Oi conclui compra da BrT e nova empresa nasce sob desconfiança

Na última quinta-feira, a Oi concluiu a aquisição das ações da Brasil Telecom, pagando R$ 5,37 bilhões correspondentes ao valor inicialmente acertado de R$ 5,86 bilhões corrigido pela variação da taxa média do Certificado de Depósito Interbancário (CDI), deduzida uma dívida que a BrT possuía junto à Invitel no valor de R$ 998 milhões. A nova empresa manterá o nome Oi e a unificação das duas estruturas deverá ocorrer em até 60 dias.

Como ao longo do processo de negociação e da mudança do novo Plano Geral de Outorgas (PGO), que permitiu a criação da nova tele, a finalização da compra foi marcada por intensos questionamentos. A aprovação da anuência prévia pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) foi ameaçada por uma medida cautelar expedida pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no dia da reunião do Conselho Diretor marcada para este fim, em 17 de dezembro.

A decisão alegava falta de “transparência do processo de anuência prévia, especialmente no que diz respeito à falta de submissão ao escrutínio público das contrapartidas ou condicionantes a serem exigidos”. Apenas após uma forte pressão do governo federal, que contou inclusive com uma visita do ministro das Comunicações, Hélio Costa, ao ministro do TCU autor da medida, Raimundo Carreiro, a medida cautelar foi suspensa, permitindo a aprovação da anuência da agência na madrugada do dia 18. Apesar de ter cedido em relação à ação, o TCU continua investigando a Anatel por sua atuação no processo.

O comportamento da Anatel, altamente alinhado aos interesses dos envolvidos no negócio, também foi alvo de questionamentos do Ministério Público Federal, tanto por ações movidas a partir de denúncias de sindicatos e outras entidades, como por meio de um pedido de esclarecimentos e vistas de documentos do procurador Paulo José da Rocha Júnior. “Muito embora se deva elogiar a busca da eficiência no serviço público, não se pode permitir que a velocidade desejável na administração venha a custo da inversão de valores, privilegiando o interesse privado em notório prejuízo ao interesse público”, argumenta o procurador na ação.

Segundo Joaquim Alves de Castro, presidente da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel), a votação da anuência foi mais um caso explícito desta inversão de valores. A tensão que tomou conta da reunião do Conselho Diretor foi motivada, diz o sindicalista, pela necessidade de garantir a permissão do negócio ainda antes de 21 de dezembro. Este era o prazo estipulado pelas operadoras para realização efetiva da compra, e seu descumprimento implicaria em multa de R$ 500 milhões a ser paga pela Oi à BrT.

Em entrevista à mídia especializada, o conselheiro Antônio Bedran afirmou no dia 19 que a ata da reunião de aprovação da anuência publicada naquele dia serviria para impedir o pagamento da multa, evidenciando a preocupação apontada por Joaquim Castro. Na opinião da Fittel, todo o processo foi “açodado e mal conduzido”, tendo desmantelado o PGO de maneira casuística para permitir a compra sem regular a concorrência, o que só será feito por meio das medidas previstas no Plano Geral de Atualização da Regulamentação em Telecomunicações (PGR), que deveria ter sido revisto em conjunto com o primeiro plano.

Riscos e incertezas

Se, por um lado, sobram críticas à fusão, por outro faltam garantias sobre os benefícios anunciados pelos envolvidos e pelo principal patrocinador do negócio, o governo federal. Para o coordenador do Laboratório de Políticas de Comunicação a UnB, Murilo Ramos, dificilmente haverá conseqüências benéficas ao cidadão. “Para o consumidor, eu vejo poucas. Não acho que esta empresa, que operará em regime de duopólio na telefonia fixa com a Telefônica, vá beneficiar a sociedade em matéria de oferta de serviços e em matéria de preços e tarifas”, analisa Ramos.

A redução de tarifas decorrente do ganho de escala da nova empresa é previsão ainda nebulosa entre os anúncios feitos pelo novo presidente da tele, Luiz Eduardo Falco, em coletiva dada à imprensa na última sexta-feira (9). Segundo Falco, ela deve ocorrer apenas na telefonia móvel na região da Brasil Telecom e em algumas outras áreas, por conta do condicionante estipulado pela Anatel de manutenção dos menores preços praticados entre os serviços oferecidos pelas duas operadoras. “Vamos equacionar a minutagem, com a tarifa mais baixa”, confirmou.

Para Joaquim Castro, da Fittel, apesar da nova empresa ter maiores condições de reduzir os preços pela diminuição de custos e extinção das taxas de interconexão (a tarifa paga pela Oi à Brasil Telecom, ou vice -versa, para que a ligação de um cliente de uma chegasse a um usuário da outra), a redução não deve ocorrer. “Tenho certeza que não vai baratear. Estes cortes de despesas ficarão todos como bônus para a nova operadora”, prevê o sindicalista.

Supertele nacional?

Outro argumento propalado para justificar a compra foi a necessidade de criar uma “supertele” nacional com condições de disputar com as gigantes internacionais no mercado interno (a Telefónica de España e a Telmex) e externo. Com a compra, a nova Oi terá 53 milhões de clientes, sendo 22 milhões na telefonia fixa, 27 milhões na telefonia móvel, 3,7 milhões na banda larga e 60 mil na TV por Assinatura.

Sua cobertura alcançará 4,8 mil municípios e faturamento de R$ 29,3 bilhões. Se levada em conta a divisão do mercado de telecomunicações no país, a Oi passará a Telefônica, que arrecada R$ 28,7 bilhões ao ano. Segundo a própria Oi, o grupo Telmex arrecada no Brasil uma receita de US$ 20,5 bilhões.

Durante a coletiva, Luiz Eduardo Falco anunciou plano de chegar a 110 milhões de clientes entrando em mercados como América Latina e África. No entanto, para Murilo Ramos, ver a Oi como supertele nacional, com possibilidades de inserção global, é um equívoco. "Ela é uma grande empresa de telecomunicações, hoje de capital nacional. E isto pode ser circunstancial, a depender das oportunidades com as quais os acionistas se deparem”, afirma. Na opinião do professor, esta noção foi um argumento para legitimar o negócio junto à opinião pública.

Para Diogo Moyses, integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, a proibição feita no novo PGO impede apenas uma aquisição pela Embratel ou pela Telefônica. Não há obstáculos para que outras gigantes do setor de telecomunicações adquiram a nova Oi. “Assim como a Oi se moveu pela lógica da capitalização e ganho de escala para comprar a Brasil Telecom, um grupo de outro país pode fazer o mesmo e adquirir a nova Oi fazendo uma oferta atraente aos acionistas”, lembra Moyses.

Concentração de mercado

Se não será uma supertele nacional de fato, a nova Oi terá grande importância no mercado de telecomunicações, especialmente na telefonia fixa, uma vez que a nova empresa operará este tipo de serviço em 26 estados. A exceção é São Paulo.

A preocupação com a concentração de mercado foi destacada no voto do conselheiro-diretor Plínio de Aguiar Júnior, o único contrário à anuência prévia da Anatel. “Sem que haja fortes condicionamentos que propiciem imediata abertura da infra-estrutura de acesso local à competição, o futuro das telecomunicações brasileiras fica comprometido, em especial o desenvolvimento da banda larga e, conseqüentemente, da inclusão digital, caso um mesmo grupo econômico explore as concessões nas duas regiões”, alertou Aguiar Júnior em seu voto.

Para autorizar a fusão, a Anatel apresentou 15 condicionantes a serem cumpridos pela nova operadora. Entre as obrigações, estão a disponibilização de todas as ofertas existentes na área da Oi também na região da Brasil Telecom, bem como a equalização dos serviços pelo preço mais baixo praticado entre as duas. A nova empresa deverá prover serviço de banda larga nos 1.080 municípios na região da Oi, bem como nas 126 cidades abaixo de 25 mil habitantes da área da Brasil Telecom. Em 300 municípios com 50 mil habitantes, deverão ser instaladas redes de fibra ótica.

Joaquim Castro vê estas obrigações como “genéricas” e pouco efetivas para impedir a concentração de mercado. Para a ex-integrante do Conselho Consultivo da Anatel e advogada do Instituto ProTeste, Flávia Lefévre, a compra é prejudicial à concorrência no setor e terá efeitos na universalização dos serviços de telecomunicações. “Elas [a Brasil Telecom e a Oi] já concentram não só o serviço de telefonia fixa, mas também o serviço de comunicação de dados que o pessoal chama de banda larga. Esse cenário não tem perspectiva de melhorar com os condicionantes apresentados”, lamenta.

Precarização das relações de trabalho

A Fittel vê como um dos maiores riscos da compra a redução dos 15 mil empregos até então mantidos pela Oi e pela Brasil Telecom. A Anatel aprovou como condicionante a manutenção destes postos de trabalho. No entanto, segundo o presidente da federação, tal obrigação não deverá proteger os empregados de um processo intenso de precarização das relações de trabalho.

“A Anatel garantiu a manutenção dos postos de trabalho, o que é diferente de empregos. A nova Oi pode até garantir os 15 mil postos de trabalho, mas não os empregos, porque eles podem demitir todo mundo e diminuir os custos com pessoal. Podem até ampliar os postos de trabalho terceirizando, mas isso irá precarizar a relações de trabalho”, denuncia.

A preocupação dos sindicalistas têm razão de ser. Em sua entrevista, Luiz Eduardo Falco já anunciou que haverá mudanças na área de pessoal. “Vamos manter os empregos, como estabelecemos no acordo de compra e conforme a Anatel determinou para conceder a Anuência Prévia, mas é claro que haverá ajustes porque há uma fusão. Mas somos os maiores empregadores do país e vamos continuar com esta marca”, disse.

Novos questionamentos

As críticas ao mérito da compra e quanto aos riscos que esta traz ao setor daqui para frente devem ensejar novos questionamentos. O deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP) está se movimentando para angariar apoio a um projeto de sua autoria (PDC 1145/08) que susta o plano. O deputado foi o principal articulador da resistência no Congresso, mas encontrou pouco apoio até agora. Sem críticas na oposição e com forte apoio na base governista, dificilmente a fusão será questionada pelo Parlamento.

Resta então o Judiciário. Alvo de várias ações e medidas movidas quando da discussão sobre o PGO e da aprovação da anuência prévia, a Justiça deve receber novos questionamentos sobre o negócio. A Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp) anunciou que pretende acionar este poder para reverter a fusão. “A da Oi-BrT foi a mais rápida da história, apenas 27 dias. Há exemplos que tomaram 3 mil dias, mas a média são 200 dias. O fato de ter sido tão mais depressa indica diferenciação e uma agência deve agir com transparência”, justifica Luiz Cuza, dirigente da associação.

* Com informações do TeleTime News, Convergência Digital e Telecom Online.

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