como objetivo difundir conceitos fundamentais e softwares básicos de criptografia

São Paulo recebe entre os dias 5 e 6 de maio o maior encontro sobre tecnologia da América Latina, a CryptoRave. O evento, que já está em sua quarta edição, tem como objetivo difundir conceitos, a cultura e as ferramentas básicas do universo da criptografia, além de debater privacidade e liberdade nas redes.

O grande e acelerado avanço tecnológico mostra que, em tempos de retrocessos sociais e políticos, tensionamento entre setores e mobilização de grupos envolvendo os mais diferentes atores, o direito à privacidade deve ser considerado um direito fundamental de todo cidadão e cidadã. Contudo, encontramos atualmente diversas iniciativas que tentam desabilitar a criptografia em sistemas de mensagens instantâneas, como acontece com alguma frequência com o aplicativo WhatsApp.

É neste contexto que entidades e ativistas que defendem o direito à privacidade e ao uso de tecnologias que garantam esta privacidade se unem em torno da CryptoRave, um evento com duração de 24 horas voltado para pessoas interessadas no tema.

Desde 2014, a Crytorave vem se consolidando como um dos maiores encontros abertos e gratuitos sobre a privacidade nas redes. Organizado por coletivos como Actantes, Escola de Ativismo, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Saravá, além de ativistas e hackers independentes, a iniciativa foi totalmente custeada por campanhas de financiamento coletivo e doações de entidades.

Diferentemente da maioria dos eventos de segurança da informação, para além dos aspectos técnicos, a Cryptorave aborda a questão também sob as perspectivas humana, social e política da privacidade. Neste sentido, o encontro oferecerá uma série de oficinas básicas para quem quer entender e melhorar a privacidade em sua comunicação – ou de sua empresa, organização, movimento.

Nas 24 horas do evento, estão programadas palestras, oficinas e atividades sobre segurança, criptografia, hacking, anonimato e privacidade na rede. Assuntos imprescindíveis para entender o impacto crescente da vigilância em massa e aprofundar o debate sobre privacidade na internet como direito fundamental e essencial à democracia.

A abertura do evento contará com a presença do jornalista investigativo James Bamford, um dos maiores especialistas em vigilância de massa e ciberguerra. “Ele nunca esteve no Brasil para um evento aberto, como é a CryptoRave, e estamos animados para o resultado deste encontro”, destaca Marina Pita, jornalista e integrante do Intervozes.

A CryptoRave 2017 será realizada na Casa do Povo, localizada na Rua Três Rios, 252, bairro Bom Retiro, na cidade de São Paulo (SP), a partir das 18 horas do dia 5 de maio (sexta-feira) até 19 horas do dia 6 de maio (sábado). A participação em todas as atividades é aberta mediante inscrição online gratuita, realizada no próprio site do evento: cryptorave.org.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

UNESCO publica relatório sobre concentração de mídia e liberdade de expressão

Documento, que abrange a situação nas Américas, foi lançado nesta quarta-feira, 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa

Foi lançado nesta quarta-feira, 3 de maio, na cidade de Assunção, Paraguai, o relatório “Concentração de Propriedade de Mídia e Liberdade de Expressão: Padrões e Implicações Globais para as Américas”, elaborado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

O ato faz parte da celebração do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa na América Latina e no Caribe, que começou nesta quarta e segue até sexta, dia 5 de maio. O relatório representa uma importante contribuição da UNESCO e de vários parceiros nos esforços para desenvolver padrões de comunicação que ultrapassem a barreira do exercício da liberdade de expressão, de forma a alcançar um ambiente de mídia diversificado e pluralista.

O documento elaborado por Toby Mendel, Angel Garcia Castillejo e Gustavo Gómez, especialistas mundiais na área da regulação dos meios de comunicação e em questões relacionadas à liberdade de expressão, mostra que há um esforço mundial para normatizar estas questões nos últimos 70 anos.

O relatório aborda a dupla proteção dos direitos à liberdade de expressão, do “falante” e do “ouvinte”, e apresenta ações para regular o mercado de mídia, com base no direito internacional. Este elemento proporciona a base jurídica do conceito de diversidade de meios de comunicação, o que pressupõe a colocação de obstáculos à concentração indevida da propriedade destes meios.

Neste contexto, a publicação pretende lançar luz sobre a regulamentação internacional dos meios de comunicação, bem como analisar as várias abordagens em nível nacional para fazer implementar essas normas.

