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Unesco defende alfabetização midiática como forma de fortalecer o uso livre e democrático da mídia

“Alfabetização midiática como ferramenta de transformação”. Essa foi a tese defendida por Alton Grizzle, representante da Divisão de Liberdade de Expressão e de Desenvolvimento da Mídia, vinculada à Organização das Nações Unidas para a Educação, Comunicação e Cultura (Unesco), em seminário realizado hoje, 7 de novembro, no Congresso Nacional, em Brasília (DF).

Grizzle defendeu a posição durante sua palestra no seminário “Educação Midiática e Informacional no Brasil”, que teve como objetivo debater experiências de educomunicação nas escolas brasileiras e dar a conhecer o projeto “Alfabetização Midiática e Informacional”, da Unesco.

O representante do escritório central da Unesco, em Paris, enfatizou que a entidade usa o termo “informação e alfabetização midiática” para o que no Brasil estamos chamando de educomunicação. Tratar sobre o tema, na sua avaliação, é uma forma de “transformar a vida dos jovens no país”.

Para ele, a má compreensão ou a falta de compreensão a respeito da mídia, da comunicação, das bibliotecas, da informação inicia-se na mente dos homens e das mulheres, e é na mente dos homens e das mulheres que se deve corrigir esse mau uso. Grizzle  relata que o trabalho da Unesco sobre a temática sse concentra em fortalecer o uso livre e democrático da mídia.

“Vivemos num mundo virtual. Acredito que grande parte de nós pode se entender em algum lugar deste mundo. Seja no mundo da televisão, do Facebook ou do Radiopélago, nós vivemos num mundo virtual. Tudo que fazemos, tudo que aprendemos sobre o mundo ao nosso redor é mediado neste mundo virtual”, aponta ele, refletindo sobre a relevância da alfabetização midiática para que se comunique e se informe eticamente.

Grizzle enfatizou a necessidade de que se reconheça que cada cidadão é co-criador da informação e do conhecimento e que tem uma mensagem a dizer. Dessa forma, deve ser empoderado para que possa acessar os meios para expressar a sua própria comunicação. Respondendo à crítica de conselheiros do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, sobre a função jornalística nos projetos, ele foi enfático: “Jornalismo para cidadão não substitui jornalismo profissional. É complemento”.

Educação midiática

A iniciativa de realização do seminário partiu do conselheiro Ismar de Oliveira Soares, que também preside a Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação (ABPEducom). Para ele, é necessário discutir sobre a contribuição que um programa de educação midiática e informacional pode oferecer para a melhoria dos processos educativos, “tanto na educação formal escolar quanto na educação não formal, na família e nas organizações sociais”.

Soares lembrou que o tema do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil”, ressalta As possibilidades da educomunicação, que permite aos estudantes uma oportunidade de compreender questões de relacionamento e de contextos sociais da sociedade brasileira.

“Para alguém ter tido um bom desempenho na prova do Enem, era necessário que tivesse tido também uma educação midiática e informacional que correspondesse a essa necessidade. Estamos falando de algo relativo ao currículo das escolas e algo relativo à prática social, especialmente no que se refere ao direito de conhecer o sistema de comunicação e de nele intervir a partir da perspectiva da cidadania”, destacou Soares.

Analfabetos funcionais

Conforme Raquel Paiva, professora e pesquisadora do Laboratório de Estudos em Comunicação Comunitária da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), nas duas últimas semanas um conceito muito utilizado nas décadas de 1970 e 1980 tem voltado a figurar na mídia, o dos “analfabetos funcionais”, referindo-se principalmente à condição suscetível de manipulação.

“Até o início do século passado, nós tínhamos instituições responsáveis por fazer a mediação entre o homem e o mundo. Tínhamos o trabalho, a escola, a família, a religião, a política. Enfim, estruturas que eram responsáveis por realizar essa mediação, ou seja, explicar o mundo para o sujeito, inserindo o sujeito no mundo. Entretanto, tudo isso mudou. Essas instituições foram completamente invadidas pelo que nomeamos midiatização, o que significa neste momento a concretização total do domínio da informação, com os seus valores e regras”, ressalta paiva

Paiva defende que o poder midiático seja reconhecido como tal, como primeira medida de enfrentamento à situação. “O não reconhecimento significa adotarmos a compreensão de que se trata de algo natural, da natureza, e não é. Trata-se de um sistema, e este sistema carrega as imperfeições da natureza humana. Então, se temos um sistema político voltado para a inclusão social, o sistema de produção de mensagens é aberto a todos, os quais passam a atuar não apenas como consumidores da produção. Se, por outro lado, temos um sistema de concentração de empresas responsáveis pela produção dessas mensagens [entretenimento e notícias], as pessoas são, em maior número, meros consumidores passivos”.

