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Documentos liberados pelo Wikileaks não estão sendo lidos

Aconteceu na última quarta-feira (15) o Ato-Debate “Wikileaks, o que está em jogo?”, organizado por 17 entidades da organização civil, em sua maioria ligadas à comunicação. Natália Viana, jornalista parceira do Wikileaks no Brasil, esteve presente para comentar o caso e responder perguntas da platéia sobre os fatos relacionados aos documentos que pautaram a mídia nos últimos 20 dias. Natália apontou que os jornais estão dando notícias, mas as pessoas, inclusive repórteres, não estão lendo os documentos que estão sendo disponibilizados pelo Wikileaks sobre o Brasil, não chegam a acessar o documento além da matéria jornalística. “A Folha está dando, todo mundo seguindo, e pouca gente está fazendo reportagens. Saiu muito mais coisa, tem coisa muito interessante, e ninguém está lendo”.

 

O apontamento de Natália dizia respeito também à mídia independente, que foi lembrada durante o debate. O grupo Wikileaks fez parceria com cinco jornais do mundo para dar visibilidade aos documentos diplomáticos e, no Brasil, para dar visibilidade aos 2.855 documentos, o grupo internacional fez parceria com a Folha e O Globo, dois jornais de grande circulação, de dois estados diferentes. Esses dois grupos, mais a jornalista, tem exclusividade de todos os documentos brasileiros e vão soltar aos poucos. A ideia é dar grande visibilidade a cada documento, no critério de cada veículo. A escolha deste veículos por parte do Wikileaks para ajudar a noticiar os documentos foi intensamente criticada pela platéia e militantes a favor da democratização da comunicação.

Natália afirma que o objetivo do Wikileaks é dar a maior amplitude aos documentos que “contam a história de um império em decadência”, afirmou, citando Julian Assange. “Os documentos não foram liberados porque o Julian Assange achou que era fofoca. É porque eles trazem indícios de má conduta dos EUA para com o resto do mundo”, disse a jornalista. Ela também garantiu que não houve critérios políticos para a escolha dos jornais em questão, apenas critério de alcance. “Fiquei enlouquecida com os documentos”, empolga-se. “Contam a história do governo Lula inteirinha visto pela diplomacia americana”.

Para tocar o trabalho jornalístico de transformar os arquivos em notícia, Natália está trabalhando solitariamente de forma voluntária, dando visibilidade aos documentos por meio do seu blog na Carta Capital , e pelas equipes dos dois jornais brasileiros. Tudo será publicado, mas com o critério de importância editorial de cada publicador. “Cabe aos jornais decidirem o que eles vão lançar”, explicou.

Nos EUA existe direito à informação pública, e todos os documentos podem ser revelados mediante solicitação da sociedade civil. Mas os pedidos têm um tempo para serem divulgados, e quanto mais secreto, mais tempo leva para serem acessados, mas são.

Natália acredita que o Wikileaks apareceu em um momento peculiar da comunicação brasileira: “esse ano foi muito interessante pra quem discute democratização da comunicação no Brasil. Na Confecom isso apareceu muitas vezes. Todos os jornais apoiaram quando teve a coisa dos humoristas que não poderiam tirar sarros de políticos, a demissão da Maria Rita Khel, a Falha de S. Paulo, a crítica do presidente aos jornais”.

 

Segundo Natália, há 2.855 documentos sobre o Brasil para serem liberados, riquíssimos. Desses, 1.947 são da embaixada americana em Brasília, 12 do Consulado em Recife, 119 no Rio de Janeiro e 777 em São Paulo. No total, a organização internacional possui 250  mil documentos. Em todos eles, há o trabalho de retirar nomes de pessoas para não prejudicá-las.

 

O debate pretendia discutir o acesso à informações públicas a partir do caso Wikileaks, mas acabou servindo também de local de protesto por transparência, contra a criminalização da internet, pela liberdade de expressão – pautada também por Lino Bocchini, criador da Falha de S. Paulo, que está sendo processado. Ele compos a mesa juntamente com Natália.

Em resposta às críticas quanto à escolha de jornais da grande imprensa para terem um acesso inicial aos documentos, a jornalista afirmou que O Wikileaks não é a favor da concentração da mídia, “tanto que o principio é tudo estar no site para todos receberem. A organização trabalha baseada no princípio de espalhar seus documentos”. Ela foi questionada quanto ao tratamento editorial dado por esses grupos no caso dos documentos tratarem de questões da comunicação no país, como a projeto de lei de cybercrimes do senador Eduardo Azeredo, intensamente citada ao longo do debate. Pessoalmente, Natália prometeu para os militantes pesquisar documentos específicos sobre essa questão.

