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Governo quer ser ‘parceiro’ da iBiquity, diz Hélio Costa

O governo quer ser parceiro da empresa norte-americana i-Biquity, detentora da tecnologia HD Radio, no desenvolvimento de um sistema de transmissão e recepção de rádio digital adaptado às particularidades brasileiras. O anúncio foi feito pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa, em reunião, em Brasília, nesta quinta-feira (13 de dezembro), com representantes de 89 professores e pesquisadores ligados ao Núcleo de Pesquisa Rádio e Mídia Sonora da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). A comissão, integrada pelos professores Luiz Artur Ferraretto, Nair Prata e Nélia Del Bianco, entregou ao ministro uma carta com propostas de parâmetros científicos para a adoção de uma tecnologia digital para o rádio. O encontro foi intermediado pelo secretário de Telecomunicações, Roberto Martins.

Ao se referir à parceria com a i-Biquity, o ministro disse que o interesse do governo é ser como um sócio da empresa para, inclusive, fabricar equipamentos no Brasil e, no futuro, exportar transmissores e receptores para outros países da América Latina. Hélio Costa condicionou esta aproximação à abertura da tecnologia, hoje proprietária, ou seja sob controle total da empresa. Com a medida, os radiodifusores passariam a ter direito de uso e de adaptação do HD Radio às características do sistema de radiodifusão sonora brasileiro. O ministro acenou, ainda, com a possibilidade de abertura de financiamentos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a indústria eletro-eletrônica. Até o final do ano, Hélio Costa espera receber da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) um relatório, "pormenorizado e consolidado", sobre a situação dos testes com o HD Radio que estão sendo realizados por emissoras comerciais.

Durante o encontro, o ministro comprometeu-se em manter um canal aberto à discussão com a comunidade científica, prometendo analisar as sugestões apresentadas pelos pesquisadores. A comissão de representantes dos pesquisadores de rádio e mídia sonora avalia como positivo o encontro com Hélio Costa e seus assessores. Os professores esperam que a decisão sobre o sistema brasileiro de rádio digital considere as sete diretrizes apontadas na carta entregue ao ministro: manutenção da gratuidade do acesso ao rádio, transmissão de áudio com qualidade em qualquer situação de recepção, adaptabilidade do padrão escolhido ao parque técnico instalado, coevolução e coexistência do digital com o analógico, aparelho receptor com potencial de popularização, escolha de uma tecnologia não-proprietária e com potencial de integração do rádio com outras mídias digitais.

Confira a íntegra do texto entregue ao ministro:

Brasília, 13 de dezembro de 2007

Ao Exmo.sr. Hélio Costa
Ministro de Estado das Comunicações

Prezado senhor:

Nós, um grupo de pesquisadores de rádio e mídia sonora, aqui incluídos os responsáveis por parcela majoritária da bibliografia produzida em nosso país nestas áreas dentro do campo da Comunicação Social, vimos, respeitosamente, sugerir ao senhor ministro das Comunicações, Hélio Costa, uma série de providências a respeito da implantação dos sistemas de transmissão e recepção digital na radiodifusão sonora. Todas as propostas aqui incluídas foram debatidas e partem do documento Carta dos Pesquisadores de Rádio e Mídia Sonora do Brasil, anteriormente divulgado por nós e repassado a Vossa Excelência e à sociedade brasileira.

1. A respeito dos testes com os sistemas existentes, propomos a criação de um Comitê de Assessoramento Científico, dando suporte ao Conselho Consultivo do Rádio Digital, estabelecido pela portaria ministerial número 83, de 13 de março de 2007. Seus integrantes seriam indicados por instâncias governamentais e/ou instituições da sociedade civil como a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel); o Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia; a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC); a Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão (SET); a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom)…

2. A este comitê caberá a definição dos padrões dos testes a serem realizados de forma mais sistemática, incluindo, neste processo, o estabelecimento de uma metodologia adequada e comum a todas as estações participantes e oferecendo ainda subsídios para a definição de um cronograma de implantação do sistema ou dos sistemas de rádio digital. Também o comitê vai se encarregar da ponderação dos resultados provenientes de emissoras de natureza diversa: comerciais, educativas e/ou comunitárias; de pequeno, médio e/ou grande porte; e de amplitude modulada e/ou de freqüência modulada… Esta instância poderá sugerir novas propostas para o rádio como produtor e emissor de conteúdo, a partir da base tecnológica digital.

