Uma "explosão", até uma "revolução". Descrita assim por governo e produtoras, a lei 12.485 entrou em vigor há quatro meses –e agora os canais pagos devem passar duas horas e 20 minutos de programas nacionais no horário nobre, por semana.
É pouco, relativamente. Na média, os canais pagos apresentam 160 horas de programação por semana. E a definição de horário nobre foi dilatada pela lei: vai das 18h às 24h, para canais adultos.
Mas a "explosão de demanda" ou a "pequena revolução" já havia começado antes mesmo da vigência, a partir do momento em que a lei foi aprovada no Congresso e sancionada, no final de 2011.
"Ela conferiu à produção independente um valor dentro do mercado", diz Marco Altberg, presidente da associação das produtoras (ABPI-TV). Ele credita à lei o salto de 170 para 265 no número de associadas, em 2012.
"Tem produtora nova e produtora que antes trabalhava mais com publicidade e cinema e voltou a sua atenção ao conteúdo de televisão", diz Altberg, que dirige a Indiana Produções, do Rio.
Para Roberto T. Oliveira, diretor da TX, de São Paulo, "é nítido" o aumento da demanda por conteúdo nacional. "Os canais se prepararam para cobrir a cota", diz.
Também as produtoras. "A gente já sabia que a lei chegaria. Foi anunciada com bastante antecedência e muitas se prepararam, até com investimentos em roteiro, nessa lacuna e já estão colhendo frutos", diz Oliveira.
Classe C
O estímulo da nova lei de TV paga à produção não se restringe à cota nacional. Luiz Noronha, diretor-executivo de TV da Conspiração, destaca que ela abriu caminho para as operadoras investirem no próprio serviço.
"Depois da lei, as telefônicas se sentiram mais à vontade para investir e oferecer pacotes mais baratos", diz. "O número de assinantes aumentou exponencialmente, muito rápido. Muito mais gente entrou na TV fechada."
No dado mais recente divulgado pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), para novembro, o número de domicílios com TV paga alcançou 15,9 milhões, alta de 28,3% em um ano.
Os novos assinantes vêm principalmente da classe C. A TV paga cresceu, sustenta Noronha, também pelo simples fato de "o brasileiro ter mais dinheiro, por causa da situação econômica mesmo".
Esse público, que já levara canais pagos à ampliação da programação dublada nos últimos anos, busca programas locais. "Ele recebe muito bem o conteúdo nacional", diz o produtor Roberto Muylaert.
Ex-presidente da Fundação Padre Anchieta, que administra a TV Cultura, Muylaert diz que a preferência por programação local também não é novidade na TV paga.
"A grande conquista da Globosat foi lançar o canal Globo News", diz Muylaert. "Alguém duvida que interessa mais a nós do que a CNN?"
Fundo
Mas a implantação da lei 12.485 enfrenta obstáculos. Segundo a ABPI-TV, o mínimo de duas horas e 20 minutos de conteúdo nacional foi adiado por três meses até começar a vigorar em dezembro, sem rigor na fiscalização.
Ao menos uma programadora, a Buena Vista, dos canais Disney, pediu dispensa da cota em 2012, argumentando dificuldade em encontrar programas infantis prontos para licenciamento.
Também cresceu na virada do ano a pressão de produtoras e programadoras de TV paga pela liberação mais rápida dos recursos do Fundo Setorial do Audiovisual.
"O fundo vai ser o grande centro de atenções agora", diz Altberg. "O produtor apresenta um projeto, junto com um contrato com um canal de TV paga, e eles aí obtêm recursos para produzir as séries e outros produtos."
Ponderação
Principal executivo da Globo por três décadas, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, não confia nos efeitos da lei 12.485.
"Sou inteiramente a favor da produção nacional, mas, em princípio, as coisas devem ser resolvidas pelo mercado. Incentivos ajudam, mas não resolvem."