Pedro Ekman, membro do Intervozes, discutiu o critério político da escolha dos jornais. “Acho a estratégia válida, se fosse o Wikileaks sozinho já tinha ido. Mas no Brasil porque não [veículos como] a EBC (Empresa Brasil de Comunicação) e a Carta Capital?”, perguntou. Ele citou que apesar desses veículos não terem a mesma penetração do grupo Globo, essa exclusividade provavelmente está trazendo retorno financeiro, e seria uma possibilidade de fortalecer a emissora pública, por exemplo.

Platéia

O Ato-Debate feito no Sindicato dos Engenheiros, em São Paulo, contou com a participação de 150 pessoas. Pelo Twittcam, chegaram a acompanhar 600 pessoas, que fizeram a hashtag #atowikileaks ficar entre as mais repetidas do Brasil.

A jornalista e representante do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Renata Mielli, ficou impressionada com o número de pessoas presentes no debate. Ela acredita que todos têm claro que o que está em jogo é que todos tem que ter acesso à informação pública disponibilizada pelos seus próprios países. “Coisas do governo não são segredo de estado”, opinou.

 

Rachel Moreno, do Observatório da Mulher e Campanha pela Ética na TV, acredita que a criminalização de Assange é um ataque a toda a informação que não é conservadora. Ela compartilhou que uma rede de jornalistas britânicas e suecas com visão de gênero, que contataram feministas da respectivos países, relatou que a opinião geral é que todas estão estupefatas com a rigidez do crime pelo qual ele está sendo acusado. “As jornalistas femininas declararam que as bandeiras das mulheres estão sendo usadas com finalidades políticas que não tem a ver com a liberdade das mulheres”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

OEA relaciona concentração da propriedade a censura

O informe anual da Relatoria para Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA) aponta que a desconcentração da propriedade dos meios de radiodifusão é um passo fundamental para os países signatários avançarem na democracia. O documento, que reflete sobre dados coletados em 2009, cita explicitamente a necessidade de existirem mecanismos regulatórios e de fiscalização, além de sanções e restrições, para alcançar estágio em que os meios de comunicação sejam livres, independentes, vigorosos, pluralistas e diversos.

Os pontos detalhados pela OEA legitimam agenda das pautas das organizações em prol do direito à comunicação no Brasil, ratificando a necessidade de alterações na legislação e no papel do Estado para reparar o alto grau de concentração no setor. A OEA, instituição subordinada a Organização das Nações Unidas (ONU), baseia todo o documento na Declaração Americana dos Direitos e Deveres dos Homem.

O informe também aproxima a liberdade de expressão, em particular a radiodifusão, das políticas sociais essenciais para a inserção dos segmentos indefesos.  De acordo com a Relatoria da OEA, a convergência entre a exclusão social e a ausência de canais institucionais ou privados para expressão suas opiniões ou se informar, produz um efeito similar à censura: o silêncio.

Em entrevista ao Observatório do Direito à Comunicação, a relatora especial da OEA para Liberdade de Expressão, Catalina Botero, preferiu não tecer considerações objetivas em relação à radiodifusão no Brasil. Segundo ela, futuramente será possível avaliar a situação de cada país via convite aos Estados e sociedade civil para colaborarem com relatórios próprios sobre o país, ao ponto de permitir avaliações e recomendações específicas. De acordo com Catalina, a etapa atual do trabalho da Relatoria para Liberdade de Expressão da OEA é de elaboração cuidadosa de normas correspondentes a doutrina e jurisprudência interamericana.

Para João Brant, membro do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, a pauta das organizações nacionais é baseada em políticas de incentivo a pluralidade e diversidade, justamente o que é apontado agora pela OEA como fundamental à garantia da liberdade de expressão. “Nós que somos acusados de posições radicais temos convergências com a maioria do documento”, avalia. Brant, entretanto, coloca que as organizações brasileiras vão um pouco além do documento da OEA. O documento não trabalha na perspectiva do direito à comunicação, conceito que ganha força entre os movimentos sociais no Brasil e vai além do que tradicionalmente se estabeleceu como liberdade de expressão.

O silêncio do poder econômico e político

A partir de informes anteriores, a OEA avaliou que a concentração tem natureza essencialmente econômica e que essa não deve sobressair na ocupação dos canais de radiodifusão. O oligopólio e monopólio da informação, via concentração vertical e horizontal, por exemplo, são criticados objetivamente desde o informe publicado no ano 2000.

O informe atual também aponta que os mecanismos fiscalizatórios devem ser dotados de autonomia dos grupos comerciais e do poder Executivo, sendo papel estatal dar sustentabilidade financeira a esses instrumentos. Catalina Botero comentou que as autoridades de regulação sem autonomia são problemáticas e podem ser utilizadas com fins políticos ou econômicos. Para ela, é fundamental que essas autoridades, e não outras, estejam a cargo do Congresso, bem como qualquer regime de telecomunicações deve ser produto de debate do Legislativo.

No relatório, aprofunda-se um pouco mais a análise e afirma-se que o instrumento fiscalizador deve ser composto por um órgão colegiado com pluralidade e submetido a procedimentos claros, integralmente públicos, transparentes e submetidos a um estrito controle judicial. Para João Brant a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) é essencialmente contrária a esses princípios.

Já a questão da valorização dos aspectos econômicos como definidores da distribuição das frequências de radiodifusão choca-se diretamente com as regras em vigor no Brasil. O Decreto 1720/95, que estabelece as regras para as licitações de concessões, abre espaço para que o único critério que define quem obtém um canal de rádio ou TV seja o maior valor ofertado pelas empresas interessadas.

A OEA também cita que conceder a licença por si só não é suficiente para garantir a liberdade, pluralismo e diversidade, se existirem normas que estabelecem condições arbitrárias ou discriminatórias para o seu uso. Quanto aos veículos comunitários no Brasil, os conflitos com o relatório estão nas restrições a utilização do espectro, dificuldades para obter as outorgas e fontes de financiamento.

O limite dos proprietários

Ao contrário do que pregam os empresários de comunicação em toda a América Latina e em especial no Brasil, para a OEA o estabelecimento de sanções e restrições aos meios comunicação são consideradas essenciais para o bom funcionamento da democracia. Nesse aspecto, o informe ressalta que, com o objetivo de respeitar outros direitos, medidas restritivas podem ser executadas a depender do: i) o grau de afetação de outro direito; ii) importância de satisfazer outro direito; iii) se a satisfação de outro direito justifica a liberdade de expressão.

O relatório detalha que, ao se renovar uma licença, é dever dos õrgãos responsáveis analisar se a concessão se compatibilizou com o objetivo de fomentar a pluralidade e diversidade, em especial em países ou regiões em que a concentração da propriedade é muito alta.

Meios públicos e comunitários

Os meios públicos, para a OEA, desempenham uma função essencial para assegurar a pluralidade e diversidade. A organização recomenda que estes veículos tenham como papel principal a promoção de conteúdos não necessariamente comerciais, mas articulados com as necessidades informativas, educativas e culturais da população.

O relatório aponta quatro questões preocupantes para esses meios: obstáculos no financiamento público; existência de meios sem missão pública definida;falta de reconhecimento legal específico para as emissoras comunitárias, além da ausência de frequências e mecanismos de financiamento suficientes para as emissoras comunitárias.

Quanto às emissoras comunitárias, o relatório comenta o projeto de Lei enviado ao Congresso brasileiro em 2009 que descriminaliza a operação de radiodifusão sem licença. A OEA pede prudência ao Brasil na adoção de medidas penais e comenta que é indispensável considerar os parâmetros de pluralismo e diversidade nestas decisões.

Digitalização

Se tomados como parâmetros para avaliar as políticas adotadas, os critérios apontados como fundamentais pela OEA para que a transição dos sistemas analógicos para o digital também mostram que a situação é ruim no Brasil. Para a Relatoria sobre Liberdade de Expressão, deve haver planificação na transição do modelo analógico para o digital, através de um plano claro, que não limite os meios considerados públicos.

Catalina cita a necessidade de a digitalização abrir novas oportunidades na distribuição das licenças de radiodifusão. Além disso, a Relatoria sugere a adoção de medidas para capacitar a operação dos meios comunitários na nova plataforma.

João Brant salienta que o Brasil "estranhamente" desperdiçou a oportunidade de democratizar o espectro com a chegada da digitalização. A manutenção de uma estrutura regulatória sem transparência do modelo analógico e ausência de política concisa para ocupação dos canais públicos, são fatores que favorecem a concentração, segundo o membro do Intervozes.

O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar em breve a constitucionalidade do decreto que estabeleceu o Sistema Brasileito de Televisão Digital.