3. Sugere-se que, dando suporte às iniciativas do Comitê de Assessoramento Científico, este aponte, com o apoio do Ministério da Educação, instituições de ensino superior aptas a analisar, em cada região, os dados provenientes dos testes ali realizados. Pretende-se, deste modo, ampliar o debate e as instâncias de análise, além de valorizar o imenso capital humano existente nas universidades brasileiras. Neste sentido, é fundamental a realização de audiências públicas descentralizadas. Considera-se como necessária a ocorrência de pelo menos uma em cada região do país e nos estados de maior concentração da produção radiofônica, propondo-se como locais universidades federais ou estaduais.

4. Deve-se ressaltar também, como é do conhecimento de Vossa Excelência, a imensa diversidade territorial do Brasil. Por este motivo, propomos a realização de testes, se necessário por emissora ligada ao governo federal, em pontos das regiões Centro-oeste, Nordeste e Norte, não apenas no Sul e no Sudeste, onde se concentram as experiências hoje realizadas de forma assistemática por estações que adquiriram os equipamentos de HD Radio do consórcio estado-unidense iBiquity. Da mesma forma, salientamos a obrigatoriedade de realizar testes nas mais diversas condições meteorológicas e topográficas.

5. Após o primeiro período de experimentos, seguir-se-ia uma cuidadosa análise por este comitê e, quando necessário, para a validação científica dos experimentos, ocorreria a repetição dos mesmos, todos realizados sob a fiscalização desta instância e com resultados tornados públicos por meio do Conselho Consultivo do Rádio Digital.

6. Para a definição do sistema ou dos sistemas, sugerimos que sejam consideradas as sete diretrizes para a implantação do rádio digital no Brasil a seguir relacionadas e explicadas:

6.1. Manutenção da gratuidade do acesso ao rádio.

Adotar um sistema que favoreça a oferta gratuita de programação é fundamental para o rádio. Estabelecer o princípio da gratuidade significa manter aberto o acesso à programação radiofônica centrada em notícia, entretenimento, esporte e utilidade pública.

6.2. Transmissão de áudio com qualidade em qualquer situação de recepção.

A tecnologia a ser adotada precisa garantir qualidade de som em diferentes situações de audição: móvel e doméstica. Necessita também ser capaz de garantir eficiência de transmissão em cidades com diferentes características topográficas e condições de uso do espectro eletromagnético, especialmente naquelas que apresentam elevados índices de poluição radioelétrica.

6.3. Adaptabilidade do padrão ao parque técnico instalado.

As emissoras brasileiras diferem quanto ao tipo de freqüência, potência dos transmissores, tipo de transmissor (valvular ou modular), infra-estrutura técnica de produção, equipe de pessoal técnico e de produção. Há diferenças a serem consideradas na forma de exploração e forma de financiamento: comerciais, educativas, culturais, legislativas, estatais, institucionais e comunitárias. A tecnologia de transmissão precisa ter em si este potencial de adaptabilidade em diferentes situações. Talvez seja conveniente pensar que um único padrão não será suficiente para atender à diversidade existente. Os testes devem, portanto, considerar a possibilidade de adoção de um sistema híbrido.

6.4. Coevolução e coexistência do digital com o analógico.

No processo de mudança, é necessário haver um período de transmissão simultânea de conteúdos em formato analógico e digital, até o momento em que ocorra a popularização dos receptores digitais. Para tanto, os testes devem atentar para possíveis interferências entre o novo sinal digital e o analógico tradicional.

6.5. Aparelho receptor com potencial de popularização.

A preocupação com a popularização do rádio digital é procedente porque a adoção de uma nova tecnologia não pode criar uma divisória digital intransponível entre os que terão acesso ao aparelho receptor digital e os outros que permanecerão no analógico por falta de recursos para adquirir um novo aparelho. E isto contraria o espírito popular e abrangente conquistado pelo rádio na era eletrônica. Ter aparelhos acessíveis no mercado requer implementar políticas públicas de incentivo para que a cadeia produtiva da área elétrica e eletrônica possa disponibilizá-los a preços atraentes para o consumidor final. Desta política, pode depender o sucesso da mudança.

6.6. Tecnologia não-proprietária.

O pagamento pela tecnologia digital de transmissão pode inviabilizar sua adoção por parte de emissoras comunitárias, educativas ou mesmo comerciais de pequeno porte. Esta condição deixa os radiodifusores sujeitos aos ditames de uma empresa que administra os direitos de uso da tecnologia, podendo estes perder o controle sob o gerenciamento do processo de instalação e definição de equipamentos.

