Arquivo da tag: Direito Autoral

MinC fará apresentação da proposta da reforma da lei de direito autoral no ínicio de novembro

O Ministério da Cultura vai apresentar a proposta de reforma da lei de direitos autorais (Lei 9.610/1998) no dia 9 de novembro, durante o III Congresso de Direito de Autor e Interesse Público, em São Paulo. Depois de apresentada publicamente, a proposta será levada a consulta pública. A expectativa do MinC é de que a proposta de reforma da lei entre na pauta do Congresso no início do ano legislativo de 2010.

O MinC anunciou a data oficial de apresentação da proposta depois de receber em 23 de outubro um apelo para a imediata publicação da reforma da lei, assinado pelo Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação da Universidade de SãoPaulo (Gpopai/USP), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Ação Educativa, Instituto Paulo Freire, Movimento Música Para Baixar, Sérgio Amadeu, Ladislau Dowbor e Ivana Bentes.

Os grupos e pessoas envolvidos no apelo participaram do processo de discussões sobre a lei de direitos autorais atual, conduzido pelo Minc nos últimos dois anos, processo que apontou a inadequação da lei frente às necessidades da sociedade brasileira. A expectativa inicial era de que a proposta de uma nova lei fosse apresentada em abril de 2009.

“Tratar-se-ia, neste caso, do desperdício de uma oportunidade histórica de elaborar uma proposta avançada, adequada à nova realidade tecnológica e às necessidades efetivas da sociedade brasileira que hoje carece de respaldo legal para desenvolver de maneira adequada a educação e a cultura do país”, diz o apelo.

As inscrições para o III Congresso de Direito de Autor e Interesse Públicosão gratuitas e limitadas, podendo ser feitas até o dia 4 de novembro no site http://www.direitoautoral.ufsc.br/ (clique em "Inscrições" e siga as instruções).

Lei brasileira é restritiva, diz estudo internacional

[Título original: Estudo comparativo mostra que lei de direito autoral brasileira é restritiva]

Relatório produzido pela organização Consumers International coloca o Brasil em 13o lugar entre 16 países avaliados quanto aos dispositivos presentes na lei de direito autoral que permitem o acesso ao conhecimento. O estudo avaliou a presença de 60 itens que podem estar presentes nas leis e que permitem que as pessoas tenham maior acesso a bens protegidos por direito autoral. O Brasil só garantiu mais acesso que Inglaterra, Tailândia e Argentina.

O estudo da Consumers International foi baseado em questões elaboradas por especialistas que avaliam o grau de acesso ao conhecimento que a legislação de direito autoral dos países permite. Entre os itens avaliados, destacam-se o escopo e duração do direito autoral; a liberdade de uso de materiais protegidos por usuários domésticos, para fins educacionais, na Internet, pelos criadores de conteúdos, pela imprensa, por bibliotecas, por deficientes físicos e em assuntos públicos e a liberdade de compartilhar e transferir os direitos.

O estudo busca contrapor-se ao Relatório Especial 301, um controverso dispositivo utilizado pelos Estados Unidos para pressionar países com os quais mantém relações comerciais a adotarem políticas de direito autoral mais restritivas. O Relatório Especial 301 é publicado pelo United States Trade Representative (espécie de secretaria de comércio exterior) e avalia as leis nacionais de direito autoral e o seu cumprimento, ameaçando países cujas ações neste campo os EUA consideram inadequadas de perder tratamento alfandegário privilegiado.

Entre os países que se saíram melhor na avaliação da Consumer International estão grandes países asiáticos, como Índia (1o lugar), China (2o), Coréia do Sul (3o) e Indonésia (5o). Ao lado deles, estão os Estados Unidos (4o lugar), justamente o país que mais tem pressionado na sua política externa para a adoção de regras de direito autoral menos permissivas. Enquanto os Estados Unidos adotam uma legislação permissiva, particularmente por um mecanismo abrangente de exceções e limitações chamado "fair use" (uso justo), sua política comercial, que inclui os Relatórios Especiais 301, tem pressionado outros países a reduzir os dispositivos que garantem o acesso ao conhecimento.

SAIBA MAIS:

– Sumário do relatório da Consumers International.
– Relatório da Consumers International analisando a legislação brasileira.
– Relatório Especial 301 do USTR.

Ecad, Globo, compositores: De quem é a música?

