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Audiência Pública no Rio pede Conferência Nacional de Comunicação

O auditório do anexo dois da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro teve todos os lugares ocupados e algumas pessoas precisaram ficar de pé. Elas assistiam à Audiência Pública sobre a Conferência Nacional de Comunicação e a renovação das concessões de rádio e TV, presidida pelo deputado estadual Gilberto Palmares (PT), no dia 17 de outubro. A Audiência foi organizada pelo Comitê Rio Pró-Conferência Nacional de Comunicação, do qual participam cerca de trinta entidades e movimentos sociais.

Participaram da mesa da Audiência Pública a representante do Coletivo Intervozes de Comunicação Márcia Correa, o presidente da Associação das Rádios Públicas do Brasil (Arpub), Orlando Guilhon, o diretor do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, Celso Schroeder, o presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Maurício Azêdo e o deputado federal Jorge Bittar (PT-RJ). O Ministério das Comunicações, apesar de convidado, não apareceu. O deputado Jorge Bittar justificou a ausência do ministério. Segundo ele, a equipe ministerial já tinha um compromisso anteriormente assumido.

Por unanimidade, a mesa concordou sobre a necessidade de se realizar uma Conferência Nacional de Comunicação. “Seria a possibilidade histórica de subvertermos esse costume de não debater a comunicação”, comentou Celso Schroeder, do FNDC. Os movimentos presentes lembraram que o governo federal, inclusive, já destinou R$ 6 milhões em 2008 para a realização da Conferência. Apesar disso, a atividade ainda não foi convocada.

A concessão é pública, mas quando o estado precisa, tem que pagar

Márcia Correia, do Intervozes, enfatizou a importância de se lembrar que as emissoras são concessões públicas, ou seja, o Estado não aluga e não vende o espaço para as empresas de comunicação, mas apenas concede um direito de uso daquele canal por um tempo determinado. Ela lembrou o exemplo da Multirio, uma produtora de TV criada pela prefeitura da cidade do Rio de Janeiro que produz conteúdos educativos para serem transmitidos ao público em geral e utilizados nas escolas municipais. Para que a programação da Multirio chegue ao telespectador, a prefeitura compra um espaço na programação de uma emissora, no caso a Bandeirantes.

“Paga-se por um espaço que na verdade é público”, disse Márcia. Ela chamou a atenção para o fato de estarem vencendo as concessões da Rede Globo, Bandeirantes e Record, que provavelmente serão renovadas sem uma discussão pública a respeito da decisão. Maurício Azêdo, da ABI, criticou a postura do governo federal frente à comunicação. Para ele, a União “não tem coragem de enfrentar as grandes emissoras”. Ele falou sobre o exemplo do governo da Venezuela que não renovou a concessão da emissora RCTV. O canal comercial foi um dos responsáveis pelo golpe contra o governo do presidente Hugo Chávez em 2002. Por esse motivo e outros agravantes não teve a concessão renovada. Chávez teve coragem de enfrentar os golpistas. Aqui o governo é muito fraco e leniente em relação a essas questões”, ressaltou.

Frente parlamentar em defesa da conferência nacional de comunicação

Após a exposição da mesa, os presentes puderam também se expressar. Roseli Goffman, do Conselho Regional de Psicologia, propôs que parlamentares identificados com a causa criem uma frente pró-realização da Conferência Nacional de Comunicação. A proposta foi aplaudida.

Ela lembrou que já existe uma frente parlamentar da comunicação, com mais de 200 parlamentares, mas que, entretanto, apóia os grandes radiodifusores. Apesar da presença de dois parlamentares na mesa – um deputado estadual e outro federal – nenhum deles se manifestou sobre a proposta de criação da Frente Parlamentar.

Rádios funcionam com concessões vencidas

Enquanto a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) persegue e criminaliza as rádios comunitárias, rádios comerciais com situação irregular e concessões vencidas continuam a transmitir normalmente. A denúncia foi feita na Audiência Pública pela jornalista Claudia de Abreu, dos Comunicativistas e da TV Comunitária de Niterói.

Segundo os Comunicativistas, no momento em que pesquisaram na página eletrônica da Anatel, todas as concessões de rádio do município do Rio de Janeiro figuravam como vencidas. Entretanto, em uma segunda pesquisa, pouco tempo depois, as mesmas concessões apareciam como renovadas sem que houvesse tido tempo hábil para a discussão e para tornar pública a decisão sobre a renovação.