6.7. Escolher uma tecnologia que tenha potencial de integração do rádio com outras mídias digitais.

O digital é por natureza uma tecnologia flexível, porque permite combinar, interligar, organizar e integrar serviços, que antes estavam separados. A sua disseminação tem contribuído para forjar uma base material que favorece hibridação das infra-estruturas indispensáveis à geração e à transmissão de dados, sons e imagens em proporções incalculáveis e em alta velocidade graças aos processos de compressão e descompressão de dados. Com esta tecnologia, é possível caminhar para a convergência de setores antes distintos – a informática, as telecomunicações e a comunicação – num só campo técnico denominado de multimídia, uma estrutura de comunicação integrada, digital e interativa. O rádio digital não poderá ficar isolado do movimento convergente. A tecnologia de transmissão a ser escolhida terá de ser flexível a ponto de favorecer a integração do meio com as demais mídias e com sistemas de redes informatizadas.

7. Independentemente do sistema a ser adotado, observamos a necessidade de que sejam estabelecidas pelo governo federal duas frentes de linhas de custeio: a primeira delas destinada às emissoras comerciais de pequeno porte, comunitárias e educativas, usando como balizadora a potência não superior a 5 kW e não sendo, no caso de estação comercial, propriedade de indivíduo sócio de outros empreendimentos na área; e a segunda voltada à indústria eletrônica para a produção de aparelhos com tecnologia digital de transmissão e recepção para radiodifusão sonora. Nesta última, incluir-se-ia a obrigatoriedade da presença da amplitude modulada em qualquer equipamento (celular, MP3 player etc.) que disponibilizar ao ouvinte a faixa de freqüência modulada. Observa-se, ainda, a necessidade de apoio financeiro do governo para a cobertura dos custos provenientes da manutenção do Comitê de Assessoramento Científico.

Com estas medidas, cremos que o rádio brasileiro terá garantida, em sua diversidade, a continuação progressiva e segura do seu desenvolvimento histórico. Ficamos, assim, à disposição através de nossos representantes, os professores Luiz Artur Ferraretto, Nair Prata e Nélia Del Bianco, e subscrevemo-nos.

Abert quer novos testes com IBOC e tenta defender padrão

A Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) está convidando a Universidade Mackenzie para realizar testes independentes do padrão de rádio digital In Band on Channel (Iboc) durante os próximos dois meses, para dar maior credibilidade e comprovar a eficácia dessa tecnologia. A informação foi dada com exclusividade a esta coluna pelo presidente da entidade, Daniel Pimentel Slaviero. Até aqui os testes têm sido feitos apenas por uma dúzia de emissoras de AM, FM e ondas curtas, sem critérios homogêneos.

A Abert defende convictamente o padrão Iboc. Falando ao Estado, Daniel Slaviero responde a cada um dos problemas evidenciados nos testes ou apontados pelos críticos do padrão norte-americano, criado pela empresa Ibiquity. Eis, a seguir, uma síntese de sua defesa:

• O atraso de 8 segundos do sinal digital em relação ao analógico será progressivamente reduzido com o avanço tecnológico. Mas nunca será eliminado.

• A interferência do sinal digital em AM nas demais emissoras, especialmente à noite, já está sendo resolvida, com alguns recursos tecnológicos e com a redução da potência nos horários noturnos, como ocorre com as transmissões analógicas.

• Em sua opinião, a evolução tecnológica permitirá o desenvolvimento de receptores portáteis, hoje inviáveis por conta do excessivo consumo das baterias.

• A dificuldade de produção de receptores digitais a preços acessíveis pela indústria brasileira será resolvida pelo aumento da escala de produção, por incentivos e políticas especiais e pela própria evolução tecnológica.

• Com a adoção do padrão Iboc, a maioria das emissoras brasileiras irá, progressivamente, superando as dificuldades financeiras decorrentes do investimento em novos transmissores e estúdios, hoje variáveis de R$ 35 mil a R$ 140 mil, conforme a potência das rádios. É claro que as maiores emissoras começarão o processo em primeiro lugar, estimulando as demais a seguir o rumo do salto tecnológico.

Em síntese, Slaviero acredita que “todos os problemas surgidos nos testes de rádio digital ou apontados pelos técnicos já foram ou serão eliminados a curto ou médio prazo com a evolução da tecnologia”. A única limitação que, em sua avaliação, ainda deverá persistir, embora em menor grau, será o atraso de quase 8 segundos, entre o processamento do sinal digital e o analógico.

