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Sem investimento japonês, política industrial naufraga

Em 29 de junho de 2006, a publicação do Decreto 5.820 selou a vitória dos japoneses na disputa de meses pela preferência do governo federal no processo de escolha do padrão tecnológico da TV digital. No mesmo dia e nos que se seguiram, o ministro Hélio Costa e o próprio presidente Luís Inácio Lula da Silva apontaram o grande trunfo nipônico para bater europeus e norte-americanos: haveria uma contrapartida do governo japonês de investir em uma fábrica de semicondutores no país.

“A TV Digital possibilita uma efetiva política industrial que contemple a associação de empresas brasileiras e japonesas”, comemorou o presidente Lula na cerimônia de assinatura do decreto. Segundo o mandatário, a adoção do padrão ISDB e o conseqüente acordo com o Japão ajudaria o Brasil “a recuperar esse tempo perdido na indústria de semicondutores, e de avançar ainda mais na área de software em geral”.

No entanto, a despeito das comemorações, o ano de 2007 se passou e não houve nenhum sinal dos investimentos prometidos. Em 2008, o que se viu foram sinalizações de que o governo japonês desistiu ou jamais teve intenção real de financiar a tal fábrica de semicondutores, seguidas de prontos desmentidos por parte do Ministério das Comunicações.

Em março, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), afirmou ter recebido sinais de desistência por parte do governo japonês e da empresa Toshiba. O argumento seria a falta de mercado para sustentar uma produção desta natureza. O ministério desmentiu a declaração do governador carioca.

Em um evento em maio deste ano, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Miguel Jorge, desmoralizou o acerto. “Eu vi esse documento [o acordo com o governo japonês]. Eu nem chamaria de documento de intenções. Pelo que eu li, ele não chegava nem a ser um memorando de entendimentos. Não era. Era uma coisa, muito assim, de que estava disposto a estudar. Para ser muito franco, era mais bla-bla-blá”, disparou. O Ministério das Comunicações respondeu em nota afirmando que ainda há disposição da Toshiba de investir em uma empreitada deste tipo no país.

Como a disposição não vira ação, o governo federal inverteu o jogo e passou a declarar interesses de ele investir em empresas japonesas para que estas viessem produzir semicondutores no Brasil. “O BNDES pode não só financiar, como a gente pode participar societariamente da indústria de semicondutor, por intermédio do braço de participações [do banco], que é a Bndespar”, disse em entrevista à Agência Brasil, em 6 de maio, o chefe do Departamento de Indústria Eletrônica do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Maurício Neves.

"Conversa para boi dormir"

Na avaliação do professor da PUC do Rio de Janeiro e especialista no tema, Marcos Dantas, o anúncio dos investimentos japoneses são uma “conversa para boi dormir” vendida à população para justificar a adoção do padrão tecnológico japonês. “Uma fábrica de semicondutores exige ou alta escala de mercado ou nicho de mercado, sem falar do know-how e know-why de toda a sofisticada tecnologia”, argumenta. Ele acredita que as montadoras japonesas continuarão trazendo seus produtos com chips produzidos fora, por não visualizarem perspectiva de desenvolvimento do mercado brasileiro.

A ânsia do ministro das Comunicações pela adoção do ISDB nos demais países do continente seria motivada também por esta busca de uma escala maior para estes produtos. Nos últimos meses, Hélio Costa viajou para diversos países vizinhos, como o Chile, a Colômbia e a Argentina, para promover a adoção da tecnologia japonesa.

Para Gustavo Gindre, integrante do coletivo Intervozes e membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil, no atual modelo de divisão internacional do trabalho, não cabe uma “foundry” (fábrica de semicondutores) de uma empresa estrangeira no Brasil. “Nossa inserção tem se dado, infelizmente, como exportador de commodities e para mudar isso seria necessário toda uma reviravolta em nossa política, com altos investimentos em educação, formação de mão-de-obra altamente qualificada, atração de pessoal especializado de outros países, modernização dos portos, etc. Simplesmente não vejo como atrair esse tipo de investimento, que hoje é todo concentrado no sudeste asiático”, lamenta.

