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Entidades de defesa dos consumidores apontam problemas no projeto que modifica modelo de Telecom no Brasil

IDEC e Proteste destacam falta de clareza sobre a forma como o governo vai definir compromissos com as operadoras que migrarem do regime público para o privado

Em debate realizado nesta terça-feira, dia 14, no 47º Encontro Tele.Síntese, em Brasília, representantes de empresas de telecomunicações, do governo federal, da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) discutiram a revisão do modelo de telecomunicações em curso no Brasil, proposto pelo Projeto de Lei 79 (PLC 79).

A mesa de abertura do encontro contou com as presenças da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), de Juarez Quadros, presidente da Anatel, e de André Borges, secretário de Telecomunicações do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

O presidente da Anatel, Juarez Quadros, propôs às concessionárias antecipar a redução da VUM (Valor de Uso da rede Móvel, que a operadora de telefonia fixa paga à operadora de telefonia celular para uma chamada de fixo para móvel), que estava prevista para 2019, para o ano que vem. Segundo ele, a medida é mais uma tentativa de dar sobrevida ao serviço de telefonia fixa, que perde assinantes desde 2014.

A redução, que vem ocorrendo desde 2016, tem diminuído o custo das ligações de telefones fixos para celulares. A proposta não foi bem recebida pelas empresas, que não têm nenhum interesse em melhorar o serviço, menos ainda em manter o funcionamento da telefonia fixa no Brasil.

Quadros afirmou que o PLC 79/2016 é essencial para atender à demanda por internet banda larga no país e lembrou que, apesar de não pode dar palpite sobre a tramitação da matéria no Legislativo, ela deveria ser mais debatida no Senado Federal, inclusive em plenário.

O secretário de Telecomunicações do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, André Borges, informou que o órgão deverá abrir uma consulta pública para discutir a prioridade de investimentos na expansão da banda larga em algumas semanas. O secretário também ressaltou que haverá outras alternativas em debate para a expansão da banda larga, entre elas a retomada do programa Cidades Inteligentes.

A senadora Gleisi Hoffmann deixou claro que a oposição vai continuar brigando por um trâmite que envolva mais debate e discussões. “Queremos que o PLC 79 passe pelas Comissões de Economia e de Ciência e Tecnologia no Congresso. São áreas que terão muito impacto com as mudanças”, frisou.

Soberania Nacional

Durante sua fala, a senadora Gleisi Hoffmann afirmou que iria encaminhar um pedido de informações ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, à Casa Civil, à Telebrás e ao Ministério da Defesa sobre o processo de “privatização do satélite brasileiro”, que foi divulgado pela Telebrás no dia 23 de fevereiro como um modelo de negócios de comercialização com previsão de venda de três lotes de transponders, somando 89% da capacidade da banda ka, para operadoras privadas.

Segundo a senadora, o Ministério da Defesa fez pressão durante a gestão da presidenta Dilma Rousseff para que o Brasil fizesse investimentos em um satélite de comunicação próprio, inclusive por uma questão de soberania. “Se era uma questão de soberania, porque deixou de ser? Os setores militares concordam com isso? Fizemos investimentos de R$ 2 bilhões e agora isso será jogado no lixo?”, questionou. Ela pedirá também que o governo participe de audiência pública no Senado para dar explicações sobre a forma como está conduzindo esse processo.

Flávia Lefèvre, advogada da Proteste, criticou a condução do PLC 79/2016, principalmente no Senado. “Não foi feito de forma transparente e nem levou em conta os riscos associados à migração do serviço”, analisou. Ela leu trechos de um documento em que o Tribunal de Contas da União (TCU) aponta prejuízos ao erário por inexatidão do cálculo dos bens reversíveis.

Segundo Lefèvre as telecomunicações precisam, sim, de novas regras, mas certamente não é este projeto que irá atender ao interesse público. “A LGT teve mais 2 anos de discussões na sociedade e no Congresso, no cenário atual onde as tecnologias e demandas são muito maiores é necessário ampliar e aprofundar o debate com a sociedade”, acentuou.

Muito poder, pouco compromisso

Rafael Zanatta, pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), reiterou a posição da entidade sobre o PLC 79. Na visão da organização, subscrita por outras organizações sociais participantes da Coalizão Direitos na Rede, o projeto dá muito poder à Anatel e ao Executivo, enquanto elimina compromissos das concessionárias com a universalização de serviços.