Por que não esperar que esses problemas sejam totalmente eliminados? “Porque temos urgência na adoção do padrão digital e não podemos esperar pela solução de pequenos e eventuais problemas que ainda existem” – explica Slaviero. Para a Abert, a questão é de sobrevivência do modelo de negócios do rádio brasileiro. “A digitalização – diz seu presidente – é a única solução inovadora capaz de elevar a qualidade e o alcance das transmissões de rádio e oferecer novas opções ao modelo de negócio das emissoras, diante dos desafios da convergência tecnológica e da entrada no mercado de competidores tão fortes quanto as empresas de telefonia”.

Slaviero acha que a situação do padrão Iboc nos Estados Unidos não é negativa. Pelo contrário, considera animador o fato de 12% das 15 mil emissoras norte-americanas já terem aderido à tecnologia digital, desde sua introdução em 2002. Embora a decisão do órgão regulador das comunicações dos Estados Unidos, a Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês), em favor do Iboc tenha sido adotada de 2002, “a introdução do padrão digital – diz Slaviero – só começou, a rigor, há dois anos.”

Por todas essas razões, a realização de testes pela Universidade Mackenzie, sob a responsabilidade do professor Gunnar Bedicks Jr. “deverá eliminar todas as dúvidas sobre a qualidade do padrão Iboc” – aposta Daniel Slaviero. A própria Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) poderá acompanhar e homologar esses testes.

A Abert acha também que as eventuais divergências ou diferenças de opinião entre a Casa Civil e o Ministério das Comunicações sobre o padrão Iboc de rádio digital são menores do que sugerem as notícias divulgadas nas duas últimas semanas. Por isso defende a decisão governamental em favor do padrão digital logo após os testes a serem realizados pela Universidade Mackenzie, sem ter que aguardar as conclusões de uma possível delegação brasileira aos Estados Unidos, como sugeriu André Barbosa Filho, assessor da ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil.

Vale lembrar que, depois de ter participado de audiência pública no Senado, dia 16 de outubro, Barbosa Filho, revelou sua preocupação com as possíveis conseqüências da adoção de um padrão de rádio digital no estágio que demonstram os testes feitos pelas emissoras.

Segundo o assessor, o ministro das Comunicações Hélio Costa está ciente das preocupações da Casa Civil e poderá aceitar a sugestão de uma delegação brasileira que visite os Estados Unidos, com o objetivo de ouvir representantes da FCC, das emissoras de rádio e das universidades. “A Casa Civil está preocupada em não tomar uma decisão de afogadilho", frisou.

Após constatar problemas, governo adia decisão para 2008

O governo irá adiar por mais alguns meses a decisão sobre o padrão digital para as rádios brasileiras. Há meses o padrão norte-americano Iboc tem sido apresentado pelas emissoras associadas da Abert como o único capaz de atender as necessidades das empresas nacionais, tendo o apoio do Ministério das Comunicações. Mas as dúvidas sobre a eficiência técnica do sistema, que já povoavam os corredores da Anatel, chegaram em instâncias superiores. A cautela agora é da Casa Civil, que estima ser possível definir a questão apenas no primeiro trimestre de 2008, na melhor das hipóteses.

"Esse tema da rádio digital tem nos assustado na Casa Civil, em vista do que estamos ouvindo sobre o padrão", confessou o assessor especial André Barbosa. "O Iboc tem problemas. Técnicos canadenses nos contaram que à noite há grandes interferências entre as transmissões digitais e analógicas, por exemplo. Existe ainda a questão do alcance. Uma rádio que tem alcance 110 km, no sistema digital cobrirá 70 km. Imagine para uma rádio comercial perder 40 km de cobertura", afirmou após debate no Senado Federal sobre os desafios para a criação de uma Lei de Comunicação Eletrônica de Massa.

Os primeiros alertas sobre os problemas com o Iboc partiram da Anatel. O superintendente de Serviços de Comunicação de Massa, Ara Apkar Minassian, reclamou publicamente da falta de informações objetivas nos resultados dos testes encaminhados pelas empresas à agência. Os dados incompletos atingem exatamente os pontos levantados por Barbosa: cobertura e nível de interferência.

Comitiva

Para tentar separar as críticas consistentes dos boatos, Casa Civil e Ministério das Comunicações decidiram mandar uma missão aos Estados Unidos para analisar a aplicação prática do Iboc. A comitiva deve fazer um breve tour em emissoras de Washington que adotaram o sistema, conversar com a Federal Communications Commission (FCC) e avaliar os estudos tocados no âmbito acadêmico, provavelmente visitando a universidade de Georgetown. "Nós sabemos de antemão que, das 13 mil rádios norte-americanas, menos de 1 mil se digitalizaram. Vamos lá pra saber por que isso aconteceu", explicou Barbosa.