Ela entregou a cada um dos participantes da mesa um envelope contendo informações retiradas da própria página da Anatel e que dão conta dessas irregularidades. Entre o material estava também denúncias a respeito de programação televisiva por parte da campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania.

Uma das emissoras de rádio irregulares citadas, a BandNews FM, do grupo Bandeirantes, tem uma concessão de Niterói, mas transmite da cidade do Rio de Janeiro. Na página da Anatel consta que a emissora está bloqueada e é devedora, mas a qualquer momento pode-se escutá-la com normalidade. Aliás, é justamente a BandNews que faz uma campanha diária contra as rádios comunitárias, chamadas pela emissora de “rádios piratas”, recordou Claudia.

Sobre outra rádio, a CBN, das Organizações Globo, a Anatel não apresenta na internet informações sobre a data na qual termina a concessão. E foi justamente essa rádio que obteve autorização para testar o padrão IBOC de rádio digital. A tecnologia estadunidense é criticada pelos movimentos sociais pela democratização da mídia por ser restritivo e dificultar ainda mais a transmissão das rádios comunitárias. Os radiodifusores privados já fazem pressão pela escolha do IBOC.

Movimento também organiza ato político-cultural na Praça XV

Na parte da tarde, um ato político-cultural na praça XV, centro da cidade, também pautou a democratização da comunicação e a necessidade de realização da Conferência. Durante a atividade, o Teatro do Oprimido fez esquetes debatendo o tema. Vídeos foram exibidos e os participantes registraram depoimentos para a TV Comunitária de Niterói.

Um painel feito na hora em grafite também refletiu a concentração dos meios de comunicação e a manipulação colocada em prática pela grande mídia, simbolizada no desenho pela Rede Globo. Quem passava por ali era convidado a assinar o “abaixo assinado” pela realização da Conferência Nacional de Comunicação. A mobilização pela realização da Conferência continua no dia 8 de novembro, no Clube de Engenharia do Rio, com o seminário Pró Conferência Nacional de Comunicação, de 9 às 18 horas.

Movimento divulga manifesto sobre 1º Fórum da Mídia Livre

Jornalistas, acadêmicos, ativistas pela democratização da comunicação divulgaram manifesto em defesa da diversidade informativa e da garantia de amplo direito à comunicação. O manifesto, resultado de reunião promovida em São Paulo em março [ver aqui], lança as bases para a organização do Fórum Mídia Livre.

As próximas ações do movimento devem ser debatidas no 1º Fórum da Mídia Livre, evento previsto para acontecer em maio na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Confira a íntegra do manifesto:

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Manifesto da Mídia Livre

O setor da comunicação no Brasil não reflete os avanços que ao longo dos últimos trinta anos a sociedade brasileira garantiu em outras áreas. Isso impede que o país cresça democraticamente e se torne socialmente mais justo.

A democracia brasileira precisa de maior diversidade informativa e de amplo direito à comunicação. Para que isso se torne realidade, é necessário modificar a lógica que impera no setor e que privilegia os interesses dos grandes grupos econômicos.

Não se pode mais aceitar que os movimentos sociais que conquistaram muitos dos nossos avanços democráticos sejam sistematicamente criminalizados, sem condições de defesa, pela quase totalidade dos grupos midiáticos comerciais. E que não tenham condições de informar suas posições com as mesmas possibilidades e com o mesmo alcance à disposição dos que os condenam.

Um Estado democrático precisa assegurar que os mais distintos pontos de vista tenham expressão pública. E isso não ocorre no Brasil.

Também precisa criar um amplo e diversificado sistema público de comunicação, no sentido de produzido pelo público, para o público, com o público. Tal sistema deve oferecer à sociedade notícias e programação cultural para além da lógica do mercado.

Por fim, um Estado democrático precisa defender a verdadeira liberdade de imprensa e de acesso à informação, em toda sua dimensão política e publica. E ela só se dá quando cidadãos e grupos sociais podem ter condições de expressar idéias e pensamentos de forma livre, e de alcançar de modo equânime toda a variedade de pontos de vista que compõe o universo ideológico de uma sociedade.

