No Mato Grosso, deputado tenta intimidar jornalistas com ações na Justiça

A abertura de processo contra a presidenta do Sindicato dos Jornalistas foi a última ação do regime de censura no Mato Grosso capitaneada pelo presidente da Assembleia Legislativa (AL), José Geraldo Riva (PP). A sindicalista Ana Angélica de Araújo Werneck é processada por reproduzir em blogs os inúmeros processos instaurados contra o deputado estadual, em especial a última condenação por desviar dinheiro público. 

A censura não se limita aos veículos alternativos. Ancorado na falta de transparência e critérios para destinar as verbas publicitárias da AL, o deputado Riva também é acusado de exercer forte influência sobre os grandes meios de comunicação, sejam jornais ou TVs, sobre suas pendências na Justiça e assim caminhar para o próximo pleito sem a devida avaliação dos eleitores do Mato Grosso.
 

A situação no Mato Grosso confirma tendência do relatório Violência e Liberdade de Imprensa de 2009, produzido pela  Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), na qual se demonstra que a maioria dos casos de coerção contra os jornalistas é cometida por agentes do Estado ou a mando deles. 
 

Outros casos

Ana Angélica é a quarta jornalista do país a ser processada por José Geraldo Riva ao publicar suas dívidas na Justiça. Ela ainda não teve acesso aos autos, mas a intimidação não deve ser diferente da que recebeu os blogueiros Enock Cavalcanti e Adriana Vandoni, que podem pegar pena de 11 anos e seis meses de reclusão respectivamente. Já o repórter Fábio Pannunzio pode passar até 15 anos de regime fechado, segundo pede o deputado Riva. Enock chegou a colocar uma faixa escrito censurado em seu blog por ser impedido pela Justiça de opinar sobre Riva em novembro de 2009. Um mês antes o veículo reproduziu o texto de Ana que foi objeto da ação judicial.
 

Conhecida pelos militantes como Keka, Ana Angélica, acredita que seu caso polemizou mais pelo fato de ser presidente do sindicato, o que representa para ela uma ameça mais incisiva a toda categoria: "Não escrevo para política. Emiti uma opinião pontual sobre as informações que venho lendo e não acho que parlamentares com a ficha suja devam concorrer as eleições", diz Keka, de forma cautelosa após a ameaça e invisibilidade do tema nos principais veículos locais. 
 

O promotor do Ministério Público Estadual (MPE) Célio Joubert Fúrio reafirma a situação de Riva na Justiça: "Ele tem mais de cem processos civis e cerca de duas duzias por peculato. E possui mais do que denúncia: nas ações civis públicas, quatro foram condenações em primeira instância e ele apelando", relata o promotor, que considera o problema muito sério.

O membro do MPE, que integra o Núcleo de Defesa do Patrimônio Público e da Probidade Administrativa, prefere que a imprensa seja consultada para explicar porque saem poucas informações negativas sobre Riva, mas sem ações mais enérgicas do Judiciário para deferir os pedidos do MPE, resta a seguinte explicação: “Ele (Riva) tem um conta poderosa na mão e institucionalmente utiliza muito bem”, opina Fúrio.
 

O representante do Movimento Organizado pela Moralidade Pública e Cidadania (Moral), Ademar Adams, vai mais a fundo: “A Assembleia é um dos maiores anunciantes do Estado, se não o maior. Esses anúncios acabam comprando o silêncio dos meios de comunicação.  Não sai nos jornais, nem no noticiário das emissoras”. Adams, que também é jornalista, alega que a Ong Moral já pediu os números dos gastos com publicidade ao MPE e AL, mas a população continua sem saber quanto efetivamente se gasta em publicidade para os veículos, nem os critérios.
 

Liberdade de imprensa

A direção da Fenaj soltou uma nota de solidariedade a Ana Angélica, em que classifica a ação de Riva como “clara tentativa de intimidar a imprensa e impedir o livre acesso da população a informações de interesse público”. Na mesma linha, o movimento de oposição à atual direção da Federação, Luta Fenaj, também divulgou um texto em apoio a Keka.  

No relatório Violência e Liberdade de Imprensa de 2009, a Fenaj aponta um crescimento dos recursos à Justiça para impedir circulação de conteúdos, que representam hoje 27% dos casos, ficando atrás apenas das agressões físicas ou verbais, com 40%. Enock e e Adriana Vanoni são citados pelo documento por serem proibidos de opinar sobre José Riva ainda em 2009. 
 

O relatório também menciona que os assuntos políticos ou relacionados à administração pública representam 29% das temáticas. Ademar Adams acha que os blogs são os espaços no qual é possível quebrar o silêncio no Mato Grosso, porém Riva está “tentando calar a gente via processo judicial”. A observação é pertinente, já que os blogs e sítios na internet já somam 14% das mídias censuradas, um número crescente, pois em 2007 somavam 7% e em 2008, 10%.  

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