Zanatta frisou que o texto falha em estabelecer estes compromissos. “O procedimento de criação desses deveres é extremamente vago, abrindo espaços para capturas regulatórias e diminuição do controle social”, defendeu.

Para ele, deixar a regulamentação das obrigações nas mãos apenas do governo “afronta a arquitetura de governança do uso e expansão da internet no Brasil, definido pelo Marco Civil da Internet. Se os compromissos de investimento servem à inclusão digital e redução de desigualdades, então a lógica a se seguir não é somente a da Lei Geral de Telecomunicações, mas também a da sistemática criada pelo Marco Civil da Internet”, afirmou.

O advogado reclama da postura adotada pelos defensores do PLC 79, que, a seu ver, tentam focar o debate no valor dos bens reversíveis. “O que sempre nos preocupou, mais do que a polêmica dos bens reversíveis, foi o desenho regulatório para estimular investimentos em regiões mais pobres e os riscos de opacidade e captura que a agência pode sofrer no processo de negociação do ‘onde investir’ e do ‘como investir’, uma vez abandonados os instrumentos jurídicos do regime público previstos na Lei Geral de Telecomunicações”. Ele ressaltou que não está claro para especialistas e profissionais do setor como a Anatel pretende firmar compromissos de investimento em banda larga e como irá ocorrer o cálculo do valor da migração do serviço de concessão para autorização.

Consultoria e mapeamento

Ainda sobre bens reversíveis, o presidente da Telefônica, Eduardo Navarro, disse que a empresa irá contratar uma consultoria para fazer o levantamento dos seus ativos, a fim de identificar o que pode ser classificado como bem reversível, de acordo com o que foi estabelecido na época da privatização. Segundo ele, essa iniciativa está relacionada à necessidade de transparência nas discussões que envolvem o PLC 79.

Nesta linha, o conselheiro da Anatel Igor de Freitas relatou que a agência contratou o Ipea para definir critérios de priorização dos investimentos, levando em conta dados objetivos sobre as situações em que os reflexos da banda larga são mais efetivos e as situações em que são menos efetivos. O resultado deste trabalho foi a divisão dos municípios brasileiros em seis grupos, levando em conta população, PIB, participação industrial e acesso à internet. O trabalho, que está perto de ser finalizado, será apresentado em abril em um workshop.

De acordo com o conselheiro, um mapa detalhado produzido a partir o estudo do Ipea, com informações sobre a aplicação de recursos e seus efeitos para a economia local e a geração de empregos, irá subsidiar o novo Plano de Banda Larga que está sendo preparado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.

Pequenos provedores

Helton Posseti, gerente da Abrint, que representa pequenos provedores de acesso, afirmou no encontro que é importante assegurar que os investimentos decorrentes das políticas públicas não inibam o desenvolvimento dos provedores regionais, muitos dos quais estão em operação nas cidades que as grandes empresas categorizam como pouco atrativas. “Achamos que os investimentos devem ser naquelas cidades em que realmente apenas os investimentos públicos vão viabilizar o acesso”, ponderou.

Ele questionou ainda se não seria o caso desses investimentos serem coordenados pela Telebrás, e não pelas próprias empresas, e lembrou que a estatal teve um efeito positivo sobre os preços cobrados pelos serviços naqueles locais em que conseguiu atuar. “O problema da Telebrás é ter pouca capilaridade”, concluiu.

Visão dos grandes

Entre as grandes operadoras, não parece haver muitas divergências sobre quais deveriam ser as políticas do governo para possibilitar a expansão da infraestrutura: uso de recursos públicos para as áreas de baixa atratividade e desonerações fiscais. Avaliações divergentes, contudo, começam a aparecer quando se analisa o que deve ser feito com os investimentos realizados com os recursos provenientes da migração do modelo.

Fundos de Financiamento
André Borges destacou às restrições orçamentárias do governo e afirmou que é preciso discutir caminhos alternativos, como fundos setoriais que permitam a expansão do serviço. Além dos recursos provenientes da revisão do modelo de telecomunicações, outra fonte de financiamento são as obrigações previstas nos Termos de Ajustamento de Condutas (TACs). Segundo ele, dois desses acordos já foram aprovados na Anatel – da Oi e da Telefônica -, mas dependem do aval do TCU.