A primeira parte do relatório dá exemplos de como a concentração indevida da propriedade e controle dos meios de comunicação afeta o livre fluxo de informações e ideias na sociedade, que em última análise representa o núcleo do direito à liberdade de expressão.

Na segunda parte, é apresentada uma visão geral das mais importantes normas internacionais sobre a concentração, bem como a jurisprudência apresentada pelos principais tribunais internacionais em relação ao assunto. A terceira parte, do anti-monopólio da mídia, relata o que têm sido implementado em algumas democracias consolidadas pelo mundo, a fim de atenuar a concentração da propriedade dos meios de comunicação, e são analisadas as consequências destas iniciativas. A quarta parte descreve as principais tendências na América Latina sobre a questão.

A quinta e última parte apresenta um conjunto de conclusões e recomendações que devem servir como orientações para os poderes políticos e a quem possa decidir sobre o tema.

Os principais conteúdos do relatório foram previamente discutidos pelos autores durante o seminário internacional “Mídias livres e independentes em sistemas midiáticos plurais e diversos”, ocorrido na cidade de Bogotá, Colômbia, em 18 e 19 de novembro de 2015, quando jornalistas, acadêmicos, gestores e representantes da mídia de mais de 25 países na América e Europa tiveram a oportunidade de discutir este e outros temas relacionados.

Confira o relatório disponível em Espanhol e Inglês.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações do Observatorio Latinoamericano de Regulación, Medios y Convergencia (OBSERVACOM)

Audiência com Kassab tem muito blá blá blá e pouco debate

Ministério ignorou informações sobre a privatização de satélite que foi comprado com finalidade de universalização da banda larga no país

A Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática promoveu, nesta quarta-feira, dia 26, audiência pública com o ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab. Ele compareceu à audiência junto com os presidentes da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT), Telebrás, Agência Espacial Brasileira (AEB), Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e todos os secretários do ministério, mas falou menos de 20 minutos do total de 3h30 de duração da atividade. O restante foi utilizado pelos secretários e representantes das estatais, além de deputados da base aliada.

Especificamente em relação aos Correios, Kassab afirmou que o atual governo “é contra a privatização” e que trabalha para fortalecer a empresa. Porém, o ministro destacou que o governo não irá transferir recursos do Tesouro Nacional para os Correios, pretendendo resolver problemas financeiros da instituição a partir da gestão.

A posição do governo é questionada pelo deputado Adelmo Carneiro Leão (PT-MG), para quem o não investimento de recursos nos Correios, neste momento de situação financeira difícil, coloca a empresa em risco. O que é confirmado pela fala do próprio presidente dos Correios, Guilherme Campos, que informou que, por conta da crise financeira, as férias dos trabalhadores da empresa estão suspensas por um ano.

Intervenção

No que diz respeito às telecomunicações, Gilberto Kassab declarou que o governo vai editar nos próximos dias uma medida provisória (MP) com as regras de intervenção na empresa de telefonia e banda larga Oi, que está em recuperação judicial. Segundo o ministro, a carta redigida pelos conselheiros da Anatel indicando a necessidade de intervenção soou como alerta para o ministério.

Em 2008, a Anatel e o Governo Federal mudaram o Plano Geral de Outorgas (PGO) com a publicação do Decreto nº 6.654/2008, o que permitiu a compra da Brasil Telecom pela Oi. Assim, a Oi tornou-se concessionária de telefonia fixa em 26 estados do país – à exceção de São Paulo, onde operava a Telefônica, atualmente Vivo.

O antigo PGO (Decreto nº 2.534/1998) proibia a compra de uma empresa de telefonia fixa por outra que atuasse em região diferente, entre outros motivos, para impedir que a atuação destas se estendessem a grandes regiões. Com a compra da Brasil Telecom, a Oi assumiu obrigações de universalização da telefonia fixa nas áreas menos lucrativas de praticamente todo o país, enquanto a Telefônica se concentrou no estado de São Paulo (como referido acima).

A Oi opera apenas no Brasil ao mesmo tempo em que concorre com empresas globais de telecomunicações, que sendo autorizadas a ofertar o serviço, não têm as mesmas obrigações de cobertura. Ao longo do tempo, a Oi não só acumulou dívidas para manter o nível de investimento no país como para pagar dividendos aos acionistas. Além, de receber série de multas que a operadora da Anatel pelo não cumprimento das obrigações de universalização da telefonia fixa e outras, negociadas em substituição/troca das primeiras.

