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Ministra confirma para breve nova consulta pública sobre lei de direitos autorais

O projeto de lei que promove a revisão da atual Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) deve voltar a consulta pública brevemente, informou nesta quarta-feira (6) a ministra da Cultura, Ana de Hollanda. Proposta do Ministério da Cultura de revisão da legislação, resultado de debates ao longo das gestões de Gilberto Gil e Juca Ferreira, já se encontrava na Casa Civil, de onde deveria ser enviada ao Congresso. Mas a ministra Ana de Hollanda decidiu que o tema precisa voltar à discussão. A ministra afirmou que, além da lei de direitos autorais, o novo programa de fomento e incentivo Procultura – possível substituto da Lei Rouanet – deverá ser objeto de muitos debates no Congresso este ano.

"A questão dos direitos autorais ainda está em estudo. Na forma como está ainda existem queixas. A Direção de Direitos Intelectuais do Ministério da Cultura notou a presença muito vaga da internet nesse projeto, e hoje em dia a gente não pode trabalhar sem contar com internet, porque é onde mais se busca o acesso à cultura", disse a ministra, durante a cerimônia de lançamento da Frente Parlamentar em Defesa da Cultura.

Ana de Hollanda participou em seguida de debate na Comissão de Educação do Senado.

A ministra acredita que uma nova legislação deve contemplar, inclusive, a possibilidade de pagamento de direitos autorais usando as próprias ferramentas da internet. Ana de Hollanda afirmou que a questão dos direitos autorais é estratégica para quem cria, e que a versão anterior do projeto gerou uma grande insegurança quanto à garantia desses direitos. Para ela, a situação colocava em risco a produção e o patrimônio cultural brasileiros.

"Mas temos que pensar muito numa forma de permitir o acesso do cidadão a esse patrimônio. Temos que ter os dois olhares, o de quem cria e o de quem quer ter esse acesso", disse.

Ana de Hollanda explicou que os artistas também têm interesse em usar a internet como meio de divulgação do trabalho e garantiu que apoia a cultura digital. Mas lembrou que, quando se fala em artista não se trata apenas do intérprete, mas também de compositores, que não têm acesso a outras formas de exploração de sua obra, com apresentações ao vivo.

"Ninguém quer guardar seu trabalho na gaveta, pode ter certeza. A internet é importante também para o artista, os novos meios de acesso à cultura são fundamentais", afirmou.

Sobre a polêmica retirada do selo Creative Commons do site do Ministério da Cultura, a ministra entende que não combinava com o Ministério da Cultura estimular o criador a abrir mão de seu ganha-pão. A licença Creative Commons é um projeto mundial que autoriza de maneira flexível o uso de obras intelectuais. A opção por esse modelo de licenciamento – e seu alcance – é uma decisão do autor.

Artistas

A cantora Rita Ribeiro, também presente ao lançamento da Frente em Defesa da Cultura, acredita que os artistas devem conhecer melhor a legislação para poder debater em profundidade as possíveis mudanças na legislação dos direitos autorais.

"É burocrático e cansativo, mas é preciso ter conhecimento para poder contestar. Os artistas precisam chegar junto, senão quem é que vai brigar por nós? Não adianta só reclamar que direitos autorais não estão sendo repassados", disse em entrevista à Agência Senado.

Rita Ribeiro afirmou que seus direitos autorais hoje "chegam muito pouco" e que ela "viabiliza a arte" através de shows. Sobre o papel da internet, ela reconhece que há uma relação ambivalente: ao mesmo tempo em que se sente lesada por ver pessoas acessando seu trabalho sem pagar, admite que os discos são caros para o povo brasileiro e acha interessante que sua arte esteja sendo exposta.

"Temos que mudar a estrutura de forma que a cultura seja realmente acessível às pessoas e o dinheiro chegue ao artista", defendeu.

Rita Ribeiro também pediu mudanças na Lei Rouanet. Para a cantora, não adianta o Ministério da Cultura dar uma carta autorizando o artista e depois "deixá-lo à mercê dos escritórios de marketing de empresas". A situação acaba beneficiando apenas os que já alcançaram reconhecimento de um público expressivo.

