Regulação da mídia é tema recorrente no Mídia Cidadã 2012

A regulação da mídia e a necessidade de um novo marco regulatório para as comunicações no Brasil foram assuntos recorrentes nos debates da VIII Conferência Brasileira de Mídia Cidadã, que aconteceu nas últimas segunda e terça (24 e 25 de setembro) na Universidade de Brasília (UnB) sob o tema “Mídia, Cidadania e Políticas Públicas”.

No painel central, “Mídia, Cidadania e Políticas Públicas”, o professor e pesquisador do Laboratório de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília (LapCom/UnB) Murilo César Ramos fez um breve histórico da regulação do setor no Brasil e lembrou que a legislação que regula a radiodifusão brasileira, a Lei nº 4.117 de 1962, completa 50 anos neste ano de 2012, destacando que ela precisa ser urgentemente renovada para dar conta de democratizar o setor no Brasil.

“Nos anos 70 houve uma primeira tentativa de mudar essa legislação e cerca de dez versões de uma nova lei foram produzidas. Em 88, a disputa – bonita e trágica – para a construção do Capítulo da Comunicação Social na Constituinte gerou demandas para trazer novas mudanças na legislação. No governo FHC foram produzidas seis versões iniciais de uma nova lei, e no governo Lula, depois da realização da 1ª Confecom, que mobilizou a sociedade muito mais do que a Constituinte, foi criado um Grupo de Trabalho interministerial que deixou anteprojeto pronto para o governo Dilma e até agora nada… Isso causa espanto: por que essa legislação não sai? A Globo não deixa? As emissoras não deixam? Esse é um discurso fácil. Usar a Rede Globo como bicho-papão para não alterar a lei de radiodifusão não dá mais. É preguiça, cálculo político (do governo) de que é melhor não mexer”, opina o professor.

O professor da UnB também lembra que, embora haja certo bloqueio do debate público sobre o tema por parte das emissoras, isso não é impeditivo para que a sociedade não se aproprie desse debate. E acrescenta: “Esta é a grande disputa cidadã, porque o governo criou uma expectativa. Esse escalar de coisas, os quase 20 projetos de lei inconclusos ao longo desses anos, eis o grande desafio”.

No painel “Comunicação e Cidadania na América Latina”, o professor argentino da Universidade de Quilmes e estudioso do tema, Martin Becerra, também reforçou a importância de se discutir novas legislações de comunicação para países da América Latina já que, segundo o professor, uma nova lei permite pensar uma nova estrutura de propriedade. “Ao questionar a estrutura de propriedade estamos falando também de cidadania. Na América Latina quando falamos em políticas públicas de comunicação para promover a diversidade e pluralismo nos meios estamos falando de propriedade e conteúdo”, pontua Becerra, que afirmou também que nos meios de comunicação da América Latina, a lógica comercial supera outras partes do mundo, pois não existe uma 'compensação' com meios públicos.

O assessor de programas para a área de mídia e liberdade de expressão da Fundação Ford, Mauro Porto, que também estava no painel sobre América Latina fez coro as propostas de mudança na legislação e afirmou que a Fundação Ford criou essa linha de financiamento no Brasil por acreditar que a consolidação da democracia no país só será possível se ocorrer a democratizar a comunicação. "O Brasil enfrenta grandes problemas com a ausência de um marco regulatório das comunicações, por isso apoiamos os movimentos por políticas de comunicação, para a construção de marcos regulatórios que promovam a diversidade, o pluralismo”, afirmou.

O encerramento da Conferência teve como foco a relação entre a mídia e os direitos humanos. A professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro Liv Sovik defendeu uma profunda mudança curricular nos cursos de comunicação para que os estudantes possam sair da universidade cientes da sua responsabilidade social. “Essa mudança só vai acontecer se os próprios estudantes cobrarem das universidades essa alteração no rumo do processo de formação. Vocês não podem esperar que os professores façam isso. Essa nova concepção deve partir de vocês”, ressaltou a pesquisadora.

Liv Sovik dividiu a mesa de encerramento com a presidente do Geledés – Instituto da Mulher Negra, Nilza Iraci, para quem a mobilização no ambiente virtual é importante, mais ainda demanda ativismo fora das redes. Iraci destacou iniciativas do movimento negro para acionar judicialmente emissoras de rádio e TV que transmitem programas com conteúdo racista, machista e lesbofóbico. “Precisamos rever o marco regulatório das radiodifusão para garantir que a chamada liberdade de expressão dos donos da mídia não continue preponderando sobre os direitos de mulheres negras. Não podemos mais aceitar programas como o Zorra Total, de Rede Globo, que reproduzem um estereótipo degradante da mulher negra”, afirmou a presidenta do Geledés.

O evento

Promovida desde 2005 pela Rede Brasileira de Mídia Cidadã com o objetivo de reunir universidade, movimentos populares e sociais e organizações não governamentais para “discutir as relações entre mídia e cidadania e mostrar como a mídia ajuda a construir e a desconstruir a mobilização social”, a conferência em Brasília contou com a participação de  aproximadamente 120 pessoas, entre profissionais dos meios de comunicação, pesquisadores da área, integrantes de movimentos sociais, professores e estudantes. Mais informações sobre o evento deste ano em http://midiacidada2012.unb.br/

*Colaborou Juliana Cézar Nunes

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