Satélite

Durante a audiência, foi informado que o lançamento do primeiro Satélite Geoestacionário Brasileiro ocorrerá no dia 4 de maio, o que permitirá o aumento da cobertura de banda larga no território nacional. Segundo o secretário de Telecomunicações do ministério, André Muller Borges, com o satélite, “em poucos meses não haverá uma região do país que não possa ser atendida com banda larga, e em algumas localidades até com competição”.

Porém, a realidade não é tão bonita como quer o secretário. O projeto, que recebeu investimento de 2,7 bilhões de reais e cujo objetivo era levar banda larga às escolas, postos de saúde, hospitais, postos de fronteira, etc., deve ser leiloado pelo Governo Federal para grandes operadoras que não têm interesse em levar conexão a locais de baixa densidade demográfica ou de baixa renda.

No projeto original do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), 70% da capacidade do satélite estaria vinculada à implementação de políticas públicas. Mas, após as mudanças implementadas pela gestão atual, 80% da capacidade do satélite destinada para uso civil será privatizada.

O edital de venda não exige das empresas nenhuma meta de cobertura, universalização ou preço mínimo do serviço prestado. Exige apenas “cumprir as metas do PNBL”. Aliás, o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL) já foi considerado um fracasso exatamente porque as operadoras não cumpriram com sua parte no acordo de oferecer velocidade mínima por um preço mínimo, permitindo assim o acesso da população com baixa renda.

TV digital

Gilberto Kassab anunciou também a publicação de uma portaria adiando para o segundo semestre o desligamento do serviço de TV analógica e a implantação definitiva da TV digital em algumas cidades. O Grupo de Implantação do Processo de Distribuição e Digitalização de Canais de TV e RTV (Gired) havia proposto o adiamento do processo para quatro agrupamentos de municípios: Fortaleza (CE), Salvador (BA), Belo Horizonte (MG) e parte do interior de São Paulo. Inicialmente, o desligamento do sinal analógico nestas cidades ocorreria até julho.  

A secretária de Radiodifusão do ministério, Vanda Bonna Nogueira, afirmou que tudo tem corrido dentro do esperado e que o desligamento do sinal na cidade de São Paulo foi um sucesso, não havendo reclamações sobre o assunto. Ela ignora, porém, que, com o desligamento do sinal analógico, a distribuição dos canais digitais abertos por parte das operadoras de TV por assinatura passou a depender de autorização a ser dada pelas emissoras de sinal aberto. Como não houve acordo das operadoras de TV por assinatura com SBT, Record e Rede TV!, os paulistas perderam o acesso a estes canais na TV paga, gerando sim uma série de reclamações e pedidos dos clientes de diminuição do valor do pacote – já que os três canais não estavam mais disponíveis. Portanto, se não houver acordo entre emissoras e operadoras, outras cidades podem enfrentar o mesmo problema à medida que o desligamento analógico for sendo realizado.

Fust e Fistel

Autor do requerimento para realização da audiência, o deputado Sandro Alex (PSD-PR) pediu o uso efetivo do Fundo de Fiscalização de Telecomunicações (Fistel) e do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust) para seus fins, deixando de ser utilizados para outros fins pelo governo.

O deputado sugeriu que seja elaborado pelo governo, em conjunto com os parlamentares, um cronograma para pôr fim ao contingenciamento desses recursos. Kassab concordou com a proposta e disse que será sugerido um cronograma de desbloqueio gradativo, alcançando-se o desbloqueio total em 2020. Quase a totalidade do dinheiro dos dois fundos vão atualmente para os cofres do Tesouro Nacional, sem ser aplicados na finalidade para a qual foram criados.

De qualquer forma, a audiência, que poderia esclarecer aos deputados alguns assuntos relacionados à privatização do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC) e dos Correios, acabou virando uma reunião de apresentação da pasta e uma confraternização junto à base aliada do governo. Os representantes do ministério utilizaram tanto espaço para suas falas que houve tempo apenas para que um deputado da oposição conseguisse se manifestar, inviabilizando qualquer possibilidade de debate. O que era exatamente a estratégia do governo.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

1ª Conferência Nacional Livre de Comunicação em Saúde enfatiza defesa da democracia

Encontro realizado em Brasília contou com a participação de entidades da sociedade civil pautadas pela democratização da comunicação e pela defesa da saúde pública

Realizada entre os dias 18 e 20 de abril, a 1ª Conferência Nacional Livre de Comunicação em Saúde discutiu estratégias de democratização do acesso a informações sobre o Sistema Único de Saúde (SUS). A relevância dos direitos à saúde e à comunicação, identificados como pilares da democracia, foi refletida no grande número de pessoas presentes na conferência. O público foi formado principalmente por comunicadores, membros de conselhos de saúde, estudantes, assessores de comunicação e parlamentares, entre outros.