Uma saída, propõe, seria um investimento robusto em Ciência e Tecnologia na área de design de chips, que não requer tantos recursos como uma fábrica de semicondutores e apostar no Ceitec, pequena aspirante a foundry do Rio Grande do Sul recentemente tornada pública, para o desenvolvimento de protótipos em pequena escala.

Se permanecer o cenário atual, evidencia-se que as empresas japonesas não estão dispostas a vir ao país nem sendo financiadas por recursos nacionais. Cai, assim, o principal argumento apresentado em 2006 para a escolha da tecnologia ISDB. Se isso não é suficiente para mudar o passado, pelo menos recoloca indagações do por quê desta decisão e ajuda a entender como são feitas as políticas de comunicação no Brasil.

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Problema da TVD é o modelo e não o ritmo da implantação

A lentidão na introdução da TV Digital no Brasil vem preocupando seriamente governo e emissoras. Sinal disso foi o destaque dado pelos telejornais do maior grupo de televisão do país, a Rede Globo, nesta segunda-feira (17), à entrada do sinal digital de sua emissora no Rio de Janeiro. Nas notícias, o ministro das comunicações, Hélio Costa, reiterou a promessa de conversores a  preços populares informando que um protótipo estaria disponível no mercado a R$ 230 reais a partir do mês de julho.

No entanto, para especialistas consultados pelo Observatório do Direito à Comunicação, a explicação para a falta de popularidade da TV digital não está no ritmo da entrada em operação das emissoras ou no preço dos conversores, mas no modelo adotado. “A TV digital não é interessante para o usuário porque é um investimento muito grande para não ter nada diferente daquilo que já é oferecido pela TV analógica”, explica César Bolaño, professor da Universidade Federal de Sergipe e autor de livro sobre o tema.

A semelhança com o analógico se dá pelo fato de o modelo digital brasileiro ter optado pela lógica de canal ao invés da de programação. No lugar de permitir a veiculação simultânea de uma programação em formato digital até que a transição de modelos fosse completa, o governo optou por destinar um canal adicional. A diferença e o grande problema é que uma programação digitalizada pode ser transmitida usando muito menos espaço do espectro radioelétrico, mas o que as emissoras ocupam hoje é uma faixa equivalente ao que é usado para transmitir com a tecnologia analógica – 6 MHz –, o que significa algo como quatro ou cinco vezes mais do que o necessário.

Nesta lógica, a possibilidade de ampliar o número de programações no espaço do espectro eletromagnético, opção possível com a digitalização, foi desprezada pelas emissoras comerciais. “A gente compreende que isso é inerente ao modelo comercial na medida em que para fazer multiprogramação elas teriam que dividir bolo publicitário em quatro canais e isso não é da dinâmica capitalista”, analisa Tereza Cruvinel, presidente da Empresa Brasil de Comunicação.

Mesmos canais e sem interatividade

Para o professor da PUC do Rio de Janeiro, Marcos Dantas, este quadro faz com que as emissoras comerciais de televisão estejam apenas preocupadas em acelerar o processo sem compromissos com o aproveitamento de novas potencialidades que a tecnologia viabiliza, como a interatividade. A ânsia para agilizar a transição contribui para aprofundar este processo, uma vez que seu principal desafio, o barateamento dos conversores, só será obtido às custas da retirada de qualquer nova funcionalidade que encareça seu custo de produção.

Assim, os protótipos prometidos pelo ministro das Comunicações a R$ 230 serviriam apenas para converter o sinal e gerar uma melhoria na qualidade da imagem. “Se não tiver um aparelho de televisão bom, a diferença não será tão significativa assim. Quem quer melhorar imagem da recepção deve estar mais preocupado em mudar o televisor do que comprar conversor para assistir na televisão antiga que possui”, argumenta César Bolaño.