Para que essa luta democrática se fortaleça, os que assinam este manifesto convidam a todos que defendem a liberdade no acesso e na construção da informação a participarem do 1º Fórum da Mídia Livre, que se realizará na Universidade Federal do Rio de Janeiro, nos dias 16 e 17 de maio de 2008.

Os que assinam esse manifesto apresentam a seguir algumas propostas, preocupações e idéias, que, entre outras, serão debatidas no Fórum de Mídia Livre.

Nos declaramos a favor de que:

– O Estado atue no sentido de garantir a mais ampla diversidade de veículos informativos, da total liberdade de acesso à informação e do respeito aos princípios da ética no jornalismo e na mídia em geral;

– Realize-se com a maior urgência a Conferência Nacional de Comunicação que discutirá, entre outras coisas, um novo marco regulatório para o setor, com o objetivo de limitar a concentração do mercado e a formação de oligopólios;

– A inclusão digital seja tratada com a prioridade que merece e que o investimento nela possibilite o acesso a canais em banda larga a toda a população, para que isso favoreça redes comunitárias (WiFi) e faixas em espectro livre;

– As verbas de publicidade e propaganda sejam distribuídas levando em consideração toda a ampla gama de veículos de informação e a diversidade de sua natureza; que os critérios de distribuição sejam mais amplos, públicos e justos, para além da lógica do mercado; e que ao mesmo tempo o poder público garanta espaços para os veículos da mídia livre nas TVs e nas rádios públicas, nas suas sinopses e meios semelhantes;

– O Estado brasileiro atue no sentido de apoiar as iniciativas das rádios comunitárias e não o contrário, como vem acontecendo nos últimos anos;

– O Estado brasileiro considere a possibilidade de a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos atue na área de distribuição de periódicos, criando uma nova alternativa nesse setor;

– O Cade intervenha no atual processo de concentração de distribuição de periódicos impressos, evitando a formação de um oligopólio que possa atingir a liberdade de informação; 

– A Universidade dê sua contribuição para a democracia nas comunicações, em seus cursos de graduação e pós-graduação em Comunicação Social, formando profissionais críticos que possam contribuir para a produção e distribuição de informação cidadã;

– A revisão do processo de renovação de concessões públicas de rádio e TVs, já que nos moldes atuais ele não passa por nenhum controle democrático, o que possibilita pressões e negociações distantes dos idéias republicanos, levando à formação de verdadeiras capitanias hereditárias na área;

– A sistematização e divulgação de demonstrativos dos gastos com publicidade realizados pelo Judiciário, pelo Legislativo e pelo Executivo, nas diferentes esferas de governo;

– A definição de linhas de financiamento para o aporte  tecnológico e também para a constituição de empreendimentos da mídia livre e sem fins lucrativos com critérios diferentes do que as concedidas à mídia corporativa e comercial; e que isso seja realizado com ampla transparência do montante de recursos, juros e critérios para a obtenção de recursos;

–  Que há condições para que o movimento social democrático brasileiro e também os veículos da mídia livre mobilizem recursos e esforços para constituir um portal na internet, um portal capaz de abrigar a diversidade das expressões da cidadania e de garantir a máxima visibilidade às iniciativas já existentes no ciberespaço.

FNDC propõe ato para defender TV Brasil

A TV pública brasileira é indispensável ao país. Com base nesse entendimento, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) está se mobilizando para a criação de uma frente parlamentar pró-TV pública e a realização de ato público em Brasília.

O FNDC defende a TV pública brasileira e por isso apóia a TV Brasil, recentemente inaugurada. Para difundir na sociedade a importância da iniciativa pública nesse sentido, conforme explica o jornalista Celso Schröder, Coordenador-geral da entidade, já estão sendo feitos contatos com as bancadas progressistas do Senado e da Câmara Federal, em articulação com movimentos sociais e entidades da sociedade civil, para que contribuam na organização de uma grande manifestação em defesa da TV pública. “Estamos propondo para breve a realização de um ato público em Brasília, antes das votações da MP.

Um dos principais méritos da TV pública, no entendimento de Schröder, é a sua vocação para enfrentar a concentração e a hegemonização da TV comercial no país, chamada pelo jornalista de “hipertrofia comercial”, estabelecida a partir de um modelo que nunca teve contraponto nem qualquer tipo de regulamentação e de regulação efetivas. “A consolidação de um novo tipo de televisão é fundamental, porque permite que o público tenha acesso a novas linguagens e conteúdos”, destaca Schröder.