Um belo dia, um músico com cara de Dom Quixote decidiu se insurgir contra sua própria família, a dos compositores brasileiros reunidos sob o guarda-chuva do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição, o Ecad. Com outros sete autores especializados em trilhas sonoras para televisão, Tim Rescala abriu um processo contra a instituição, que centraliza o recolhimento de direitos autorais, da qual ele é um dos 260 mil associados.

A família contra-atacou. A assembléia que compõe o Ecad, integrada em tese por compositores (mas na prática também por representantes de gravadoras e editoras de música), indignou-se com um artigo publicado no jornal O Globo, no qual Rescala classificava a instituição-mãe como “caixa-preta”. Deliberou-se que o Ecad moveria uma ação por difamação contra o filhote rebelado.

Havia ainda outro personagem, oculto e de atuação controversa na trama. “O que motiva Tim Rescala é uma coisa chamada Rede Globo”, afirma um membro ativo da assembléia do Ecad, o editor José Antonio Perdomo. “Por trás dele, está o interesse da Globo de asfixiar o Ecad.” De fato, outra disputa, bem mais feroz, se desenrola na Justiça, entre a maior rede de tevê do País e a instituição mais poderosa da atual música brasileira (em 2007, o Ecad declarou ter arrecadado 302 milhões de reais, mais que todas as grandes gravadoras reunidas). Para ter autorização de usar suas músicas, a Globo (bem como as demais emissoras, quase todas “rebeldes” ao Ecad) tem de pagar uma taxa mensal ao escritório.

O Ecad reivindica na Justiça 2,5% de todo o faturamento da Globo (o que equivaleria, hoje, a cerca de 16 milhões de reais mensais, 192 milhões por ano) em pagamento pelas músicas executadas na programação. A rede contesta esse valor e deposita, em juízo, 4,1 milhões de reais mensais. 

A Globo nega qualquer vínculo entre a disputa maior e a menor, movida pelos compositores Rescala, Sérgio Saraceni, Mu Carvalho, Guilherme Dias Gomes, Armando Sousa, Márcio Pereira, Ricardo Ottoboni e Rodolpho Rebuzzi. “A TV Globo não tem nada a ver com a ação dos produtores musicais. Este é um assunto entre eles e o Ecad”, manifesta-se a Central Globo de Comunicação (CGC). 

Rescala, além de ter usado O Globo como veículo de protesto, trabalha para a tevê do grupo desde 1989. Prestador de serviços terceirizado à Globo, é autor de temas incidentais usados em programas como Zorra Total, A Escolinha do Professor Raimundo e Hoje É Dia de Maria. “Não agimos motivados pela Globo, apenas temos um inimigo em comum”, ele afirma. E diz que o levante sobre o Ecad é resultado de uma tomada de consciência: “A nossa ignorância como classe é responsável por isso. Eu era relapso. A maioria dos músicos é assim, e vão sendo engambelados. Não sabem nem o que é o Ecad. Fui assim, não sou mais”. 

Complexas são as circunstâncias que fazem um grupo de músicos encarar como “inimiga” a entidade que existe supostamente para protegê-los. Na ação, eles reivindicam do Ecad um ressarcimento de cerca de 140 milhões de reais. “Como oito titulares de direitos autorais querem receber 140 milhões de atrasados, se a Globo não pagou isso para a gente?”, indaga a superintendente do Ecad, Glória Braga. “Arrecadamos ano passado 302 milhões de reais, para quase 100 mil autores, e eles querem 140 milhões para oito, o que é isso? Se perderem, vão pedir 140 milhões à Globo? Não vão.” Rescala tem argumentos para legitimar as queixas de seu grupo. De 2001 para cá, os autores de músicas incidentais, ou de background, para produtos audiovisuais viram o Ecad reduzir seus rendimentos sucessivamente para um terço, um sexto e 1/12 do valor original. “Para eles, a música preexistente vale 12 vezes mais que a música feita especificamente para uma novela, por exemplo. Deveria ser o contrário”, queixa-se Rescala. 

Glória Braga retruca de modo indireto: “Pergunte para os autores das músicas de abertura de novela o que acham disso”. Não diz mais, mas dá a entender que a “redistribuição” é demanda dos próprios autores, os colegas mais famosos (e poderosos) dos fazedores de trilhas. “Quando o processamos, muitos titulares nos mandaram cartas dizendo ‘é isso mesmo’.” 

Entre os temas de abertura de novelas recentes contam-se composições (quase sempre antigas) de Dorival Caymmi, Tom Jobim, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Luiz Gonzaga Jr., Fábio Jr. e Leonardo. “Não se quis levar a coisa para o lado da luta de classes”, afirma Glória. 

