Por Cecília Bizerra*
Mais um 20 de novembro e seguimos em resistência, seguimos em urgente e necessária luta. Porque os estigmas, estereótipos e representações sobre o feminino negro nos mais diversos espaços, sobretudo na mídia, se repetem, se atualizam e se recriam. Não só em termos de conteúdo, mas também de apresentação e articulação, encontrando ressonância, inclusive, entre os nossos parceiros de militância, como aconteceu recentemente com o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ).
O deputado Jean recebeu críticas de quem luta contra a estereotipação do corpo da mulher negra. O parlamentar concordou com a representação cultural que continua a colocar os corpos femininos negros num lugar de hiperssexualização e subalternidade. Ignorou as denúncias de diversas organizações de mulheres negras em relação ao programa “Sexo e as Negas”, ao defender a produção que contribui para reforçar os estereótipos e lugares de subalternidade que nos inferiorizam e nos afastam do que é intelectual e pensante.
Justamente por considerar o deputado Jean um parceiro, pois é um dos poucos que enfrenta o conservadorismo no Congresso Nacional, que é preciso cobrar a coerência e imediata retratação. De forma solidária, mas também incisiva, porque a população negra, as mulheres negras já foram silenciadas e violentadas demais. Queremos inclusão e visibilidade, mas não de forma subalterna ou estereotipada. Não mais, nunca mais. É preciso o respeito ao fato de que o protagonismo na luta e o poder de determinar o que nos agride ou não serão sempre nossos, do povo negro.
A hipersexualização das mulheres negras na mídia brasileira nos leva à discussão sobre a sub-representação, a invisibilidade e a representação distorcida da população negra em geral na mídia, que, por sua vez, nos leva a uma discussão também muito urgente: a revisão do marco regulatório das comunicações, a partir da ausência de pluralidade e diversidade na mídia, que esvazia a dimensão pública dos meios de comunicação.
Um novo marco regulatório que garanta o direito à comunicação a todos e todas, ampliando a liberdade de expressão, a diversidade e pluralidade na televisão na mídia, é urgente para que esse setor se torne um ambiente realmente democrático. Como propõe o Projeto de Lei Iniciativa Popular da Mídia Democrática (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação-FNDC, 2012), esta nova legislação deve “promover a pluralidade de ideias e opiniões; fomentar a cultura nacional, a diversidade regional, étnico-racial, de gênero, classe social, etária e de orientação sexual; garantir os direitos dos usuários”, entre outros princípios.
Nesse contexto de baixa representação e estigmatização da população negra brasileira, uma certeza permanece: o racismo se mantém no espaço midiático, atualizando-se, reinventando-se, e reaparecendo sob os mais diversos modos, estilos, contextos e títulos. Hoje, “O Sexo e as Nega”. Amanhã, o que será? Não sabemos. Sabemos apenas que não vamos mais permitir que nos calem ou nos violentem. Nunca mais. Seguimos em resistência e, se for preciso, lutaremos por vários anos, por mais alguns novembros.
Palmares vive. Não nos calaremos.
*Cecília Bizerra é jornalista, militante da Irmandade Pretas Candangas e integrante do Coletivo Intervozes. Com colaboração de Daniela Luciana, jornalista e militante da Irmandade Pretas Candangas.
Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.