Radiodifusores inviabilizaram a TV pública

O FNDC pretende mobilizar uma frente progressista no Congresso Nacional contrapondo-se aos radiodifusores comerciais e aos seus representantes históricos no parlamento. Eles se manifestam invariavelmente contra o conceito de TV Pública, argumentando que ela é desnecessária porque não teria audiência. O Fórum demonstrará que tal argumento nasceu de um círculo vicioso. “As emissoras públicas tem pouca audiência porque foram criadas para não tê-la, foram colocadas num gueto pelos próprios radiodifusores, que inviabilizaram o seu acesso aos recursos necessários”, lembra Schröder.

Desse modo, a TV pública brasileira foi imaginada para não concorrer com a radiodifusão comercial. “Porque as emissoras comerciais vendem audiência, é assim que elas faturam, essa é sua forma de remuneração. Por isso, para estes radiodifusores, a televisão pública não pode ter audiência. Esse é o pensamento histórico de uma elite brasileira que trabalha para inviabilizar o sucesso das iniciativas públicas na radiodifusão”, acusa o Coordenador-geral do Fórum.

O FNDC considera que a TV pública proposta pelo governo federal terá um caráter renovador, beneficiando inclusive a radiodifusão comercial. Esta poderá acompanhar experimentações de linguagens que não pode fazer, dada a sua condição de mercado. “Há uma necessidade urgente de desverticalizar, descomprimir e permitir que surjam novos formatos” pondera o Coordenador.

Ampliar a convergência e mudar a audiência

A nova TV pública também poderá radicalizar as possibilidades da digitalização – algo que a TV comercial não se propôs a fazer, para não pôr em risco o seu modelo de negócios. Embora tal hipótese não tenha sido contemplada no projeto, poderá ser concretizada a partir de emendas propostas à MP. Trata-se, na prática, de imprimir a convergência tecnológica e disseminar nacionalmente seus benefícios.

Por outro lado, conforme observa Schröder, no Brasil predomina uma visão distorcida de audiência. “Não é possível, em uma democracia, imaginar que as audiências tenham as dimensões brasileiras, chegando aos 80, 70 pontos”. Ele lembra que nos Estados Unidos, por exemplo, isso é proibido. Aqui, essa característica integra um modelo de sustentação ultrapassado, onde os recursos circulando no sistema concentram-se em poucas televisões. “Precisamos remodelar a forma de financiamento de tal maneira que as audiências não precisem ter os índices atuais. As emissoras devem aceitar, assim como em qualquer lugar do mundo, que dois, três pontos de audiência é algo significativo, pois ela deve ser compartilhada com toda a rede de emissoras do país”, sustenta.

Entretanto, tal como está estruturado o mercado nacional para a Globo, por exemplo – que já atingiu 90 pontos de audiência em algumas novelas – , obter 60, 40, ou 20 pontos de audiência, é considerado muito pouco. Diferentemente, semelhantes índices são considerados altos na maioria dos países.

A TV pública, para o FNDC, não pode abrir mão da audiência, disputando-a com a radiodifusão comercial e contribuindo para desconcentrá-la. Não deve, entretanto, ser pautada exclusivamente pela referida audiência. Para isso, necessita apoiar-se em um modelo de sustentação diferenciado do comercial. “O debate da MP permitirá que essas questões sejam abordadas, mas para o FNDC é inquestionável que o País precisa da TV pública e nós vamos defendê-la com todas as nossas forças”, conclui o Coordenador.

CCS e Conselho Consultivo da Anatel passam 2007 em branco

Em praticamente todas as áreas de governo, a sociedade brasileira, por meio de suas organizações e movimentos, participa de instâncias de controle social das políticas públicas respectivas a cada setor. Apesar de inúmeros problemas e contradições, conselhos, conferências e outros instrumentos articulam, em cada área, processos que buscam suprir as limitações da democracia representativa formal.

Na Comunicação, tais processos não existem, sendo a regulação e as políticas do setor historicamente pautadas pela ótica dos interesses empresariais. E dois dos espaços que poderiam contribuir para uma alteração deste quadro encontram-se hoje desativados.