Já na mesa de abertura, o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Ronald Santos, afirmou que o principal desafio do Brasil no momento é garantir a manutenção da democracia e de direitos como o acesso à saúde e a liberdade de comunicação. Segundo Santos, é preciso “juntar nossas energias para que esses elementos que traduzem nossa evolução civilizatória não deixem de existir”.

Para ele, a conferência foi uma oportunidade de reflexão sobre o momento atual do país e de discussão de estratégias de ação contra as violações de direitos verificadas nos últimos meses. Ronald Santos ainda pontuou que, no caso específico do Sistema Único de Saúde (SUS), o principal retrocesso foi a promulgação da Emenda Constitucional 95/2016, que congela os investimentos da União na área social por um período de 20 anos. Pois a emenda impede o SUS de enfrentar seu principal desafio, o subfinanciamento.

Renata Mieli, coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), também reafirmou a relevância da conferência. “A mídia produz um discurso hegemônico que desqualifica o serviço público como um todo, mas isso fica mais evidente quando se trata da saúde”, ponderou. Para ela, a luta em defesa da liberdade de expressão e do direito de acesso à informação são complementares à luta pelo direito universal à saúde.

Segundo Renata, é preciso construir uma rede de iniciativas que dialoguem em defesa da saúde pública. “O discurso da mídia comercial encobre as mazelas do sistema privado de saúde e exalta os equipamentos privados como a melhor saída para os problemas do SUS. É uma fala coordenada com os interesses empresariais que atuam no setor da saúde. Desconstruir isso é urgente e fundamental para que a população possa entender a saúde como um direito e passe a ampliar as vozes dos que estão há anos lutando por ele”, afirmou.

Rede de Comunicadoras/es em defesa do SUS

Entre as discussões apresentadas na conferência, destacou-se a criação de uma rede de comunicadoras e comunicadores voltada à produção de conteúdos diversificados sobre o SUS. Isso permitiria à população conhecer melhor este sistema público e exercer de forma mais ampla o direito constitucional à saúde.

A necessidade de comunicadoras/es da mídia alternativa criarem uma rede de difusão de conteúdo diversificado sobre o SUS foi a tônica do segundo dia do encontro, em 19 de abril, quando se debateu sobre o papel da comunicação na defesa da informação em saúde.

A jornalista e blogueira Cynara Menezes apontou um exemplo da necessidade de criação de uma rede alternativa de comunicação: o Programa Mais Médicos, criado no governo da presidenta Dilma Rousseff para melhor distribuir geograficamente a assistência médica no país. “O Programa Mais Médicos recebeu uma abordagem altamente negativa da mídia hegemônica, enquanto a mídia alternativa não fez um contraponto mostrando os avanços trazidos pelo programa”, avaliou Cynara, acrescentando que, em função disso, o resultado foi que o Mais Médicos ficou fragilizado enquanto política pública.

Desconhecimento sobre o sistema público

Adriane Cruz, assessora de Comunicação Social do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), enfatizou que “a avaliação sobre o SUS é pior entre os que não utilizam o sistema”. Para ela, esse é uma prova cabal de que a desinformação está na origem da abordagem preconceituosa da mídia hegemônica em relação ao SUS. Neste ponto do debate, o público presente se manifestou tecendo algumas críticas ao fato de o SUS gastar muitos recursos com publicidade na “grande mídia”, recebendo como retorno um tratamento preconceituoso no noticiário.

Os debatedores também discutiram alternativas para enfrentar o monopólio da comunicação no Brasil. A mesa intitulada “Desafios de Comunicação em Saúde” foi intermediada por Francisca Rêgo, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), e contou com a participação de Alexandre Padilha, ex-ministro da área; da gerente do Canal Saúde da Fiocruz, Márcia Corrêa e Castro; e da conselheira do CNS Carmen Lúcia Luiz. Os palestrantes sustentaram que a própria concepção de saúde coletiva, enquanto direito de todos e dever do estado, é distorcida pela imprensa. “A concepção da mídia privada é de que a saúde coletiva está relacionada somente às ações do Estado (vigilância, controle dos riscos) e não à saúde do indivíduo”, apontou Padilha.

Márcia Corrêa frisou que o enfrentamento ao monopólio da comunicação é necessário para a construção de uma narrativa em defesa do Sistema Único de Saúde. Entre as alternativas, ela citou a atuação de comunicadores nas redes sociais, assim como a qualificação das discussões entre os defensores do sistema. “É necessário fazer esse debate sabendo que todas as mazelas do SUS têm sido apropriadas como discurso para desmontar o sistema. Precisamos nos comunicar para que a população se sinta dona do SUS, sem contribuir com o discurso de desmonte”, destacou.

Equívocos e desinformação

Na última mesa de debates da 1ª Conferência Nacional Livre de Comunicação em Saúde, realizada na quinta-feira, dia 20, foram apresentadas algumas experiências de coletivos de comunicação. Marina Pita, do conselho diretor do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social abordou a comunicação em seus aspectos relacionados ao acesso, produção e distribuição de conteúdo. Ela lembrou também da regulação da propaganda, cujo rol de produtos anunciados não pode “ser prejudicial à saúde. Entretanto, os comerciais de cerveja ainda estão liberados para passar em qualquer horário”.

Marina ainda citou casos de abordagens científicas precipitadas e até mesmo equivocadas em programas de entretenimento e até mesmo na programação mais especializada no tema da saúde, como no caso do tratamento dado ao tema do HIV pela novela teen Malhação, em 2016. No episodio em questão a mocinha Luciana (Marina Moschen) ficou ferida durante um jogo de basquete após esbarrar no colega Henrique (Thales Cavalcanti). Preocupada, a menina correu para a enfermaria do colégio e pediu um coquetel de medicamentos contra o HIV, já que Henrique é soropositivo.

Na época Lucinha Araújo, mãe do cantor Cazuza (morto em decorrência da Aids nos anos 1990) manifestou publicamente sua indignação:

“Depois de 30 anos de trabalho para combater o preconceito e informar corretamente as formas de transmissão do HIV, vemos um programa destinado ao público jovem aconselhar soropositivos a não praticar esportes, a mostrar um médico receitar medicamento antirretroviral numa situação onde dois jovens dão uma cabeçada é no mínimo de chorar.”

 

Outro relato apresentado por Marina se referiu ao programa Bem Estar, também da Rede Globo de Televisão, durante o qual foi dito que o correto é o bebê parar de mamar no peito com um ano e meio de idade ou quando começa a andar. Alertada sobre o desserviço dado à população, a emissora decidiu não atender a um pedido de correção feito pelo Ministério Público.

Neste aspecto, Marina frisou a importância da TV pública como contraponto da comunicação comercial e as perdas advindas da fusão do Ministério da Comunicação com o da Tecnologia, o que ocasionou retrocessos como o adiamento de abertura de editais para funcionamento de emissoras de rádio em comunidades tradicionais. O que também demonstraria a importância da internet como novo meio de comunicação. Também participaram desta mesa Pablo Capilé, do Mídia Ninja, e Bruno César Dias, do Abrasco Divulga. A mediação ficou por conta de Charô Nunes, do Blogueiras Negras.

Propostas do FNDC

Conheça o resumo das propostas do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) para as estratégias de democratização do acesso da população a informações sobre a saúde:

1) Defesa de uma comunicação pautada nos princípios do SUS, como universalidade, equidade, integralidade, descentralização e participação.

2) Defesa da democratização dos meios de comunicação de massa no Brasil.

3) Defesa da comunicação pública e, em especial, da retomada do caráter público da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), como estratégia central para o exercício da liberdade de expressão dos diferentes segmentos de nossa sociedade.

4) Garantia dos canais públicos de televisão previstos no Decreto nº 5.820, que instituiu o Sistema Brasileiro de Televisão Digital, e manutenção do Canal Saúde no sinal aberto digital, com a implementação de mecanismos e estruturas que garantam a gestão democrática e participativa da programação destes canais.

5) Defesa da universalização do acesso à internet banda larga no Brasil.

6) Defesa do princípio da privacidade, previsto no Marco Civil da Internet, e de uma lei de proteção de dados pessoais que garanta aos usuários/as do SUS que sua privacidade não seguirá sendo explorada e usada para atender aos interesses econômicos das empresas de saúde.

7) Defesa da regulamentação da publicidade dirigida às crianças e de produtos que possam colocar a saúde em risco (tabaco, agrotóxicos, medicamentos, álcool, alimentos, etc).

8) Defesa da responsabilização, com a retirada de recursos publicitários governamentais, de veículos que publiquem notícias que induzam à automedicação.

9) Fomento aos espaços de participação direta da população na gestão dos pontos da rede de saúde.

10) Defesa da implementação de estratégias de comunicação em saúde por parte do SUS e de sua rede de atendimento.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações do portal SUS Conecta