Além disso, acrescenta o professor, com o “mais do mesmo” da TV digital, as pessoas de maior renda, que geralmente dão escala às inovações tecnológicas ao adquiri-las enquanto seus preços ainda estão altos, dificilmente vão comprar a nova tecnologia agora, devendo optar pela TV a cabo ou por satélite que, afinal, ofertam mais canais.   

Outra funcionalidade além da multiplicação de canais, a interatividade, continua na gaveta. “O Ginga teve que voltar para a prancheta, por conta de sua parte conhecida como Ginga-J. E não há previsão para que set top box saiam das fábricas com o Ginga embarcado”, conta Gustavo Gindre, do Intervozes. De acordo com Moris Arditti, do Fórum SBTVD, o software Ginga está totalmente especificado mas o desenvolvimento não está pronto ainda. “O que o Fórum fez foi uma parceria com a Sun [empresa de software] para fazer o desenvolvimento do Ginga-J e, assim, definir que o custo do licenciamento seja bem mais acessível”, diz.

Ele prevê que, até o final do ano, algumas máquinas com interatividade já estejam nas prateleiras, mas lembra que, por conta dos aplicativos, da memória adicional e dos licenciamentos o preço destes conversores será mais caro. O risco já apontado nas discussões sobre a escolha do padrão tecnológico é criar duas categorias de telespectadores: os da “caixinha barata”, famílias de baixa renda que terão um conversor apenas para conseguir receber o sinal digital sem qualquer diferença em relação ao televisor comum, e os da “caixinha incrementada”, pessoas com renda alta que poderão comprar set top boxes mais caros e com funcionalidades adicionais.

Caso isso se confirme, inverte-se a lógica do interesse público. O acesso à TV digital volta-se para garantir o modelo de exploração das emissoras ao invés de servir aos interesses da população, distribuindo de forma democrática as funcionalidades da nova tecnologia.

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Governo faz promessas, mas transição segue em marcha lenta

No próximo dia 29, completará dois anos a publicação do Decreto 5.820/2006, que estabeleceu as diretrizes para a implantação da TV digital no Brasil e definiu a escolha pelo padrão tecnológico japonês como base desta nova modalidade de televisão. Passado este período, a TV digital permanece como realidade distante dos brasileiros em meio a um jogo de empurra-empurra entre governo, emissoras e fabricantes de equipamentos eletrônicos.

As primeiras transmissões iniciaram em São Paulo no dia 2 de dezembro de 2007. No cronograma oficial, estava prevista a entrada em funcionamento das geradoras de Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador e Fortaleza a partir de janeiro deste ano. E, a esta altura de 2008, já deveriam ter tido as primeiras transmissões as cidades de Porto Alegre, Belém, Curitiba, Manaus, Goiânia e Recife.

No entanto, há emissoras operando em sinal digital apenas nas capitais paulista, mineira e carioca. O maior grupo de televisão do país, a Rede Globo, começou as transmissões na cidade do Rio de Janeiro apenas nesta segunda-feira (16). Em entrevistas à imprensa o ministro das comunicações, Hélio Costa, assegurou que até o final do ano a TV digital começaria a funcionar em Brasília.

“Este calendário é meio fantasioso”, afirma uma fonte que acompanha o processo. Este Observatório entrou em contato com o Ministério das Comunicações, com emissoras e com o Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD). Para além da informação do ministro Hélio Costa, a assessoria da pasta não soube dar uma posição mais detalhada sobre o cumprimento dos prazos.

Já o vice-presidente do Fórum Sistema Brasileiro de Televisão Digital, Moris Arditti, classifica a implantação como um “sucesso”. “O tempo desde a decisão, passando pela formação da câmara para definir as especificações e chegando à instalação, foi recorde, em lugar nenhum no mundo aconteceu isso”, avalia.