Franklin Martins nega controle do governo sobre a imprensa

O secretário de Comunicação Social da Presidência da República, ministro Franklin Martins, negou hoje (25) que o governo exerça qualquer tipo de controle sobre os jornais e outros veículos de comunicação brasileiros ou tenha qualquer intenção de fazê-lo. Martins usou inclusive uma frase muito citada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para reforçar a afirmação: “nunca antes na história deste país”, a imprensa nacional gozou de tanta liberdade como nos dias de hoje.

“Acho que os 'jornalões' gostam um pouco de contar essa história de que o governo quer controlar a imprensa. No entanto, posso garantir uma coisa: nunca houve, na história deste país, um clima de liberdade de imprensa tão grande como existe hoje. Os jornais são livres para publicarem tudo, inclusive as mentiras que queiram. E ninguém é perseguido por causa disso”, disse o ministro, após palestra no Congresso Mega Brasil de Comunicação 2010.

Para ele, os próprios leitores já perceberam as intenções de alguns jornais e fazem cobranças pelo bom jornalismo. “Os jornais precisam voltar a respeitar mais a inteligência do leitor, serem mais plurais e não acharem que tem que puxar o leitor pelo nariz para cá ou para lá. Isso não é bom jornalismo. E os jornais vão descobrir isso. Se não descobrirem pelo seu movimento interno, descobrirão porque a sociedade exigirá mudanças nos jornais”, afirmou.

Perguntado sobre episódios em que a posição do governo foi considerada um tipo de censura, como a ideia de cassar o visto e expulsar do país o jornalista Larry Rother, do New York Times, que escreveu uma reportagem dizendo que o presidente tinha problemas com o álcool, e a proposta de criação de um conselho federal para regulamentar o jornalismo, Franklin Martins afirmou que não houve censura.

“No [caso do conselho], acho que foi mais uma disputa política do que qualquer outra coisa. No episódio do New York Times, ele vem ao Brasil, escreve um livro, está aqui, não foi expulso, não aconteceu nada.”

Franklin Martins ressaltou que, como ministro, nunca entrou em contato com jornais para reclamar de uma matéria. “Tem muita gente que enche a boca para falar de liberdade de imprensa e vive reclamando para os donos de jornais das matérias que saíram. Eu nunca fiz isso.”

Na entrevista, o ministro falou também sobre o lançamento da TV Brasil Internacional, da EBC. Ele lembrou que, de acordo com a Constituição, deve haver complementariedade entre as TVs, pública, estatal e privada. “No Brasil, tínhamos praticamente só a TV privada. É bom que tenhamos TV pública, evidentemente. Televisão é uma coisa que leva tempo para construir. Está avançando, e acho muito positivo, muito bom, porque transmite também para fora do Brasil”, afirmou.

Edição: Nádia Franco

No Mato Grosso, deputado tenta intimidar jornalistas com ações na Justiça

A abertura de processo contra a presidenta do Sindicato dos Jornalistas foi a última ação do regime de censura no Mato Grosso capitaneada pelo presidente da Assembleia Legislativa (AL), José Geraldo Riva (PP). A sindicalista Ana Angélica de Araújo Werneck é processada por reproduzir em blogs os inúmeros processos instaurados contra o deputado estadual, em especial a última condenação por desviar dinheiro público. 

A censura não se limita aos veículos alternativos. Ancorado na falta de transparência e critérios para destinar as verbas publicitárias da AL, o deputado Riva também é acusado de exercer forte influência sobre os grandes meios de comunicação, sejam jornais ou TVs, sobre suas pendências na Justiça e assim caminhar para o próximo pleito sem a devida avaliação dos eleitores do Mato Grosso.
 

A situação no Mato Grosso confirma tendência do relatório Violência e Liberdade de Imprensa de 2009, produzido pela  Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), na qual se demonstra que a maioria dos casos de coerção contra os jornalistas é cometida por agentes do Estado ou a mando deles. 
 

Outros casos

Ana Angélica é a quarta jornalista do país a ser processada por José Geraldo Riva ao publicar suas dívidas na Justiça. Ela ainda não teve acesso aos autos, mas a intimidação não deve ser diferente da que recebeu os blogueiros Enock Cavalcanti e Adriana Vandoni, que podem pegar pena de 11 anos e seis meses de reclusão respectivamente. Já o repórter Fábio Pannunzio pode passar até 15 anos de regime fechado, segundo pede o deputado Riva. Enock chegou a colocar uma faixa escrito censurado em seu blog por ser impedido pela Justiça de opinar sobre Riva em novembro de 2009. Um mês antes o veículo reproduziu o texto de Ana que foi objeto da ação judicial.
 

