Na última semana, o ministro das comunicações, Hélio Costa, anunciou no 25 Congresso Brasileiro de Radiodifusão, realizado em Brasília, a abertura de uma consulta pública para discutir o padrão técnico a ser adotado para o sistema de rádio digital brasileiro. A decisão assegurou mais 180 dias para testes com outras tecnologias que não o HD Radio/IBOC, já avaliado pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert).
“Queremos discutir para buscar um consenso na escolha do padrão que envolva os radiodifusores, a indústria de equipamentos de transmissão e recepção e a população”, afirmou Costa, em entrevista a jornalistas no Congresso. Mais uma vez, o ministro utilizou o recurso do pânico para tentar justificar a urgência da decisão ainda este ano. “Se não tivermos uma decisão sobre o rádio digital este ano, estaremos levando as rádios a uma situação de insolvência", disse. Em 2007, o titular do Minicom repetia o mesmo argumento, mas a escolha não se concretizou.
Na prática, a decisão do ministério dá uma sobrevida ao DRM (Digital Radio Mondiale), padrão desenvolvido por um consórcio internacional e adotado na Europa, na Índia e na Rússia. Até então, ele era pouco ou nada considerado como opção pela quase inexistência de testes em solo brasileiro. Apenas a extinta Radiobrás (hoje EBC) e a UnB haviam realizado experiências com a tecnologia, mas sem conclusões divulgadas publicamente.
Desta vez, os promotores do DRM aportam no país com uma estratégia mais agressiva. Seus promotores conseguiram espaço importante em uma mesa sobre rádio digital no Congresso Brasileiro de Radiodifusão, quando debateram com representantes do HD Radio/IBOC as qualidades e defeitos de cada uma das tecnologias.
Na última sexta-feira (22), o Ministério das Comunicações promoveu encontro entre gestores públicos e autoridades com técnicos do consórcio responsável pelo DRM para apresentação do sistema. Até então, os diálogos e ações promocionais eram feitos exclusivamente pela Ibiquity, empresa detentora do padrão.
DRM x IBOC
No debate entre os representantes das duas tecnologias no Congresso Brasileiro de Radiodifusão, foram confrontados os pontos positivos e negativos de cada um dos padrões. John Schneider, gerente para a América Latina da Ibiquity, destacou duas vantagens principais de seu produto.
A primeira é o fato dele consegue transmitir no mesmo canal e na mesma banda (In Band On Channel, ou IBOC). Esta funcionalidade eximiria os radiodifusores de qualquer mudança de faixa de espectro, não demandaria receptores que necessitem ser adaptados a captar sinais de outra faixa e, principalmente, permitiria uma transição de acordo com o “ritmo” de cada estação.
“Ele é o único sistema que assegura transição harmoniosa para o rádio digital. A tecnologia é completamente compatível com as rádios existentes. Em algum futuro, quando povo tiver receptores digitais, pode se desligar”, argumentou Schneider.
A segunda é a suposta maturação do HD Radio. O gerente enfatizou que o padrão estadunidense é, entre os dois, o mais avançado em termos de desenvolvimento. “O DRM em AM está em fase de implantação e o em FM é um protótipo em fase de desenvolvimento. Já nós operamos nas faixas AM e FM desde 2002”, comparou. Schneider completou informando que o padrão é utilizado por duas mil estações e por um milhão de ouvintes.
Os representantes do DRM rebateram contra-argumentaram e relativizaram algumas das afirmações feitas pelo gerente da Ibiquity. Quanto à falta de maturação, anunciaram para até setembro deste ano o lançamento oficial do sistema DRM+, que abarca também os canais da faixa FM. Alex Zink explicou que a transmissão no mesmo canal e na mesma banda não é a única para que o ouvinte não perca a referência na sua estação.
Com a recepção digital, acrescentou, não haverá um dial linear, que vai de 88 MHz ao 108 Mhz. “Os ouvintes vão selecionar programa sem saber de onde vem, a freqüência perderá referência”, disse. Para as estações também não haveria dificuldades na transmissão, pois a alocação do sinal digital em um canal adjacente poderia ser ajustada no índice dos receptores para que o ouvinte recebesse ambos como se fosse o mesmo. “O DRM mantêm o mesmo equipamento e pode colocar no mesmo canal adjacente, que pode ser usado em outra banda acima ou abaixo do canal analógico. Para o receptor, eles surgem como o mesmo programa”, esclareceu.
Michel Penneroux, diretor do comitê comercial do DRM, também partiu para o ataque e destacou a diferença dos dois padrões quanto aos custos de implantação. Enquanto o DRM é um padrão aberto, enfatizou, o HD Radio/IBOC demanda o pagamento de royalties para o seu uso. “O DRM é um padrão aberto, pode ser acessado de graça. Um fabricante pode construir receptor ou o transmissor sem pagar nada, não precisa pagar royalties”, ressaltou. “O custo é único, no pagamento da licença embutido no custo do aparelho. Sem royalties para radiodifusores”, reforçou Alex Zink.
Segundo Penneroux, o DRM também possui desempenho na faixa AM, onde o HD Radio/IBOC possui problemas detectados inclusive nos testes realizados pela Abert. “As vezes as transmissões em AM experimentam problema na parte da noite. No DRM é fácil tornar o programa mais robusto neste horário. Isso é feito com reconfiguração dinâmicas, que ocorre sem interrupção”, contou.
Por fim, Zink e Penneroux destacaram o conjunto extenso de aplicações multimídia do DRM e a qualidade sonora do padrão, que usa o sistema 5.1. Surround. “É a mesma evolução de quando passou de mono para estéreo”, comparou Zink.
Radiodifusores mantém opção
Mesmo com a visibilidade dada por Hélio Costa ao DRM, a direção da Abert mantém-se como firme defensora da adoção do HD Radio/IBOC. “Pelos testes que fizemos, não há padrão que atenda como o IBOC a demanda dos radiodifusores para a transmissão na mesma faixa e na mesma freqüência”, afirma o assessor técnico da entidade, Ronald Barbosa.
Embora reconheça que o padrão estadunidense ainda patina na transmissão em AM, Barbosa acredita que não há outro caminho a não ser adotar o IBOC e acompanhar o desenvolvimento desta tecnologia nessa faixa. Ele é cético quanto à possibilidade de resultados efetivos de testes com outros padrões no prazo estipulado pelo Minicom. “Para adotar outro padrão, teríamos de realizar novos testes, o que levaria uns dois anos”, prevê.
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