Após uma década, um mercado em plena revolução

Sem a presença do seu principal mentor – o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, que morreu em abril de 1998 – o governo Fernando Henrique Cardoso promovia no dia 29 de julho de 1998, a privatização do Sistema Telebrás na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. O governo arrecadou R$ 22,058 bilhões, um ágio de 63,7% sobre o preço mínimo estipulado. Entre erros e acertos, a área de telefonia foi remodelada no país. Completada uma década do negócio, o setor de Telecom passa por um momento crucial no país e no mundo.

A evolução tecnológica impôs e impõe mudanças significativas. A cadeia produtiva está sendo redesenhada. Gigantes de outrora, hoje, lutam para sobreviver. A consolidação de players é fato mundial. No Brasil, a convergência colocou dois grandes titãs frente a frente: Telecomunicações e Radiodifusão. Conciliar os interesses não está sendo tarefa simples, principalmente, quando se leva em conta o direito do consumidor: A oferta de serviços com qualidade e preço justo.

Há 10 anos, o Brasil vivia um momento peculiar. Ter um telefone fixo era fato a ser registrado no Imposto de Renda. O Sistema Telebrás, que monopolizava o atendimento na área, tinha profissionais extremamente qualificados – tanto que a maior parte, logo, se transferiu para a iniciativa privada – mas sofria com a falta de recursos públicos. Ao assumir o comando do país, em 1994, o presidente Fernando Henrique Cardoso nomeou para o ministério das Comunicações, um dos seus principais aliados: Sérgio Motta. Ele foi um "trator".

Enfrentou as críticas pesadas – boa parte da oposição resistia à privatização – mas manteve o ritmo e desenhou o modelo de privatização: Telefonia fixa com operadoras-espelho para concorrerem diretamente e as móveis, divididas por áreas no país. Foi na segunda gestão de FHC que aconteceu a venda do sistema. Muitos acreditavam até que o presidente Fernando Henrique desistiria do  projeto após a morte seu líder, mas o governo foi em frente e optou pela realização do leilão.

Na telefonia fixa foi vendido o controle de três holdings de telefonia fixa, uma de longa distância e a maior do Brasil até então – a Embratel – e oito de telefonia celular. Acontecia a maior privatização do país. a Telesp foi comprada pela espanhola Telefónica, a Embratel, pela então titã norte-americana, MCI.

As duas outras concessionárias, numa prova que o dito popular, quase sempre tem razão, tiveram um processo de aquisição turbulento e não à toa estiveram no centro das atenções, e não apenas pelas ações de telecom, mas pelas brigas entre os seus acionistas.

A Tele Centro Sul, transformada em Brasil Telecom, foi arrematada pelos fundos de pensão, Banco Opportunity e Telecom Italia. Já a Tele Norte Leste, que virou Telemar, foi comprada pelo grupo AG Telecom, com forte participação do BNDES. Foi uma privatização complexa e ao longo destes anos, marcada por muita polêmica.

Certo ou não, agora, é a fusão dessas duas empresas: Brasil Telecom e Telemar ( que virou Oi) que causa tantas transformações e mutações no cenário. Para que ela ocorra é preciso alterar a Lei Geral de Telecomunicações, promulgada em junho de 1997. Sem essa mudança, não há como o negócio acontecer.

Na telefonia fixa, dois fatos também ficaram marcantes: A norte-americana MCI, uma titã do setor, foi 'engolida" pelos escãndalos de corrupção financeira e, simplesmente, quebrou. A Embratel perdeu o rumo e, depois até de uma tentativa frustrada de as outras concessionárias do país – Brasil Telecom, Telemar e Telefônica – de comprarem seu controle, foi parar nas mãos do grupo mexicano Telmex, do megaempresário Carlos Slim.

A empresa-concorrente, a Intelig, também sofreu com a briga dos seus acionistas – a inglesa National Grid, a Sprint e a France Telecom. Com o estouro da bolha da Internet em 2001, o dinheiro ficou curto e a Intelig passou a sofrer com a falta de investidores. Atualmente, extra-oficialmente, porque a sua compra não foi ainda ratificada, está sob o controle do grupo do empresário brasileiro Nelson Tanure.

Ainda na telefonia fixa, o modelo das espelhos também não vingou. Talvez tenha sido o maior erro do processo de privatização. A Vésper, que surgiu como concorrente da Telefónica e da Telemar, não conseguiu marcar presença e sucumbiu a falta de infra-estrutura para competir com uma operadora já com rede e clientes estabelecidos, além é, claro, de ter optado, à época, por uma tecnologia em desenvolvimento: O CDMA, da telefonia móvel, para a oferta de serviços fixos. A aposta foi alta e a "banca não pagou". A única espelho que sobreviveu e, com louvor, apesar dos percalços no sue caminho foi a GVT, concorrente da Brasil Telecom, mas ainda com presença pequena no market share nacional.

Investimentos bilionários e muito por fazer

Nesses 10 anos, segundo a Associação Brasileira de Telecomunicações, no período de 1997 a 2007, as operadoras de serviços de telecom fizeram, em conjunto, um investimento de R$ 148,5 bilhões, sendo que o ano de 2001 – quando as operadoras anteciparam as metas para poderem atuar em outras áreas do país – o investimento foi de R$ 24,2 bilhões, o maior já feito, de acordo com a Telebrasil, por um único setor da economia no Brasil. As operadoras também aplicaram R$ 34,6 bilhões na compra de outorgas para a prestação de novos serviços.

O ex-ministro das Comunicações, Juarez Quadros do Nascimento, que participou diretamente do desenho do modelo de privatização do país, não hesita ao afirmar que os 10 anos da privatização do setor de telecomunicações no Brasil serão um marco para um novo tempo.

Ele destaca que é inquestionável observar o sucesso do modelo no serviço de telefonia de longa distância e no serviço celular, mesmo que, ressalta, 80% dos celulares sejam pré-pagos (praticamente só recebem ligações) e que 40% dos municípios brasileiros ainda não tenham acesso ao serviço. Mas, observa o ex-ministro, há uma ampla competição, com acentuado crescimento do atendimento da demanda pelos serviços.

Na visão de Quadros, o ponto crítico da privatização é O serviço telefônico local. Ele observa que mesmo com 100% dos municípios brasileiros sendo atendidos, "os preços do serviço – incluída nesta conta a pesada carga tributária de 34% – inibem o seu uso, fazendo com que, a partir de 2002, haja decréscimo da quantidade de telefones em serviço".

Para o ex-ministro das Comunicações, hoje, consultor do setor, o Brasil precisa zelar pela competição no serviço telefônico fixo local, reduzir preços e tributos na sua exploração, em vez de experimentar aumentos periodicamente. Falta atendimento de serviços de telecomunicações para famílias com baixo poder aquisitivo e para a população localizada em área rural, como é feito mundialmente.

Quadros vai além. Ele lamenta que não haja vontade política para utilizar os recursos do Fust – Fundo de Universalização das Telecomunicações, recolhido das operadoras, que totalizam mais de R$ 5 bilhões, destinados, hoje, para os cofres do Tesouro Nacional, sem que nenhum de seus programas tenha sido implementado.

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