Transição a passos lentos

Para Gustavo Gindre, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, as emissoras se esforçam para tentar passar a impressão de que os prazos estão sendo cumpridos, mas o processo está bastante atrasado. “Nem mesmo em toda a cidade de São Paulo, a primeira a entrar no ar com a nova tecnologia, é possível captar o sinal, pois há várias áreas de sombra. No Rio de Janeiro, as tramissões só começam agora em junho. Muitas emissoras estão transmitindo com uma capacidade mais baixa do que a necessária, apenas para dizer que estão no modo digital”, avalia.

De acordo com Marcelo Cordeiro, da Associação Brasileira de Radiodifusão, Tecnologia e Telecomunicações (Abratel), a razão pela demora na instalação de transmissores é do governo federal. O Ministério das Comunicações, explica, não está conseguindo se articular com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e com a Receita Federal para agilizar a importação dos equipamentos. “Precisaria de uma ação mais conectada para que a aquisição e instalação fossem feitas em menos tempo”, cobra.

Segundo Cordeiro, os atrasos poderão ficar maiores quando a transição começar para as geradoras das cidades do interior e para as retransmissoras. “Acho que vai ter emissora com muita dificuldade para implantar o sistema digital. Há linha de crédito com custos abaixo da Selic, cerca de 11% ao ano, mas que não é barato para emissoras do interior”, alerta.

Frente às dificuldades, o ministro Hélio Costa já admite, antes de se completar o primeiro ano das transmissões com o novo sinal, que é real a possibilidade de adiar o desligamento do sinal analógico, previsto para 2016.

A lenda dos conversores a baixo custo

O problema não acontece apenas pela demora na chegada da TV digital nas praças. Onde ela já está presente, a adesão é baixíssima, o que se expressa nas vendas reduzidas dos conversores (set top boxes), aparelhos que decodificam o sinal digital nos televisores analógicos. A polêmica tem gerado um cabo-de-guerra colocando fabricantes de um lado e o ministro das Comunicações de outro.

Desde o início das discussões sobre a oferta deste equipamento aos brasileiros, Hélio Costa vem reclamando do preço praticado pelos fabricantes. “A indústria não se preparou para vender o conversor, nem mesmo caro”, afirmou em entrevista à Folha Online em 7 de junho. Desde 2007, Costa promete um conversor a R$ 200, mas até agora o preço praticado no mercado varia entre R$ 500 e R$ 1.100. Segundo informações de empresas que lidam com o produto no mercado, na capital paulista não há mais do que 20 mil conversores em funcionamento.

A Associação Nacional de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) rebate, argumentando que é difícil praticar preços mais baixos pela ausência de escala. Por outro lado, afirmam que falta uma política de incentivos por parte do governo. “A Eletros nunca afirmou que os preços seriam baixos nessa fase inicial, embora tenhamos apresentado ao governo as medidas necessárias para acelerar o processo de redução dos preços dos conversores”, afirmou em nota.

Na avaliação de Gustavo Gindre, o erro está na escolha do padrão japonês (ISDB). “O Brasil adotou uma tecnologia com menor escala de produção do que o DVB [europeu] e mesmo do ATSC [estadunidense], já que o ISDB está presente apenas no Japão. Além disso, os custos de royalties com a tecnologia japonesa são altos”, comenta.

O professor da PUC do Rio de Janeiro Marcos Dantas ressalta também as consequências da escolha de um padrão estrangeiro.“Como a indústria não é nacional, não tem muito interesse em adotar blocos tecnológicos fora dos seus padrões mundiais”, afirma.

Promessa de novidade

No último mês, Hélio Costa viu acender uma luz no fim do túnel. A empresa Proview anunciou um protótipo que poderia ser vendido pelo valor prometido pelo ministro.

No entanto, vale lembrar que este não será o preço final para ter a nova tecnologia em casa uma vez que, além do aparelho, ainda é necessário comprar antena, cabos e pagar pela instalação. E as benesses da alta-definição – o diferencial anunciado sem parar pelos radiodifusores – só podem ser usufruidas por quem tem um aparelho de TV próprio para este tipo de recepção, o que custa hoje, pelo menos, R$ 2 mil. Ou seja, mesmo se o conversor da Proview vier a ser produzido, não há garantias de que isso fará as vendas alavancarem.

Em uma de suas declarações no ano de 2007, o ministro Hélio Costa cogitou que o governo financiasse diretamente a compra dos conversores. No entanto, experiência semelhante em curso nos Estados Unidos não tem alcançado os resultados esperados, apesar dos investimentos públicos já terem chegado a mais de US$ 1,5 bilhão.

Limites do modelo de negócios

Na avaliação do jornalista e presidente da TV Cultura, Paulo Markun, há também um erro na estratégia das emissoras de televisão. “A opção das grandes redes de TV em apenas transmitir em alta definição a mesma programação dos canais analógicos reduz o interesse do público. Nós acreditamos que dar mais opções de canais poderia causar maior comoção”, analisa. A opção apontada por Markun parece distante dos planos das emissoras de televisão.

A operação de programações simultâneas em um mesmo canal (multiprogramação) poderia gerar uma pulverização da audiência e dividiria o bolo publicitário, resultando em problemas financeiros para as redes. É nestes limites do modelo de negócios da televisão aberta brasileira que moram os obstáculos à transição para a tecnologia digital e os riscos dela passar por turbulências ainda maiores do que as atuais.

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Governo avalia adiar fim de transmissão analógica, diz ministro das Comunicações

Tão simbólico quanto a estréia da TV digital, acompanhada por quase ninguém, deverá ser o fim das transmissões analógicas, marcado para 2016. Em tese, até lá todos os brasileiros estarão munidos de receptores ou TVs com conversores embutidos e todas emissoras estarão transmitindo programação digital.

O governo admite ter um plano B para adiar o chamado "switch off" da TV analógica caso as adesões continuem baixas e as transmissões, limitadas.

"O plano existe. Se amanhã chegarmos à conclusão de que a grande maioria da população brasileira ainda não recebe a TV digital, claro que a gente pode [adiar o desligamento do sinal analógico]. O presidente da República tem autoridade para fazer isso, ele pode estender o projeto", afirma o ministro das Comunicações, Hélio Costa.

Se o Brasil seguir o exemplo de outros países, a chance de um prazo maior é grande. Segundo Juliano Castilho, diretor da área de TV digital do CPqD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações), "esse cronograma não foi cumprido em lugar nenhum do mundo".

"Olhando exemplos de outros países, acho que há chance de não ser cumprido o cronograma. Mas isso não é o que importa", diz.

De acordo com Castilho, o cronograma funciona como um "direcionador". "Se as pessoas não compraram uma grande quantidade de receptores, você não vai tirar o sinal. Não interessa a ninguém."

"Se sairmos de uma tendência atual, a partir desse preço de lançamento, conseguiríamos em dez anos atingir cerca de 80% da população, em número de residências. Daí vem a questão política: 80% é um bom número para fazer o desligamento?", questiona o especialista.

Sem sinal

Além da compra de conversores, outra dor de cabeça para o governo deve ser a potência da transmissão das emissoras, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos.

Marcada para 17 de fevereiro de 2009, a interrupção na transmissão de televisão analógica nos Estados Unidos deve deixar cerca de 23 mil pessoas sem receber sinal de alguns canais. É o que mostra estudo realizado pelo Government Accountability Office, o braço investigativo do Congresso norte-americano. Isso porque alguns radiodifusores afirmam que seu sinal digital terá uma cobertura geográfica menor do que a analógica.

"Aqui, a Globo entrou com potência de 15 kilowatts nas suas transmissões. Mas tem emissora aí que entrou com 1 kilowatt. Só para dizer "olha, eu sou digital", mas não tem a potência suficiente", diz o ministro Hélio Costa.

Para contornar essa situação, Castilho defende que o consumidor receba no momento da compra um mapa oficial com os problemas da TV digital, feito por radiodifusores, fabricantes e governo.

"Isso já acontece no próprio Japão. Mesmo porque só vou comprar um negócio se souber que vou levar para casa e vai funcionar", afirma.

A companhia Philips mantém em seu site (www. simplificandotvdigital. com.br) um mapa -restrito e contestado por técnicos- sobre a recepção da TV digital na capital paulista.

Após seis meses, TV digital brasileira “dá traço” no Ibope

Seis meses após sua estréia oficial, a única certeza que se tem sobre a TV digital brasileira é que ela ainda dá traço -ou seja, a recepção do sinal em televisores nem sequer atinge o equivalente a um ponto no Ibope, 55 mil domicílios na Grande SP. Números obtidos com a Suframa (Superintendência da Zona Franca de Manaus) revelam que, de 2007 até abril deste ano, 25.854 conversores (ou "set-top boxes") foram fabricados na região. Os aparelhos são necessários para a recepção do novo sinal nos televisores.

"Quase a totalidade dos receptores vem de Manaus, por conta dos benefícios [fiscais]", diz Roberto Franco, presidente do Fórum da TV Digital. Hélio Rotenberg, presidente da Positivo Informática, líder em vendas nesse mercado, diz haver 20 mil famílias recebendo o sinal na Grande SP, no máximo. "Algo entre 10 mil e 20 mil."
Além de São Paulo, as cidades de Rio de Janeiro e Belo Horizonte também têm TV digital, mas a implementação começou a menos tempo.

Órgãos responsáveis pela inserção do novo sistema, como Ministério das Comunicações, Abert (Associação Brasileira de Rádio e Televisão) e Eletros (Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos), afirmam não ter dados oficiais sobre adesão. Ainda não há também o volume de compra de TVs com receptores digitais embutidos, mas o produto é restrito a nichos de alto poder aquisitivo. Um dos aparelhos mais baratos desse tipo custa R$ 6.000. Já o conversor mais barato do mercado sai por R$ 499 -preço considerado alto, já que a demanda é baixa.

O conteúdo transmitido em alta definição pelas emissoras, um dos chamarizes para a procura por "set-top boxes", é limitado. Em São Paulo, o único canal que transmite toda a programação em alta definição (fora os horários alugados) é a RedeTV!.

Além do conteúdo, as promessas não cumpridas também empurram para a baixa procura pelo sistema. O conversor popular de R$ 250, prometido desde antes do lançamento, ainda não chegou. Tampouco a interatividade.

"A indústria não se preparou para vender o conversor, nem mesmo caro", disse o ministro Hélio Costa (Comunicações).

"A Eletros nunca afirmou que os preços seriam baixos nesta fase inicial, embora tenhamos apresentado ao governo as medidas necessárias para acelerar o processo de redução dos preços conversores", responde a associação dos fabricantes, em nota.

Responsabilidade

Sobre a interatividade, Costa responsabiliza radiodifusores e até telespectadores: "A interatividade é uma coisa que depende muito mais do usuário, das emissoras de TV, das entidades que querem utilizar a interatividade, do comércio, das empresas, do que do governo. Não é uma responsabilidade do governo fazer a interatividade".

Segundo Roberto Pinto Martins, secretário de Telecomunicações, a interatividade chega em 2009 -"talvez no início do ano". O governo alega que um imbróglio envolvendo pagamento de royalties atrasou a formulação do sistema Ginga, responsável pela interatividade dentro do conversor.

"As emissoras morrem de medo de conectar algum canal de retorno na TV e verem a chegada da convergência ao ambiente que elas lutam para manter "intocado", diz Gustavo Gindré, membro da ONG Intervozes, que discute a ampliação do direito à comunicação.

O presidente da Abert (Associação Brasileira de Rádio e Televisão), Daniel Slaviero, diz que "as televisões estão cumprindo rigorosamente a sua parte" na divulgação da TV digital e que lançarão neste mês uma nova campanha de publicidade para espalhar o sistema.

A questão do preço também tem um horizonte, diz Costa. "Vou ao Japão neste mês. Na minha ida, vão anunciar o conversor de US$ 50."