Mas que a luta existe, existe. É o que afirma Roberto Ferigato, um músico de Jundiaí, autor de trilhas de esporte radical e fornecedor de fundos musicais para o SBT e a Record. Com outros 24 autores, ele move ação semelhante contra o Ecad, a partir de São Paulo, e descreve uma situação hipotética: “Eles acham que a gente estava ganhando mais que os compositores em evidência. Não querem que conste no boletim do Ecad que ‘a música mais tocada do ano é de Roberto Ferigato’. Quem é Roberto Ferigato? Uma parte da classe autoral que está pendurada mamando na teta não quer isso”. 

Ele justifica o processo contra o Ecad: “Não aceitamos a redução de valores, feita sem nossa autorização. Foi desleal. Não publicam as pautas das assembléias. Não tem como a gente participar, não é um processo democrático. Processaram o Tim para intimidar a gente”. A assembléia do Ecad, hoje, é integrada por dez sociedades arrecadadoras de direitos autorais, das quais só seis têm poder de voto. O peso de cada voto é proporcional ao montante recolhido por sociedade. Atualmente, as decisões no Ecad são lideradas pela União Brasileira de Compositores (UBC) e pela Associação Brasileira de Música e Artes (Abramus), com cerca de 38% do recolhimento total para cada uma. 

À UBC estão filiadas editoras poderosas e autores como Gilberto Gil, Chico Buarque, Erasmo Carlos, Milton Nascimento, Rita Lee, Djavan, Leonardo, Marisa Monte, Racionais MC’s e Ana Carolina. A Abramus é tida como a sociedade das gravadoras, e abriga nomes como Caetano Veloso, Tom Zé, Zé Ramalho, Fábio Jr., Marina Lima, Titãs, Nando Reis, Chitãozinho & Xororó, Seu Jorge e Pitty. E Tim Rescala. 

Segundo o compositor, a redução dos valores devidos a autores de trilhas começou quando vários deles ingressaram na Abramus. Sua entrada, diz, colocaria essa sociedade na liderança da assembléia, o que teria provocado a reação da UBC e a mudança das regras. Para ele, José Antonio Perdomo é “o Eurico Miranda do Ecad”. Ex-presidente da editora multinacional EMI Publishing, Perdomo tem sido reeleito sucessivamente na UBC desde 1989. 

“Nosso plano era ficar quatro anos e cair fora, mas as coisas não são assim. Eu sempre fui eleito pelos compositores, com mais de 80% dos votos”, defende-se. “A gente troca a diretoria para não dizerem que é sempre a mesma.” 

Mesmo sob um verniz de maior civilidade e modernidade, o Ecad faz lembrar, sob esses aspectos, a cartorial Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), controlada por Wilson Sandoli desde 1964, e onde membros rebelados costumam ser ameaçados de processos ou expulsão. Rescala acusa o escritório de inicialmente ter se utilizado da controversa Lei de Imprensa para processá-lo, o que o departamento jurídico do Ecad nega. 

Glória Braga sustenta que o processo não se deve à represália. “A assembléia entendeu que o artigo dele era difamatório, calunioso. Decidimos procurar remédio no Judiciário. Isso é a democracia”, diz. É ela, de resto elegante e gentil, quem profere uma frase como a seguinte: “Ato de ditadura seria contratar alguém para dar uma surra no Tim Rescala”. 

Nas sombras da trama, permanece a Rede Globo, contrária aos 2,5% exigidos pelo Ecad. “Tem de pagar 2,5%, sim”, retruca Perdomo. “O preço de seus anúncios quem estipula é ela. Eu dou o preço, se não quiser pagar, então não usa as músicas. A Globo alega que o Ecad está querendo ser sócio dela. Mas, se tirar a música, acabou a Rede Globo.” 

Nas sombras vive também a elite dos autores brasileiros, de quem raramente se ouvem queixas contra o Ecad. Perdomo dá a entender de que lado eles estão: “Como o artista pode ir contra uma TV Globo? Eles podem nos dar força, mas no nível da diretoria, não em público. Se um artista médio defender o Ecad, acabou”. 

É desse contexto que emerge, das entranhas da Rede Globo, um quixote como Tim Rescala.

Senadores defendem revisão da lei de direitos autorais

Em audiência pública na Comissão de Educação, Cultura e Esportes do Senado, a necessidade de revisão da lei brasileira de direitos autorais (Lei 9.610/98) foi consenso entre os parlamentares.

O encontro que reuniu, durante quatro horas, senadores, especialistas, associações representativas dos músicos e cineastas e um representante do governo, teve como tema principal a arrecadação de direitos autorais da atual legislação pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) e a falta de regulação por um agente estatal.

O senador Gerson Camata (PMDB-ES), contrariado com a legislação vigente, sugeriu ao senador que presidia a audiência, Flávio Arns (PT-PR), que um dos convidados, o professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e especialista em propriedade intelectual Marcos Bitelli sugerisse um novo texto para a lei.

O professor fez críticas ao modelo de gestão do Ecad e disse que é um modelo concentrador já que coloca nas mãos de apenas duas, das dez associações que compõem o escritório, as decisões de direitos autorais no país.

Para Flávio Arns, a revisão da lei, com o auxílio de um novo texto de Bitelli, seria um desdobramento prático da audiência. Ao final, ele estabeleceu o prazo de duas a três semanas para que ocorra uma reunião de trabalho "para apresentação do texto que seria de debate para uma nova lei de direitos autorais". O senador Papaléo Paes (PSDB-AP) concordou que este seria o desenho de uma lei "mais justa" para os autores.

Já o coordenador-geral de Direito Autoral do Ministério da Cultura, Marcos Alves de Souza, defendeu que a supervisão estatal seria um bom caminho. Segundo ele, é impossível ao ministério avaliar se os valores cobrados pelo Ecad são razoáveis, já que o escritório cobra 2,5% do faturamento total dos donos de salas de cinema, emissoras de televisão e de eventos para os direitos autorais.

Especialista critica modelo de gestão dos direitos autorais no Brasil

Brasília – Cobrar taxas por músicas inseridas em filmes ou na programação de emissoras de televisão é "um choque entre dois mundos". Essa é a avaliação do professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e especialista nas áreas de propriedade intelectual, audiovisual e comunicação social, Marcos Bitelli, que participou hoje (20) de audiência pública no Senado.

A reunião discutiu a lei brasileira de direitos autorais e a atuação do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) na Comissão de Educação, Cultura e Esportes e reuniu, além do especialista, senadores e representantes dos setores de cinema e música.

“As televisões, os cinemas pagam 50% dos seus faturamentos [em direitos autorais], às vezes até mais, em termos de conteúdos audiovisuais. Então já se paga muito de direito autoral. E a música é um acessório do audiovisual. Então tem que fazer uma adaptação para este setor”, defendeu, em entrevista, o pesquisador.

É que, segundo ele, o Ecad cobra das emissoras de televisão e dos grupos de cinema como se fossem rádios comerciais. No entanto, estas últimas pagam apenas os 2,5% aos autores de música, enquanto os primeiros já têm que pagar também os direitos autorais a roteiristas, diretores e realizadores das obras audiovisuais.

Depois de sua apresentação, os senadores Gerson Camata (PMDB-ES), Flávio Arns (PT-PR) e Papaléo Paes (PSDB-AP) pediram a Bitelli que desenhasse uma nova proposta para modificar a atual legislação. O especialista fez críticas ao modelo de gestão dos direitos autorais no Brasil, concentrados nas mãos do Ecad e sem regulação.

Indagado sobre o fato de pequenos estabelecimentos – como hotéis e salões de beleza – terem que pagar direitos autorais, Bitelli defendeu que esta cobrança é abusiva.

“Nos Estados Unidos, estabelecimentos com menos de 2,5 mil pés quadrados [unidade de medida utilizada no país] já não pagam mais direitos autorais, porque seria um uso social de comunicação pública e a lei brasileira deveria adotar também esse princípio, que seria uma licença legal aos pequenos estabelecimentos”, argumentou.

Bitelli propõe duas soluções possíveis para resolver o impasse, além da distinção do que deve ser cobrado de produtos audiovisuais e do que deve ser cobrado de quem veicula apenas música.

“Falta algum agente arbitral, porque faltam regras na lei e o Ecad vem usando isso como se fosse o próprio autor e ele não é o autor [detentor do direito autoral]. É uma associação monopolista que representa gravadoras, artistas e autores. Então uma das soluções seria um controle externo e outra é que fosse desenvolvido um agente arbitral para que fosse criado um modelo para cada setor de atividade”.

Na apresentação, Bitelli detalhou que apenas o grupo Severiano Ribeiro, que controla salas de cinema por todo o país, efetua o pagamento dos 2,5% atualmente por força de decisão judicial e que o Ecad tem a intenção de cobrar cerca de 9% sobre downloads de música pela internet.