Equador realiza auditoria das concessões de rádio e TV

Enquanto, no Brasil, o sistema de outorgas de radiodifusão é marcado pela falta de transparência, ilegalidades e por abusos recorrentes, no Equador o governo federal decidiu realizar uma auditoria para detectar irregularidades e avaliar se as licenças concedidas entre os anos de 1995 e 2008 se adequam à nova Constituição do país. O texto constitucional estabelece que as adaptações dos contratos aos novos preceitos legais sejam feitas num prazo de dois anos.

A auditoria, iniciada no final de dezembro de 2008, está sendo realizada por uma comissão formada por especialistas equatorianos e de outros países da América Latina, nomeada por um decreto publicado em novembro pelo presidente Rafael Correa. O texto do decreto determina que a auditoria estará voltada para “determinar a constitucionalidade, legitimidade e transparência das concessões, considerando os enfoques legal, financeiro, social e comunicacional”.

Entre os princípios e diretrizes aprovados na nova Constituição equatoriana está a proibição a monopólios e oligopólios diretos e indiretos nos meios de comunicação, o impedimento de que entidades ou grupos financeiros, bem como seus representantes legais, membros da diretoria e acionistas, tenham participação no controle de capital, investimento ou patrimônio dos meios de comunicação social.

A comissão é composta por 14 membros, sendo 10 nacionais (equatorianos) e 4 estrangeiros. Entre os estrangeiros, foi indicado o membro da coordenação executiva do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, João Brant, por conta do trabalho do grupo sobre o tema de concessões de rádio e TV. Além dele, participam Gustavo Gómez e Aleida Callejas, da diretoria da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) e José Ignácio Lopez Vigil, jornalista cubano radicado no Peru.

Exemplo

Para João Brant, a iniciativa do governo equatoriano deve servir de exemplo ao Brasil como ação de combate às irregularidades e abuso no uso das concessões. A auditoria também pode ser um mecanismo de garantia de transparência neste tipo de concessão de serviço público.

“A atitude do governo equatoriano deve servir de exemplo para o Brasil. Aqui, desde o governo Figueiredo tem-se notícia das irregularidades na distribuição e uso das concessões, mas nunca houve uma averiguação apropriada”, afirma Brant. “No começo do governo Sarney, Antonio Carlos Magalhães, assumindo o ministério, prometeu que faria uma auditoria. Não só não fez, como acabou repetindo de maneira amplificada os processos irregulares do governo anterior.”

Em novembro de 2008, um dossiê preparado por entidades da sociedade civil foi apresentado durante audiência pública na Câmara dos Deputados sobre a renovação das outorgas de rádio e TV vencidas em 2007. O levantamento revelou várias violações de direitos humanos, descumprimentos dos princípios constitucionais e desrespeitos à legislação da área de radiodifusão. O documento foi entregue à Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara, ao Ministério das Comunicações, ao Tribunal de Contas da União e às associações de radiodifusores [ver aqui].

Trabalho autônomo

Na avaliação de João Brant, a comissão deverá ter uma relação de independência com o governo equatoriano para realizar a auditoria. “Os primeiros sinais do governo foram de respeito à autonomia da comissão. Eles sabem que um trabalho desse só tem sentido se for feito de maneira séria e objetiva”, conta o representante do Intervozes.

Na primeira reunião, realizada ainda em dezembro do ano passado em Quito, os membros elegeram o pesquisador Guillermo Navarro para presidi-la, tendo como vice Valeria Betancourt, da Associação para o Progresso das Comunicações (APC), e como secretário Sammy de la Torre. Além disso, foram definidos princípios éticos para o trabalho da comissão, baseados em nove pontos:

  1. Objetividade, entendida como o apego estrito às evidências, que devem ser adequadamente apreciadas;
  2. Imparcialidade e não discriminacão, ou seja, sem simpatia ou antipatia por nenhuma parte;
  3. Honestidade intelectual, impermeável a estímulos positivos ou negativos propostos pelos grupos de poder, com a obrigação de denunciá-los no interior da comissão;
  4. Independência de critério, livre de pressões do poder político;
  5. Transparência na definição e na aplicação dos procedimentos aprovados para a auditoria;
  6. Diligência, a fim de assegurar a entrega do relatório final da auditoria na oportunidade e com a qualidade necessária para que o governo nacional possa tomar as decisões necessárias;
  7. Confidencialidade, entendida como a obrigação de não antecipar critérios nem proporcionar a informação obtida na pesquisa nem os resultados preliminares;
  8. Respeito às resoluções da comissão, inclusive se o participante tiver se manifestado em contrário no momento de discuti-las e aprová-las;
  9. Abertura a todas a opiniões e alegações dos atores sociais.

Alguns dos especialistas nacionais foram contratados para trabalhar em tempo integral na análise de toda a documentação. A comissão vai reunir todos os membros a cada quinze dias até 19 de maio, quando deverá entregar o seu relatório ao presidente Rafael Correa.

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