Sociedade civil se manifesta em defesa do caráter público da EBC

Enquanto os jornais tentam antecipar o nome do próximo presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), 51 entidades da sociedade civil divulgaram uma carta avaliando os quatro anos de funcionamento da empresa e sugerindo ações para a melhoria dela e do sistema público de comunicação como um todo.

Para os signatários do documento, o projeto de um sistema público no país corre riscos. Alguns vindos da própria mídia comercial e outros construídos dentro do Congresso e Judiciário – esses dois últimos ligados ao caso da discussão dos programas religiosos na TV Brasil. Além da TV, a EBC gerencia oito emissoras de rádio, uma rádioagência e uma agência de notícias na internet. 

A carta expõe dez propostas das entidades, como a universalização do sinal da TV Brasil, a construção de redes de TV e rádio públicas nacionais e o desenvolvimento de metodologia e mecanismos de aferição de audiência. O documento é assinado por organizações de peso, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Congresso Brasileiro de Cinema (CBC) e Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH).

 

No dia 31 de outubro expira o mandato da jornalista Tereza Cruvinel na presidência da empresa. Ela pode ser reconduzida, mas já adiantou que não gostaria de seguir no cargo. O jornalista Nelson Breve, que está no Executivo desde o governo Lula, é o mais cotado para assumir a vaga. 

Confira a íntegra da nota:

 

 

Em defesa do caráter público da EBC

Criada há pouco menos de 4 anos, a EBC – Empresa Brasil de Comunicação – está concluindo a primeira fase de uma longa caminhada no sentido da consolidação e fortalecimento da comunicação pública brasileira. Diversos atores sociais, tanto da sociedade civil como dos poderes públicos, envolveram-se nos debates iniciais que deram origem à criação da empresa, em particular durante o I Fórum Nacional de TVs Públicas, o que deu uma grande legitimidade ao processo de criação da EBC, embora ela continue sofrendo críticas por parte da mídia comercial privada e de setores da oposição, que ainda não compreendem a relevância e a necessidade de se garantir a complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal, prevista em nossa Constituição, para o fortalecimento de nossa democracia.

Infelizmente, o projeto da uma comunicação pública forte no Brasil, representado em grande medida pela criação da EBC, não se pode considerar consolidado e ainda corre sérios riscos – evidenciados nas últimas duas semanas por dois exemplos de atentado contra sua autonomia. Primeiro, a Justiça Federal conferiu liminar ao pedido da Arquidiocese do Estado do Rio de Janeiro a fim de garantir a permanência dos programas religiosos nas grades de programação das mídias da EBC. Os programas deveriam ter sido retirados das grades da TV Brasil e das rádios por decisão do Conselho Curador.

No dia 29, em audiência no Senado Federal para se debater a mesma decisão do Conselho Curador, parlamentares de vários partidos colocaram em xeque o próprio Conselho, atentando contra aquela que é uma das principais conquistas democráticas do processo da criação da EBC. Chegou a ser apresentada proposta de decreto legislativo anulando a decisão do Conselho Curador.

A despeito do mérito da discussão – e da dúvida sobre a legalidade das ações da Justiça e do Senado – as duas tentativas representam uma séria ameaça à autonomia da EBC e a seu caráter público, que tem no Conselho Curador seu principal fiador. Cabe ao Conselho justamente o papel de zelar pelos princípios e objetivos da empresa, opinar sobre matérias relacionadas ao cumprimento desses princípios e objetivos, deliberar sobre a linha editorial de produção e programação proposta pela Diretoria Executiva da EBC e manifestar-se sobre sua aplicação prática. No momento em que instituições do Legislativo e do Judiciário tentam interferir na construção da programação da emissora, seu caráter público fica evidentemente em risco.

Os próximos quatro anos


Neste momento, a EBC entra numa fase delicada, mas ao mesmo tempo oportuna, de reafirmar seu caráter público e republicano, ao aproximar-se do final do mandato da atual Diretora-Presidente. Nestes quase quatro anos de existência, a atual gestão da EBC promoveu avanços em alguns aspectos importantes, como investimentos no parque tecnológico de suas emissoras, com obras e reformas em suas instalações, e a melhoria e diversificação no conteúdo de suas programações – não só através de novos conteúdos de produção própria, mas também da produção independente –, além de dar os passos iniciais para a criação de uma Rede Nacional de TVs Públicas e garantir importantes ferramentas de governança e controle público, como as Audiências Públicas e o trabalho da Ouvidoria.

No entanto, há ainda um longo caminho a percorrer para que a EBC e seus veículos de comunicação (TV Brasil, Agência Brasil, 08 emissoras de rádios e Radioagência Nacional) se aproximem de fato dos objetivos e metas traçados no I Fórum Nacional de TVs Públicas, espaço que deu o pontapé inicial no processo de criação desta nova empresa pública de comunicação em nosso país. Entre eles, destacamos alguns que consideramos sejam estratégicos para orientar o novo período de gestão que se aproxima:

  1. A universalização do sinal da TV Brasil (e das emissoras de rádio da EBC), por meio de infraestrutura única e pública (Operador de Rede), compartilhada com os demais atores do campo público da comunicação;

  2. A construção de verdadeiras redes nacionais públicas de TV e de Rádio, com a EBC assumindo seu papel de espinha dorsal do sistema público, mas sempre dialogando com as demais emissoras públicas de TV e rádio, universitárias, educativas e culturais, de caráter federal, estadual ou municipal e com suas entidades representativas.;

  3. A Consolidação da Contribuição para o Fomento da Comunicação Pública como fonte contínua e não contigenciável de um fundo para a comunicação pública, que possa ser acessado por todos os veículos públicos mas também, e principalmente, pela própria EBC;

  4. A transição para as transmissões digitais de rádio e televisão, bem como o protagonismo no uso de ferramentas interativas digitais e de linguagem inovadora;

  5. O fortalecimento das ferramentas de governança e de controle público de gestão da EBC, em particular do Conselho Curador, das Audiências Públicas e da Ouvidoria, no sentido de garantir uma máxima participação da sociedade na definição das diretrizes de gestão, programação e investimentos nos veículos da EBC;

  6. O desenvolvimento de metodologia e mecanismos de aferição de audiência e qualidade da programação condizentes com os objetivos da comunicação pública.

  7. Uma gestão interna que seja cada vez mais democrática, republicana e colegiada, condizente com a missão institucional de comunicação pública da EBC;

  8. A presença cada vez maior de produção local na programação da TV Brasil nas praças onde exista geradora própria do canal;

  9. A valorização do corpo de concursados da empresa, através de políticas justas de salários e condições de trabalho adequadas.

  10. A efetivação de parcerias com a produção independente e com as emissoras regionais que possibilitem a diversificação e regionalização do conteúdo da programação.

Esses são alguns dos desafios que uma nova gestão da EBC terá que enfrentar. O atual processo de sucessão na Presidência da EBC pode ser uma oportunidade valiosa para a consolidação do caráter público e republicano da empresa. Nomes de possíveis candidatos à sucessão começam a ser ventilados na mídia, certamente profissionais com currículos qualificados e competência comprovada em suas áreas. Sabemos que a Lei 11.652/08, em seu artigo 19, determina que o Diretor-Presidente e o Diretor-Geral da EBC sejam nomeados diretamente pelo Presidente da República. Mas entendemos como fundamental que esse processo de indicação seja precedido de publicização do debate e do envolvimento da sociedade, em torno de ideias e projetos para o futuro da comunicação pública e da EBC, tomando como referência os objetivos estratégicos acima elencados. Um amplo debate no âmbito da sociedade civil e do Parlamento certamente irá contribuir ainda mais para consolidar o projeto da EBC em nossa sociedade.

17 de outubro de 2011

ACMUN – Associação Cultural de Mulheres Negras

AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras

AMNB – Articulação de Organizações de Mulheres Negras

AMARC – Associação Mundial de Rádios Comunitárias

ANDI – Comunicação e Direitos

ARPUB – Associação das Rádios Públicas do Brasil

Assessoria de Comunicação do Instituto Federal do Paraná

Associação Ilê Mulher/RS

CBC – Congresso Brasileiro de Cinema

CCLF – Centro de Cultura Luiz Freire/PE

Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

Centro de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos Padre Josimo – Imperatriz/MA

Cipó – Comunicação Interativa/BA

Ciranda – Central de Notícias dos Direitos da Infância e Adolescência/PR

CNC – Conselho Nacional de Cineclubes

Coletivo do Mandato da Vereadora Professora Josete (PT-Curitiba/PR)

Coletivo Soylocoporti

Comunidade Bahá'í do Brasil

COMULHER – Comunicação Mulher

CCM – Conselho Comunitário de Maricá/RJ

CUT – Central Única dos Trabalhadores

FALE RIO – Frente Ampla pela Liberdade de Expressão e pelo Direito à Comunicação – RJ

FAMMAR – Federação das Associações de Moradores de Maricá/RJ

Federação Pernambucana de Cineclubes – FEPEC

Fopecom – Fórum Pernambucano de Comunicação

Fórum de Comunicação Democrática do Sul Fluminense

Fórum Goiano de Mulheres

FRENAVATEC – Frente Nacional de Valorização das TVs do Campo Público

GAJOB – Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares

Griô Produções

Grupo Cactos, Gênero e Cidadania – Paulista/PE

Grupo Curumim/PE

Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás/PE

Grupo Feminista Autônomo "Oficina Mulher"/GO

IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

Instituto Patrícia Galvão – Mídia e Direitos

Instituto Telecom

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

MNDH – Movimento Nacional de Direitos Humanos

MPB – Movimento Música para Baixar

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

NPC – Núcleo Piratininga de Comunicação

ODDPM – Organização de Defesa dos povos e das Missões/RJ

ONG Sentinela Ambiental

Partido Comunista Revolucionário – PCR-Brasil

Pretas Candangas

Rede Mulher e Mídia

REDHMC – Rede Estadual de Direitos Humanos e Moderadores de Conflitos/RJ

SINDEPPERJ – Sindicato dos Empregados em Previdência Complementar Privada do RJ

Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal

Sindicato dos Jornalistas do Estado do Rio de Janeiro

 

 

 

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