Conselho Consultivo pede explicações sobre troca de metas

Há cerca de duas semanas o Instituto Pro Teste denunciou que o termo aditivo aos contratos de concessão das empresas de telefonia fixa, celebrado em 7 de abril de 2008, continha um grave problema: a troca nas metas de universalização de pontos de acesso a serviços de telefonia fixa (PSTs) por redes de conexão à Internet (backhauls) seria ilegal.

Na argumentação da entidade, os backhauls não podem ser considerados da mesma natureza jurídica da telefonia fixa, sendo inaceitável do ponto de vista legal que os primeiros sejam incorporados aos contratos de concessão que tratam de Serviço de Telefonia Fixa Comutada (STFC). A denúncia, que já havia sido divulgada na mídia especializada (ver aqui), foi apresentada nesta sexta-feira (29) na reunião do Conselho Consultivo da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) pela representante do Instituto, Flavia Lefevre.

 

O documento, assinado por um conjunto de entidades que compõe a Frente de Consumidores de Telecomunicações, cobra explicações da Anatel e do governo federal sobre o fato. O manifesto defende que o backhaul não é  um suporte para o Sistema de Telefonia Fixa Comutada – STFC, mas “trata-se de infra-estrutura de rede para suporte de transmissão de dados”.

 

Outro ponto central do texto, e que motivou a maior parte da discussão, foi o questionamento sobre a retirada da cláusula da versão final do aditivo que explicitava a reversibilidade dos backhauls. Ou seja, em se tratando de um serviço de regime público, se ao final do contrato, em 2025, as empresas optarem pela não continuidade das operações elas teriam de reverter os equipamentos ao Estado. “A relevância da cláusula de reversibiliadde é indiscutível”, defendeu José Zunga, representante dos usuários pelo Instituto Observatório Social de Telecomunicações.

 

As respostas da Anatel foram dadas pelo assessor da presidência José Alexandre Bicalho. Ele reafirmou que na visão da Agência, os backhauls podem ser considerados da mesma natureza dos antigos PSTs. Por isso, não haveria necessidade de inserir uma cláusula sobre a reversibilidade uma vez que a legislação sobre telecomunicações já institui este procedimento para os serviços em regime público. “Rede do STFC já é reversível. Se concluiu que se ficássemos excetuando fragilizaria o documento”, explicou.

 

Bicalho também teve de responder críticas à falta de transparência no processo. Os conselheiros da sociedade civil cobraram o por quê da direção da Anatel não ter submetido a versão final ao Conselho Consultivo antes de aprová-la e ter negligenciado o acesso à  documentação do caso. “Se não houver canais de acesso à informação criam-se sempre dificuldades. Estabeleceu-se neste caso um problema que trouxe desconforto muito grande”, reclamou Israel Bayma, conselheiro pela Câmara dos Deputados.

 

O representante da Anatel fez um ‘mea-culpa’ e reconheceu o atropelo na aprovação do aditivo. “Tenho que em nome da Anatel me penitenciar por que esta nova minuta, mesmo não sendo exigência, poderia ter sido encaminhada ao Conselho. Mas tínhamos um processo em andamento, e havia também o acordo banda larga das escolas, e neste momento pode ter acontecido uma deficiência na trasparência”.

 

Aditivo em ‘xeque’

 

José Alexandre Bicalho alertou que o questionamento feito não teve como foco a transparência ou a cláusula de reversibilidade, mas o próprio aditivo em si, uma vez que apontava uma diferença jurídica entre os PSTs e os backhauls. Em tom ameaçador, criticou esta posição concluindo que ela colocaria em risco não só as novas metas de universalização como o conjunto de iniciativas para levar banda larga à população.

 

“Quando os backhauls são questionados, além de prejudicar não só o Plano Geral de Metas de Universalização e a conexão das escolas, isso traz riscos a um novo cenário de ampliação da banda larga”, sugeriu, indicando que o rompimento do aditivo teria impactos não só na troca dos PSTs como no acordo que gerou o programa Banda Larga nas Escolas e no novo ambiente cuja nova mudança de peso é a fusão da Brasil Telecom com a Oi.

 

Flávia Lefevre, entretanto, lembrou que a preocupação em levar banda larga à população não é só da Anatel ou do governo federal, mas de toda a sociedade. Ela enfatizou que, ao contrário do favorecimento dado às empresas de telecomunicação com o aditivo, a preocupação dos conselheiros da sociedade civil ali era que a organização do modelo de telecomunicações para beneficiar os cidadãos, e não apenas ampliar os lucros das operadoras.

Ao final, permaneceu a divergência entre a interpretação da advogada do Instituto Pro Teste e do assessor da Anatel. Para resolver a questão, o Conselho solicitou o parecer jurídico que embasou a opinião defendida pela Agência para avaliar sua posição diante da denúncia apresentada.

Embora o principal embate tenha ficado em torno da cláusula de reversibilidade, a preocupação de José Bicalho trouxe à tona a questão fundamental: se validada o questionamento jurídico do Instituto Pro Teste, inviabiliza-se legalmente todo o aditivo. Anatel e o governo federal não cogitam esta possibilidade, mas, como ainda não apresentaram argumentos para uma avaliação jurídica mais consistente, um dos pilares da reorganização das telecomunicações poderá voltar à estaca zero.

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