Conhecida pelos militantes como Keka, Ana Angélica, acredita que seu caso polemizou mais pelo fato de ser presidente do sindicato, o que representa para ela uma ameça mais incisiva a toda categoria: "Não escrevo para política. Emiti uma opinião pontual sobre as informações que venho lendo e não acho que parlamentares com a ficha suja devam concorrer as eleições", diz Keka, de forma cautelosa após a ameaça e invisibilidade do tema nos principais veículos locais. 
 

O promotor do Ministério Público Estadual (MPE) Célio Joubert Fúrio reafirma a situação de Riva na Justiça: "Ele tem mais de cem processos civis e cerca de duas duzias por peculato. E possui mais do que denúncia: nas ações civis públicas, quatro foram condenações em primeira instância e ele apelando", relata o promotor, que considera o problema muito sério.

O membro do MPE, que integra o Núcleo de Defesa do Patrimônio Público e da Probidade Administrativa, prefere que a imprensa seja consultada para explicar porque saem poucas informações negativas sobre Riva, mas sem ações mais enérgicas do Judiciário para deferir os pedidos do MPE, resta a seguinte explicação: “Ele (Riva) tem um conta poderosa na mão e institucionalmente utiliza muito bem”, opina Fúrio.
 

O representante do Movimento Organizado pela Moralidade Pública e Cidadania (Moral), Ademar Adams, vai mais a fundo: “A Assembleia é um dos maiores anunciantes do Estado, se não o maior. Esses anúncios acabam comprando o silêncio dos meios de comunicação.  Não sai nos jornais, nem no noticiário das emissoras”. Adams, que também é jornalista, alega que a Ong Moral já pediu os números dos gastos com publicidade ao MPE e AL, mas a população continua sem saber quanto efetivamente se gasta em publicidade para os veículos, nem os critérios.
 

Liberdade de imprensa

A direção da Fenaj soltou uma nota de solidariedade a Ana Angélica, em que classifica a ação de Riva como “clara tentativa de intimidar a imprensa e impedir o livre acesso da população a informações de interesse público”. Na mesma linha, o movimento de oposição à atual direção da Federação, Luta Fenaj, também divulgou um texto em apoio a Keka.  

No relatório Violência e Liberdade de Imprensa de 2009, a Fenaj aponta um crescimento dos recursos à Justiça para impedir circulação de conteúdos, que representam hoje 27% dos casos, ficando atrás apenas das agressões físicas ou verbais, com 40%. Enock e e Adriana Vanoni são citados pelo documento por serem proibidos de opinar sobre José Riva ainda em 2009. 
 

O relatório também menciona que os assuntos políticos ou relacionados à administração pública representam 29% das temáticas. Ademar Adams acha que os blogs são os espaços no qual é possível quebrar o silêncio no Mato Grosso, porém Riva está “tentando calar a gente via processo judicial”. A observação é pertinente, já que os blogs e sítios na internet já somam 14% das mídias censuradas, um número crescente, pois em 2007 somavam 7% e em 2008, 10%.  

Relatores da ONU e OEA reforçam necessidade de mídia plural

Ao longo do século XX, a ampliação da comunicação de massa constituiu um ambiente que trouxe novas barreiras à efetivação da liberdade de expressão. Tão importante quanto poder falar, passou a ser fundamental ter os meios para se expressar em condições de ser efetivamente ouvido no debate público, feito sobretudo pela mídia. Com esta nova configuração da política e da cultura, aprofundada nas últimas três décadas, o conceito de liberdade de expressão tem de ser ampliado, incorporando especialmente a necessidade de garantia da pluralidade e da diversidade dos e nos meios de comunicação.

Esta é a opinião dos relatores para a Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Organização das Nações Unidas (ONU). Ambos participaram dos debates do seminário “Mordaças Invisíveis: Novas e Velhas Barreiras à Diversidade na Radiodifusão”, promovido pela Associação Mundial de Rádios Comunitárias em Buenos Aires, nos dias 13 e 14 deste mês.

"O guarda-chuva da liberdade de expressão se ampliou. O direito começou protegendo os indivíduos e sofreu um giro conceitual importante. O que protege hoje a liberdade de expressão é a possibilidade de que exista debate público, vigoroso, aberto, plural. Não só poder falar, mas ter os meios para falar. Só este debate permite a liberdade de exercício da liberdade e autodeterminação democrática", defendeu a colombiana Catalina Botero, relatora da OEA.

De acordo com Frank LaRue, jornalista guatemalteco hoje ocupando o posto de relator da ONU para a Liberdade de Expressão, o conceito surgiu de uma visão liberal de direitos civis e políticos. O desafio atualmente é superar a noção do direito individual, atrelada a esta visão antiga, e fazer dele um direito coletivo, que permita aos povos falar seu idioma, expressar sua cultura e ter garantida qualquer manifestação coletiva pública. "É muito importante ampliar esta visão. A liberdade de expressão é fundamental como baluarte da democracia mas também é importante como direito da cidadania, pois deve lidar com a presença de sistemas plurais", argumentou.

Ele destacou que esta ampliação implica em uma mudança substancial da visão sobre o papel do Estado. Se antes ele era o principal violador da liberdade de expressão dos agentes privados, e, portanto, o inimigo a ser contido e combatido, agora a situação se inverteu: enquanto o Estado torna-se o principal ente que pode garantir uma regulação promotora de ambientes plurais e diversos na comunicação de massa, os grupos privados comerciais – cada vez mais organizados em conglomerados e monopólios – transformaram-se em um obstáculo à efetivação deste direito.

“Hoje, para garantir liberdade de expressão, é preciso um Estado atuante", apontou LaRue. Isso não significa, continua, esperar do Estado a resolução para que sejam extintas todas as barreiras à diversidade, mas vê-lo como arena que deve ser disputada pelas forças progressistas e que têm na pluralidade uma bandeira. Desta forma, as regulações poderão refletir estas concepções, em detrimento de seguirem protegendo a flexibilidade de ação dos grandes grupos de mídia.

Acesso dos segmentos excluídos

Para Catalina Botero, a reversão deste quadro passa primeiramente por regular a formação de monopólios e oligopólios que concentram a produção e difusão de informações nas mãos de poucos grupos. “Por que não há leis anti-monopólio para esta mercadoria vital? Devem existir leis deste tipo específicas para os meios de comunicação. Um primeiro caminho é este.”

No entanto, a relatora acrescentou que apenas assegurar a existência de competidores não é suficiente, pois não garante que sejam distintos. Para que haja uma efetiva diversidade, coloca-se como um imperativo viabilizar o acesso de segmentos marginalizados e minorizados da sociedade à arena midiática, o que passa atualmente pela operação de canais de rádio e TV por estes grupos.

Botero apresentou o que, para ela, seria uma distribuição justa no espectro de radiofreqüências: dividir os canais igualmente entre operadores comerciais, organizações destes setores excluídos e emissoras públicas. Os segundos cumpririam o papel de fomentar as vozes que normalmente não são contempladas nos meios de massa, enquanto os terceiros contemplariam conteúdos que não são nem rentáveis, nem representação da visão de segmento específico, mas que são importantes para o debate democrático.

Tanto a relatora da OEA quanto Frank LaRue bateram na tecla da importância das rádios comunitárias e na urgência de promover o seu fortalecimento. Para isso, é necessário incentivo à sua apropriação por minorias, bem como o combate às legislações e arbitrariedades de Estados nacionais que marginalizam esta modalidade de mídia.

Sentido clássico

Frank LaRue destacou que, se há este novo e difícil programa do pluralismo e da diversidade a ser perseguido, o sentido clássico da liberdade de expressão não pode ser esquecido. O relator citou casos de censura e abuso do poder estatal, freqüentes ainda no Oriente Médio e na Ásia, e de violência contra jornalistas, existente em todo o mundo mas acentuada em zonas de guerra e conflito.

Uma das questões mais delicadas relacionadas à liberdade de expressar-se em sentido estrito é o conjunto de limitações impostas por regimes com alta penetração de forças religiosas. "Os conflitos religiosos têm que incrementar a liberdade de expressão, e não reduzi-la", defendeu. "O Estado nunca deve meter-se no conteúdo da comunicação salvo estabelecer limitações, como frear os casos de discriminação e incitação à violência."

Os dois relatores citaram a América Latina como um campo fecundo de experiências que podem ser utilizadas como exemplo para o resto do mundo. Infelizmente, entre o rol de iniciativas a serem vistas como modelo estão não apenas as experiências de luta pela diversidade, mas também os ambientes e ações de governos e do mercado que obstaculizam o alcance de uma efetiva diversidade nos meios de comunicação no continente.