A criação de um novo “Fust” (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) encontra apoio em vários representantes empresariais e governamentais. O presidente da Oi, Marco Schroeder defendeu a reavaliação do modelo de fundos setoriais, lembrando que apenas 7% dos R$ 80 bilhões arrecadados de 2001 a 2016 foram utilizados.

Flávia Lefèvre fez uma ressalva de que o fundo estava sendo usado, mas para outros fins e que a Anatel não permitiu acesso aos documentos sobre o uso do Fust.

O Idec também ressaltou que o PLC 79 falha ao tratar do Fundo de Universalização de Serviços de Telecomunicações (Fust). O projeto dá margem para que as concessionárias que migrarem para o regime de autorizadas entrem na Justiça pedindo isenção do dever de contribuir para o fundo.

“Do jeito como o projeto está, o PLC gera enormes vantagens para empresas que se tornarão autorizatárias, mas não ataca o problema da universalização – do direito de acessar à Internet banda larga –, pois o FUST, além de não estar desenhado para esse fim, tem sido historicamente contingenciado”, salientou.

Desde o dia 16 de fevereiro, a Mesa Diretora do Senado está devendo uma resposta à questão de ordem levantada pela senadora Gleisi Hoffmann. A parlamentar pediu esclarecimento sobre quando se decidirá sobre os recursos apresentados ao PLC 79, nos termos da decisão do Ministro Luís Roberto Barroso sobre a matéria, para que vá ao plenário.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

SENADO APROVA MP QUE ALTERA REGRAS PARA RENOVAÇÃO DE CONCESSÕES DE RÁDIO E TV

Acordo na comissão mista que analisou a matéria incluiu rádios comunitárias no texto. Medida provisória impõe modificação a artigos do Código Brasileiro de Telecomunicações

O plenário do Senado aprovou nesta terça-feira, dia 7, a Medida Provisória (MP) 747/2016, que altera as regras de concessões de radiodifusão. O texto permite a regularização das concessões que estão vencidas e possibilita a essas emissoras regularizarem a situação junto ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações no prazo de 90 dias, contados a partir da data de edição da MP.

A medida provisória estabelece que as emissoras com a concessão em dia podem solicitar a renovação durante os 12 meses anteriores ao vencimento. Se o prazo acabar e a emissora não tiver feito o pedido, o Ministério das Comunicações faz um aviso à emissora e abre prazo de 90 dias para que ela se manifeste.

Segundo o governo, a edição da MP foi necessária devido ao acúmulo de pedidos de extinção de concessão que o Executivo deveria enviar ao Congresso pela falta de manifestação do interesse na renovação por parte das emissoras.

Durante o trâmite na comissão mista que analisou a MP, foram incluídas no texto as rádios comunitárias, que podem fazer o pedido de renovação até dois meses antes do término do prazo da validade da licença. Vencido esse limite sem o pedido, a emissora também é notificada.

A votação foi simbólica e aconteceu após um acordo para manter o artigo que trata da renovação da outorga das rádios comunitárias. Alguns senadores que defendem que o projeto abarque as rádios comunitárias estavam preocupados com a possibilidade de veto presidencial no caso dessas rádios ficarem em artigo separado das comerciais, porém o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), garantiu que um acordo foi feito com o governo para que isso não ocorra.

O senador Paulo Rocha (PT-PA) lembrou que, durante as reuniões da comissão mista que analisou a MP, houve o comprometimento do senador Romero Jucá (PMDB-PE), que representava o governo naquele momento, de que ainda em março seria constituído um grupo de trabalho perante o Ministério das Comunicações, com a presença também de parlamentares da oposição, para que ocorressem discussões com técnicos da área para consolidar avanços na legislação específica para as rádios comunitárias.

“Então, se há esse compromisso do líder do governo de criar um grupo de trabalho para consolidar uma legislação para as rádios comunitárias, que, sem dúvida nenhuma, cumprem um papel muito importante na democratização dos meios de comunicação, mas também na consolidação de uma democracia com participação mais popular, com mais participação do povo organizado, votamos sim [pela aprovação da MP 747/2016]”, afirmou Rocha.

A senadora Fátima Bezerra (PT-RN) expressou indignação pelo governo ter enviado a MP sem abarcar as rádios comunitárias. “É inaceitável que o governo tenha mandado uma medida provisória para esta Casa garantindo as rádios comerciais e TVs comerciais que perderam o prazo de renovação de suas outorgas, e não tenha estendido esse mesmo tratamento para as rádios comunitárias”.

“Em boa hora, a comissão especial que tratou da matéria está corrigindo isso.  Senadora Lúcia Vânia fez aqui a leitura da emenda. A emenda é muito clara, no sentido de nos dar garantia de que não haverá veto parcial. Portanto, que o governo federal, espero, realmente sancione a matéria, dando às rádios comunitárias de todo o país o mesmo tratamento”, continuou ela.

Rádios comunitárias

O texto aprovado concede às rádios comunitárias 30 dias para se manifestarem sobre o interesse em renovar, contados a partir de notificação. Essa notificação é feita caso a entidade autorizada a funcionar como rádio comunitária não se manifeste no prazo legal, entre um ano e até dois meses antes do término da vigência da outorga.

Caso a rádio não responda à notificação, deverá correr o processo de perda da outorga. Se houver resposta, dentro do prazo, solicitando a renovação, a rádio será multada segundo regras do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/1962). Em todas as situações, também estará autorizada a funcionar em caráter precário até a resolução da pendência. Aplicam-se a essas rádios também as regras de renovação cujo pedido tenha sido entregue fora do prazo legal, inclusive aquelas com parecer pela extinção, desde que ainda não votado pelo Congresso Nacional.

Licença provisória

Pelo texto, as emissoras de rádio e TV poderão funcionar em “caráter precário”, caso a concessão tenha vencido antes da decisão sobre o pedido de renovação. Ou seja, a emissora terá uma licença provisória de funcionamento até a definição da renovação da outorga pelo Ministério das Comunicações e pelo Congresso Nacional. Atualmente, as concessões de radiodifusão têm a duração de 10 anos, no caso das rádios, e de 15 anos, no caso das TVs.

Brasileiros na gestão

De acordo com a Constituição, compete ao governo outorgar e renovar as concessões. Cabe ao Congresso examinar a decisão do Executivo. O ato de outorga ou renovação somente produz efeito legal após deliberação da Câmara e do Senado. A MP retira do texto do Código Brasileiro de Telecomunicações a necessidade de as emissoras cumprirem todas as obrigações legais e contratuais e manterem “idoneidade técnica, financeira e moral, atendido o interesse público” para a renovação.

A MP também estende às autorizações a determinação de que pelo menos 70% do capital total e do capital votante pertençam, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, que deverão exercer obrigatoriamente a gestão das atividades e estabelecer o conteúdo da programação. Redação semelhante já constava do código, mas se direciona às concessionárias e permissionárias.

Transferência

A MP 747 possibilita ainda que pedidos de transferência direta de outorga (que ocorre quando a emissora muda de controle e de razão social) possam ser analisados e aprovados mesmo nos casos em que o pedido de renovação ainda esteja tramitando. Nesse caso, a transferência só será deferida após concluída a instrução do processo de renovação no Ministério das Comunicações — antes, portanto, da decisão do Congresso.

Condições contratuais

O texto modifica ainda a legislação para atualizá-la quanto a restrições vinculadas a questões de segurança nacional. Também tira do Código Brasileiro de Telecomunicações a necessidade de cumprimento de condições contratuais como prova de idoneidade moral, demonstração dos recursos técnicos e financeiros e indicação dos responsáveis pela orientação intelectual e administrativa da entidade.

Também saem da lei as restrições ao emprego de técnicos estrangeiros e a necessidade de registrar em junta comercial a composição do capital social. O texto que veio da Câmara incluiu, porém, a obrigação de as empresas pleiteantes de concessão ou permissão de radiodifusão apresentarem declaração de que nenhum dos dirigentes e sócios é condenado em decisão transitada em julgado por crimes que impliquem enquadramento na Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 64/1990).

Isenção de sanções

Ainda de acordo com a MP 747, as alterações contratuais ou estatutárias poderão ser encaminhadas ao Executivo dentro de 60 dias, com toda a documentação que comprovar o atendimento à legislação em vigor, isentando-as de sanções previstas no Código Brasileiro de Telecomunicações. Na profissão de radialista, a medida prevê que a descrição das funções nas quais ele pode atuar deve considerar as ocupações relacionadas à digitalização das emissoras, a novas tecnologias, aos equipamentos e aos meios de informação e comunicação.

Como foi modificada no Congresso Nacional, a matéria segue agora para a sanção da Presidência da República.

Por: Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações da Agência Senado

Partidos e entidades se mobilizam em defesa do caráter público da EBC

“A comunicação pública existe para tratar dos interesses públicos de forma a dar voz à pluralidade e diversidade de ideias, o que normalmente não é de interesse nas empresas comerciais”, enfatizou Bia Barbosa, secretária-geral do FNDC

Em entrevista concedida ao programa O Povo no Rádio, da CBN de Fortaleza (CE) nesta segunda-feira, dia 6, Bia Barbosa, coordenadora do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e secretária-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), falou sobre os principais problemas da Lei 13.417/2017. Sancionada por Michel Temer na semana passada, a lei desmonta o caráter público da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e a transforma numa espécie de empresa de comunicação governamental.

Bia explicou que a EBC é hoje a única empresa nacional de comunicação pública. Há outras rádios e TVs públicas, mas de abrangência estadual. A EBC foi criada em 2008 para fazer cumprir o disposto no artigo 223 da Constituição, que estabelece a complementaridade entre os sistemas de comunicação no Brasil. “A comunicação pública existe para tratar dos interesses públicos de forma a dar voz à pluralidade e diversidade de ideias, o que normalmente não é de interesse nas empresas comerciais”, enfatizou Bia. A EBC preencheu um espaço que necessitava ser ocupado na organização da rede pública de comunicação. A empresa se transformou numa “cabeça de rede” que reuniu e organizou rádios e TVs públicas nos estados.

Infelizmente, o Brasil tem um histórico muito recente de comunicação pública. “Nossa comunicação, que vem dos anos 1940/1950, nasceu essencialmente comercial. Se olharmos para fora, veremos que vários países, principalmente os europeus, possuem uma comunicação pública consolidada. Olhando esses países, vemos que existem mecanismos reconhecidos internacionalmente como fundamentais para garantir o caráter público da comunicação”, destacou Bia, levantando duas questões primordiais: a autonomia em relação ao governo e a existência de conselhos que priorizem a participação social na gestão.

Bia Barbosa também falou sobre a ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) que entidades e movimentos em defesa da democratização da comunicação, entre elas o FNDC, estão articulando para tentar reverter os retrocessos impostos pelo atual governo à comunicação pública no país. A ADIN deverá ser protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF) por PT, PCdoB e PSOL em breve.

Desmonte da comunicação pública

A Presidência da República sancionou na quinta-feira, dia 2, a Lei 13.417/2017, originada da Medida Provisória 744/2016 – lei que altera a estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) que enfraquece seu caráter público e reforça a decisão do governo de transformá-la em uma emissora dedicada meramente à reprodução de conteúdo de assessoria governamental.

A lei extingue o Conselho Curador, põe fim à independência do mandato do presidente da empresa, que poderá ser substituído a qualquer momento pelo governo.

Michel Temer ainda apresentou vetos que retiram da lei a prerrogativa do Comitê Editorial e de Programação de deliberar sobre planos editoriais propostos pela diretoria-executiva para os veículos da EBC, de deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela EBC e de convocar audiências e consultas públicas sobre os conteúdos produzidos. Ou seja, da nova lei resulta a existência de um comitê figurativo, sem força para atuar como representante da sociedade civil na empresa.

No texto que saiu do Legislativo, caberia ao Comitê deliberar sobre questões relativas aos planos editoriais propostos pela diretoria, “na perspectiva da observância dos princípios da radiodifusão pública”, e também “deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela empresa”. Agora, tais deliberações são exclusivas da diretoria-executiva, cuja gestão estará subordinada completamente aos interesses do governo. Do que resulta a transformação da EBC em uma empresa dedicada à comunicação estatal, e não mais à comunicação pública.

Temer ainda vetou o dispositivo que previa mandato máximo de quatro anos para os membros da diretoria-executiva da EBC e rejeitou um outro que determinava a nomeação do diretor-presidente da estatal somente após aprovação de sua indicação pelo Senado Federal. Portanto, na versão final da lei, caberá ao ocupante do cargo de presidente da República a decisão soberana sobre quem comandará a empresa de comunicação e por quanto tempo permanecerá no cargo.

Por: Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Temer sanciona lei que ataca caráter público da EBC

Medida Provisória que acaba com Conselho Curador da emissora e com a independência do mandato diretivo recebeu vetos que resultam em falta de autonomia em relação ao governo

A Presidência da República sancionou nesta quinta-feira, dia 2, a Lei 13.417/2017, originada da Medida Provisória 744/2016 – lei que altera a estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), enfraquece seu caráter público e reforça a decisão do governo de transformá-la em uma emissora dedicada meramente à reprodução de conteúdo de assessoria governamental.

A lei extingue o Conselho Curador, põe fim à independência do mandato do presidente da empresa, que poderá ser substituído a qualquer momento pelo governo de turno, e cria um Conselho de Administração e uma diretoria-executiva como novos órgãos gestores.

Entre os vetos apresentados, Michel Temer retirou da lei a prerrogativa do Comitê Editorial e de Programação de deliberar sobre planos editoriais propostos pela diretoria-executiva para os veículos da EBC, de deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela EBC e de convocar audiências e consultas públicas sobre os conteúdos produzidos. Ou seja, da nova lei resulta a existência de um comitê figurativo, sem força para atuar como representante da sociedade civil na empresa.

No texto que saiu do Legislativo, caberia ao Comitê deliberar sobre questões relativas aos planos editoriais propostos pela diretoria, “na perspectiva da observância dos princípios da radiodifusão pública”, e também “deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela empresa”. Agora, tais deliberações são exclusivas da diretoria-executiva, cuja gestão estará subordinada completamente aos interesses do governo. Do que resulta a transformação da EBC em uma empresa dedicada à comunicação estatal, e não mais à comunicação pública.

Temer ainda vetou o dispositivo que previa mandato máximo de quatro anos para os membros da diretoria-executiva da EBC e rejeitou um outro que determinava a nomeação do diretor-presidente da estatal somente após aprovação de sua indicação pelo Senado Federal. Portanto, na versão final da lei, caberá ao ocupante do cargo de presidente da República a decisão soberana sobre quem comandará a empresa de comunicação e por quanto tempo permanecerá no cargo.

Censura e silenciamento

Durante a votação da MP 744/2016 no Senado Federal, a senadora Fátima Bezerra (PT-PI) lembrou que, em outubro de 2016, o Ministério Público Federal apresentou uma nota técnica sobre a Medida Provisória, apontando que esta poderia trazer como consequência a fragilização estrutural da EBC, com “a subordinação da empresa às diretrizes do governo e o seu condicionamento às regras estritas de mercado”. Abrindo-se, desta forma, espaço para a prática da “censura de natureza política, ideológica e artística”, tanto pela definição da linha editorial da empresa e da programação na perspectiva dos interesses dos governantes quanto pelo silenciamento das vozes divergentes ao governo.

“Teremos um comitê editorial que será chapa branca, pois terá que atender às demandas vindas do governo e sempre estará à mercê do humor de quem está na direção”, lamentou Fátima Bezerra, sem saber à época que os futuros vetos presidenciais acabariam de vez com qualquer participação social na empresa.

A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), por sua vez, enfatiza que o governo comete um ato inconstitucional com a MP, pois a existência de um sistema de comunicação pública não-governamental faz parte de algo que já está previsto na Constituição, em seu artigo 223, que é a complementaridade entre os sistemas público, estatal e privado de comunicação. Essa complementaridade teria por objetivo assegurar a efetiva realização da liberdade de manifestação do pensamento, pela possibilidade de serem ouvidas outras vozes, além daquelas emitidas pelos ocupantes de cargos públicos e pelas forças que controlam o mercado.

“A EBC foi criada para preencher uma lacuna que estava aberta na comunicação com a sociedade. O objetivo dessa empresa não deve ser o lucro, e sim a comunicação independente, educativa e cultural. E é isso que tanto incomoda ao governo: a liberdade para mostrar um lado diferente do que predomina na mídia nativa”, reforçava Gleisi Hoffmann à época.

Desmonte da comunicação pública

A Lei 13.417/2017 foi sancionada depois de um ato arbitrário do governo envolvendo o jornalista Ricardo Pereira de Melo, ex-presidente da empresa. Ele foi afastado pelo então presidente interino Michel Temer (PMDB) em maio de 2016, logo depois do afastamento provisório de Dilma Rousseff.

Um dia após sua demissão, Melo protocolou mandado de segurança (nº 34.205) no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando sua exoneração, já que tinha estabilidade no cargo. Na antiga estrutura da EBC, organizada pela Lei 11.652/2008, o presidente da estatal tinha um mandato de quatro anos, independentemente de quem ocupava o cargo de presidente da República.

Melo retornou à presidência da EBC em liminar proferida pelo ministro Dias Toffoli, do STF. Na decisão, o magistrado reconheceu que o artigo 19, parágrafo 2º, da Lei 11.652/2008 determinava claramente que o mandato do presidente da EBC era de quatro anos e só poderia ser interrompido por decisão do Conselho Diretor da empresa.

Segundo Toffoli, essa condição mostrava o “nítido intuito legislativo de assegurar autonomia à gestão da diretoria-executiva da EBC, inclusive ao seu diretor-presidente”. “Em análise precária, portanto, me parece que seria esvaziar o cerne normativo dos dispositivos interpretá-los — tal qual propõe a autoridade impetrada — no sentido da existência de mandato apenas na expressão, mas não em seu conteúdo”, afirmava o ministro do STF em sua decisão.

Governo impôs decretos sobre leis

Entre o afastamento arbitrário de Melo por Michel Temer e a liminar proferida por Dias Toffoli no dia 2 de junho de 2016, a presidência da EBC foi ocupada pelo também jornalista Laerte Rímoli. Para reverter a decisão do STF, Michel Temer alterou em setembro, por decreto, o estatuto da EBC, garantindo a nomeação de Rímoli como presidente da empresa. A mudança estatutária transformou a presidência da EBC em um cargo de livre nomeação do presidente da República.

Por meio de outro decreto, o governo demitiu então Ricardo Melo, nomeando Laerte Rímoli para o cargo. Rímoli chefiou o setor de comunicação da Câmara dos Deputados durante parte da gestão do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e também integrou a campanha do senador Aécio Neves (PSDB-MG) à Presidência da República em 2014, quando o tucano foi derrotado por Dilma Rousseff nas urnas.

Segundo a Lei das Estatais, portanto, Rímoli não poderia ocupar o cargo de presidente da EBC. Mas Temer preferiu ignorar também essa lei. Ao mesmo tempo, o governo editou a Medida Provisória 744/2016 para alterar a Lei 11.652/2008 e tornar o cargo de diretor-presidente de livre nomeação e exoneração do ministro-chefe da Casa Civil, “oficializando” o que já havia feito por meio de decreto.

A MP 744 e os decretos foram questionados por Ricardo Melo sob o argumento de que os atos de Temer violaram a soberania da Justiça e o ato jurídico perfeito. A ação fez com que o governo federal voltasse atrás e editasse um terceiro decreto, tornando sem efeito a exoneração do jornalista. Essa mudança fez com que Dias Toffoli declarasse a perda de objeto do mandado de segurança apresentado por Melo logo após a sua exoneração.

Entretanto, é certo que as mudanças trazidas neste terceiro decreto de Temer não resolveram os problemas ocasionados na gestão da EBC pelas medidas arbitrárias do atual governo. Pelo contrário, apenas reforçam que, com a nova estrutura, a empresa responderá ainda mais às demandas do governo de turno, deixando de fazer uma comunicação de caráter público e inviabilizando a complementariedade entre os sistemas privado, público e estatal prevista na Constituição Federal.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação, com informações da Agência Senado

Governo suspendeu renovação das rádios comunitárias durante processo de transição de AM para FM das rádios comerciais

Movimento Nacional de Rádios Comunitárias denuncia que tecnologia internacional usada pelo governo neste processo não contempla o funcionamento de um segmento social de comunicação no Brasil, garantido pela Constituição Federal

O coordenador do Movimento Nacional de Rádios Comunitárias (MNRC), Jerry Oliveira, denuncia que o governo suspendeu a renovação de cerca de 1200 rádios comunitárias durante o processo de migração das rádios AM para FM. “Destas, cerca de 900 entregaram a documentação no prazo para renovação, e muitas tiveram suas concessões não renovadas, negadas por uma política de criminalização das rádios comunitárias”, afirma.

Oliveira aponta que o processo de mudança das rádios da faixa de AM para a de FM suspendeu todos os processos de novas rádios que poderiam ser autorizadas através do Plano Nacional de Outorga. O decreto assinado em 2013 pela então presidenta Dilma Rousseff vem sendo utilizado pelo atual governo como argumento para a não renovação de contratos das rádios comunitárias, que já operam em FM.

“O objetivo é claro, eles querem limpar o espectro, mas não para atender às demandas dos segmentos de rádio, e sim para garantir o aumento de potências e do número de frequências para emissoras comerciais. Isso vai congestionar o espectro e impedir a complementaridade dos sistemas”, destaca o coordenador do MNRC. Para ele, é uma forma clara e objetiva de impedir qualquer avanço das demandas das rádios comunitárias, como o aumento de potência e o aumento do número de canais. Ou seja, a postura do governo resultaria na privatização total do espectro.

Oliveira destaca que a proposta do governo de digitalização da radiodifusão também visa atender aos interesses do modelo americano digital de rádio, cuja tecnologia se baseia no sistema Iboc (In Band On Channel, em inglês), ou HD rádio (High Definition Radio, em inglês), desenvolvido pelo consórcio americano Ibiquity e que não opera na faixa AM. “A transferência de faixas com uso de tecnologia americana coloca em risco a soberania da comunicação no Brasil e não contempla um sistema social de comunicação, pois essa tecnologia foi criada a partir de uma realidade de mercado que não corresponde à brasileira”, denuncia. Trata-se de um sistema com tecnologia fechada e que coloca em risco a soberania da comunicação do país, pois será entregue um “espectro, um bem público, para o setor privado”.

O encerramento da onda de radiodifusão AM acaba não só com a comunicação entre as comunidades ribeirinhas, mas também com a comunicação do Brasil em nível internacional. “É uma questão política que deve ser analisada com muita calma”, diz Oliveira. Para longos alcances, normalmente utiliza-se a faixa AM ou a de Ondas Curtas (OC).

Governo ignora a Constituição

Criada em 1998, a Lei 9.612 regulamenta o exercício das rádios comunitárias no Brasil. Mas esse segmento da comunicação, que veio para preencher o espaço previsto na Constituição Federal de complementaridade dos sistemas público, estatal e privado de comunicação, tem encontrando séries dificuldades para desempenhar seu papel, boa parte delas impostas justamente pelo Estado, que deveria zelar pelo correto funcionamento deste sistema tripartite.

O princípio da complementaridade dos sistemas público, privado e estatal de radiodifusão, contido no art. 223 da Constituição, exige um modelo de serviços de radiodifusão que vai além do clássico. A Constituição impõe a complementaridade entre os setores para criar harmonia e colaboração entre as estruturas de comunicação social. Desta forma, deveria-se garantir o equilíbrio adequado entre campos de comunicação social com funções diferenciadas, para evitar distorções arbitrárias no processo de comunicação social.

Desde antes da criação da Lei 9.612, o Estado brasileiro vem promovendo uma patrulha contra a comunicação comunitária e popular. Além de um marco legal que limita os direitos desse tipo de comunicação, a prática da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e da Polícia Federal são costumeiramente abusivas e desrespeitosas com a democracia. “Essa situação só vem piorando, como a publicação de portarias e decretos assinados pelo ex-ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que só aumentaram e restringiram ainda mais as atividades das rádios comunitárias”, frisa Oliveira.

Segundo ele, o cenário atual continua desfavorável, mas o MNRC pretende construir possibilidades de resistência, como a ocupação de emissoras e o não reconhecimento das cassações. “Precisamos ocupar esses latifúndios e vamos resistir com muita luta”, garante.

Movimentos Sociais e Rádios Comunitárias

Jerry Oliveira também reforça a importância de unificar a pauta de todas entidades ligadas à radiodifusão comunitária. “Precisamos discutir e cobrar a complementaridade do sistema e a regionalização da comunicação”.

Ele deseja o reconhecimento, por parte dos grupos e organizações de esquerda, das rádios comunitárias como um movimento social, e não apenas como uma mídia. “Essa invisibilidade fez com que a despolitização fosse uma marca, e é aí que outras pessoas se aproveitam e se apropriam das rádios. Esse é um espaço de conscientização e disputa da comunidade, e não pode estar nas mãos de interesses que não sejam ‘comunitários’ ”, adverte.

Oliveira chama os outros movimentos sociais a reconhecerem e se somarem à luta das rádios comunitárias. “Quando a gente entra na discussão da democratização da comunicação, [notamos que] a rádio comunitária é mais invisível do que se pode imaginar. Nós estamos fazendo um esforço danado para dizer o que está acontecendo, mas as pessoas estão priorizando outras discussões”.

Para o coordenador do Movimento Nacional de Rádios Comunitárias, estas emissoras fortalecem outras bandeiras de luta sociais a partir do diálogo que pode e deve ser mobilizado a partir das associações comunitárias. “Precisamos formar uma rede de resistência”, enfatiza Oliveira.

Por: Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação