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Direitos, valores e sociedade

A liberdade de expressão está garantida na Constituição, assim como o acesso à informação. Mas não se tratam apenas de direitos que devem ser garantidos pelo Estado. É dever de toda a sociedade lutar, defender e reivindicá-los. Esta é a bandeira da organização Artigo 19, que está presente em vários países. No Brasil, o escritório fica em São Paulo. A revistapontocom conversou com Camila Marques e Karina Quintanilha, advogadas do Centro de Referência Legal, da Artigo 19.

Na entrevista que segue, elas explicam os desafios que o Brasil enfrenta para alcançar a ‘liberdade de expressão’. Mostram que, em alguns casos, é necessário encontrar um equilíbrio entre a liberdade de expressão e outros direitos, como o que defende as crianças. Falam também de dois temas polêmicos que envolvem a infância e a liberdade de expressão: a classificação indicativa e a propaganda abusiva. Segundo elas, a publicidade abusiva é toda aquela que se aproveita da vulnerabilidade do consumidor ou que viole valores sociais e morais do mesmo.

“Mesmo que se admita a existência de uma “liberdade de expressão publicitária”, é necessário primeiro avaliar os interesses da sociedade e verificar o que é mais importante: veicular a publicidade, garantindo a liberdade de expressão, ou proteger outros direitos e valores que podem ser prejudicados por ela. O que se busca ao regular a publicidade não é impedir seu exercício legítimo, mas definir parâmetros que estejam de acordo com os valores da sociedade. Quem deve definir os limites da regulamentação é, portanto, a própria sociedade, de maneira participativa e democrática, e não os publicitários e anunciantes isoladamente”, destacam as advogadas.

Qual é o objetivo da organização Artigo 19?

Camila Marques e Karina Quintanilha – A Artigo 19 trabalha para que todos e todas, em qualquer lugar, possam se expressar de forma livre, acessar informação e desfrutar de liberdade de imprensa. Compreendemos que a liberdade de expressão está baseada em um tripé: direito de se pronunciar, liberdade de imprensa e direito de saber. Nesse sentido, o principal objetivo da organização é proteger e promover o direito à liberdade de expressão e acesso à informação, previstos pelo artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Este é o motivo para adoção do referido artigo como nome da organização. Para a Artigo 19, o acesso à informação é o oxigênio da democracia.

A criação da Artigo 19 é uma prova de que a liberdade de expressão ainda não é um direito?

C.M. e K.Q. – A existência de uma organização de direitos humanos como a Artigo 19 comprova que a garantia desses direitos pelo Estado não depende apenas de previsão legal, mas também de políticas públicas efetivas construídas de forma participativa com a sociedade. Assim, podemos afirmar que a liberdade de expressão, sem dúvida, é um direito fruto da luta histórica da sociedade por direitos, porém cabe a todos e todas exercer o controle social do Estado para cobrar que esse direito seja efetivado de forma igualitária na sociedade.

Quais são os desafios para se alcançar o pleno exercício da liberdade de expressão, nos três eixos citados: o direito de se pronunciar, liberdade de imprensa e o direito de saber?

C.M. e K.Q. – Para a Artigo 19, esses três eixos estão interligados, de forma que o pleno exercício da liberdade de expressão somente poderá ocorrer quando esse tripé – buscar, receber e difundir informações e ideias – esteja garantido. No Brasil, dentre os principais desafios para a realização plena da liberdade de expressão podemos citar: as barreiras impostas ao acesso à informação pública; violência contra jornalistas, comunicadores e defensores de direitos humanos; violência estatal e criminalização de protestantes; censura e vigilantismo na internet; a ausência de regulamentação e fiscalização para estimular o pluralismo e diversidade na mídia além de coibir o monopólio dos meios de comunicação e a apropriação desses meios por políticos; a criminalização dos meios comunitários de comunicação decorrente da ineficiência do Estado em garantir as outorgas; sanções criminais ou civis abusivas e desproporcionais por difamação contra aqueles que levantam a sua voz para denunciar violações a direitos humanos; acesso limitado à internet por grupos vulneráveis.

Dos três direitos, talvez o que trata da liberdade de imprensa seja o mais conhecido, pois volta e meia entra no discurso das grandes corporações de mídia. Os outros: o direito de saber e o de pronunciar parecem que estão ligados mais ao cidadão e são poucos conhecidos. Correto?

C.M. e K.Q. – Como mencionamos anteriormente, tratam-se de dimensões diferentes da liberdade de expressão, mas que estão intrinsecamente ligadas entre si. Pode-se dizer que houve uma evolução na concepção da liberdade de expressão. Assim, a interpretação contemporânea desse direito mostra que a liberdade de expressão vai além de um direito individual, pois implica no reconhecimento da dimensão coletiva desse direito, já que toda a sociedade tem o direito de difundir, receber e propagar informações e ideias num ambiente de pluralismo e diversidade. Dessa forma, superamos a interpretação tradicional desse direito que implicava no entendimento de que liberdade de expressão significava apenas o direito de cada um dizer o que “lhe vier a mente” sem nenhum tipo de restrição. A concepção contemporânea da liberdade de expressão mostra que existe uma dimensão individual e coletiva desse direito, já que o direito de receber informações de fontes diversas e variadas está embutido na liberdade de expressão enquanto cidadão e cidadã. Além disso, ainda existe o direito de todos nós de ter acesso aos meios necessários para difundir qualquer tipo de expressão que tenhamos interesse em difundir. Infelizmente, o desconhecimento sobre esses aspectos da liberdade de expressão é uma realidade. Acreditamos que isso ocorre, principalmente, pois existe uma omissão do Estado em desenvolver políticas públicas que incentivem a disseminação de informações e educação sobre os direitos humanos.

Se os cidadãos adultos muitas vezes não têm noção de tais direitos, o que dirá a infância ou a juventude. Pelo que vocês observam no dia a dia, crianças e adolescentes são considerados cidadãos com menos direitos?

C.M. e K.Q. – Realmente seria muito importante que o Estado se preocupasse desde os primórdios da educação infantil com a garantia desses direitos e a educação em direitos humano. Isso não quer dizer que crianças e adolescentes são considerados cidadãos com menos direitos, muito pelo contrário, as diversas legislações protetivas dos direitos das crianças e adolescentes mostram que existe um reconhecimento da sociedade da necessidade de garantir proteção especial para esse grupo.

Há algum trabalho específico de vocês para crianças e adolescentes?

C.M. e K.Q. – A Artigo 19 acompanha desde os primórdios a discussão sobre a classificação indicativa no Conselho Nacional de Comunicação. Sobre esse assunto, apresentou Amicus Curiae – espécie de parecer jurídico – no Supremo Tribunal Federal (STF) para defender a constitucionalidade da classificação indicativa. Estamos envolvidos com algumas iniciativas no que diz respeito às medidas de proteção da criança e do adolescente frente aos conteúdos abusivos e violentos veiculados nos meios de comunicação. Recentemente acompanhamos as discussões decorrentes da Resolução 163 do Conanda a fim de mostrar que existem limitações legítimas à liberdade de expressão, como é o caso da limitação da publicidade comercial para proteger o direito das crianças e adolescentes.

No Brasil, qualquer tipo de ação política e ou política pública que tente de alguma forma regular qualquer questão frente às crianças e aos adolescentes (por exemplo, a questão da classificação indicativa, como vocês mencionaram) é associada à censura e consequentemente à violação da liberdade de imprensa. Por que isto acontece?

C.M. e K.Q. – Não se trata apenas de um fenômeno nacional. A regulamentação da mídia é tema de grande debate e resistência por parte das grandes corporações em todo o mundo. No Brasil, a questão é ainda mais complicada devido ao histórico monopólio dos meios de comunicação que favorece economicamente e politicamente os setores comerciais. Esses setores fazem uso do argumento da censura para convencer a opinião de pública de que a regulamentação da mídia restringiria a liberdade de imprensa. Ocorre, no entanto, que o Brasil é um dos mais atrasados nessa questão e toda a população sofre com ausência de parâmetros claros para garantir que não haja monopólio na mídia e para que existam políticas públicas que garantam espaço para grupos minoritários e independentes nos meios de comunicação. A política de classificação indicativa, por exemplo, que está sendo implementada no Brasil, tem sido elogiada por outros países como um modelo de regulamentação de acordo com os padrões internacionais de proteção às crianças e liberdade de expressão. No entanto, essa política que tem como finalidade proteger as crianças de conteúdos ofensivos ou prejudiciais a sua integridade psíquica e formação intelectual está sendo contestada nesse momento no STF sob a alegação de que se trata de uma limitação ao direito à liberdade de expressão, apesar da Constituição Federal deixar claro a necessidade da proteção da criança e adolescentes a conteúdos veiculados na mídia. Quatro ministros do STF já se posicionaram contra a política de classificação indicativa em atendimento aos argumentos apresentados pelo setor comercial que tem interesse em veicular a sua programação sem nenhuma restrição de horário. Recentemente o processo entrou para a pauta de julgamento e caso não haja forte mobilização e pressão por parte da sociedade civil corremos sérios riscos de ver deslegitimada a política pública de classificação indicativa, o que representaria uma enorme perda para aqueles que lutam por uma regulamentação dos meios de comunicação em favor de maior pluralismo e diversidade na mídia de acordo com padrões internacionais que equilibrem o direito à liberdade de expressão frente a outros direitos como é o caso das crianças.

Essa mesma discussão dos interesses comerciais também está presente na questão da publicidade, não é mesmo? Recentemente, o Conanda aprovou a resolução 163 que recomenda o fim da publicidade abusiva direcionada às crianças e o setor vinculou, novamente, à censura.

C.M. e K.Q. – A publicidade é uma prática comercial, destinada a promover a venda. Para isso, ultrapassa o discurso informativo e entra no campo da persuasão. Ao estimular o consumo por meio do convencimento, o discurso publicitário tem o poder de interferir na saúde, na segurança, na definição de valores culturais e educacionais de uma sociedade e de cada indivíduo, incluindo a formação de crenças e valores das crianças. Se uma sociedade está preocupada com o tipo de influência que a publicidade pode exercer na formação de valores e no exercício de outros direitos, regulamentá-la é perfeitamente legítimo. Ao proteger a opinião e a livre expressão do pensamento, a Constituição Federal teve a intenção de garantir a manifestação de ideias e convicções individuais ou da coletividade, mesmo que estas possam causar incômodo. Publicidade não se trata disso: seu fim não é expressar uma convicção ou uma informação, mas vender. O titular da liberdade de expressão como direito fundamental é sempre o indivíduo ou a coletividade, não as empresas. Publicidade abusiva é toda aquela que se aproveite da vulnerabilidade do consumidor ou que viole valores sociais e morais do mesmo. Nesse sentido, para analisar se a regulamentação da publicidade é legítima, é preciso ver se há interesse público em proteger outros direitos que podem ser colocados em risco pelo discurso publicitário. Mesmo que se admita a existência de uma “liberdade de expressão publicitária”, é necessário primeiro avaliar os interesses da sociedade e verificar o que é mais importante: veicular a publicidade, garantindo a liberdade de expressão, ou proteger outros direitos e valores que podem ser prejudicados por ela. O que se busca ao regular a publicidade não é impedir seu exercício legítimo, mas definir parâmetros que estejam de acordo com os valores da sociedade. Quem deve definir os limites da regulamentação é, portanto, a própria sociedade, de maneira participativa e democrática, e não os publicitários e anunciantes isoladamente. O discurso da liberdade de imprensa pode ser superado através de argumentos que mostram que o possível “dano” causado por programação veiculada em faixa inadequada ou publicidade comercial direcionada a crianças é potencialmente reforçado por quatro problemas: ele é provável (possivelmente com frequência diária), de grande impacto (trata-se de meios de comunicação de penetração nacional), de difícil mensuração imediata de efeitos e de difícil reparação posterior. Ainda, o direito nacional e internacional protege a integridade física e psíquica de crianças e adolescentes o que inclui a garantia do bem-estar social desses indivíduos que estão em plena formação e devem ser tratados pelo Estado e sociedade com especial cuidado e atenção para a defesa de sua saúde, segurança, valores culturais e educacionais, e não como um mercado consumidor em potencial. Por fim, vale reforçar que os titulares do direito à liberdade de expressão são sempre os próprios indivíduos ou a coletividade e não as empresas.

No mundo de hoje, os ‘direitos de expressão’ são direitos de poucos?

C.M. e K.Q. – O direito à liberdade de expressão legalmente constituído é de todos e todas, porém o que vemos na prática é que poucas pessoas têm acesso aos meios que permitem a apropriação desse direito e, principalmente, grupos minoritários e vulneráveis acabam sofrendo censura e até mesmo violência quando buscam fazer uso da liberdade de expressão para manifestar as suas demandas ou reivindicar outros direitos.

Entrevista concedida a Marcus Tavares, publicada na revistapontocom e reproduzida do Observatório da Imprensa – www.observatoriodaimprensa.com.br

Justiça condena jornalista por texto ficcional. Liberdade de expressão?

Por Ana Carolina Westrup*

Quantos de nós ouvimos histórias em que o rei tinha o poder soberano e todos os seus subordinados o respeitavam e faziam da sua ordem a lei? Mais do que contar a história de personagens, os contos revelam a busca íntima do escritor em provocar nos leitores a reflexão sobre determinado contexto histórico. A linguagem literária, que usa a ficção como elemento chave, pode se adequar, assim, a qualquer realidade, pessoas, tempos ou lugares. Essa foi a característica central de um texto publicado pelo jornalista sergipano Cristian Góes, em maio de 2012.

Mas não foi essa a compreensão do desembargador e atual vice-presidente do Tribunal de Justiça de Sergipe, Edson Ulisses, que pediu a condenação de Góes. O papel de escritor do jornalista logo deu espaço então ao de alguém que vive um dos momentos mais dramáticos da sua vida. E o episódio expõe, de forma mais do que concreta, a fragilidade em torno do exercício da liberdade de expressão em nosso país.

Vamos ao caso. Em 2012, Cristian Góes publica em um blog de Sergipe a crônica Eu, o coronel em mim, que não cita nomes ou períodos históricos. O desembargador Edson Ulisses, no entanto, entendeu que um dos personagens da história – o “jagunço das leis” – o representava. Ingressou então com dois processos contra o jornalista: uma ação criminal em que pedia a prisão Góes por difamação e uma ação cível, com pedido de indenização por danos morais.

Em janeiro de 2013, na primeira audiência de conciliação, o jornalista propôs publicar uma nota esclarecendo que o texto não fazia referência a ninguém. O desembargador não aceitou a proposta e, em contrapartida, ofereceu ao jornalista a possibilidade de admitir a culpa a ele embutida, visando uma redução da pena. Na mesma ocasião, provocado pelo autor do processo, o Ministério Público Estadual (MPE) também impetrou uma ação penal contra o autor.

Neste momento, já estava claro que o objetivo do desembargador não era esclarecer qualquer erro de interpretação dos leitores, mas sim punir Góes com todo o peso de um processo criminal. Sem conciliação, o processo correu e, em uma velocidade digna das metas do Conselho Nacional de Justiça, em julho do mesmo, o juiz Luiz Eduardo Araújo Portela condenou o jornalista a sete meses e 16 dias de reclusão.

O cerceamento à liberdade de expressão do jornalista ganhou repercussão nacional e internacional. Cristian Góes chegou a participar de uma audiência pública na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) para denunciar o caso.

A pressão social, no entanto, não foi suficiente para mexer as peças no tabuleiro jurídico. O recurso impetrado na turma recursal do Tribunal de Justiça de Sergipe, apesar da consistência dos argumentos, foi negado por maioria. A estratégia foi recorrer, junto ao Supremo Tribunal Federal, pedindo a revisão da condenação. Porém, na última sexta-feira (15), sem sequer julgar o mérito da ação, o ministro do Supremo Ricardo Lewandowski negou o pedido, mantendo, portanto, a condenação à prisão do jornalista.

Para o advogado do caso, Rodrigo Machado, o texto do jornalista não promove qualquer tipo de dano pessoal. Trata-se do direito à crítica através de uma linguagem ficcional.

“O direito da liberdade de expressão não deve ser confundido com o direito de elogiar. É papel de todo e qualquer cidadão fazer crítica a uma situação ou conjuntura política. Cristian fez isso através de um texto ficcional, que se adéqua a qualquer realidade ou personagens. No nosso entender, sua condenação é uma distorção do conceito de liberdade de expressão”, defende o advogado.

A condenação de Góes em diversas instâncias do Poder Judiciário também revela um quadro de desequilíbrio na forma como a Justiça é aplicada para jornalistas de grandes veículos e para comunicadores independentes. Ela mostra o quão seletivo o Judiciário é ao utilizar um texto ficcional para privar alguém de sua liberdade enquanto silencia diante de uma série de violações praticadas por jornalistas da grande imprensa, que destroem reputações e não sofrem qualquer punição.

Um novo recurso deve ser apresentado ao STF, com base no próprio posicionamento do órgão acerca de proteção à liberdade de expressão, manifestada no julgamento do ADPF 130. Já no âmbito da pressão social, uma nova nota de repúdio está aberta a adesões. Entidades de defesa da liberdade de expressão também se preparam para apresentar uma denúncia formal contra a decisão da Justiça brasileira nos organismos internacionais de proteção aos direitos humanos.

*Ana Carolina Westrup é jornalista sergipana e integrante do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Agentes do Estado seriam responsáveis por 77% dos crimes contra comunicadores

De acordo com o relatório “Violações à Liberdade de Expressão”, publicado pela Artigo 19, agentes do Estado (polícia, políticos e agentes públicos) estariam envolvidos em 23 (77%) dos casos graves de violência contra comunicadores registrados em 2013 como mandantes. Superam, inclusive, os 4 casos envolvendo o crime organizado.

A polícia lidera o ranking de mandantes em número de homicídios contra comunicadores no ano de 2013, estando envolvida em 3 casos desse tipo e em 3 outros de ameaça de morte. Em relação às ações comandadas pelo crime organizado, foram registrados 1 caso de homicídio, 2 ameaças de morte e um sequestro. A maioria das mortes (75%) teria como alvo vítimas que vinham fazendo denúncias. Em um número menor de casos (25%), o assassinato está relacionado com a emissão de opiniões.

O cientista político, Pedro Fassoni, professor da PUC-SP afirma no relatório que “geralmente esses jornalistas são assassinados através de assassinos de aluguel e muitas vezes chega-se até a autoria do crime, mas não ao mandante. O poder econômico continua determinando também essa questão”.

Os políticos lideram, por outro lado, o número de mandantes em casos de ameaças de morte (8) e de tentativas de homicídio (6), além de ter sido registrado também 1 sequestro. Assim, como no caso das ocorrências de homicídios, a maioria das motivações que levam à ameaça de morte estão relacionadas à denúncias (87,5%), e uma menor parte de casos motivados por opinião (12,5%).

A maioria dos casos de violações contra comunicadores registrados aconteceu na região Sudeste (8), seguida pelas regiões Norte (6), Sul (6), Nordeste (5) e Centro-Oeste (4).

A metodologia empregada para a produção do relatório se valeu de matérias publicadas em diversos veículos de comunicação, organizações sociais e redes de correspondentes, bem como de relatos das próprias vítimas ou testemunhas dos casos. Posteriormente, foi realizada uma apuração de cada caso, com entrevistas com as vítimas, seus conhecidos e familiares, membros da sociedade civil que trabalham com o tema e autoridades responsáveis pelas ocorrências.

Na categoria comunicadores estão jornalistas, radialistas, blogueiros, repórteres investigativos, apresentadores de televisão, fotógrafos, chargistas e comunicadores comunitários. Ao final, o relatório faz dez recomendações ao Estado brasileiro sobre como atuar para reduzir o número de violações, além de recomendações a organismos internacionais e a organizações da sociedade civil e de mídia.

Violência nas manifestações

As manifestações de rua que cresceram desde junho de 2013 chamaram a atenção da população para um caso específico de violência contra a liberdade de expressão, dirigida contra comunicadores que tentam registrar as ocorrências nos grandes atos públicos.

Luis Roberto Antonik, diretor-geral da Associação Brasileira de Empresas de Rádio e Televisão (Abert), apresentou, em audiência pública realizada pelo Conselho de Comunicação Social no Senado no dia 5 de maio, números que demonstram parte desse problema. De acordo com esses dados, em 2013 houve 136 casos registrados de violação à atividade jornalística, sendo que 67% estão relacionados às manifestações que ocorreram em locais públicos. Segundo Antonik, a violência partiu principalmente de policiais.

O representante dos empresários atribui a violação à liberdade de expressão ao despreparo de policiais e desconsidera a possibilidade de que essa violência seja algo deliberado. “Não entendemos que os policias tenham um propósito contra jornalistas, mas entendemos que não estão preparados para esse cenário [das manifestações] que temos enfrentado no último ano”, explicou Antonik.

A íntegra do relatório que também levanta casos de violência contra defensores dos direitos humanos pode ser acessada clicando aqui.

Com informações da Artigo 19 e da Agência Senado

Ministro do STF defende regulação da comunicação

O presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STF), Joaquim Barbosa, defendeu na última segunda-feira (7) a regulação da comunicação no país e a criação de leis mais modernas no setor. A declaração do ministro foi feita a um grupo de jornalistas após sua fala na abertura do seminário “A liberdade de expressão e o poder judiciário”, realizado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, na qual criticou a falta de diversidade nos veículos de comunicação.

“Na vida social, sempre há necessidade de se estabelecer balizas, e a regulação ajuda bastante o magistrado a resolver os conflitos que surgem”, afirmou o ministro. Segundo ele, a falta de normas “tende a favorecer quem tem mais poder, mais dinheiro” e defender a normatização do setor não tem nenhuma relação com qualquer interesse de censura.

Joaquim Barbosa já havia se manifestado sobre o tema da falta de diversidade na mídia brasileira em discurso proferido na comemoração da Unesco realizada na Costa Rica pelo Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, em maio de 2013.

Internet

O relator especial da ONU para o direito à liberdade de expressão e opinião, Frank de La Rue, destacou o papel da privacidade para o exercício da liberdade de expressão, considerando que este é um problema que se coloca com evidência em um mundo em que a internet “acelera” o processo de cidadania ativa. Lembrou do caso das agitações que derrubaram os governos no Egito nos últimos anos, no qual as redes sociais tiveram um importante papel. “Sem privacidade, há intimidação”, afirmou.

Joaquim Falcão, professor da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), mencionou o Marco Civil da Internet e se disse preocupado com o fato de já existirem 41 propostas de emendas no Senado para modificar o texto aprovado pela Câmara. Pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV, Luiz Moncau apontou a existência de alguns abusos do poder econômico em momentos eleitorais por meio da internet, como acontece em casos de contratação de serviços de envio de mensagens automáticas.

Acesso à informação

Um dos temas para o qual o evento deu especial atenção foi o da relação entre o acesso à informação e a liberdade de expressão. O juiz Diego García-Sayan, da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), lembrou do caso “Claude Reyes”, ocorrido em 2006.

Julgando que o governo do Chile havia violado o direito da “Fundación Terram”, uma ONG ambientalista, de ter acesso à informação a respeito de uma importante operação de desmatamento naquele país, foi possível criar uma jurisprudência que inspira hoje juízes no continente. Essa decisão representou o primeiro “reconhecimento de um tribunal internacional a um direito básico de acesso a informações do governo como parte do direito à liberdade de expressão”, segundo a Open Society Foundation.

Recentemente a CIDH condenou também o governo brasileiro, no caso “Gomes Lund” em que foram negadas informações sobre o paradeiro de alguns guerrilheiros desaparecidos na Guerrilha do Araguaia, caso não mencionado no evento.

O ministro Jorge Hage, da Controladoria Geral da União apresentou a evolução do que considera a “intensificação” do movimento pela transparência pública. “Vivemos o momento da intensificação do debate e colocação na agenda nacional da questão do acesso à informação”, afirmou.

* Com informações do site Consultor Jurídico