O primeiro deles é o Conselho Consultivo (CC) da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), instância formada por representantes dos poderes públicos, do mercado e da sociedade, que não se reúne desde fevereiro de 2007. O segundo é o Conselho de Comunicação Social (CCS), órgão auxiliar do Congresso Nacional, que passou o ano de 2007 sem realizar uma reunião sequer, mesmo com crescente interesse pelo tema tanto na Câmara quanto no Senado Federal.

Órgão alienígena?

Dentre as principais funções do Conselho Consultivo, segundo o portal da própria Anatel, está a de "opinar, antes do encaminhamento ao Ministério das Comunicações, sobre o Plano Geral de Outorgas, o Plano Geral de Metas de Universalização de serviços prestados em regime público e demais políticas governamentais de telecomunicações". Criado em 1998, o CC, em tese, encontra-se no mesmo nível hierárquico do Conselho Diretor e da Ouvidoria da agência. A realidade, porém, é bem distinta do que sugere o organograma oficial.

Luiz Fernando Liñares, advogado, assessor especial da Câmara dos Deputados e representante desta no Conselho Consultivo, afirma que o órgão está inativo por ações deliberadas da direção da agência. "É como se o Conselho Consultivo fosse um órgão alienígena, como se seus membros não tivessem sido nomeados pelo Presidente da República", considera. Liñares vai além e responsabiliza o Conselho Diretor pela inanição da instância consultiva. "Ao que parece, o projeto da direção da agência, em médio ou longo prazo, é dissolver o Conselho Consultivo, que teve a sua autonomia seriamente ferida quando passou a produzir opiniões que contrariavam os interesses predominantes do mercado", diz.

Empossado na função de presidente do Conselho Consultivo em abril de 2006, com mandato de um ano, Liñares também enxerga na ausência de estrutura mínima para seu funcionamento – recursos humanos e materiais – uma violação à autonomia do órgão. A isso se soma a insuficiência de critérios técnicos e a falta de transparência no processo de nomeação dos seus integrantes, cuja decisão é competência única e exclusiva do Presidente da República.

A opinião acerca da ingerência do Conselho Diretor no trabalho do CC é corroborada pelos fatos. Após a última reunião do órgão, então presidido por Liñares, em fevereiro passado, o Conselho Diretor negou a liberação de verbas para a realização de novas reuniões. A justificativa, segundo Liñares, foi a falta de quorum mínimo que legitimasse os encontros. Entretanto, o advogado diz que a falta de quorum impediria atos deliberativos por parte do conselho, mas não a realização de reuniões.

A dificuldade de aproximação entre o CC e a Ouvidoria da agência também é alvo de cobrança de Liñares. "Funcionários da Ouvidoria participaram de todas as nossas reuniões na minha gestão enquanto presidente. No entanto, jamais tivemos retorno quanto às proposições feitas, quanto ao posicionamento e quanto à sua acolhida ou não por parte da Ouvidoria", expõe o representante da Câmara.

Atualmente, passados quase três meses da nomeação dos membros para as vagas que completam, na ótica da direção da agência, o quorum mínimo para reuniões, o CC não se reuniu, embora Liñares tenha feito a solicitação ao Conselho Diretor no mesmo dia em que foram nomeados Igor Vilas Boas de Freitas, para a vaga do Poder Executivo, e Amadeu de Paula Castro Neto, para a do Senado.

A assessoria parlamentar e a assessoria de imprensa da Anatel foram procuradas reiteradas vezes pela reportagem, por telefone e email. Até o fechamento da matéria, porém, ambas não responderam às questões formuladas.

CCS: um ano sem se reunir

No último dia 11 de dezembro completou-se um ano da última reunião do Conselho de Comunicação Social, órgão auxiliar do Congresso Nacional para questões desta área. Enquanto isso, foram intensamente debatidas na Câmara e no Senado matérias que propõem mudanças no campo da comunicação: modificações no marco legal da TV paga, alterações nos procedimentos de renovação de concessões de rádio e televisão, criação da TV pública, entre outros temas.

Inscrito na Constituição de 1988 – de forma bastante limitada em relação aos anseios da sociedade civil naquele momento, – o CCS, cujos conselheiros têm mandatos de dois anos, foi criado em 1991 pelo então presidente Fernando Collor. A sua instalação, no entanto, ocorreu apenas onze anos depois, em 2002, no contexto da aprovação da emenda constitucional que possibilitou a entrada de capital estrangeiro nas empresas de radiodifusão e de imprensa.

A segunda gestão do órgão se encerrou em dezembro de 2006 e caberia à Mesa Diretora do Senado a nomeação de seus novos integrantes, o que até hoje não ocorreu. Na Secretaria-Geral da Mesa Diretora do Senado não há qualquer informação sobre perspectivas para as nomeações ou sobre as possíveis justificativas para a omissão. Tampouco há informações a respeito na Secretaria de Apoio a Conselhos e Órgãos do Parlamento, instância à qual é vinculado o CCS.

Elefante branco

Para a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP), o CCS sofre com a sua natureza limitada. "O conselho, da forma como está hoje, não tem peso nenhum. Não tem autonomia, não consegue exercer o controle social, é um grande elefante branco", critica a parlamentar.

Berenice Mendes, integrante do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e conselheira integrante das duas gestões do órgão representando a categoria profissional dos artistas, critica duramente a situação. "Chegar ao final do ano sem que os membros do seu conselho tenham sido nomeados nos deixa em estado de perplexidade. Não há qualquer justificativa para que o Senado deixe de cumprir a lei, principalmente num ano em que a comunicação social está em debate no Congresso", protesta.

Berenice também aponta distorções em relação ao CCS. “Na segunda gestão do conselho houve manipulação por parte da representação patronal, tanto que houve usurpação das cadeiras da sociedade civil, com empresários ocupando estas vagas. Além disso, pessoalmente acredito que as entidades da sociedade civil nunca souberam reconhecer a importância do CCS, nunca o utilizaram e o defenderam como deveriam ter feito", pondera a conselheira. A opinião é partilhada pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP). "A sociedade ainda não se apropriou devidamente dessas conquistas, desses espaços de luta", lamenta a parlamentar.

Para o professor Fernando Paulino, da Universidade de Brasília (UnB), a questão se insere num cenário histórico de escassa atenção às políticas públicas de comunicação. "Deveriam ser criados mecanismos para que, efetivamente, os meios de comunicação social cumprissem com as suas responsabilidades constitucionais. Mas o primeiro destes mecanismos hoje definha e passa por um processo de inanição que o torna praticamente inexistente", avalia o pesquisador.

A deputada Erundina afirma que pretende realizar audiência pública em 2008 para tratar do aperfeiçoamento do CCS, assunto sobre o qual já há projetos de lei em tramitação no Congresso. Resta saber o que pensam os senadores, especialmente o novo presidente da casa, Garibaldi Alves (PMDB-RN), cuja família é proprietária do maior grupo de comunicação do Rio Grande do Norte. 

FNDC apóia TV Brasil, mas critica modelo de rede e gestão

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) manifesta publicamente – por meio de Nota Oficial – sua posição sobre a TV Brasil e conclama o governo federal a revisar os posicionamentos adotados para a nova TV pública do país. Apela ao Congresso Nacional para que aperfeiçoe a Medida Provisória criadora da TV Brasil, assegurando o seu caráter público.

Em função da concentração dos meios de comunicação, o projeto da TV pública brasileira é defensável, porém não de forma incondicional. O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) considera que a TV Brasil representa um contraponto à hipertrofia comercial no setor de televisão no país. Na opinião do jornalista Celso Schröder, coordenador-geral do FNDC, “a nova emissora mostra uma vontade política de produzir TV pública de qualidade, com dimensão nacional, recursos e investimentos até agora pensados apenas na TV comercial”, analisa Schröder.

Ao defender a TV pública, o jornalista destaca que o projeto é necessário, porém não a qualquer custo. “Não podemos aceitar nessa nova emissora uma formatação vertical, nem na gestão, nem na programação, como é nas TVs comerciais”. Esse, segundo Schröder, é um sério risco, uma vez que a representação pública, na estrutura de gestão da TV Brasil foi minimizada. O Conselho Gestor da TV Brasil, “estranhamente chamado Conselho Curador”, tem uma formatação personalizada e foi nomeado pelo Presidente da República (e isso dá ao organismo um caráter estatal). “Não sabemos qual o lugar desse conselho no organograma da nova televisão”, destaca Schröder, lamentando a ausência da sociedade civil, das categorias profissionais, dos empresários do setor, dos movimentos sociais, dos movimentos que lutam pela democratização da comunicação, dos pesquisadores e trabalhadores da comunicação na formação do Conselho Curador da TV Brasil. Neste sentido, o FNDC publica a manifestação a seguir:

NOTA OFICIAL

Em defesa de uma TV do Brasil

O FNDC conclama o governo federal a revisar seus encaminhamentos e apela ao Congresso Nacional para que aperfeiçoe a MP da TV Brasil.