"E quem está fazendo arte no interior do Brasil, quem é menos exposto que outros, onde é que fica? Se o dinheiro é público tem que ter uma distribuição melhor desse dinheiro", reivindicou.

A presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Cultura, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), também ressaltou a importância de o Congresso Nacional avançar no debate sobre direitos autorais. Para a deputada, não é possível, por exemplo, um compositor como Nelson Sargento, cujo trabalho tem repercussão internacional, receber em um ano apenas R$ 1 em direitos autorais, como já aconteceu, segundo a deputada.

O líder do PT no Senado, senador Humberto Costa (PE), reconhece que a polêmica dos direitos autorais ainda não esquentou no Congresso. Para o senador, é preciso levar em consideração as demandas da sociedade e também as necessidades de quem produz o bem cultural e vive disso, de modo que o país chegue a uma legislação interessante para os dois lados.

Queda de braço entre ministérios garantiu avanços para a comunicação

Durante as gestões de Gilberto Gil e Juca Ferreira no Ministério da Cultura (MinC) um dos principais atritos foi interferência em atribuições antes reservadas somente ao "vizinho" Ministério das Comunicações (Minicom), resultando em intensos debates entre os dois ministérios.

Atualmente na coordenação das conferências da Secretaria do Audiovisual (SAV) do MinC, James Görgen defende que houve um estreitamento na relação entre os dois setores: "No projeto iniciado por Gil a comunicação faz parte da política cultural do país, não era vista como alienígena. Era preciso que os meios valorizassem os aspectos culturais".

O Minicom, ainda dotado de atribuições que envolvem maior peso político e econômico, teve respaldo dos empresários das teles e radiodifusão para barrar as investidas do MinC. Essa situação foi perceptível já na primeira grande polêmica envolvendo o MinC e a comunicação no projeto da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav) e concomitante elaboração de uma Lei Geral da Comunicação Eletrônica de Massa, entre 2004 e 2005. O objetivo era alterar a retrógrada legislação para fortalecer todo o audiovisual brasileiro, incluindo a televisão, via o fomento e fiscalização.

A proposta do MinC foi descartada, devido pressão das grades empresas de mídia do país. Tal conjuntura fez o MinC valorizar sua inserção em setores progressistas da sociedade civil. "Quando não tinha competência especifica o papel (do MinC) era colocar o debate na rua e ser contraponto de ideias pré estabelecidas", explica Görgen.

A leitura feita por Gil do cordel da TV Digital durante aula inaugural da Escola de Comunicação da UFRJ em 2006 foi emblemático quanto as diferenças entre os ministérios e do movimento do MinC em buscar forças para não sofrer outras derrotas como no caso da Ancinav. Enquanto falava sobre democratização no acesso e distribuição de conteúdos e os impactos da digitalização, Gil leu para plateia um cordel que pedia o investimento e adoção do padrão brasileiro da TV digital, além de chamar Hélio Costa de "empresário boçal" que apostava no "monopólio privado".

O decreto da TV Digital acabou por privilegiar um padrão estrangeiro, o japonês, reservando no espectro o contendo de um canal público exclusivo para cultura. Entretanto, a relação entre os dois ministérios continuou tensa. Sem inserção nos meios comerciais de mídia, a estratégia do MinC foi estimular ao lado da Radiobrás e Casa Civil o I Fórum de TVs Públicas em 2007 e a consequente criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Tal movimentação foi sem a presença do Minicom, que havia perdido credibilidade no núcleo do governo, pois as eleições de 2006 foram marcadas pela oposição da Rede Globo, a principal parceira do Ministro Hélio Costa no decreto da TV Digital. Isolado, Costa até tentou tumultuar o processo ao sugerir a criação de uma TV estatal então avaliada em R$ 250 milhões, mas não obteve sucesso.

Troca ministerial

Em julho de 2008 Gil deixou o MinC para voltar a priorizar a vida artística e familiar e passou o bastão para Juca Fecrreira. Teoricamente a ausência do músico tropicalista enfraqueceria a pasta, mas Juca foi responsável direto pela reestruturação do MinC e também detinha experiência para lidar com a conjuntura política do segundo mandato de Lula. Assim, a Cultura aglutinou o fracassado projeto da Ancinav para influenciar temas de peso como o Grupo de Trabalho (GT) responsável pela proposta de reformulação do Marco Regulatório das Comunicações, o desenvolvimento do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) e Projeto de Lei (PLC) nº116 (ex-PL 29).

"Contribuímos de forma permanente nessa área, sob visão sistemática. Não percebemos a comunicação como mera infra-estrutura, tubos e conexões. Mas o que é transportado, foi para o superestrutural, na disputa do simbólico. Não entendendo apenas como ligação do interpessoal, mas também de massa, de todos os tipos", defende James Görgen.

No GT do Marco Legal foi discutido a possibilidade da Agência Nacional de Cinema (Ancine) ficar apenas com o papel de fomento e se reativar as ideias da Ancinav, de fiscalizar o audiovisual . Já no Governo Dilma Roussef o parecer jurídico do Minicom demarcou a tendência da fiscalização dos radiodifusores ser da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) que já formou um GT com a Ancine a fim de criar regras específicas para canais por assinatura.

No PLC 116 o MinC intensificou o papel dos seus articuladores no Congresso para aprovação. Apesar das inúmeras modificações, a postura do ministério e também a Ancine é pela aprovação imediata, fato continuado pelo gestão de Ana de Hollanda. O maior interesse é o incentivo a produção regional e independente que terão cotas especificas a serem cumpridas pelas programadoras dos canais por assinatura. Vale lembrar que na Ancinav eram previstas medidas que se aproximavam desses princípios do antigo PL 29.

Durante o 8º Congresso Brasileiro de Cinema e Audiovisual (CBC) o PLC 116 foi elencado como prioridade para o setor. Além das cotas na programação, a Ancine terá elevada sua capacidade de fomento a produção. O diretor da Ancine, Paulo Alcoforado, sintetizou ao público preocupações de setores do governo que rodearam o MinC: "Para o produtor independente se sobressair ao lado das teles e radiodifusoras é preciso comprovar que a descentralização movimenta a economia".

O fim da “política do balcão” no Ministério da Cultura

O Ministério da Cultura (MinC) era reconhecido até o fim do governo Fernando Henrique Cardoso por sua "política de balcão", a fim de favorecer artistas consagrados sob práticas de mecenato. Gilberto Gil assumiu o desafio de comandar o Ministério ainda no primeiro mandato do Governo Lula e tratou de mudar os rumos da pasta. A partir de então a cadeia produtiva da cultura foi alvo de ações mais complexas como a proposta de revisão dos direitos autorais, adoção do Creative Commons e o programa Mais Cultura, ao conciliar ações com as políticas sociais, em especial nos Pontos de Cultura.

O Instituto de Pesquisas Aplicadas (IPEA) avaliou de forma positiva 500 Pontos de Cultura distribuídos em aproximadamente 250 municípios brasileiros. Os Pontos integram o "Programa Arte Cultura e Cidadania – Cultura Viva" e contaram com cerca de 1 milhão de frequentadores esporádicos e 124 mil habituais.

Conforme os dados do IPEA, os investimento do Cultura Viva detém a maior responsabilidade pela ampliação das atividades nos Pontos. 37% dos espaços físicos são oriundos desses recursos, o que inclui bibliotecas, teatros, discotecas e salas de aula. A viabilidade e eficácia dos investimentos são registrados pelo fato de que cada Ponto recebe em torno R$ 180 mil reais para o período de dois anos e emprega 11 pessoas em média.

O Instituto também apontou as fragilidades para continuidade do programa, em especial a sustentabilidade, que pode ser comprometida em razão dos atrasos dos repasses e da descontinuidade do fluxo de recursos. Ao fim da gestão de Juca Ferreira é generalizada a situação dos Pontos que estão sem receber dinheiro já empenhado ou mesmo aqueles que esperam ratificar a validade de editais nos quais foram credenciados. Estima-se que o MinC herdou uma dívida de R$ 320 milhões, sendo R$ 70 milhões somente do Cultura Viva, o que representa 20% do total.

Os ordenados a pagar da antiga gestão do MinC se tornaram um dos álibis para a equipe a ministra do Governo Dilma Rousseff, Ana de Hollanda, sinalizar para fragilização do Programa. A atual Secretária da Cidadania e Diversidade Cultural, Marta Porto, responsável pelos Pontos, antes de chegar ao governo, defendeu a tese de que o social está matando a cultura. Atualmente ela aponta a necessidade de qualificar, mas descarta a expansão dos Pontos.

A professora da Escola de Comunicação da UFRJ, Ivana Bentes, escreveu artigo questionando a dicotomia entre expadir e qualificar. Para ela a rede dos Pontos seria “um programa de bolsas” caso não tivesse expandido por Estados e Municípios.

Tarciana Portella, representante do MinC na região nordeste, indica que além de pagar é preciso ampliar os recursos que margeiam cerca de 5 mil reais por mês para cada empreitada. Para ela as dificuldades enfrentadas pelos Pontos são sintomáticas de uma pasta historicamente esfacelada: infra-estrutura quase inexistente envolvendo união, estados e municípios, baixo orçamento e poucos funcionários.

Comunicação e Cultura

Portella ressalta que no projeto original os Pontos receberam equipamentos digitais que incluíam câmeras e computadores, criando dentro dos pontos uma vasta possibilidade de produção de conteúdo. Para difusão deste material foi utilizada a rede de cineclubes, internet e as TVs públicas. "Precisamos romper essa barreira entre a comunicação e cultura", sentencia Tarciana, já de saída do Minc.

A representação regional do nordeste do MinC foi responsável pela Conferência Livre de Comunicação para Cultura em setembro de 2009. O espaço buscou fazer conexões entre os temas das conferências dos dois setores.

Na II Conferência Nacional de Cultura, finalizada em março de 2010, foi possível perceber a maior capilaridades dos debates da comunicação ao sair resoluções como avançar na formulação e implantação do PNBL com a prestação do serviço em internet em regime público, além de ratificar o papel da TV pública para promover a produção independente e diversa.

Gustavo Yoda, jornalista cultural e associado do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, percebe avanços nos setores articulados nas políticas do MinC – a exemplo da rede Cultura Viva, na qual os Pontos de Mídia Livre são integrantes – mas ainda considera que o debate da difusão está muito aquém do ideal: "Uma parte estava na I Conferência Nacional de Comunicação, mas a rede não foi envolvida como um todo. Ainda falta encarar a comunicação como pauta essencial para dar vazão a outras pautas".

Direitos Autorais

Além de novos canais comprometidos com a produção e difusão de conteúdos, o MinC buscou constituir novos instrumentos legais para a propriedade intelectual, o que, teoricamente, atinge a concentração dos conglomerados midiáticos no país e porque não, no mundo.  Vale lembrar que o ministério teve participação destacável na convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, em 2007, na qual garantiu mecanismos para a área não sofrer interferências da Organização Mundial do Comércio (OMC).

As investidas do MinC e da Agência Nacional de Cinema (Ancine) no campo da propriedade intelectual buscam adequar a produção cultural nacional as novas necessidades do ambiente de convergência ao buscar tridimensionalidade dos direitos patrimoniais: direito sobre a obra, direito de exploração comercial e direitos sobre as receitas.

A proposta para revisão dos direitos autorais que caminha para o Congresso em 2011 destaca a descriminalização da cópia de músicas pela internet e a punição para as rádios e tv's que praticam o jabá.

Já o Creative Commons (CC) representa mecanismo de flexibilização das licenças nas obras artísticas, situação essa que tende a fragilizar o poder do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) no país e ampliar as possibilidades de compartilhamento cultural. Na gestão de Ana de Hollanda o Minc retirou do seu site o selo do CC, o que pra muitos significa o retorno da "política do balcão" em correspondência aos artistas consagrados que subiram no palco de Dilma Rousseff durante a tensa eleição presidencial de 2010. O ato no Rio de Janeiro teve entre os organizadores Antonio Grassi, atual presidente da Funarte, que também fez parte do Minc durante o governo Lula, mas saiu devido divergências.

Gustavo Yoda ressalta o papel do MinC no campo internacional e o pioneirismo em discussões como do direito autoral, mas lembra: "Muita coisa ficou pra trás, como a criminalização do jabá, por pressão no Congresso, lobby e ao mesmo tempo falta de postura enérgica do MinC".

 

Movimentos se apropriam da Arte e da Comunicação em suas lutas

A Cidade Tiradentes foi o último conjunto habitacional construído em São Paulo. Sua função era servir de cidade dormitório para trabalhadores do ABC. Apesar de planejado, como é comum na história da periferia paulistana, o projeto não foi bem desenvolvido, e hoje é um enorme distrito (distante 35km da Sé) com sérios problemas estruturais, onde moram mais de 200 mil pessoas. Quem conta a história é Wellington Lopes Goes, do Núcleo Cultural Força Ativa, movimento que tenta mobilizar os jovens locais pela cultura – hip hop, incentivo à leitura e ao estudo, etc. Wellington foi um dos convidados da Semana de Movimentos Sociais da USP, que aconteceu de 18 a 24 de setembro, na Escola de Comunicações e Artes.

Não são movimento artístico nem movimento social, assim se indefinem. Por meio de pequenas ações e manifestações artísticas tentam problematizar o cotidiano que as pessoas vivem. “Através da poesia trazer concepção de mundo que tá na vida das pessoas, mas que elas não percebem porque tem que fazer outras coisas”, diz Wellington Goes. Uma das principais atividades do grupo é o funcionamento da biblioteca comunitária, que surgiu para impulsionar a criação de uma pública.

Formada com doações da própria comunidade, começou com 1500 livros em 2001, e com o passar do tempo chegaram ao número de cinco mil catalogados e 500 não catalogados – o que, segundo Wellington, prova que a comunidade lê, “talvez não leia um por mês, mas um por ano sim. De certa forma, lê”.

A biblioteca acabou servindo também para formação de novos leitores. Atraíram muitos jovens com isso, e logo começaram um projeto de interpretação e escrita de textos. Para isso tiveram a ajuda do hip hop com oficinas de música, incentivando as pessoas a escreverem. “Quebramos a visão de serviço público. No começo, o pessoal achava que era serviço pelo costume. Fomos ensinando as pessoas a por a mão no livro, a pesquisar, sem ter medo de ter contato com o livro”, conta.

Tentaram colocar discussões sobre cultura para que o povo se mobilizasse. Inicialmente queriam que a prefeitura fizesse uma biblioteca em Tiradentes – que é do tamanho de muitas cidades do estado, porém a biblioteca pública não veio.

Quanto ao financiamento, se inscreveram em editais e chegaram a ter dois anos de financiamento público, o suficiente para comprar alguns livros, videoteca, e pagar um técnico por um tempo. O problema de organizações pegarem financiamento, acredita, é se as pessoas acharem que para começar qualquer projeto precisa de financiamento de fora. “Tem grupos que vivem pra isso, o fim é isso, captar recursos pra fazer. Aí eu acho que é uma confusão no movimento social. Isso é o fim do movimento”, opina Wellington.

Arte

Repensar a arte. Como ela pode organizar o cotidiano, ajudar o público a enxergar o cotidiano de forma inusitada, não dispersa; tirar a pessoa do dia a dia e levá-la a refletir, para que ela volte à realidade com outro olhar. Esse é o conceito de arte que prefere os integrantes da Força Ativa, inspirados em teóricos como Georg Lukács – citado a todo o momento por Wellington. Arte relevante seria aquela que desperta o reconhecimento do gênero humano, e não o reflexo do indivíduo egoísta, pós-moderno.

Fora da periferia, na Vila Madalena, a arte para a classe média encontra-se com os movimentos sociais. É a Companhia do Latão, que também esteve presente na Semana de Movimentos Sociais da USP na pessoa de Sérgio Carvalho, um dos fundadores da Cia, e professor de Dramaturgia e Crítica do curso de Artes Cênicas da ECA. A parceria com movimentos sociais do campo (como MST e Via Campesina) fez o Latão ser do jeito que hoje é conhecido, com crítica à sociedade e abordagem da luta de classe em clássicos como Santa Joana dos Matadouros e Círculo de Giz Caucasiano.

O Latão, surgido no começo dos anos 90, teve uma ligação acidental com os movimentos sociais. Quando fizeram Santa Joana dos Matadouros (de Bertold Brecth), bispos da Igreja pediram para apresentar a peça em Brasília, para o clero e lideranças do MST, que na época fazia sua segunda maior marcha da história. Trabalharam com grupos de cultura do MST e da Via Campesina para teatros, e chegaram a fazer vídeo com a Via.

“Se não tivéssemos ido em teatrão, não teríamos influenciado teatro crítico em São Paulo. No começo dos anos 90 não tinha a quantidade de teatro crítico que tem hoje, era bem diferente o cenário, onde há dezenas de grupos atuando inclusive na periferia. Mas ocupamos espaço de visibilidade”, afirma Sérgio. Para ele, só chegar na periferia não adianta se a produção não for crítica. Quanto ao mercado, não tem como escapar, a forma mercadoria é uma potência – o modelo dominante é “avassalador”, e a forma, diz, contém ideologia -, mas os novos grupos como Dolores, Engenho Teatral, Antropofágica, estão percebendo a necessidade de dramaturgia critica mais avançada, acredita.

A forma mercadoria também é um problema que afeta outras áreas, como os jornais. Sérgio lembra o caso do Brasil de Fato, de onde fez parte do conselho editorial. Apesar de o projeto inicial ser um jornal radical, conforme as idéias foram aparecendo, estavam muito próximas do padrão mercantil, em sua avaliação. A produção cultural é outro problema que jornais e teatros alternativos esbarram: se não se tem dinheiro ou propaganda, como manter uma equipe profissionalizada?

Sérgio também acredita que é preciso tomar cuidado com financiamento público, mas não fugir dele. “Teatro em São Paulo tem acesso a fomento publico. Antes era miséria, hoje é semi miséria, e dá para continuar a pesquisa, não só produzir espetáculo”. Para os grupos que querem se organizar politicamente, criar círculos alternativos na contramão, financiamento público é o único caminho, hoje. “O caminho publico é o único jeito. Caminho empresarial não tem nada”, avalia Sérgio.

Estudo mostra cultura brasileira em números

O Ministério da Cultura (MinC) lançou a segunda edição do estudo Cultura em Números, originalmente publicado em 2008. O levantamento traz os indicadores culturais referentes à produção, oferta, valores de captação, fundos, legislação e políticas de cultura.

Entre os setores analisados estão: cinema, vídeo, música, teatro, dança, circo, artes, design e moda, fotografia, patrimônio, museus, cultura popular, biblioteca pública, livraria, centro cultural, artesanato e meios de comunicação.

Os dados foram coletados entre os anos de 2003 e 2007 pelo IBGE, IPEA, INEP, Ibope, e compilados pelo MinC entre 2007 e 2008.

No setor cinematográfico, há informações sobre o número de salas por região e por habitantes, concentração de salas nas capitais, percentual de municípios com salas, cursos, festivais e editais de cinema. Além de esmiuçar a freqüência do público por faixa etária, raça, renda, escolaridade e sexo.

De acordo com os dados, a região que mais concentra salas de cinema no Brasil é a Sudeste, com 1.244, sendo que 722 estão no Estado de São Paulo. Na região Sul, a maior quantidade de salas está no Rio Grande do Sul: 139. No Nordeste, as salas estão mais concentradas na Bahia, com 71. No Norte, no Amazonas: 22. E no Centro-Oeste, no Distrito Federal: 79.

O Estado do Rio de Janeiro, por sua vez, é o que tem o maior percentual de festivais (28,26%), concursos de cinema (18,48%), cineclubes (27,17%), escolas e cursos de cinema (7,61%) e de municípios com salas de cinema (41,30%).

Porto Alegre e o Distrito Federal tem o maior percentual de pessoas que frequentam cinema. A média verificada nas capitais é de 15%, mas a capital gaúcha registrou 21% e o DF, 20%.

Já a faixa etária que passa mais tempo dentro das salas de cinema no país é a de 20 a 24 anos, com 21%. Em seguida, os adolescentes de 12 a 19 anos: 20%. Na freqüência por sexo, os homens aparecem com vantagem: 15% contra 13% das mulheres. E a raça que mais freqüenta as salas é a oriental, com 30%, seguida pelos brancos: 18%.

O perfil do consumidor apontado pelo estudo mostra que a população do Brasil, em média, vai ao cinema uma vez a cada 2 ou 3 meses, preferindo filmes de Hollywood e dos gêneros ação, aventura e comédia.