Sobre o fim do diploma de jornalista

Inicialmente pequenas considerações sobre o órgão máximo do judiciário brasileiro cujos sábios ministros, com exceção de Marco Aurélio não conseguem diferenciar liberdade de expressão de jornalismo.

Não foi só o capitalismo que sobreveio à idade média. Essencialmente, veio depois a modernidade e com ela o tão aplaudido, idolatrado e intocável "Estado Democrático de Direito". É justamente dessa estrutura modelar que fazem parte as supremas cortes (parece monarquia), os parlamentos da democracia representativa (de quem?) e os novos monarcas ditos presidentes que reinam absolutos por quatro anos e depois por mais quatro sem que sua troca, no mais das vezes mude muita coisa.

Quando apensar de todos os anti-corpos do sistema, elege-se um Chaves, um Evo, um Correa, um Lugo, um Ortega, ouvimos logo a velha ladainha de que o Estado Democrático de Direito está ameaçado! Ora, se a legítima eleição desses representantes do povo e não das elites ameaça o Estado Democrático de Direito, é porque é hora desse tal Estado acabar. Mas – foi Marx quem disse – estamos todos impregnados da ideologia dominante e custamos às vezes a nos livrar de alguns conceitos. 

Sobre o diploma não acho que devamos cair na lamentação e sim olhar para esta nova realidade, analisá-la e planejar nossa ação diante dela. Vejamos algumas possibilidades. 

Os supermercados de diplomas

A absurda proliferação de cursos de jornalismo de péssima qualidade, que tratam o diploma como mercadoria e os estudantes como clientes, cuja política pedagógica é ditada pelo código do consumidor – pagou levou – tem produzido sucessivas gerações de técnicos em softwares de edição de texto e diagramação, sem qualquer conteúdo crítico. É o que as empresas querem.

Talvez com o fim da exigência de diploma a maioria dessas instituições comerciais de ensino feche de uma vez pois não terão mais "clientes" e restem aqueles cursos sérios que até hoje se mantém mesmo contra a maré. O fechamento dessa feira livre de diplomas – que não é privilégio de jornalistas – afirmo aqui: já virá tarde, é benéfica à sociedade, ao jornalismo e à democratização da comunicação.

Uma polêmica trabalhista

No campo trabalhista temos também interessantes possibilidades. Hoje quem exerce a profissão de jornalista com registro profissional tem direito a piso salarial e jornada de 5 horas. Quem não tem registro profissional não tem estes direitos ainda que exerça atividades típicas da profissão por força dos desvios dos donos da mídia. Tampouco são considerados da categoria dos jornalistas não sendo atingidos pelas convenções coletivas, tampouco tendo direito a se filiarem aos nossos sindicatos.

A decisão do STF acabou com a exigência do diploma de jornalismo para exercício da profissão de jornalista ao revogar um decreto (instrumento legislativo menor) que assim determinava. O STF não acabou com a exigência de registro profissional que é definida em lei e não no decreto atacado. Qual a implicação disto? O exercício da profissão de jornalista continua dando ao profissional o limte de 5 horas diárias de jornada e o piso salarial da categoria. Cito apenas esses dois direitos exclusivamente para fins de exemplificação, sem prejuízo de todos os outros. A nova situação vai colocar diante da Justiça do Trabalho uma interessante questão. Não poderá ser negado registro a pessoa que exerça atividades de jornalista ainda que não tenha diploma. Quem tiver registro será jornalista e, por conseqüência legal, terá direito às condições de trabalho estabelecidas por lei para o exercício da profissão. Esta situação pode formalizar uma legião de trabalhadores nas empresas de comunicação que tem sua força de trabalho explorada exercendo atividades típicas de jornalistas mas que até hoje não tinham a cobertura da lei que estabelece condições de trabalho desta categoria. Não tenhamos dúvidas de que o próximo passo do patronato será investir contra as condições legais de exercício da profissão como jornada de 5 horas e o piso salarial.

Uma nova situação sindical

A nova situação legal de exercício da profissão sem exigência do diploma coloca para o movimento sindical dos jornalistas a pauta urgente de unificação das categorias de trabalhadores da comunicação. Quanto à necessidade desta unidade orgânica, penso não haver dúvidas. A dificuldade impeditiva desta solução, para os jornalistas – existem outras – até agora era a estrutura dos nossos sindicatos forjada sobre a idéia de que jornalistas são só os diplomados com registro. Este fato, em que pesem todos os argumentos a favor do diploma, que também defendo, era um limitador da base na nossa estrutura sindical. Mais ou menos como o que exclui os desempregados, os sub-empregados, os informais, os escravos da estrutura sindical brasileira. Todos estes não tem espaço em nenhum sindicato brasileiro. Na Argentina, a Central dos Trabalhadores Argentinos – CTA, já nasceu com espaço para todas estas categorias. No Brasil ainda não chegamos a tanto.

Então, talvez a decisão do STF esteja trazendo, sem qualquer intenção obviamente, condições objetivas para um salto de qualidade em nossa organização.

Prefiro trabalhar com estas conjecturas que podem nos levar à frente do que cair na simples lamentação que não nos levará a nada. Para isso é preciso resgatarmos lá do fundo a verdadeira consciência de classe que já foi a marca de nossa profissão.

* Caio Teixeira é jornalista diplomado.

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