A data da viagem ainda não foi agendada e a Casa Civil espera que o Ministério das Comunicações organize a comitiva. Mas, antes dela, é praticamente nula a possibilidade de uma definição sobre o padrão. "Não acredito que essa decisão seja em 20, 30 dias já que ainda nem marcamos a viagem. Estamos preocupados em não tomar uma decisão de afogadilho", ponderou o assessor.

Alternativas

Um outro aspecto para a insegurança em decidir sobre o padrão é a perspectiva nutrida pela Casa Civil de encontrar alternativas ao Iboc. O Comitê Comercial do Consórcio DRM (Europeu) chegou a prometer ao governo brasileiro o desenvolvimento de uma solução que permitisse o uso do padrão europeu em multicasting. Mas a promessa, até hoje, não foi cumprida. "Michel Penneroux, manda pra gente! Nós queremos uma alternativa", reclamou André Barbosa, referindo-se ao presidente do comitê.

Mas Barbosa defende um outro plano para construir uma alternativa ao Iboc. O assessor especial apóia levar o debate ao ambiente universitário, que se dedicou anteriormente à pesquisa da TV digital. "A única maneira de resolver é colocar a inteligência brasileira nisso", resumiu. Ele aposta que, com a expertise gerada com as pesquisas para TV, a academia precisaria de uns seis meses para apresentar uma solução híbrida ao Iboc corrigindo os problemas do sistema.

HD Radio/Iboc vai reduzir espectro de frequências em 30%

Se a implantação do rádio digital alimentava expectativas quanto ao aumento do número de emissoras, melhorias na qualidade do som e o fim das interferências na transmissão das emissoras AM, a escolha do padrão pode resultar no inverso.

Segundo especialistas, a implantação do sistema HD Rádio (também conhecido como Iboc) pode provocar o desaparecimento de um terço das emissoras. Em São Paulo, por exemplo, deixariam de funcionar 13 das 39 emissoras comerciais em atividade na cidade, entre as locais e as que têm área de cobertura na região metropolitana. Isso porque, para que comece a transmitir simultaneamente os sinais analógico e digital, cada emissora vai dobrar de espaço: dos atuais 200 kHz, passará a 400, diminuindo as possibilidades de ocupação do espectro em aproximadamente 30%.

“Com o HD Rádio, algumas emissoras comerciais serão prejudicadas, pois deixarão de existir, e outras, beneficiadas pela redução de concorrência. Mas qual será o critério para decidir quem fica e quem sai?”, pergunta o engenheiro e pesquisador Marcus Manhães.

No afã de realizar rapidamente a transição, o Ministério das Comunicações prescindiu de levantamentos sobre as implicações econômicas, políticas e sociais da escolha [veja matéria]. Claramente favorável ao sistema norte-americano, o órgão sequer realizou testes comparativos entre os padrões, e faz ouvidos moucos às críticas que o HD Rádio vem sofrendo de engenheiros, dirigentes de emissoras públicas e representantes de rádios comunitárias.

Falso IBOC

Dois padrões são compatíveis com o sistema de radiodifusão brasileiro: o HD Rádio, desenvolvido pela empresa norte-americana iBiquity Digital Corporation (que apresenta os sistemas AM IBOC e FM Iboc) e o Digital Radio Mondiale (DRM), desenvolvido por um consórcio europeu.

Os radiodifusores e o ministro Hélio Costa apresentam o sistema norte-americano como o mais adequado à realidade brasileira. Sua justificativa é o fato – imprescindível, segundo eles – de o Iboc manter as emissoras em suas freqüências atuais.

O conceito de Iboc (In Band on Channel) é transmitir sinais analógico e digital em um mesmo canal. O sistema norte-americano, contudo, não é um Iboc de fato. Em vez de manter os dois sinais no espaço ocupado pela emissora originalmente, de 200 kHz, o sinal digital é alocado nas laterais, avançando sobre outras emissoras.

“O sistema da iBiquity”, observa o engenheiro Takashi Tome, “parte do pressuposto de que o espectro está esparsamente ocupado e que os canais adjacentes estão livres”. Nas regiões metropolitanas brasileiras, onde o espectro é congestionado, esse procedimento pode causar interferências e, na prática, suprimir emissoras.

Não há qualquer garantia de que quando o sinal analógico seja suprimido a emissora voltará ao seu tamanho anterior. A própria iBiquity já propôs a ampliação das emissoras, após a implantação do rádio digital, para 250 kHz, sob justificativa de melhorar a recepção.

Atualmente, está em desenvolvimento um DRM em modo Iboc. Com uma diferença fundamental do modelo da iBiquity: “o sinal fica estritamente confinado ao próprio canal (ou seja, é um Iboc verdadeiro) e, assim, não interfere nas emissoras adjacentes”, diz Tome. 

Pressa

A Universidade de Brasília, em parceria com a Radiobrás, anunciou que irá testar o DRM – até agora, apenas o HD Rádio foi testado no Brasil. Segundo Lúcio Martins da Silva, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da UnB, é inviável escolher o padrão agora. “A menos que não se espere pelos testes”, conclui.

A Anatel, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que aguarda a finalização dos trabalhos na UnB para realizar a avaliação com o padrão DRM. A agência enfatiza, porém, que sua função é subsidiar as decisões do Ministério das Comunicações, que é o responsável pela decisão sobre os padrões e sobre o cronograma de implantação do rádio digital no país.

O ministro Hélio Costa declarou à imprensa, em diferentes ocasiões, que a decisão tem de ser tomada com urgência e que não é possível esperar pelos resultados de testes com o DRM. Procurado pela reportagem, o Ministério das Comunicações afirmou que todas as informações sobre o rádio digital estão disponíveis em seu site na internet.

Transição pode acabar com pequenas rádios, diz parlamentar

Porto Alegre (RS) – A digitalização pode acabar com as rádios comunitárias e independentes, caso o governo não propicie as condições mínimas para a adequação ao novo sistema. O alerta foi dado pelo deputado federal Paulo Bornhausen (DEM-SC), coordenador da Frente Parlamentar da Radiodifusão na Câmara dos Deputados. O parlamentar critica o pouco debate com a sociedade e a falta de clareza nas informações dadas pelo Ministério das Comunicações. Bornhausen também denuncia que se o sistema digital não for bem escolhido e implementado no país, as rádios poderão ser marginalizadas, reduzindo a diversidade de informações disponibilizadas hoje ao cidadão.

O motivos dessa marginalização, explica Bornhausen, seria principalmente a questão econômica, já que as rádios comunitárias e as que não integram as grandes cadeias de Comunicação dispõem de poucos recursos. "Primeiro, porque o sistema é caro. Em segundo, precisa-se saber de que forma irá ser feita essa transição. E, depois, que condições serão dadas, principalmente para as pequenas rádios, que são as que estão à margem desse processo. Porque os grandes grupos de comunicação do Brasil têm dinheiro, tem condições de atender às questões bancárias, financiar os seus equipamentos. E as pequenas rádios, até agora, visto que a digitalização pode custar US$ 150 mil, o que acontece é que são poucas as rádios do país que têm condições de dispor desses recursos sem ter que buscar empréstimos", afirma.

O deputado também reclama da falta de prioridade dada pelo governo federal ao tema da digitalização das rádios. Ele relata que o debate sobre o novo sistema de televisão já está bem adiantado, já que as grandes emissoras estão pressionando para que o padrão seja escolhido e rapidamente implementado. Bornhausen teme que a demora e a falta de discussão com a sociedade sobre a digitalização do rádio possam fazer com que seja aprovado um padrão longe da realidade das emissoras no país.

"Mas agora precisamos da definição, da tecnologia, porque várias rádios vão começar a entrar em operação, como já estão hoje em operação experimental, mas já usam essa tecnologia, e vai ser inviável não fazer rapidamente a universalização da digitalização" diz.

A Frente Parlamentar da Radiodifusão da Câmara irá promover debates sobre a digitalização do rádio. O governo federal ainda não definiu o padrão a ser utilizado, mas Bornhausen avalia que o mais cotado para AM e FM é o sistema dos Estados Unidos, que permite à emissora utilizar o mesmo canal em que já trabalha. No caso das ondas curtas, o sistema mais propício é o europeu. Para o deputado, a digitalização deve facilitar o setor de Comunicações.

"Hoje, o sistema de informações é muito bem coberto pela radiodifusão nacional. Só que à medida que você cria um padrão comercial diferente, um padrão de qualidade, se não der condições para que todos possam se digitalizar, vamos assistir aí a uma diminuição no número de rádios no Brasil, na comunicação, e quem irá ficar descoberto será certamente as pessoas que vivem no interior do país", afirma