Política cultural de Gil será mantida com Juca Ferreira

A notícia da saída do ministro Gilberto Gil do Ministério da Cultura, anunciada nesta quarta-feira (30/7), foi recebida com tristeza por grande parte dos integrantes do campo cultural. A decisão de Gil gerou preocupação com o destino da pasta, que poderia perder a sustentação que a figura pública do cantor garantia, mas o Presidente da República indicou que a política deverá ser mantida e que o escolhido para dar continuidade ao projeto será o ex secretário-executivo do órgão e atual ministro interino, Juca Ferreira.

A entrada de Gilberto Gil no primeiro governo Lula foi cercada de descrédito. Seu êxito na carreira artística não era acompanhado pela sua experiência como gestor público. No entanto, sob seu comando a equipe do MinC surpreendeu e protagonizou alguns dos episódios mais ousados do governo.

Em casos como o da proposta de criação de uma Agência Nacional do Audiovisual (Ancinav) para regular e fomentar a atividade a partir da taxação de exibidores de cinema e da radiodifusão privada, a afronta ao status quo foi tamanha que a iniciativa foi abatida sem sequer ter sido enviado ao Congresso.

Na sua gestão, o ministério também tomou medidas de regionalização da destinação das verbas de fomento. Mesmo sob críticas, o MinC conseguiu alterar o desequilíbrio favorável ao eixo Rio-São Paulo na aplicação de verbas para produção cultural.

Por estas e por outras ações é que o pedido de demissão de Gilberto Gil para se dedicar exclusivamente à sua carreira foi saudado com lamentos. “Vamos sentir falta dele. Gil trabalhou para a construção de uma identidade nacional feita com as diferenças. Ele soube buscar recursos, mediar os interesses dos autores e realizadores”, diz Paulo Rufino, presidente do Congresso Brasileiro de Cinema.

“A saída do ministro só nos entristece. A presença pública do Gil na sociedade brasileira com sua contribuição cultural é imensa e sua presença no governo era emblemática”, avalia o deputado Ângelo Vanhoni (PT-PR), que tem atuação voltada ao tema na Comissão de Educação e Cultura da Câmara. A preocupação agora, aponta Vanhoni, é com a manutenção das ações que já estavam estabelecidas e com a implantação daquelas que estão em discussão.

No primeiro caso, estão os Pontos de Cultura, programa que vem tendo boa aceitação por destinar infra-estrutura de produção e distribuição a coletivos de todo o país para que estes possam potencializar as manifestações culturais dentro das comunidades. No segundo caso, figuram principalmente projetos como o Mais Cultura, megaprograma que reúne várias ações da pasta lançado com a promessa de investir R$ 4,5 bilhões até 2010, e a proposta de revisão do sistema de financiamento calcado nas leis de incentivo (Lei Rouanet e Lei do Audiovisual).

A questão dos recursos esteve nas recentes críticas proferidas ao Ministério da Cultura, acusado de executar pouco seu já pequeno orçamento. Órgãos de imprensa e a oposição vinham ligando o fato à ausência do titular da pasta, que, além de férias, licenciou-se duas vezes para atender seus compromissos de músico fora da capital federal e, em alguns casos, do país. No segundo semestre, o ex-ministro tiraria novo período para uma nova turnê, o que poderia abrir ainda mais o flanco para questionamentos.

Além do desgaste específico da figura de Gilberto Gil para o público em geral, uma vez que no setor ele gozava de ampla aceitação, temia-se que o ataque ao MinC atingisse a principal meta da política da pasta para o próximo período: reorganizar o sistema de financiamento da cultura a partir da aprovação da Emenda Constitucional que obriga a destinação de 2% do Orçamento Geral da União para a área. A medida seria um salto qualitativo importante para um dos endereços mais desprestigiados financeiramente da Esplanada dos Ministérios. O MinC conta, hoje, com recursos na casa de apenas 0,6% do Produto Interno Bruto. “A aprovação da emenda significaria só para orçamento federal acréscimo de R$ 2 bilhões”, apóia Ângelo Vanhoni.

Juca no comando

Para manter o projeto e ampliar o espaço institucional da cultura, a escolha do presidente Luis Inácio Lula da Silva foi declarar ministro-interino o secretário-executivo de Gil, Juca Ferreira, sinalizando a futura efetivação no cargo. “O presidente Lula quer a continuidade deste trabalho porque acredita nas políticas públicas conduzidas pelo Ministério da Cultura”, disse Ferreira em entrevista dada ao jornal Correio da Bahia.

O número dois de Gil já vinha se comportando como mais do que um braço direito. Com a reeleição de Lula, Gil renovou sua estada na esplanada sob a condição de que pudesse ter mais liberdade para conciliar demandas de sua carreira artística. Com o aval de Lula, o ministro veio delegando responsabilidades cada vez maiores a Ferreira.

“Juca Ferreira está preparadíssimo para exercer o cargo da ministro, mas ele precisa dos instrumentos indispensáveis ao desenvolvimento da cultura brasileira. O problema é mais de verba do que de verbo”, defendeu o presidente da Academia Brasileira de Letras, Cícero Sandroni, fazendo referência ao desafio do aumento de recursos para a área. “Acho que secretário Juca Ferreira está preparado para conduzir o ministério. Conhece todas as políticas que estão sendo desenvolvidas e é um nome com todas as credenciais para dar continuidade ao atual trabalho do ministério”, endossa o deputado Ângelo Vanhoni.

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