Programas de TV são alvo da justiça

Na última segunda, 24, a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) encaminhou ofício ao ministro das comunicações, Paulo Bernardo, solicitando a tomada de providências no que se refere à utilização de concessões públicas de televisão para incitar a violência contra a população LGBT. Segundo a ABGLT, também são frequentes as ofensas a homossexuais em emissoras de TV, principalmente por parte de programas religiosos que arrendam horário em emissoras comerciais. A solicitação feita ao Ministério das Comunicações nesta semana foi especificamente por conta de declarações do pastor evangélico Silas Malafaia, que apresenta o programa “Vitória em Cristo” em duas emissoras de televisão: Bandeirantes e RedeTV. “O Malafaia vinha nos ofendendo em várias situações nos seus programas. Só que agora ele incentiva à violência, diz para abaixar o porrete na gente. Por isso nós pedimos providências ao Ministério das Comunicações e ao Ministério Público também”, declara Toni Reis, presidente da ABGLT.

A ABGLT reivindica alguma punição às emissoras que veiculem declarações ofensivas, para que se iniba a prática nos meios de comunicação. “Nós participamos da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) e agora sabemos que os meios de comunicação são concessões públicas, por isso não se pode se utilizar deste espaço público para ofender as pessoas”, argumenta Reis.

Diálogo

Sobre outros programas, ele afirma que a associação geralmente busca dialogar para que não haja reincidência. “Temos uma coleção de situações que se resolveram com o diálogo. Teve ocasiões, por exemplo, em que o Datena, apresentador da Bandeirantes, foi infeliz em suas declarações a respeito de homossexuais, o Faustão também, e só com o diálogo que fizemos essas pessoas perceberam que estavam incorrendo numa situação de discriminação e passaram a respeitar mais a gente”, diz o presidente da ABGLT.

Segundo Toni Reis, nunca houve abertura por parte do pastor Silas Malafaia para o diálogo, por isso estão buscando a própria TV, e solicitaram providências do Ministério das Comunicações. “Nós entramos também com uma ação no Ministério Público Federal e vamos utilizar todos os meios legais a que tivermos acesso aqui no Brasil. A nossa ideia é de não judicializar tudo, é de primar sempre pelo diálogo, mas a partir do momento em que isso se fizer necessário, vamos fazer sem sombra de dúvida”, conclui Toni.

Procurado para falar sobre o tema, o Ministério das Comunicações não se pronunciou até o fechamento desta reportagem.

Violações na TV

Assim como a população LGBT, outros grupos tem seus direitos violados diariamente na televisão. Na Paraíba, o Ministério Público Federal (MPF-PB) propôs, no dia 6 de outubro, uma Ação Civil Pública (ACP) contra a TV Correio, afiliada da TV Record no estado. Motivo da ação: a exibição de cenas reais do estupro de uma adolescente no programa Correio Verdade, apresentado por Samuca Duarte e veiculado de segunda a sexta entre 12h e 13h. A ação também foi ajuizada contra a União, por ser a titular da concessão de radiodifusão.

Segundo o procurador do MPF-PB que subscreve a ação, Duciran Farena, a emissora já é reincidente em casos de violação aos direitos humanos em seu “vale tudo” pela audiência. “O conteúdo do programa Correio Verdade somente tem piorado, chegando ao cúmulo do intolerável com a exibição das cenas do estupro”, afirma o procurador. “Neste caso, atinge exatamente o segmento mais fragilizado da sociedade – as crianças e adolescentes.”

Farena acredita que as emissoras abusam desse tipo de programação porque não há regulação para a mídia no país. “Provavelmente trata-se do único setor concedido sobre o qual o poder público não tem nenhum poder disciplinar sobre os prestadores do serviço”, declara. “A regulamentação, aliada a um controle social, pluralista, com representantes da sociedade e das empresas, com regras claras, poderia impedir a continuidade desses abusos”, disse Farena, referindo-se à necessidade de um órgão regulador para a radiodifusão no Brasil e de um Conselho de Comunicação com participação plural.

“Lamentavelmente, a imprensa, especialmente a televisão brasileira, não quer nem ouvir falar nisso – qualquer proposta neste sentido, por mais razoável ejusta que seja, é imediatamente qualificada pela mídia de censura, chavismo, nazismo. Acredito que ainda temos um longo caminho a trilhar para este objetivo”, pontua o procurador.

A Ação

Além da suspensão de programa, a ACP também pede a cassação da concessão da TV Correio, o pagamento de indenização de R$ 500 mil à adolescente, pelo uso indevido da imagem, violação da privacidade e danos morais. Também é exigido o pagamento de indenização por danos morais à coletividade, no valor de R$ 5 milhões, que devem ser revertidos ao Fundo Municipal da Criança e do Adolescente das cidades de João Pessoa e Bayeux, cidade paraibana onde ocorreu o crime.

A ACP solicita ainda à União a cassação da concessão da TV Correio e a suspensão, por 15 dias, do programa Correio da Verdade. A ação também foi proposta contra a União, por ser efetivamente a titular da concessão de radiodifusão. Neste caso, a União responder subsidiariamente pelas indenizações, no caso de falência ou desaparecimento dos réus.

A Secretaria de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações apenas informou que abriu processo de apuração de infração para saber qual sanção pode ser aplicada à emissora conforme a legislação vigente e que também prepara os esclarecimentos a serem encaminhados ao Ministério Público.

Mobilização social

Sônia Lima, do movimento de mulheres e de rádios comunitárias da Paraíba e integrante da Rede Mulher e Mídia, afirma que a iniciativa da ACP é resultado de um diálogo que a sociedade vem tendo com o MPF-PB. O objetivo da articulação é pautar questões ligadas ao direito à comunicação e, sobretudo, questões ligadas às violações aos direitos humanos na mídia paraibana. “Desde o início do ano estamos nessa interlocução, enviando provocações, sugestões ao Ministério Público. Se hoje existe um monitoramento, é graças ao movimento”, afirma a radialista.

De acordo com Sônia, o diálogo com o MPF-PB se dá por meio do Fórum de Ética e Mídia da Paraíba (Femi-PB), articulação que surgiu no ano de 2010 a partir das mobilizações Pró-Conferência de Comunicação no estado, em 2009. “O Fórum conta hoje com a participação de várias organizações da sociedade civil da Paraíba, entre elas o Sindicato dos Jornalistas, movimento de rádios comunitárias, movimento de mulheres, representantes da Universidade Federal da Paraíba e a Comissão de Direitos Humanos da OAB”, conta.

Sônia também observa que já podem ser vistos alguns bons resultados da ACP e da mobilização do Fórum de Ética e Mídia. “Já estão acontecendo umas coisas interessantes, como por exemplo, o fato de a produtora chamar a atenção dele – Samuca Duarte, apresentador do programa – toda hora no ar depois dessa ação. Vamos ver no que mais vai dar”, finaliza Sônia.

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