Por Bruno Marinoni*
Não bastou o governo federal declarar regime de urgência para que o Marco Civil da Internet fosse votado pelo Congresso em 2013. O projeto de lei tramita há cerca de dois anos na Câmara dos Deputados. Fruto de um debate feito com ampla participação, por meio de audiências públicas e consultas abertas realizadas até maio de 2010, a cada dia que passa o texto corre mais risco de perder suas características de avanço em direitos fundamentais e se transformar em um típico “balaio de gato”. E o processo se arrasta mais uma vez, virando o ano sem ter o que comemorar.
No último dia 11 de dezembro, o deputado Alessandro Molon (PT/RJ), relator do projeto na Casa, apresentou um novo substitutivo visando acomodar os diversos interesses que vêm pressionando os parlamentares. Boa parte das alterações abre brechas para interpretações que “flexibilizam” os direitos garantidos, sobretudo em relação à preservação da privacidade do internauta, e o estrago pode ser maior se o processo continuar se prolongando.
As perspectivas não são boas. As teles têm batido o pé e o governo feito corpo mole. As corporações temem que a regulamentação dos direitos civis na internet possa atrapalhar os negócios, pois, no capitalismo monopolista, onde termina o direito quem manda é a força bruta da concentração de dinheiro. Nesta última versão do texto, elas conseguiram introduzir uma ressalva que garante a “liberdade dos modelos de negócio”, consubstanciando o famoso fetichismo da mercadoria que trata do direito das coisas como se fosse do direito das pessoas humanas.
O governo, em vez de defender de fato o Marco Civil e encaminhar sua votação, optou por utilizar o regime de urgência do projeto, que trava a votação dos demais PLs na fila, como estratégia para reafirmar sua política de ajuste fiscal e não liberar novos gastos no orçamento. Da mesma forma, a gestão Dilma preferiu não se indispor com o líder do PMDB, Eduardo Cunha, principal aliado na base governista, às vésperas das eleições de 2014. Assim, postergou a decisão e nos presenteia nesse Natal com mais dúvidas sobre a possibilidade de que a sociedade brasileira conquistará essa vitória.
2014 será um ano difícil. O presidente da Câmara já anunciou que quer ver votado o Marco Civil da Internet em fevereiro. Se não for, o texto terá que competir com o carnaval, a Copa do Mundo e talvez as eleições. Esperamos que o Marco Civil da Internet não tenha o mesmo destino do projeto de lei que tenta regulamentar o artigo da Constituição que versa sobre a regionalização da produção audiovisual e já comemora 20 anos de tramitação no Congresso Nacional.
* Bruno Marinoni é doutor em Sociologia pela UFPE e repórter do Observatório do Direito à Comunicação.
Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.
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