A pesquisadora defende a necessidade de ser sistematizada a leitura crítica da produção midiática de forma a reduzir “o fascínio e, consequentemente, o pouco questionamento crítico da produção”. Ela professora lembrou que alguns institutos e teóricos já se preocuparam com a força dessa estrutura midiática e como esse quadro poderia transformar a humanidade, caso do relatório MacBride. “Esse relatório – Many voices, one world (Muitas vozes, um só mundo) – foi divulgado em 1980, na Conferência Geral da Unesco, e chocou o mundo. Por quê? Além do diagnóstico, propunha uma nova ordem comunicacional, buscando promover a paz e o desenvolvimento humano”, enfatizou ela, lamentando que o relatório nunca tenha sido efetivamente executado – embora tenha permanecidocomo um referencial teórico para aqueles que acreditam na democratização da comunicação.

Educomunicação na prática

Nessa perspectiva, as estudantes Clarice Villari, do Dante Alighieri, e Maria Eduarda Silva de Oliveira, da Escola de Ensino Fundamental Casablanca, da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, apresentaram o projeto “Educom.geraçãocidadã.2016”, uma experiência realizada entre as duas instituições de ensino – uma particular e a outra pública – com a implementação de práticas de educomunicação voltadas para a alfabetização em educação midiática e informacional. As escolas já possuíam projetos de educomunicação e, por iniciativa do professor Ismar Soares, realizaram A ação em parceria.

“Fomos apresentados ao projeto na mesma semana e tivemos nosso primeiro contato visual via Google Hangouts. Então nós nos conhecemos um pouco virtualmente antes de nos conhecermos pessoalmente. Antes de o projeto começar, assistimos a um vídeo, que seria o início da nossa reflexão, chamado “Nós, os Povos!”, da ONU, com as 17 metas da organização. A partir desse vídeo, tivemos a nossa reflexão inicial sobre o mundo, que depois daria origem à maioria das atividades do projeto”, declarou Clarice Villari.

De acordo com Maria Eduarda de Oliveira, a iniciativa proporcionou uma compreensão melhor sobre a mídia. “Foi uma contribuição muito grande para nossas vidas, uma nova forma de ver um mundo e de ser mais críticos ao que está ao nosso redor”. O Educom.geraçãocidadã.2016 possui página no Facebook e um canal no YouTube, onde estão reunidas a informações sobre o projeto.

Saber interpretar a mídia

A proposta central dos temas que envolvem educomunicação e alfabetização midiática é a de habilitar pessoas de todas as idades, de todos os sexos e de qualquer nível de instrução a ler, a interpretar a produção que hoje é responsável por expressar valores e ditar na sociedade o que deve ser feito e aceito. A importância desse tema é visível ao se observar os dados da Pesquisa Brasileira de Mídia de 2015, elaborado pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, junto com o Ibope: a TV segue sendo a principal fonte de informação e entretenimento para 95% da população, com os jovens de 14 a 25 anos assistindo uma média de quatro horas diárias. O uso da mídia digital aparece em segundo lugar, alcançando 48% dos brasileiros, com um consumo de 5 horas diárias. O principal acesso da mídia digital são as redes sociais, em especial, o Facebook.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

AGU tenta conter vitórias obtidas nos tribunais contra concessões de rádio e TV para políticos

A Advocacia-Geral da União (AGU) requereu ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, “medida cautelar incidental” com o objetivo de suspender o andamento de todos os processos e decisões judiciais que tenham relação com a outorga e a renovação de concessões de rádio e televisão mantidas por empresas de parlamentares. A medida pretende conter uma série de vitórias que as entidades do campo da democratização da comunicação estão obtendo nos estados.

