Mercado de TV a cabo gera disputa no Congresso

É uma briga de cachorro grande. De um lado, empresas de telefonia de olho no lucrativo mercado da TV por assinatura, no qual querem entrar. De outro, as empresas que já exploram esse mercado dispostas a lutar para preservar seu nicho. Em torno dessa briga, o lobby mais uma vez se faz presente no Congresso.
 
Circula pela Câmara um recurso solicitando aos deputados que o Projeto de Lei 29/07 (que abre o mercado de TV por assinatura às empresas de telefonia) seja analisado no plenário da Casa antes de seguir ao Senado. O projeto foi aprovado em caráter terminativo na Comissão de Constituição e Justiça da  Câmara.

O autor da iniciativa, o deputado Régis de Oliveira (PSC-SP), não esconde de onde veio a inspiração para o recurso. Ele admite que foi procurado por representantes da empresa Sky, de TV a cabo, e pela Associação Brasileira de Programadores de Televisão por Assinatura (ABPTA) antes de apresentá-la.

O parlamentar paulista ressalta que não conhece, nem mantém qualquer tipo de contato com pessoas que atuam no mercado de TV paga. “Eles foram ao meu gabinete e perguntaram se eu apresentaria um recurso. Qual é o mal? É regimental. Não sei qual é a pressa de votar esse projeto”, afirma.

Interesses comerciais

Régis, de qualquer maneira, avalia que seu recurso não terá as assinaturas suficientes para forçar a apreciação da matéria em plenário. Ou seja, o projeto deve mesmo seguir na próxima semana para análise dos senadores. “Vão pedir aos deputados que assinaram para que desistam”, avalia.

A história ilustra, no entanto, os interesses comerciais que estão por trás do projeto. Relator do PL 29 na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, o deputado Paulo Henrique Lustosa (PMDB-CE) classifica a tentativa de recurso como “uma clara manobra protelatória”. “Temos dez medidas provisórias e o plenário não está conseguindo votar. Todo mundo sabe que qualquer matéria que vier para o plenário, se não tiver urgência ou acordo, está condenada a só ser votada no fim do ano ou na próxima legislatura”, explica o deputado cearense, ressaltando que o recurso é legítimo. “Não tem nada de irregular”.

Para o congressista cearense, o receio de que novas empresas “com recursos e capacidade de investimento” atuem no mercado de TV por assinatura explicam o pedido. “Se você olhar os números hoje, a Sky é uma das empresas que mais tem crescido no número de assinantes. E eu acho que ela vê o projeto como uma ameaça em relação ao seu crescimento e à sua participação no mercado.”
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De acordo com a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o mercado brasileiro de TV por assinatura alcançou 7,9 milhões de clientes em março de 2010.

O Congresso em Foco entrou em contato com a assessoria da Sky e com a ABPTA, mas não obteve resposta. O site está aberto para eventuais esclarecimentos.   

Telefone, internet banda larga e TV por assinatura

Os serviços descritos acima, e oferecidos em forma de pacote, estão no cerne da disputa entre as empresas de telefonia e as de TV por assinatura. Hoje, oficialmente só as televisões pagas poderiam oferecer o trio de serviços. Mas, na prática, a via já é mão de dupla. O que o projeto visa é exatamente regulamentar essa situação.

“A tendência do consumidor em querer esses serviços combinados levou as empresas a conseguirem, nos meandros da legislação, oferecer esses serviços. E hoje, nas principais cidades do país, nos principais mercados, todo mundo tem acesso a uma variedade de serviços combinados de voz, de televisão por assinatura e de internet completamente à margem de qualquer regulamento”, explica Lustosa.

Por conta dessa falta de regulação, emenda o peemedebista, aqueles que eram contra o PL 29 no início (notadamente radiodifusores e alguns operadores de TV por assinatura), ficaram a favor. “É melhor um projeto que regulamente esse processo do que a absoluta falta de regra”, explica Lustosa.

Além da regulamentação e do aumento da concorrência, o deputado cearense avalia que a proposta vai forçar o mercado a modernizar as redes de transmissão no país de forma mais célere. “Com isso, as empresas vão contribuir com a meta do governo pela universalização da banda larga sem que tenha de haver um aporte de recursos públicos, principalmente nas áreas onde o mercado é mais demandante e tem mais recursos para pagar pelos serviços”.

Segundo Lustosa, as redes das empresas de telefonia já instaladas nos domicílios “são redes antigas, herdadas do período em que as empresas de telefonia eram públicas”.

Crítica

O PL 29 foi aprovado em caráter terminativo (sem a necessidade de ir a plenário) pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara na semana passada. Se pelo menos 51 deputados assinarem o recurso de Régis, a matéria ficará na Câmara. O texto aprovado no colegiado, e relatado pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tem outra polêmica: obriga a transmissão de, pelo menos, um canal religioso pelas TVs por assinatura.

Contudo, o recurso de Regis não partiu apenas por conta do pedido dos que atuam no mercado de TV fechada. Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo entre os anos de1990 a 1993 e uma das referências jurídicas na Câmara, Régis de Oliveira critica o Artigo 6º do PL 29.

Pelo artigo, as prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo não poderão, por exemplo, contratar artistas nacionais para produzir conteúdo audiovisual para sua veiculação. “Isso é problemático e inconstitucional”, resume. “O mercado tem de ser livre. Eles que briguem e que disputem o mercado igualmente”, complementa.

Régis de Oliveira chegou a criticar a cota estabelecida para a produção audiovisual brasileira em canais internacionais (três horas semanais em horário nobre). Contudo, ele foi convencido de que a medida serve de estímulo para a produção brasileira.

“A cota é para filmes, documentários, minisséries. Para algo que gere empregos, que gere divisas”, afirma Lustosa.

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