O Fórum Mundial de Mídia Livre realizou nesta sexta-feira (24) uma série de rodas de conversa com representantes de movimentos sociais da área de Comunicação. O evento é parte do Fórum Social Temático 2014 (FST 2014) e visa articular ações efetivas para a democratização da comunicação no País.
Monopólio midiático dificulta exercício da Democracia
Rosane Bertotti, Secretária Nacional de Comunicação da CUT e coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), afirma não haver Democracia real enquanto houver monopólio de mídia. A concentração dos meios impede a pluralidade de opiniões, a emancipação social, serve de instrumento a setores conservadores e distorce projetos políticos.
Para a dirigente, não há dúvidas de que a liberdade de expressão deve ser garantida. Mas é preciso cuidado, pois ela é também utilizada como justificativa de criminalização de movimentos sociais e vozes dissonantes. “Ao mesmo tempo em que a liberdade de expressão é santificada, ela é usada para cercear. Lembrando que são basicamente duas formas de atingir vozes contrárias: ou eu criminalizo ou ignoro. A forma mais prática de cercear é simplesmente não dar visibilidade, mas a criminalização também é forte.”, lembra. “É preciso perceber as nuances do debate. Qual conceito de liberdade de expressão estamos adotando? O que é utilizado para cercear ou o que amplia direitos populares?”, questiona Bertotti.
Plenária nacional da Campanha “Para Expressar a Liberdade”
No dia 7 de fevereiro, a partir das 15h, na sede do Sindicato dos Jornalistas em São Paulo, o FNDC realizará sua primeira plenária nacional de 2014.
“A plenária é importante para discutir projetos que desmontem a lógica concentradora da comunicação atual. É importante, também, para estabelecermos uma estratégia de lutas para 2014”, afirma a dirigente cutista. Entre as prioridades dos movimentos sociais do setor, está o recolhimento de assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Mídia Democrática (PLIP). “Nós precisamos recolher 1 milhão e 300 mil assinaturas. Hoje, não temos 100 mil.”, destaca a dirigente, reafirmando a necessidade de articulação para garantir que o projeto seja votado.
Para Bia Barbosa, jornalista e ativista do Coletivo Intervozes, é importante conciliar os debates sobre Democratização da Comunicação e sobre reforma política, já que ambos são intimamente ligados. “Uma questão interessante de abordar, principalmente pela proximidade do período eleitoral, é a dos políticos donos de mídia. Um dos artigos do PLIP é o que proíbe expressamente a concentração de meios em mãos de detentores de mandato eletivo”, destaca Bia.
Comunicação pública
Segundo a constituição Brasileira, o sistema de Comunicação do País precisa estar articulado em três vertentes: pública, privada e estatal. Para ser público é preciso ser autônomo do Estado, do sistema financeiro e do sistema político.
A Empresa Brasil de Comunicação (EBC), segundo Rosane Bertotti, que também é Conselheira da entidade, foi concebida para ser pública mas tem forte dependência do Estado. “Hoje, como está, se o Ministério do Planejamento decidir não incluir verbas para a EBC no orçamento, ele não inclui. Porque não é uma política de Estado, é uma política de governo. Isso é inadmissível. É preciso garantir autonomia se quisermos realmente construir uma Comunicação pública e de qualidade no Brasil”.
Bia Barbosa complementa lembrando que “não podemos agir como se já tivéssemos a estrutura e as políticas de Comunicação garantidas. Temos que ter consciência de que mesmo as conquistas que tivemos até aqui ainda estão em risco”.
Mas, para Rosane Bertotti, a EBC tem desafios ainda mais básicos do que os políticos. Como, por exemplo, ter abrangência nacional. “Sua TV [TV Brasil] precisa chegar aos lares brasileiros, precisa ser acessível. É claro que a audiência atual é baixa. Mesmo em grandes centros há dificuldade de sintonização e acesso, imagine no campo, em pequenas cidades, ou em territórios indígenas.”, lembra a sindicalista.
Rádios Comunitárias
“A luta pela radiodifusão e o direito à Comunicação é fundamental para o estabelecimento da Democracia no Brasil”, destaca Jerry de Oliveira, do Movimento Nacional de Rádios Comunitárias (MNRC). O ativista se refere à ocupação do espectro de mídia pelos movimentos sociais e comunidade.
“Para os movimentos de rádio comunitária, a questão do espectro vai ser um grande motivo de luta de classes. Talvez até violenta”, afirma o ativista. “Muitos dizem ser melhor ir para a internet, porque é livre. É de se duvidar essa liberdade, mas mesmo que fosse, a questão é outra. É ocupar um espaço que é da sociedade. Precisamos encampar a luta pelo Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Mídia Democrática”. Para ele, rádio comunitária deve ser independente do Estado e do poder financeiro.
Rádio Comunitária não é questão de licença, mas uma concepção de Comunicação para uso coletivo e popular. “Rádio comunitária não é um papel. Tem um conceito mais amplo, de uso comum do povo. E ela precisa ser cultural, participativa, laica e organizativa. Senão reproduz a mesma lógica de valores que já estão aí”, reafirma.
Perseguição às rádios comunitárias
Segundo Jerry, o MNRC solicitou à ANATEL dados sobre emissoras fechadas no País. Nos últimos 7 anos, cerca de 11 mil rádios tiveram suas atividades encerradas pela Agência. “Talvez tenhamos perdido nossa maior chance de revolução na Comunicação. E isso fizeram ao mesmo tempo em que se defende o artigo constitucional que impediria o monopólio da Comunicação”.
Para o ativista, o Estado utiliza duas formas de reprimir o movimento: o primeiro é pôr em prática um artigo da época da ditadura que tipifica como crime a possessão de rádio sem outorga. A outra é a criminalização dos manifestantes. Jerry foi condenado recentemente por intervir no fechamento de uma emissora comunitária na região de Campinas (SP). “E para quem pensa que rádio comunitária é mídia livre, não é. A Anatel fiscaliza querendo que se cumpra as determinações específicas deles. Não há liberdade”.