Está no ar a TV Brasil, que nasce para constituir-se como uma rede pública de televisão, comprometida com a pluralidade social e cultural.

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) considera a TV Brasil vital para a consolidação de uma identidade brasileira marcada por valores populares e democráticos, bem como para assegurar o trânsito indispensável ao conhecimento e à cultura universais.

A solidificação da nação brasileira reclama a prática de uma comunicação social que expresse as mais genuínas manifestações do seu povo, seus anseios e reivindicações.

Igualmente, reclama o debate aberto dos temas contemporâneos, cujo domínio coletivo é indispensável para a escolha dos rumos nacionais.

O FNDC defende, portanto, a criação da TV Brasil, reconhecendo-a como legítima iniciativa governamental. Ela poderá elevar os interesses da cidadania acima dos interesses comerciais que, de modo geral, desvirtuam a televisão privada e tendem a eliminar da sua programação potencialidades humanizadoras.

Entretanto, o FNDC alerta os responsáveis pela TV Brasil e ao governo federal que os bons propósitos da iniciativa correm o sério risco de não se confirmarem.

Obviamente o Estado, em variados graus, representa o interesse público – daí a legitimidade da criação, pelo governo, de uma TV dita pública. Mas o Estado não substitui o Público. São bem conhecidos os limites da democracia representativa.

Apesar disso, a estrutura adotada para a TV Brasil desconsiderou a participação da sociedade civil e dos movimentos sociais, dos movimentos que lutam pela democratização da comunicação, dos pesquisadores e trabalhadores da comunicação.

Sem esses segmentos sociais não há como garantir um estatuto público à televisão. Trata-se de uma evidência histórica estranhamente ignorada pelos responsáveis que ainda não explicaram como, para erguer uma TV pública, dispensam o acúmulo público sobre o tema.

Essa opção refletiu-se nos conceitos de gestão, programação e financiamento adotados que, além de não assegurarem o caráter público da TV Brasil, sequer garantem a sua continuidade nos próximos governos ou a oferta de práticas e conteúdos televisivos adequados às demandas da nacionalidade.

Além disso, ao criar a TV Brasil desprezando o conhecimento especializado nacional, o governo brasileiro furtou-se à obrigação de praticar uma comunicação assentada em novas bases tecnológicas.

Tal como está, a TV Brasil deixa de valer-se da convergência tecnológica, de agregar à sua rede uma oferta de serviços digitais e de viabilizar a inclusão social. Nem mesmo foi pensada uma rede integrando as produções regionais. A proposição apresentada condiciona a participação das emissoras dos vários estados à imposição de uma programação.

Ademais, a comunicação pública não pode mais ser compreendida como o ato de tornar públicos conteúdos relevantes, apenas. Ela representa a base tecnológica e política de um grande diálogo nacional, entre o Estado, o cidadão e a cidadania. Sem esse diálogo não se configuram, na contemporaneidade, os pressupostos republicanos.

O FNDC, entidade reconhecida pelas suas ações históricas para a formulação de políticas públicas de comunicação, conclama o governo federal a revisar os posicionamentos adotados para a TV Brasil, abrindo-se para a sociedade civil e os movimentos sociais, com eles dialogando e examinando as suas contribuições.

Igualmente, apela ao Congresso Nacional para que aperfeiçoe a Medida Provisória criadora da TV Brasil, assegurando o seu caráter público.

Sabem os atuais governantes, desde as suas origens, que o eleito não substitui o eleitor e que a boa democracia não prescinde da participação popular.

Ainda há tempo para este governo legar ao País uma TV Brasil que faça jus ao seu nome, constituindo-se em um marco de transformações revolucionárias na comunicação nacional.

Brasília, 7 de dezembro de 2007.

Coordenação Executiva do FNDC