Arquivo da tag: Imprensa

STF começa a debater tutela judicial sobre imprensa

Durante o julgamento de ontem, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) anteciparam o debate sobre o poder do Judiciário de impedir a publicação de jornais, livros e revistas para impedir a violação de direitos individuais. Dois dos ministros adiantaram o entendimento sobre o assunto. O presidente do STF, Gilmar Mendes, foi enfático ao dizer que os juízes podem impedir a publicação de matérias jornalísticas, por exemplo, caso o assunto viole a intimidade ou honra de alguém.

Mendes citou um episódio ocorrido em 1994 envolvendo a Escola Base, que funcionava no bairro paulistano da Aclimação, em São Paulo. A escola teve de ser fechada depois que os donos e funcionários foram apontados por um delegado como suspeitos de abusar sexualmente dos alunos.

"Se tivesse havido naquele caso uma intervenção judicial, infelizmente não houve, que tivesse impedido aquele delegado, mancomunado com órgão de imprensa, de divulgar aquele fato, aquela estrutura toda escolar e familiar teria sido preservada. E não foi", disse Mendes.

O ministro Eros Grau concordou com a tese. "O juiz está limitado pela lei. O censor não está limitado por lei alguma. Aí não há censura. Há aplicação da lei. Aqui não estamos falando em censura. Estamos falando na aplicação da Constituição pelo Poder Judiciário", afirmou o ministro ao tratar do processo protocolado pelo Estado.

O ministro Carlos Ayres Britto, que relatou o processo que culminou na extinção da Lei de Imprensa, disse que o Judiciário não pode censurar prévia ou posteriormente a publicação de matérias. "Não há no direito brasileiro norma ou lei que chancele poder de censura à magistratura", declarou.

Decano do STF, o ministro Celso de Mello afirmou que desde o Império as Constituições brasileiras vedavam a censura, com exceção do governo ditatorial de Getúlio Vargas e dos governos militares. Ele lembrou que há 41 anos era baixado o Ato Institucional número 5, que suspendeu diversos direitos no Brasil e permitiu a censura prévia, inclusive em caráter administrativo. "O poder de cautela é o novo nome da censura no nosso País", criticou.

O próprio relator da reclamação, Cezar Peluso, que votou contra o pedido do Estado, admitiu que estranhava o fato de o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) ter mantido a liminar que impede a publicação mesmo depois de ter afastado o desembargador Dácio Vieira da relatoria e transferido o caso para a Justiça Federal no Maranhão.

"Não há, por fim, lugar para estima da legitimidade do trâmite processual da causa, embora admire, à primeira vista, a manutenção de liminar concedida por magistrado afastado por suspeição em acórdão do tribunal que se declarou absolutamente incompetente para o feito, ao avistar conexão entre o objeto do agravo de instrumento e a decisão de quebra de sigilo telefônico emitida por juiz federal do Estado do Maranhão", afirmou Peluso. Ao final, porém, negou o pedido do jornal.

Os outros ministros não se manifestaram sobre o tema. O ministro José Antonio Dias Toffoli, por exemplo, afirmou que seu voto limitou-se a analisar se a decisão do Tribunal de Justiça desrespeitava julgamento do STF ao analisar a Lei de Imprensa.

STF mantém censura a ‘O Estado de S. Paulo’

Sem entrar no mérito e utilizando um argumento técnico, o STF (Supremo Tribunal Federal) rejeitou ontem o pedido do jornal O Estado de S. Paulo de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, cujo principal investigado é Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

O tribunal manteve, por 6 votos a 3, a decisão do TJ (Tribunal de Justiça) do Distrito Federal, que 133 dias atrás proibiu o jornal de veicular trechos do inquérito e dos grampos.

A Boi Barrica, depois rebatizada de Faktor, investigou a atuação de Fernando Sarney no setor elétrico. Série de reportagens da Folha neste ano revelou que o filho do senador afirmava ajudar o pai a "atacar" o setor e de nomear "quem quisesse" no Senado, além de interferir na agenda de trabalho do ministro de Minas e Energia. Em 2008, Fernando foi indiciado por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Ele nega todas as acusações.

Numa ação juridicamente chamada "reclamação", O Estado alegou que o veto desrespeitara a decisão do STF quando este derrubou a Lei de Imprensa – naquele julgamento, o STF afirmou que os meios de comunicação não podem sofrer nenhum tipo de restrição, nem mesmo pelo Judiciário.

Ontem [10/12], a maioria dos ministros entendeu que os advogados do jornal utilizaram o mecanismo errado para contestar a proibição. Cezar Peluso, relator do caso, argumentou que a reclamação só poderia ser usada se, para determinar a proibição, o juiz do TJ-DF tivesse utilizado como base a Lei de Imprensa, o que não ocorreu.

No final de abril deste ano, o STF revogou toda a Lei de Imprensa (5.250/67), um conjunto de regras criado na ditadura militar (1964-1985) que previa atos como a censura, a apreensão de publicações e a blindagem de autoridades contra o trabalho jornalístico.

Em julho, o desembargador Dácio Vieira concedeu uma liminar proibindo o jornal O Estado de S. Paulo de publicar notícias sobre a Boi Barrica, utilizando o argumento de que a veiculação de tais informações feriria garantias constitucionais, além de violar a Lei de Interceptações Telefônicas.

"A decisão [do TJ-DF], diante do dispositivo constitucional da liberdade de imprensa, utilizou outros dispositivos constitucionais que protegem a honra e a privacidade para limitar a publicação. Este tema foi objeto da decisão do Supremo? Não", afirmou Peluso.

O relator foi acompanhado pelo presidente do STF, Gilmar Mendes, e pelos ministros José Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e Eros Grau. Mendes e Eros afirmaram que a decisão do TJ não configurava censura, mas uma decisão de caráter individual de um magistrado com base em legislações existentes.

Os ministros Carlos Ayres Britto, Cármen Lúcia e Celso de Mello entenderam diferente. Para eles, a proibição de veicular informações é censura prévia. "O poder de cautela do Judiciário é o novo nome de censura", disse Mello.

STF rejeita recurso e censura ao ‘Estado’ continua em vigor

O Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 votos a 3, arquivou ontem [10/12] a reclamação em que os advogados do Estado pediam o fim da proibição ao jornal de publicar reportagens sobre a Operação Boi Barrica, que investigou o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Com isso, fica mantida a censura imposta no fim de julho pelo desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ-DF). A mordaça ao Estado, que vai recorrer, já soma 133 dias.

A maioria dos ministros – numa decisão que discutiu aspectos técnicos e não o mérito – não concordou com a tese defendida pelos advogados do jornal, de que a censura desrespeita a decisão do próprio Supremo que derrubou a Lei de Imprensa e consagrou o pleno direito à liberdade de expressão. Naquela decisão, tomada em abril deste ano, há referência explícita contra a censura imposta pelos Poderes estatais, como o Judiciário.

"Não há liberdade de imprensa pela metade ou sob as tenazes da censura prévia, inclusive a procedente do Poder Judiciário", diz o texto publicado no Diário da Justiça. A Lei de Imprensa que vigorou até o julgamento de abril era um documento legal do tempo do regime militar (1964-1985).

Interceptações

Apesar de ter decidido dessa forma neste ano, ontem [10/12] a maioria dos ministros do STF afirmou que o resultado do julgamento sobre a Lei de Imprensa não poderia ser aplicado ao caso do Estado. De acordo com a ala do Supremo vencedora no julgamento de ontem, a decisão judicial do TJ-DF de censurar o jornal baseou-se na Constituição e na legislação que trata de interceptações telefônicas. Portanto, não haveria referência à Lei de Imprensa e ao julgamento de abril do STF. Por esse entendimento, não caberia reclamação ao Supremo por suposto desrespeito à decisão da corte.

Reclamação é um recurso usado quando uma decisão do STF é descumprida por um magistrado ou outro tribunal. No caso, entra-se no Supremo com uma reclamação para fazer valer a decisão que a corte tomou sobre o tema.

O voto vencedor do julgamento foi dado pelo vice-presidente do STF e relator do caso, ministro Cezar Peluso, que arquivou sem discussão do mérito a ação apresentada pelo Estado. "A decisão ora impugnada não tangencia sequer aspectos da Lei de Imprensa", afirmou Cezar Peluso durante o julgamento.

Votaram com Peluso os ministros Eros Graus, José Antonio Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Ellen Gracie e Ricardo Lewandowski.

Além de concordar com a argumentação técnico-jurídica de Peluso, o presidente do STF, Gilmar Mendes, disse que a honra e a intimidade, citados por Dácio Vieira para impor a censura ao jornal, têm de ser preservadas. "Se é inviolável a honra e a intimidade, é preciso que isso tenha alguma consequência. Esses valores são invioláveis. E o que é inviolável não é para ser violado", afirmou.

"Visões autoritárias"

Primeiro ministro a votar pela derrubada da mordaça imposta ao Estado, Carlos Ayres Britto lembrou que ao declarar o fim da Lei de Imprensa, em abril, o tribunal levou em conta dispositivos da Constituição que vedam a censura prévia à mídia, às manifestações e às publicações. A ministra Cármen Lúcia e o decano do STF, Celso de Mello, acompanharam Ayres Britto.

Para Celso de Mello, é profundamente grave e preocupante que ainda remanesçam no aparelho de Estado "visões autoritárias" que buscam justificar a prática da censura a publicações em geral. Ele lembrou que no dia 13 serão rememorados os 41 anos da data em que o marechal Artur da Costa e Silva, segundo presidente do regime militar, impôs ao País o Ato Institucional nº 5, o AI-5. "O passado deve ser respeitado pela corte, pelos magistrados e pelos tribunais", afirmou Celso de Mello. "O poder geral de cautela é o novo nome da censura em nosso país."

Alternativas

De acordo com ministros do STF, o jornal ainda pode questionar a censura por meio de outros instrumentos que não sejam a reclamação. Um dos ministros afirmou que a solução do caso, seguindo esse caminho, certamente vai demorar.

Estadão é censurado e não pode publicar informações sobre Sarney

Desde a última sexta-feira (31/07), o jornal O Estado de S. Paulo e o seu portal na Internet estão proibidos de publicar reportagens com informações sobre a Operação Faktor, conhecida como Boi Barrica. Em caso de descumprimento, a multa foi ficada em R$ 150 mil para cada matéria publicada.

A ação foi apresentada por Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Conversas entre os dois foram gravadas pela Polícia Federal e divulgadas pelo Estadão. Com isso, os advogados de Fernando alegam que a divulgação do conteúdo das gravações atinge a honra, a intimidade, a privacidade, aviltando o direito de personalidade de toda a família Sarney.

A liminar foi concedida pelo desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Segundo matéria publicada pelo próprio Estadão, Vieira foi consultor jurídico do Senado e é do convívio social da família Sarney e do ex-diretor-geral da Casa Agaciel Maia, envolvido no escândalo dos atos secretos.

O advogado do Grupo Estado, em matéria publicada pelo próprio jornal, informa que a empresa vai recorrer da decisão. “Há um valor constitucional maior, que é o da liberdade de imprensa, principalmente quando esta liberdade se dá em benefício do interesse público", afirmou.

Também em matéria publicada pelo Estadão, o diretor de Conteúdo, Ricardo Gandour, afirmou que a decisão judicial não vai afetar a conduta do jornal. “O Estado não se intimidará, como nunca em sua história se intimidou. Respeita os parâmetros da lei, mas utiliza métodos jornalísticos lícitos e éticos para levar informações de interesse público à sociedade".

Para a Associação Nacional de Jornais, a determinação judicial se trata de um “expediente inconstitucional (…) para subtrair ao escrutínio público operações com graves indícios de ilegalidade”.

Evento discute futuro da mídia impressa desregulamentada

Em 30 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) revogou integralmente a Lei de Imprensa (5.250, de 1967) sob a alegação de que seus artigos afrontavam os princípios previstos na Constituição Federal. A decisão foi um marco não apenas pelo papel assumido pelo Judiciário na regulação das atividades de comunicaçao, mas principalmente pela defesa fortemente liberal que motivou a sentença, evidenciando afinidades entre os argumentos dos ministros do tribunal e as posições do empresariado de comunicação.

Pouco mais de um mês depois, o tema voltou à pauta em outro endereço da Praça dos Três Poderes, em Brasília, mas com os mesmos atores. Na última semana, o Congresso Nacional promoveu a IV Conferência Legislativa sobre Liberdade de Imprensa. Dessa vez, além dos ministros do STF e de representantes da grande mídia comercial, parlamentares também engrossaram o coro pela liberdade de imprensa. Não por acaso, os debates foram mediados por um dos expoentes da mídia comercial, o apresentador do Jornal da Globo William Waack.

O presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), destacou o interesse do legislativo em defender e promover a liberdade expressão. A posição foi reforçada pelo presidente do Supremo Tribunal de Federal (STF), Gilmar Mendes. “A atual luta pela liberdade de imprensa é para que se tenha o direito de falar e o governo de ouvir”, defendeu o ministro, que recentemente foi alvo de polêmica por ter mandado retirar do site da TV Câmara entrevista com o jornalista Leandro Fortes em razão críticas feitas às suas posturas.

Outro ministro do Supremo, o relator do processo que resultou na derrubada da Lei de Imprensa, Carlos Ayres Britto, reafirmou a inadequação de mecanismos como os existentes na norma em relação à prática dos jornalistas. “Na Constituição a censura é vedada e a liberdade de expressão jornalística já está considerada. Para mim, esta última já é o mesmo que liberdade de imprensa”, avaliou.

Futuro desregulado

Ao mesmo tempo em que defendeu a decisão do Supremo, Ayres Brito questionou como os veículos irão se comportar neste novo cenário desregulado: “será que os jornalistas vivem agora a insustentável leveza da imprensa?”. Para Eurípedes Alcântara, diretor de redação da revista Veja, a responsabilidade jornalística não depende da existência de uma regulamentação. “Desde que não haja má fé e malícia, pode haver a busca pela informação”, respondeu, negando a existência de “insustentável leveza”.

Havendo ou não dificuldades práticas em atuar sem a Lei, para alguns jornalistas a ausência de normas coloca desafios ao setor. “Sem a regulação há um espaço para construção de uma nova ordem com a sociedade, que ainda não sabemos como vai ser”, disse a jornalista do jornal O Globo Miriam Leitão. “Não sei se é necessário ou não uma nova lei, mas tenho dúvidas de que uma nova lei vá alterar a prática. Penso que falta uma cultura de, na prática, ser a favor da liberdade”, opinou Fernando Rodrigues, do jornal Folha de São Paulo.

O cenário de desregulamentação, quando aliado à incerteza da concorrência com novas mídias e fontes de informação, foi tratado com receio pelos presentes. Para Miriam Leitão, uma das defensoras da revogação da Lei de Imprensa, este cenário coloca o desafio da imprensa tradicional se posicionar em relação às novas mídias, como a Internet. “Em outros países os jornais estão fechando e assim a nova tecnologia nos desafia a ter um novo formato de jornalismo. Como vamos nos organizar sem Lei e com os novos desafios?”, questionou a jornalista.

O deputado federal Miro Teixeira (PDT-RJ), que representou o seu partido na apresentação da ação que levou à supressão da Lei de Imprensa, criticou a permanência de um resquício da Ditadura Militar que dá às autoridades a sensação de imunidade a críticas. Lembrou que, apesar da Lei de Imprensa contemplar elementos como o direito dos cidadãos de responderem a mídia e se defenderem contra difamação e calúnia, ela protegia de forma exacerbada o presidente da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, ministros do STF e chefes de Estado ou de governo estrangeiro.

Nos casos em que alguma dessas autoridades acusassem os jornalistas de calúnia ou difamação, a justiça não considerava a prova de defesa que os profissionais pudessem apresentar, e tinham então que responder pela acusação. Para Teixeira, o fim de tal privilégio é importante, mas não é suficiente para que haja um controle efetivo sobre as ações do poder público. "Só se a fiscalização for plena (incluindo aí a tarefa da imprensa) a sociedade vai acreditar na democracia”, disse o deputado. Ele defendeu, ainda, que “o direito de resposta deve ser melhor entendido e utilizado pelos jornalistas, já que é um direito do cidadão”.

Publicidade

O clima de leve apreensão esquentou na segunda mesa, que tratou da regulação da publicidade. Os representantes do empresariado estenderam a noção de liberdade de imprensa às mensagens publicitárias e voltaram a fazer críticas às propostas de limitação a anúncios em tramitação no Congresso Nacional.

“Há uma tentativa de cerceamento da publicidade. Mas é justamente a livre iniciativa que fomenta o mercado publicitário, e é ele que sustenta os veículos de comunicação”, pontuou Daniel Slaviero, presidente da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV (Abert). Para Judith Brito, presidente da Associação Nacional De Jornais (ANJ), “o conflito sobre o grau de intervenção na informação publicitária diz respeito ao direito à informação”.

Ottoni Fernandes Júnior, sub-chefe executivo da Secretaria de Comunicação (SECOM) ponderou que a importância de evitar o excesso de restrições não pode eliminar a necessidade de regulação para coibir abusos. “Acho que a sociedade pode sim se auto-regulamentar e não pode se fazer uma patrulha, mas um mínimo de regulação deve existir”, defendeu.