Em resposta à ação da AGU, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), autor de duas ações no Supremo que tratam deste tema, em conjunto com representantes do Intervozes e da Artigo 19, organizações que solicitaram participar das ações na figura de amicus curiae, se reuniram na última quarta-feira (26) com o ministro Gilmar Mendes. O PSOL e as entidades entregaram ao relator das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 246 e 379 uma petição solicitando que ele, antes de analisar o pedido da AGU, conceda as medidas liminares solicitadas nas ADPFs.

As arguições ajuizadas no STF estão fundamentadas sobre o fato de que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que políticos com mandato eletivo sejam beneficiados com a outorga de concessões de emissoras de rádio e de canais de televisão. A ADPF 246 foi protocolada em dezembro de 2011, enquanto que a ADPF 379, em dezembro de 2015. Segundo Bráulio Araújo, advogado do PSol, a “ jurisprudência vem avançando de forma sólida no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade da participação de políticos titulares de mandato eletivo como sócios de empresas de radiodifusão.”

Araújo menciona na petição que, em julgamento da Ação Penal 530, em novembro de 2014, o Supremo Tribunal Federal (STF) já afirmava que os artigos 54, inciso I, alínea “a”, e 54, II, “a”, da Constituição Federal, proíbem claramente que deputados e senadores sejam sócios de pessoas jurídicas com titularidade sobre concessão, permissão ou autorização de radiodifusão. Além disso, em julgamento de agravo de instrumento publicado em outubro deste ano, a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (São Paulo) confirmou a liminar deferida pelo desembargador Johonsom di Salvo em março de 2016, suspendendo a execução dos serviços de radiodifusão prestados por empresas que possuem congressistas em seu quadro de sócios. Isso justamente em razão da violação ao artigo 54 da Constituição.

Influência indevida de políticos
Por sua vez, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em manifestação expressada em agosto deste ano, apoiou a iniciativa das ADPFs, considerando que a participação de parlamentares em empresas de radiodifusão “confere a políticos poder de influência indevida sobre importantes funções da imprensa, relativas à divulgação de informações ao eleitorado e à fiscalização de atos do poder público”. Araújo ainda relata que decisões tomadas em outros tribunais também reforçam o entendimento de que a Constituição veda a celebração de contratos públicos, entre os quais se encontram as permissões e as concessões de radiodifusão, firmados entre a Administração Pública e pessoas jurídicas que tenham como sócios os políticos titulares de mandato eletivo.

Um exemplo disso seria o julgamento de apelação (nº 102.771.5/0-00) pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, que decidiu que, “em virtude das incompatibilidades negociais previstas pelos artigos 54, I, “a”, e 54, II, “a”, da Constituição Brasileira, empresa que possui políticos titulares de mandato eletivo como sócios não pode participar de licitação pública, nem pode firmar ou manter contratos com a Administração”. Outro exemplo seria a decisão sobre apelação cível (nº 2006.011311-6) do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que anulou um contrato administrativo celebrado pelo Poder Público com uma empresa que tinha deputado federal como sócio-cotista, em razão da proibição prevista no artigo 54 da Constituição. O tribunal condenou os responsáveis pela celebração do contrato pelo crime de improbidade administrativa, além de ordenar a devolução dos valores recebidos.

Tribunais apontam inconstitucionalidade
Bráulio Araújo rebate as alegações da AGU sobre as ADPFs 246 e 379, de que “a Constituição não proíbe que políticos sejam sócios de empresas de radiodifusão”. Para ele, os tribunais têm dado uma resposta firme a esse discurso: “a Constituição proíbe sim, de forma clara, a participação de políticos como sócios de empresas de radiodifusão”. Para ele, as decisões judiciais tomadas até o momento dialogam com as duas ADPFs e têm sim se posicionado contra a prática inconstitucional de participação de políticos como sócios de empresas de radiodifusão. “Ao combater essa inconstitucionalidade, essas decisões estão promovendo a segurança jurídica, e não o contrário, como sustenta a AGU. Não há direito adquirido com a manutenção de práticas inconstitucionais”, declara o advogado.

A petição entregue pelo Intervozes, Artigo 19 e Partido Socialismo e Liberdade ao ministro Gilmar Mendes relata que “a tutela jurisdicional ordinária é o único instrumento que vem sendo capaz de combater essa prática inconstitucional, ainda que com os limites inerentes aos processos ordinários”, e solicita que seja indeferida a medida cautelar requerida pela AGU por flagrante falta de base legal. Agora, cabe ao relator da ação pedir à presidenta do STF, ministra Cármen Lúcia, uma data para o julgamento do tema pelo plenário do tribunal.

“Ficamos surpresos com essa atuação da AGU. Claramente é uma resposta do governo federal a um pedido de deputados que começaram a ser condenados nas ações que o Ministério Público Federal moveu em seus estados de origem e que agora pretendem usar o STF para manter seus privilégios ilegais”, analisa Bia Barbosa, coordenadora do Intervozes, que esteve na reunião com o ministro Gilmar Mendes. O Intervozes é uma das organizações que formalizou uma representação, junto ao MPF em diferentes estados, contra o controle de emissoras de rádio e TV por políticos. “Em vez de coibir essa inconstitucionalidade, por meio do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, que outorga as licenças e tem o dever de fiscalizar o setor, o governo federal age para impedir que a Justiça atue no âmbito dos estados para barrar as ilegalidades. É uma vergonha. Esperamos que o Supremo não impeça os processos em andamento em todo o país e que julgue rapidamente as ADPFs, que já estão na Corte há bastante tempo”, conclui Bia.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Entidades denunciam PL que não garante Banda Larga para a população e entrega o patrimônio público para o setor privado

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados realizou nesta terça-feira, dia 25, uma audiência pública para discutir o Projeto de Lei (PL) 3453/2015, que prevê a prestação do serviço de telefonia fixa por autorização. O projeto altera a Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/1997), tornando mais flexíveis as regras sobre as modalidades de outorga de serviços de telecomunicações. Na prática, isso significará que determinados serviços hoje outorgados na forma de concessão poderão no futuro ser outorgados na modalidade de autorização. Esta mudança fará com que as empresas tenham menos deveres e mais privilégios.

O PL 3453, que está em análise na CCJC, gera divergências entre os deputados, mas também é alvo de duras críticas de entidades ligadas à democratização da comunicação e de órgãos de defesa do consumidor. Segundo Renata Mielli, coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), o projeto de lei “atenta contra o direito das pessoas de terem acesso à comunicação”. Mielli lembra que a Constituição Federal dá ao Estado o dever de garantir os serviços essenciais para a população. “Hoje o serviço essencial é o serviço de banda larga, que deve ser atendido pelo poder público. Esse projeto (PL 3453) não apresenta exigências regulatórias e não garante a universalização do acesso com tarifas justas”, apontou.

Por outro lado, Juarez Quadros do Nascimento, presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), e André Müller Borges, secretário de Telecomunicações do Ministério da Ciência e Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), consideram que a diminuição na presença de usuários na telefonia fixa e o crescimento do uso de dados para internet justificam a proposta em análise. Segundo eles, o PL garante o dinheiro necessário paraa realização de investimentos na ampliação da Banda Larga. Os dois também se juntam para criticar a legislação atual no que diz respeito à obrigatoriedade das empresas de devolverem a infraestrutura em uso ao poder público, ou seja, ao cidadão. Nascimento diz que os “bens reversíveis atrapalham a captação de recursos e investimentos”. Borges vai ainda mais longe, afirmando que o “bem reversível sempre pertenceu às redes de telecomunicações”.

O representante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social na audiência, Jonas Valente, rebateu enfaticamente as afirmações. “Ter zelo pela coisa pública não é entregar R$ 100 bilhões em bens públicos quase de graça para empresas privadas. Esse é um patrimônio da população brasileira’, protestou. Valente enfatizou que esta não é uma questão “telefonia fixa X banda larga”, destacando que o serviço essencial hoje para a populaçãobrasileira é o acesso à internet. Sendo assim, o Estado deve garantir a universalização da banda larga. “A questão aqui é que o Poder Público promova a modernização dos setores, construa planos de banda larga de forma a garantir que as empresas invistam e que o serviço chegue com valor acessível a toda a população. Esse projeto queestá aqui não contribui para isso”, ponderou.

Além disso, o Projeto de Lei 3453 apresenta conflitos com a Constituição Federal. “Há dúvidas se a migração da concessão para a autorização, com entrega dos bens reversíveis, não viola o artigo 37 da Constituição, que trata dos princípios que devem orientar as licitações. Em 1998, quando foi feita a concessão, o termo dizia que os bens deveriam ser devolvidos para a União. O princípio da impessoalidade está sendo ferido”, lembrou Flávia Lefèvre, representante da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), no debate.

Sobre as argumentações do governo de que não há recursos públicos para investimentos em banda larga, Lefèvre destacou que apenas 1% do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST) está sendo aplicado com este fim. Ela ainda ressaltou que o modelo privado de prestação do serviço vigente no Brasil penaliza o usuário com uma das maiores tarifas do mundo, além de concentrar sua oferta nas mãos de poucas empresas. Ou seja, a população paga a conta, que é alta, e a riqueza fica concentrada nas mãos de um pequeníssimo grupo de companhias privadas.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Definidas comissões que farão análise das medidas sobre EBC e concessão de rádios e TVs

As comissões mistas encarregadas de analisar e emitir parecer sobre as Medidas Provisórias (MPs) 744/2016, que estabelece mudanças na estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), e 747/2016, que altera o processo de concessão de rádios e TVs, foram instaladas e elegeram seus presidentes e relatores na quarta-feira, dia 19 de outubro.

A MP 744/2016 prevê a extinção do Conselho Curador da EBC. Assim, a empresa passaria a ser administrada por um Conselho de Administração e por uma Diretoria-Executiva, mantendo em sua estrutura ainda um Conselho Fiscal. A medida também dá uma nova composição ao Conselho de Administração da empresa, reduzindo a Diretoria-Executiva em dois diretores, e estabelece que todos os membros serão nomeados e exonerados pelo Presidente da República.

Risco ao caráter público da EBC
A Medida Provisória nº 744 altera a Lei nº 11.652, de 7 de abril de 2008, que criou a empresa. O Conselho Curador extinto pela MP é uma das principais conquistas da sociedade civil organizada com atuação no campo da comunicação. Afinal, uma gestão democrática só se estabelece de fato se houver um modelo de gestão com participação social – o que foi conquistado pelo Conselho Curador.

Outro retrocesso trazido pela MP 744 é o fim do mandato de diretor-presidente, que, pelo modelo previsto na lei, só poderia ser destituído por dois votos de desconfiança do Conselho Curador. Essa alteração faz com que o comando da empresa fique refém de nomeações e exonerações por parte da Presidência da República. A MP acaba por alterar o artigo da lei que reafirma a autonomia do sistema público de radiodifusão em relação ao governo federal para definir a produção, programação e distribuição de conteúdo.

Medida favorece aparelhamento
Segundo Jonas Valente, coordenador de formação do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF e jornalista concursado da TV Brasil, com o discurso de “atacar o partidarismo e o aparelhamento pelo governo”, o atual governo federal retira os principais mecanismos que justamente protegiam a empresa – com todos os seus defeitos e limites – deste citado partidarismo e aparelhamento pelos governos de plantão.

“A MP escancara o que o governo Temer queria: extirpar o diretor-presidente indicado na época de Dilma Rousseff, acabar com a participação social na empresa e atacar os instrumentos concretos que configuravam o seu caráter público. Ou seja, na prática, a MP abre a porteira para a EBC voltar a fazer comunicação governamental”, lamenta.

Violações à Constituição Federal
A MP é mal vista por todos os segmentos sociais que defendem a democratização da comunicação, pelas entidades sindicais das categorias que atuam na EBC (jornalistas e radialistas) e pela Comissão de Empregados da empresa. No começo do mês, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, também se posicionou sobre a medida, dizendo que ela “traz violações formais e materiais à Constituição Federal”, e encaminhou para o Congresso Nacional nota técnica sobre o tema.

A Comissão que irá analisar a MP 744 será presidida pelo deputado federal Ságuas Moraes (PT-MT), tendo o senador Paulo Rocha (PT-PA) como vice-presidente. Foram designados como relator o senador Lasier Martins (PDT-RS), e como relatora-revisora a deputada federal Angela Albino (PCdoB-SC). Compõem a comissão 12 senadores e 12 deputados federais, havendo o mesmo número de suplentes. Foram apresentadas 47 à Medida Provisória 744, que agora segue com a relatoria.

Mudanças na concessão de rádios e TVS
A MP 747/2016, por sua vez, altera o processo de concessão de rádios e TVs, determinando que interessados em renovar a concessão ou a permissão devem apresentar requerimento nos 12 meses anteriores ao término do respectivo prazo da outorga. As entidades que não fizerem o pedido de renovação no tempo previsto serão notificadas para que se manifestem em até 90 dias. Também será possível regularizar permissões que já estejam vencidas. Estas determinações “afrouxam” os deveres dos concessionários que prestam serviço por meio de uma concessão pública.

Na prática, a medida concede anistia ampla e geral às emissoras que estavam com suas concessões vencidas ou que não tinham solicitado a renovação no prazo legal. Quase a metade das emissoras de rádio de todo o país estão nesta situação, além de um grande número de emissoras de TV.

Discriminação às rádios comunitárias
Assim como a outra medida citada acima, também a MP 747 recebe duras críticas das entidades que defendem a democratização da comunicação. Isso porque ela discrimina a comunicação pública, anistiando outorgas privadas e permitindo que todas obtenham a renovação, mas deixando de fora as rádios comunitárias que também estão com a autorização vencida ou prestes a vencer.

O fato da MP 747 ignorar as rádios comunitárias que também precisam ter suas autorizações renovadas não é casual. O governo de Michel Temer deixou de lançar dezenas de editais previstos para a criação de novas emissoras comunitárias, prejudicando estas comunidades e impedindo as rádios de fazer publicidade.

A comissão mista da MP 747/2016 será presidida pelo senador Cidinho Santos (PR-MT), tendo como vice a deputada Gorete Pereira (PR). O relatório será elaborado pelo deputado Nilson Leitão (PSDB-MT) e a relatora-revisora será a senadora Lúcia Vânia (PSB-GO). Compõem a comissão 12 senadores e 12 deputados federais, havendo o mesmo número de suplentes. Foram apresentadas 41 emendas à medida provisória, que tem como prazo final de funcionamento o dia 1º de dezembro, podendo ser prorrogado por mais 60 dias. A matéria segue neste momento com a relatoria.

O que são as medidas provisórias?
Medida provisória é um instrumento com força de lei elaborado pelo presidente da República em casos de relevância e urgência, cujo prazo de vigência é de 60 dias, prorrogáveis uma vez por igual período. O documento legal produz efeitos imediatos, mas depende de aprovação do Congresso Nacional para sua transformação definitiva em lei.

Depois de aprovada na Câmara e no Senado, a MP (ou o projeto de lei de conversão, se houver modificação do texto original) é enviada à Presidência da República para sanção. O presidente tem a prerrogativa de vetar o texto de forma parcial ou integralmente, caso discorde de eventuais alterações feitas no Congresso Nacional.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Campanha contra ataques à liberdade de expressão marca os 25 anos do FNDC

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) completou 25 anos nesta terça-feira, 18. A data foi celebrada com um ato realizado na Câmara dos Deputados, marcado pela trajetória do FNDC em defesa de uma mídia democrática no Brasil.

Em 25 anos, a entidade teve atuação significativa na discussão e formulação de políticas públicas, na criação das leis do Cabo, das Rádios Comunitárias e do Marco Civil da Internet, na construção da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e na realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), além de ter adotado iniciativas próprias importantes no campo da comunicação, como o Projeto de Lei da Mídia Democrática.

A presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), José Maria Braga, relembrou o relevante papel exercido pelo jornalista e pesquisador Daniel Herz, que teve atuação imprescindível nos debates da Constituinte de 1988. Estes debates resultaram na criação do capítulo V da Constituição Federal, dedicado especialmente à comunicação, e na criação do próprio FNDC em 1991.

Braga também ressaltou que o momento é de somar forças para a luta pela democratização da comunicação. “Nesse ano, completamos 10 anos da morte de Daniel Herz. Esse é um simbolismo de que essa deve ser uma luta permanente de todo cidadão que presa pela democracia no Brasil. Precisamos resistir e avançar!”, afirmou.

Para o coordenador da Federação dos Radialistas (Fitert), Zé Antônio, um dos maiores desafios dos trabalhadores é conseguir romper com as estruturas vigentes para implementar uma efetiva democratização da comunicação. O posicionamento foi reforçado que foi reafirmado pela representante da Associação Mundial das Rádios Comunitárias (AMARC), Tais Ladeira. “Precisamos democratizar a comunicação a partir da democratização popular, das comunidades para as comunidades”, justificou Tais.

Segundo Bia Barbosa, secretária-geral do FNDC e coordenadora do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação, houveram poucos avanços na agenda da democratização da comunicação nos últimos anos. “Não foi possível construir uma correlação de forças que permitissem um maior avanço na pauta, mas esse momento pós-golpe precisamos estar ainda mais organizados e mobilizados para não permitir que haja retrocessos já que a agenda do governo vem acabando com os poucos espaços de participação da sociedade”, lamenta.

Na ocasião a coordenadora-geral do FNDC, Renata Mielli, apresentou a campanha nacional contra a crescente ameaça e violações à liberdade de expressão no Brasil. A campanha “Calar Jamais” visa recolher denúncias sobre violações à liberdade de expressão no Brasil. “As acusações que forem comprovadas serão encaminhadas para órgãos competentes tanto no Brasil quanto no exterior” afirma.

Mielli destacou ainda que o fórum acompanhará as pautas específicas da área com objetivo de evitar retrocessos totais no campo da comunicação, e terá como pauta, por exemplo, o reestabelecimento do conselho curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e a defesa do Marco Civil da Internet. Ela também atacou a PEC 241 (que congela os gastos públicos por 20 anos). “Quando se passarem 20 anos ainda estaremos presos em 2016 e o governo está adotando essas medidas violando a liberdade de expressão e tentando intimidar quem pensa diferente”, desabafa.

No evento foi exibido um vídeo de divulgação da campanha que reúne os casos recentes de censura e perseguições que conta com a participação de personalidades como José Trajano, Gregório Duvivier, Leonardo Sakamoto e Paulo Henrique Amorim. Em comum, todos foram vítimas de algum tipo de cerceamento à liberdade de expressão. São denunciados ainda a retirada forçada de conteúdos, o fechamento do Conselho Curador da EBC, além da criminalização de ativistas e movimentos sociais que vão às ruas exercer a liberdade de expressão.

O deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), presidente da FrenteCom, chamou atenção para a necessidade de quebrar a “bolha” das redes sociais para a difusão de ideias. “Os meios de comunicação configuram o pensamento da população e infelizmente não permitem o direito ao contraditório, por isso precisamos lutar, não somente pela democratização dos conteúdos, mas também dos meios de produção e ampliação do acesso a internet”.

O parlamentar ainda destacou que o momento atual é de resistência ao governo golpista que ameaça todas as conquistas sociais obtidas nos últimos anos e lembrou um trecho da música de Belchior, “Como Nossos Pais”, afirmando que a luta de hoje é a mesma de 1964, período que foi instalado o regime militar no Brasil. “Ao ver o vídeo me veio na cabeça o trecho de uma música ‘Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais’, estamos vivendo um momento de privação de direitos e não podemos vacilar”, alertou o deputado.

“Calar Jamais!”
A campanha “Calar Jamais!”, pode ser acessada pelo site www.paraexpressaraliberdade.org.br que vai recolher denúncias sobre violações à liberdade de expressão no país.  As denúncias que forem comprovadas serão encaminhadas para os órgãos competentes dentro e fora do Brasil.

A festa de aniversário também incluiu a premiação da designer Luciana Lobato, vencedora do concurso Selo Comemorativo de 25 anos do FNDC.

Também estiveram presentes a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), as deputadas federais Erika Kokay (PT-DF), Luciana Santos (PCdoB-PE), o deputado federal, Léo de Brito (PT-AC) e representantes da sociedade civil e de movimentos sociais.

Conheça o FNDC

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) foi criado em julho de 1991 como movimento social e transformou-se em entidade em 20 de agosto 1995. Foi atuante na finalização dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte que preparava a nova Constituição Federal. Ao final, apesar de instituído o capítulo V da Carta Magna, com artigos que tratam especificamente da comunicação, as entidades de classe que formavam a então Frente Nacional por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC) entenderam que era preciso manter um esforço permanente de mobilização e ação na busca de políticas, de fato, democratizantes.

Assim, criaram, em 1991, a associação civil FNDC, com atuação no planejamento, mobilização, relacionamento, formulação de projetos e empreendimento de medidas legais e políticas para promover a democracia na Comunicação.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação