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Aprovada em Comissão a MP que altera estrutura da EBC

A Comissão Mista formada para analisar a Medida Provisória (MP) 744/2016, que altera a estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), aprovou nesta quinta-feira, 8, o parecer do relator, senador Lasier Martins (PDT-RS). Com isso, estão mantidas as modificações propostas na MP, entre elas a transformação do antigo Conselho Curador da empresa em um Comitê Editorial, com menor capacidade de decisão e menor representação, voltado especificamente para as questões de programação.

A extinção do Conselho Curador foi duramente criticada por entidades, profissionais e pesquisadores que defendem a importância da comunicação pública para uma sociedade democrática, e também por funcionários da empresa. Entre as justificativas para a MP 744, editada em 2 de setembro, o governo de Michel Temer afirmava que o Conselho Curador “estava partidarizado, o que atrapalhava sua atuação de forma isenta”. Entretanto, as audiências públicas realizadas pela Comissão Mista para debater a Medida Provisória mostraram que o processo de escolha dos integrantes do conselho não passava por interferências do Executivo. Aliás, pelo contrário: são as alterações impostas por Temer na MP 744 que diminuem o caráter público e a autonomia da EBC, deixando a empresa à mercê dos interesses do governo de turno.

Como tentativa de obter consenso para a questão, o senador Lasier Martins propôs em seu relatório a substituição do Conselho Curador por um Comitê Editorial. Também propôs a diminuição do número de integrantes de 22 para 11 nesta remodelação, além de limitar as atribuições do comitê à observação da linha editorial da EBC e de restringir a sua composição a pessoas de “notório saber” na área da comunicação. Antes, na composição do Conselho Curador, estava prevista a atuação de profissionais de diversas áreas do saber, o que enriquecia as análises feitas no âmbito da instância e melhor representava a pluralidade e diversidade presentes na sociedade brasileira.

Comissão Interamericana de Direitos Humanos

O senador Paulo Rocha (PT-PA), que participa da Comissão Mista da MP 744/2016, critica a restrição imposta à indicação dos membros do Comitê Editorial. Ele observa que esta limitação vai impor à instância uma atuação com o viés da comunicação e do conhecimento técnico, que também são importantes, mas que não levará em consideração a função social dos organismos e a representação da sociedade civil organizada, que são ainda mais relevantes para um órgão de tais características no âmbito de uma empresa pública de comunicação.

Rocha também trouxe para debate uma comunicação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), para a secretária de Direitos Humanos do governo Temer, Flávia Piovesan. O texto, assinado pelo relator especial para a Liberdade de Expressão na CIDH, Edison Lanza, questiona os motivos que levaram o governo de Michel Temer a deslocar a EBC da Secretaria de Comunicação Social para a Casa Civil. Sobre isso, o senador Paulo Rocha faz uma ressalva: “se a proposta é fortalecer a comunicação pública e torná-la independente, não faz sentido vincular [a EBC] à Casa Civil, que é um órgão de assessoramento direto da Presidência da República”.

O relator especial para a Liberdade de Expressão na CIDH também questiona o fato de a MP 744/2016 permitir que o governo de plantão mexa à vontade na diretoria da empresa, assim como os motivos para a extinção do Conselho Curador da empresa pública. Antes da edição da MP pelo governo Temer, a única estrutura que podia demitir o presidente da EBC era justamente o Conselho Curador. Essa prerrogativa garantia a independência da Empresa Brasil de Comunicação frente aos governos. Agora, com a MP 744, o ocupante do cargo de presidente da República pode alterar a direção da EBC a qualquer momento que lhe convier. “Reconhecendo-se que a liberdade de expressão exige necessariamente uma ampla pluralidade de informações, é essencial garantir que esses meios públicos sejam independentes do governo”, enfatiza Edison Lanza.

Gastos em publicidade aumentaram 1000%

Durante o debate, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) frisou que votaria favoravelmente ao parecer por “consideração ao relator”, mas ressaltou deveria ser pedido ao governo Michel Temer a total extinção da empresa pública. Na sua avaliação, a EBC é “onerosa e desnecessária num momento de crise financeira”. Vale lembrar que o orçamento da EBC não chega à metade do que o governo repassa às mídias privadas. Desde que Michel Temer passou a ocupar a Presidência da República, as empresas privadas de comunicação tiveram um aumento de quase 1000% nos recursos que recebem em publicidade do governo federal. Portanto, se o senador Ronaldo Caiado está de fato preocupado com os gastos públicos, deveria estar questionando Temer sobre os valores que a União repassa às emissoras privadas de televisão e rádio e às mídias impressas.

A deputada Angela Albino (PCdoB-SC) rebateu a posição de Caiado e criticou a ausência de vários parlamentares nos debates realizados previamente à leitura do relatório na Comissão Mista. “Vamos ouvindo as falas e vão ficando claras duas diferenciações. A primeira é quem tem vocação para a convivência democrática e os que não têm. E a segunda é quem acompanhou o desenvolvimento dessa comissão e quem não acompanhou. Cada um discursa para a sua plateia, mas em momento nenhum aqui nós discutimos a eliminação de empregos [com uma eventual extinção da EBC]”, rebateu a deputada, fazendo referência ao fato do senador Caiado não ter participado de nenhuma outra sessão da comissão, muito menos dos debates realizados.

O deputado Chico D’Angelo (PT-RJ) questionou as verdadeiras intenções da MP 744/2016, lembrando que só a mudança na forma de escolha da presidência da empresa já demarca a intenção de torná-la estatal, retirando seu caráter público e eliminando sua autonomia em relação ao governo. D’Angelo reprovou a atitude do atual diretor-presidente da EBC, Laerte Rimolli, ao demitir arbitrariamente a jornalista Leda Nagle, apresentadora do programa Sem Censura há 20 anos. “Se estamos falando em uma empresa pública de qualidade e que tenha apelo de audiência, qual a motivação para demitir uma jornalista que atuava num dos programas mais assistidos da grade da EBC?”, perguntou ele.

Como fica a estrutura da EBC com a Medida Provisória

De acordo com o parecer aprovado na Comissão Mista da MP 744/2016, o presidente da EBC cumprirá mandato de até quatro anos, sem recondução. Será nomeado pelo presidente da República, após aprovação em sabatina no Senado Federal, mas tanto ele quanto os demais diretores-executivos poderão ser indicados e exonerados a qualquer momento pela Presidência da República. A composição da Diretoria-Executiva passará dos atuais oito integrantes para seis, todos também de livre nomeação e exoneração pelo presidente da República.

O Conselho de Administração agregará novos membros: os representantes dos Ministérios da Educação e da Cultura, além de um representante dos empregados da empresa. Eles se somam aos representantes dos Ministérios da Ciência e Tecnologia, do Planejamento e da Casa Civil. Já o Comitê Editorial e de Programação terá a função de assegurar que a programação proposta pela diretoria da EBC cumpra os princípios e os objetivos da comunicação pública. O comitê será composto por 11 membros, todos designados pelo presidente da República a partir de uma lista tríplice.

O Comitê Editorial e de Programação terá um representante de cada um dos seguintes segmentos, o qual deverá ter “notório saber” em comunicação:

– emissoras públicas de rádio e televisão;

– cursos superiores de Comunicação Social;

– setor audiovisual independente;

– veículos legislativos de comunicação;

– comunidade cultural;

– comunidade científica e tecnológica;

– entidades de defesa dos direitos de crianças e adolescentes;

– entidades de defesa dos direitos humanos e das minorias;

– entidades da sociedade civil de defesa do direito à Comunicação;

– cursos superiores de Educação e;

– empregados da EBC.

Vedadas indicações de partidos e entidades religiosas

Será vedada a participação em consulta pública, para a formação do Comitê Editorial e de Programação, de indicações oriundas de partidos políticos, instituições religiosas ou voltadas para a disseminação de credos, cultos, práticas e visões devocionais ou confessionais, atendendo proposta da deputada Ângela Albino. O mandato dos integrantes do comitê terá duração de dois anos, sem possibilidade de recondução.

O senador Lasier Martins manteve em seu relatório a proposta de que o Comitê Editorial estude a formulação de mecanismo de aferição e tipificação permanentes da audiência da EBC, mas com indicadores e métricas que considerem a natureza e os objetivos da radiodifusão pública, as peculiaridades da recepção dos sinais e as diferenças regionais. Caso a Diretoria-Executiva da empresa não considere as determinações do comitê para este e outros temas, a instância deverá acionar a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) do Senado Federal, a quem caberá as providências cabíveis.

O parecer passará a tramitar agora como projeto de lei de conversão (PLV) 35/2016 e seguirá para o plenário da Câmara dos Deputados, onde deve ser votado até o próximo dia 13, e depois para o plenário do Senado. A previsão é de que a votação da MP 744 seja concluída definitivamente no retorno dos trabalhos legislativos, após os recessos de final de ano. A intenção do governo é votar a medida provisória no Senado entre os dias 7 e 8 de fevereiro, já que a mesma expira no dia 10 de fevereiro. Caso a MP não seja aprovada pelo Congresso Nacional até lá, volta a valer a legislação anterior.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Relatório substitui Conselho Curador da EBC por um Comitê Editorial

Parecer reforça a concessão de poder total ao ocupante da Presidência da República para indicação e exoneração do diretor-presidente da empresa

Foi apresentado nesta terça-feira, dia 6, na Comissão Mista do Congresso Nacional, o relatório elaborado pelo senador Lasier Martins (PDT/RS) que analisa a Medida Provisória (MP) 744/2016 – a MP altera a Lei da EBC (Lei 11.652/2011). Uma questão destacada no parecer é a criação de um Comitê Editorial e de Programação em substituição ao Conselho Curador, extinto pela MP 744. O Conselho Curador contava com representantes da sociedade civil e do governo.

Para o relator, o comitê vai resolver uma questão colocada durante as audiências realizadas para debater as mudanças na Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que é a participação da sociedade nas decisões da empresa. Porém, o relatório diminui o número de integrantes das respectivas instâncias de 22 (Conselho Curador) para 11 (Comitê Editorial), além de limitar as atribuições da última exclusivamente à definição da linha editorial da EBC. “A principal diferença entre as duas instâncias é que a nova não terá nenhuma função administrativa no organograma da empresa, como o poder de destituir o diretor-presidente, prerrogativa que estava à disposição do ConselhoCurador”, reconhece o próprio Lasier Martins.

O relatório indica que as decisões do Comitê Editorial têm caráter consultivo e deliberativo, devendo ser seguidas pela diretoria-executiva da empresa. Em caso de descumprimento, o comitê acionaria a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado Federal, que intercederia junto à direção da EBC.

Um segundo ponto destacado no relatório diz respeito diretamente ao cargo de diretor-executivo da EBC. Na proposta de Lasier Martins, o diretor-presidente precisará passar por uma sabatina e pela aprovação do Senado, ainda que a sua nomeação e demissão sejam determinadas a qualquer momento pela Presidência da República. Sendo assim, o relatório do senador mantém um dos principais problemas responsáveis pela descaracterização da empresa pública trazidos na MP 744, que é o fim da estabilidade no mandato do presidente da empresa.

Controle social e gestão pública

Ainda justificando seu parecer, o senador traz dois argumentos principais para a criação do Comitê Editorial e de Programação. O primeiro é que “parece não haver divergência a respeito de que um de seus principais requisitos mínimos é possuir algum mecanismo de controle social, com a participação da sociedade”.

O segundo argumento, conforme sua fala, é de ordem financeira. Caso não seja previsto qualquer mecanismo que caracterize a EBC como gestora de comunicação pública e com participação social, isso poderia significar a extinção, por perda de objeto, da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública (CFRP), devida pelas prestadoras de serviços de telecomunicações, nos termos da Lei nº 11.652, de 2008. Lasier Martins reforça essa questão no relatório, destacando que, “se [a EBC] não for uma empresa de caráter público, as teles não teriam razão para recolher a CFRP, que em 2015 totalizou mais de R$ 300 milhões”. A CRFP seria a principal fonte orçamentária da EBC, mas esse recurso encontra-se bloqueado hoje por uma disputa judicial.

Críticas à inconsistência do relatório

O presidente da Comissão Mista do Congresso Nacional, deputado Ságuas Moraes (PT-MT), criticou o relatório final dos trabalhos realizados pelo colegiado. Para ele, até mesmo propostas que poderiam trazer algum avanço acabam sendo anuladas por outras que retiram sua eficácia. “O relator criou, por exemplo, a figura do Comitê Editorial e de Programação para orientar a produção de conteúdo. Poderia até funcionar, mas ele determina que essa instância deva ser composta apenas por pessoas oriundas da mídia, prejudicando a voz da sociedade. Outro ponto interessante, que é a sabatina do diretor-presidente da EBC pelo Senado, acaba se perdendo quando é criada a possiblidade do presidente da República demitir sumariamente o dirigente máximo da EBC a seu bel prazer”, afirma.

Medição de audiência

Uma outra questão controversa foi a proposta do relator sobre os “métodos para elevar os índices de audiência da EBC”. O senador Lasier Martins recomenda no parecer que a empresa pública contrate regularmente pesquisas para auferir a audiência, como forma de orientar a produção de conteúdo, ignorando a contribuição da sociedade civil, em audiência pública realizada no dia 29 de novembro, em que foram feitas várias intervenções dos participantes no sentido de afirmar que a preocupação da comunicação pública deve estar na divulgação da diversidade e pluralidade brasileiras, e menos na questão de “medições de audiências”. Isso porque tais medições quantitativas foram criadas com fins mercadológicos, não tendo a complexidade necessária para avaliar os resultados da comunicação pública, conforme seus objetivos específicos.

“As funções básicas da comunicação pública são construção de cidadania, utilidade pública, interesse público, sustentar a cidadania, promover a educação, estimular a criatividade e excelência cultural, diminuir a concentração dos veículos – uma das funções muito importantes da comunicação pública também – e aumentar a pluralidade de vozes e opiniões na mídia, sem se prender à necessidade de uma medição de audiência que não representa a realidade e a totalidade da população brasileira”, enfatizou Renata Mielli, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), durante a audiência do dia 29 de novembro.

Pessoas de notório saber

Na verdade, o Comitê Editorial e de Programação aparece no relatório mais como uma forma de minimizar as fortes críticas feitas pela sociedade civil durante as audiências públicas realizadas pela comissão. Porém, ao restringir as indicações a “pessoas de notório saber em comunicação social”, tal comitê não cumpre o papel de garantir diversidade e pluralidade na tomada de decisões. Essa é uma diferença essencial em relação ao projeto da EBC desmontado pela MP 744/2016.

O extinto Conselho Curador tinha 15 representantes da sociedade civil que não estavam necessariamente vinculados ao setor da comunicação, porém que possuíam o conhecimento de telespectador do segmento que representava naquela instância. Com o Comitê Editorial, a representação da sociedade vai se limitar aos próprios profissionais da comunicação. Serão comunicadores falando com comunicadores em nome da sociedade, sem a participação de outros sujeitos de nossa composição social.

Atribuições do Comitê Editorial

O Comitê Editorial proposto pelo senador Lasier Martins tem entre suas atribuições:

* deliberar sobre os planos editoriais propostos pela Diretoria-Executiva para os veículos da EBC, na perspectiva da observância dos princípios da radiodifusão pública;

* deliberar sobre alterações na linha editorial da programação veiculada pela EBC;

* propor a ampliação de espaço, no âmbito da programação, para pautas sobre o papel e a importância da mídia pública no contexto brasileiro;

* convocar audiências e consultas públicas que oportunizem a ampla discussão sobre os conteúdos produzidos e que permitam qualificar o desempenho do serviço prestado;

* formular mecanismo que permita a aferição permanente sobre a tipificação da audiência da EBC, mediante a construção de indicadores e métricas consentâneos com a natureza e os objetivos da radiodifusão pública, considerando as peculiaridades da recepção dos sinais e as diferenças regionais.

Composição do Comitê Editorial

De acordo com o relatório, o Comitê Editorial e de Programação será composto por membros indicados por entidades representativas dos seguintes setores:

* um representante de emissoras públicas de rádio e televisão;

* um representante dos cursos superiores de Comunicação Social;

* um representante do setor audiovisual independente;

* um representante dos veículos legislativos de comunicação;

* um representante da comunidade cultural;

* um representante da comunidade científica e tecnológica;

* um representante de entidades de defesa dos direitos de crianças e adolescentes;

* um representante de entidades de defesa dos direitos humanos e das minorias;

* um representante de entidades da sociedade civil de defesa do direito à Comunicação;

* um representante dos cursos superiores de Educação;

* um representante dos empregados da EBC.

Lido o relatório, foi concedida vista coletiva da matéria, com indicação de votação do parecer para esta quinta-feira, dia 8, às 9 horas.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Temer tenta barrar ações contra concessões de políticos e tem pedido negado no STF

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber rejeitou o pedido de liminar de Michel Temer(PMDB) para a suspensão de processos que contestam as concessões de rádios e TVs em nome de senadores e deputados federais. O atual ocupante da Presidência da República havia acionado, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), o STF para tentar barrar os processos judiciais contra políticos, numa tentativa de favorecer um grupo de 40 parlamentares.

A decisão da ministra Rosa Weber foi divulgada na quarta-feira, 30, na página do STF na internet. O pedido de liminar da Presidência, elaborado pela AGU, fora encaminhado ao tribunal em 9 de novembro. Trata-se de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) que pedia aos ministros que suspendessem e julgassem inconstitucionais decisões judiciais que contrariam os interesses dos deputados e senadores que possuem concessões públicas de rádio e TV, com o FALSO argumento de que tais decisões faziam “interpretações equivocadas da Constituição”.

A medida de Temer pretendia conter uma série de vitórias que as entidades dedicadas à democratização da comunicação estão obtendo nos estados, como por exemplo a decisão  por meio de liminar que determinou a interrupção, em agosto passado, das transmissões da Rádio Metropolitana Santista Ltda (1.240 MHz), de propriedade de Antônio Carlos Bulhões (PRB-SP), e o cancelamento de concessões de emissoras de rádio dos deputados federais Baleia Rossi (PMDB-SP) e Beto Mansur (PRB-SP). As decisões foram tomadas após ações do Ministério Público Federal. Ações similares contra parlamentares tramitam também em outros estados. A decisão de Rosa Weber garante a continuidade destes processos.

O tema já é objeto de duas ADPFs que se encontram em análise no Supremo, a 246 e a 379, ambas movidas pelo PSOL e sob relatoria do ministro Gilmar Mendes. Estas arguições questionam as concessões dadas a políticos e contam com pareceres da Procuradoria-Geral da República.

Concessão a políticos é inconstitucional

As arguições ajuizadas no STF estão fundamentadas sobre o fato de que a Constituição é descumprida quando atos do Executivo permitem que políticos com mandato eletivo sejam beneficiados com a outorga de concessões de emissoras de rádio e de canais de televisão. A ADPF 246 foi protocolada em dezembro de 2011, enquanto que a ADPF 379, em dezembro de 2015. Segundo Bráulio Araújo, advogado do PSol, a “jurisprudência vem avançando de forma sólida no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade da participação de políticos titulares de mandato eletivo como sócios de empresas de radiodifusão.”

Araújo menciona em uma das petições que, em julgamento da Ação Penal 530, em novembro de 2014, o Supremo Tribunal Federal (STF) já afirmava que os artigos 54, inciso I, alínea “a”, e 54, II, “a”, da Constituição Federal, proíbem claramente que deputados e senadores sejam sócios de pessoas jurídicas com titularidade sobre concessão, permissão ou autorização de radiodifusão. Além disso, em julgamento de agravo de instrumento publicado em outubro deste ano, a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (São Paulo) confirmou a liminar deferida pelo desembargador Johonsom di Salvo em março de 2016, suspendendo a execução dos serviços de radiodifusão prestados por empresas que possuem congressistas em seu quadro de sócios. Isso justamente em razão da violação ao artigo 54 da Constituição.

Por mais absurdo que isso seja, é justamente esse o artigo citado pelo atual governo na peça, assinada por Temer, pela advogada-geral da União, Grace Mendonça, e pela secretária-geral de Contencioso, Isadora Cartaxo de Arruda. Sustenta a Presidência que as decisões judiciais contrárias à concessão de rádios e TVs para políticos conferem “interpretação incorreta à regra de impedimento constante do artigo 54” da Constituição Federal e “ofendem os preceitos fundamentais da proteção da dignidade da pessoa, da livre iniciativa, da autonomia da vontade, da liberdade de associação e da liberdade de expressão”.

Para o PSOL e entidades como o Intervozes, Coletivo Brasil de Comunicação e Artigo 19, o artigo 54 é claro em impedir a concessão ou a renovação de concessões de rádio e TV a empresas que tenham deputados e senadores como sócios, independentemente da retórica usada pela Presidência em sua peça judicial em defesa dos parlamentares. Além disso, a ação de Temer ignora a primeira linha do artigo 55 da Constituição, que diz claramente: “Perderá o mandato o deputado ou senador que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior”, além de partir do princípio de que as liberdades individuais estão acima dos limites impostos pela lei, quando se sabe que não estão. Ou seja, quem afronta a Constituição é Temer e a AGU ao tentarem manter privilégios ilegais de parlamentares.

Ministra não vê divergência em decisões

Ao rejeitar o pedido de liminar, a ministra do STF Rosa Weber afirmou que não se faziam presentes na hipótese manifestada por Temer e AGU as circunstâncias excepcionais justificadoras da suspensão do andamento dos processos judiciais – o que era a pretensão dos autores. “As decisões judiciais trazidas aos autos juntamente com a exordial, a fim de demonstrar a alegada controvérsia constitucional, não evidenciam a existência de divergência interpretativa apta a ensejar uma suspensão geral dos processos”, ressaltou a ministra em sua decisão.

Influência indevida de políticos

Por sua vez, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em manifestação expressada em agosto deste ano, apoiou a iniciativa das ADPFs 246 e 379, considerando que a participação de parlamentares em empresas de radiodifusão “confere a políticos poder de influência indevida sobre importantes funções da imprensa, relativas à divulgação de informações ao eleitorado e à fiscalização de atos do poder público”.

Mérito da ação ainda será julgado

O mérito da questão ainda vai a julgamento no plenário do STF, sem data prevista no momento. Até lá, Rosa Weber terá de elaborar seu voto sobre a constitucionalidade ou não das concessões públicas que beneficiam parlamentares. Ao indeferir a liminar pedida por Temer, a ministra também pediu mais informações à Câmara dos Deputados, ao Senado Federal, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao Ministério das Comunicações, à própria AGU e à Procuradoria-Geral da República. Por outro lado, caberá a Gilmar Mendes apresentar voto a respeito das ADPFs 246 e 379.

De acordo com levantamento do Intervozes, 40 parlamentares, sendo 32 deputados federais e oito senadores, atuam como donos de concessões de emissoras de rádio e TV no país e podem ser beneficiados pela iniciativa de Temer. Entre eles, estão os senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Agripino Maia (DEM-RN), Fernando Collor (PTC-AL) e Jader Barbalho (PMDB-PA) e os ministros José Sarney Filho (Meio Ambiente) e Ricardo Barros (Saúde) – os dois últimos são deputados federais licenciados. Alguns parlamentares alegam que não têm mais participações em empresas de radiodifusão, porém continuam aparecendo nos respectivos quadros societários.

“A situação chegou a esse ponto por omissão do Poder Executivo nas últimas décadas. Questionamos essa omissão sistematicamente. Nosso objetivo [no Ministério Público] era provocar a manifestação do Supremo. O governo tenta agora justificar a omissão com essa ADPF”, afirmou em entrevista para o UOL, na semana passada, o procurador da República Jefferson Aparecido Dias, que atua na Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão no Estado de São Paulo e participa do Fórum Interinstitucional pelo Direito à Comunicação (Findac). No entendimento de Dias, parlamentar que atua como dono de concessão não pode vender sua parte nem transferi-la a um familiar. Deve devolvê-la ao poder público.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Sem Conselho Curador, não há comunicação efetivamente pública

Conclusão norteia manifestações de participantes em audiência pública sobre a MP 744/2016. Segmentos da sociedade se mostram preocupados com a falta de entendimento do atual governo sobre as diferenças entre uma empresa pública e uma empresa estatal

Representantes de organizações da sociedade, especialistas e funcionários da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) participaram nesta terça-feira, dia 29, de uma audiência pública destinada a debater a Medida Provisória (MP) 744/2016, que reestrutura a empresa, diminui sua autonomia e descaracteriza seu caráter público, alterando dessa forma a Lei 11.652/2008, de criação da EBC.

A MP 744 estabelece o fim do Conselho Curador e a vinculação da EBC à Casa Civil, e não mais à Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República. Também muda a configuração da diretoria-executiva, que passa a ser composta por um diretor-presidente, um diretor-geral e quatro diretores, todos nomeados pelo presidente da República, que poderá exonerá-los a qualquer momento sem nenhuma mediação. O que evidentemente diminui a autonomia da empresa e a deixa refém dos interesses do governo de turno. Antes da medida, o diretor-presidente da EBC tinha mandato de quatro anos e podia ser reconduzido ao cargo.

Gilberto Rios, coordenador-executivo da Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), enfatizou na audiência que qualquer intenção de reestruturação da EBC não pode ignorar todo o debate prévio realizado para a construção de uma empresa pública de comunicação no Brasil. “Esse debate iniciou num Fórum de Comunicação Pública e continuou por muito tempo, até chegar a um projeto que desse conta dos anseios de um conjunto de organizações”, afirmou.

A representante dos funcionários da EBC, Akemi Nitahara, repudiou a atitude do atual diretor-presidente da empresa, Laerte Rímoli, que, na primeira audiência sobre o tema, realizada na quinta-feira, 24, acusou alguns funcionários e conselheiros de serem insubordinados e ligados a partidos políticos. “Somos concursados, não entramos [na empresa] por cota de partidos. Conhecemos muito bem a lei que criou a EBC e é ela que nós defendemos. Defendemos seu caráter público e a manutenção de sua autonomia sem ingerências no trabalho que é realizado”, reforçou.

Questionada pelo relator da MP 744, o senador Lasier Martins, sobre a importância de cada veículo da empresa, Nitahara destacou que não existe hierarquia de importância nos veículos da EBC. “Todos os veículos têm importância em sua área de atuação, enquanto veículos públicos, e desenvolvem um importante papel na democratização da informação”, respondeu ela.

Sem justificativa para edição da medida

Presidente do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional (CCS), o advogado Miguel Ângelo Cançado lembrou na audiência que as MPs só devem ser utilizadas em caso de relevância e urgência, como previsto no artigo 62 da Constituição Federal. “A CCS acredita que esse [a reestruturação da EBC] não seja um caso urgente quanto ao mérito. Não acreditamos que a extinção do Conselho Curador seja a solução, não se pode falar em eficiência sem o controle social. Essas medidas vão contra o artigo 223 da Constituição e promovem uma distorção da comunicação pública”, avaliou ele, ressalvando que deveria ser uma preocupação do Poder Executivo assegurar o princípio da complementaridade entre os sistemas privado, público e estatal de comunicação, conforme previsto na Constituição.

Renata Mielli, coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), ponderou que organismos internacionais defendem a existência de uma comunicação pública com referência para a construção de uma sociedade democrática. “Os sistemas estatal e privado não são suficientes para garantir pluralidade na comunicação. Essa MP [744/2016] descaracteriza o caráter público. A EBC não é de nenhum partido, de nenhuma organização. Ela é da sociedade”, argumentou.

Mielli lembrou que o Conselho Curador “é justamente o espaço de participação e debates público” da sociedade na EBC, e questionou a obstinação de setores que questionam a existência da empresa usando como argumento dados de verificação de audiência. “Não é esse o papel da comunicação pública. A sua função é atender a pluralidade e diversidade, e não corresponder a expectativas mercadológicas”.

Para Teresa Cruvinel, jornalista e ex-presidente da EBC, a alteração por medida provisória de uma lei [Lei 11.652/2008] criada e aprovada no Congresso Nacional é inconstitucional. Cruvinel reforça que a comunicação pública deve ser independente do mercado e do Estado e deve também contar com a participação da sociedade, o que é possível por meio, justamente, do trabalho do Conselho Curador. “Essa MP é ambígua, pois a empresa deixará de ser de fato pública e se tornará uma empresa governamental. Ou o governo assume que está se apropriando da EBC ou os senhores [parlamentares] rejeitem essa MP“, enfatizou Cruvinel, citando exemplos internacionais da ação de conselhos semelhantes cuja atuação deliberativa é tão mais expressiva quanto têm sua “voz respeitada nas empresas”.

MP diminui autonomia em relação ao governo

Afastada do Conselho Curador desde a edição da MP 744, a jornalista e ex-presidente do Conselho Curador da EBC Rita Freire relatou o trabalho executado e sua independência em relação a partidos políticos. “Nos preocupamos em dar à EBC um caráter plural e estamos lutando pelo direito de ter uma comunicação pública verdadeira. Não estamos defendendo cargos, o que queremos é garantir a autonomia da empresa e o seu compromisso com a sociedade, não com governos”.

Venício Lima, jornalista, professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB) e ex-membro do Conselho Curador da EBC, também enfatizou que a MP 744 transforma a experiência de comunicação pública em comunicação estatal. Para ele, o que está em jogo é a disputa pela formação da opinião pública no Brasil.

O professor questionou o desrespeito aos artigos 220 e 223 da Constituição Federal. O primeiro proíbe monopólios formados por meios de comunicação; o segundo estabelece a complementaridade dos sistemas público, privado e estatal. “Quando não regulamentamos esses princípios, o Estado brasileiro prossegue delegando à iniciativa privada a responsabilidade pela comunicação”, apontou. Ele lembrou que existe desde 2010 no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, ajuizada pelo jurista Fábio Konder Comparato, que requer à Corte que determine ao Congresso Nacional a regulamentação de matérias existentes em três artigos da Constituição Federal (220, 221 e 223), relativos à comunicação social.

Presente na audiência, o deputado Jean Wylys (Psol-RJ), coordenador da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular, respondendo a um questionamento do senador Lasier Martins, citou trabalhos realizados pelo Conselho Curador da EBC, entre eles a criação de faixa de transmissão para programas de diversidade religiosa. “A demonização da EBC mistura mentira com preconceitos políticos arraigados”, declarou Wylys.

Nesta quinta, 1º/12, às 9h30, será realizada mais uma audiência pública no âmbito da Comissão Mista que analisa a MP 744/2016, desta vez com o ministro Eliseu Padilha. As audiências estão sendo transmitidas ao vivo pela TV Senado. Todas as pessoas que se manifestaram na audiência desta terça acreditam que é possível melhorar o projeto de comunicação pública colocado em prática pela EBC, mas todas são unânimes também em afirmar que a MP 744 acaba com o caráter público da empresa, a transformando em uma empresa de assessoria ao atual governo.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

Prefeitura de SP sanciona lei de incentivo a rádios comunitárias

Prefeito Haddad propõe que parte do orçamento de publicidade seja destinado às emissoras com o intuito de democratizar a comunicação

Com a sanção da Lei 16.572/2016 e sua respectiva publicação no Diário Oficial, em 19 de novembro, a cidade de São Paulo instituiu a primeira lei brasileira de política de incentivo às rádios comunitárias. Nesta quinta-feira, 24, o prefeito Fernando Haddad esteve reunido com representantes de diversas emissoras comunitárias para anunciar a novidade.

Ainda em julho passado, o prefeito esteve com representantes do setor para declarar sua intenção de criar uma lei em benefício à comunicação comunitária. Na ocasião, o prefeito destacou que a ideia era destinar parte do orçamento de publicidade às rádios comunitárias da cidade. A prefeitura possui um orçamento de R$ 100 milhões destinado à publicidade. “Temos que criar um plano pró-diversidade e liberdade da comunicação. Até mesmo o liberalismo é contra o oligopólio (midiático)”, afirmou ele na ocasião.

O plano foi elaborado em conjunto com o movimento de rádios comunitárias. O projeto foi apresentado pelo então vereador José Américo em 2011 e atualizado este ano, com apoio do vereador Antônio Donato, ambos do Partido dos Trabalhadores. A política municipal de fomento ao serviço de radiodifusão comunitária prevê a destinação de um orçamento mínimo de R$ 10 milhões aos projetos do setor (10% do valor total). São Paulo possui hoje mais de 30 veículos comunitários, localizados em diversas regiões da cidade.

A Lei 16.572/2016 representa um marco na comunicação comunitária. Haddad acredita que a iniciativa de São Paulo possa estimular outros agentes públicos a tomar iniciativas semelhantes. O prefeito considera que a política de incentivo às rádios comunitárias vai tornar a comunicação da cidade mais plural.

Para Marilene Araújo, advogada do Movimento das Rádios Comunitárias, a inciativa “vem fortalecer e reconhecer o papel das emissoras comunitárias”. Também os comunicadores comunitários receberam a lei como uma “grande vitória” do setor, pois viabiliza a pluralidade de informação no município. “Há um bloqueio midiático gigante. O fortalecimento da comunicação comunitária e alternativa amplia as possibilidades de acesso ao contraditório”, aponta Ana Flávia Marx, do Centro de Estudos de Mídia Alternativa Barão de Itararé.

Sobre o projeto

No programa de fomento a rádios comunitárias instituído pela Lei 16.572/2016, as rádios poderão apresentar projetos para financiamento de atividades de produção de conteúdo local e ações culturais. O texto legal busca reconhecer o papel desses serviços nas comunidades e procura garantir a sustentabilidade da programação de tais emissoras.

Todos os anos serão escolhidos até 40 projetos entre os inscritos. Cada rádio poderá inscrever até dois pedidos de financiamento, que poderão contemplar recursos humanos, material de consumo, equipamentos, locação, manutenção e administração de espaço, obras, reformas, produção da programação da rádio comunitária, transportes, material gráfico e publicações, divulgação, fotos, gravações e outros suportes de divulgação, pesquisa e documentação.

Os planos de trabalho deverão ter duração de no máximo um ano e orçamento de até R$ 250 mil. Os candidatos ao fomento serão selecionados por uma comissão julgadora formada por quatro representantes da Secretaria Municipal de Cultura e três representantes das rádios, que serão escolhidos por votação. Serão valorizados planos de ação continuada que não se restrinjam a um evento ou uma obra, além do interesse cultural das propostas.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação