Parlamentares questionam fusão de empresas de telefonia

Sobraram argumentos e explicações, mas os representantes da Brasil Telecom e da Oi não escaparam de uma chuva de questionamentos dos deputados presentes à audiência realizada nesta quinta-feira (29) pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara para discutir a fusão das duas empresas.

Ari Joaquim da Silva, da Brasil Telecom, e Luiz Falco, presidente da Oi, defenderam a operação afirmando que a concentração no mercado de telecomunicações é uma tendência mundial. Silva citou o exemplo dos Estados Unidos, que teve seu sistema na forma de monopólio privado até 1984, quando o separou em empresas com cobertura regional (como no Brasil) e, em 1996, flexibilizou as restrições à concentração visando fortalecer suas operadoras do setor.

"O regulador percebeu naquele momento que precisava permitir a concentração para estimular a competição" , lembrou. A competição, neste caso e agora, segundo Silva, não é mais em âmbito nacional, mas internacional. "Existem os paises que foram atropelados e os que atropelaram durante o processo de convergência. A fusão aponta para a direção de que o Brasil quer atropelar", definiu Luiz Falco.

A visão de mercado das operadoras envolvidas na fusão não está mais restrita às fronteiras brasileiras e mira a disputa do mercado de toda a América Latina, hoje dividido entre a mexicana Telmex e a espanhola Telefonica. Se tomados todos os países do continente à exceção do Brasil, os dois grupos controlam 60% dos acessos fixos e 70% dos acessos móveis.

Para Falco, o ganho de competitividade do novo grupo será benéfico à população. "Quanto mais rápido a gente ganha, mais rápido repassamos os ganhos para o consumidor. Aumenta a qualidade, aumenta a lucratividade e diminui o preço cobrado ao consumidor", explicou.

Do monopólio privado ao público

Na avaliação do deputado Ivan Valente (PSOL-SP), a mudança do marco regulatório das telecomunicações para permitir a fusão pode piorar a concentração no setor. "Quem garante que não haverá um movimento em direção ao monopólio, seja com as empresas apenas dentro do Brasil seja com empresas estrangeiras", questionou. De acordo com o parlamentar paulista, a compra da Brasil Telecom pela Oi pode completar um movimento de mudança do antigo cenário de monopólio público para um novo momento de monopólio privado.

Valente atentou para o fato de que o movimento constante de concentração traz em si o risco de desnacionalização de setores estratégicos. Ele citou o caso da Vale do Rio Doce e da Ambev, companhias que se associaram a grandes grupos de outros países e perderam o comando de acionistas nacionais. "Qual é a participação do Estado?  Quais são as garantias de que isso permanecerá sob controle nacional e com participação do Estado nas decisões estratégicas?", indagou o parlamentar do PSOL.

O deputado Nelson Proença (PPS/RS) defendeu que o tema seja tratado como assunto estratégico de Estado. "Esse negócio é um negócio público. Primeiro porque são empresas detentoras de concessões públicas, segundo porque o BNDES, que é um banco público, participa ativamente desse processo, assim como os fundos de pensão". Luiz Falco discordou do parlamentar afirmando que a fusão é privada. "É claro que dado as características do regime de concessões públicas, envolvimento de atores públicos, dá uma dimensão assim. Mas é um negócio essencialmente privado", disse.

Júlio Semeghini (PSDB-SP) também defendeu a importância de utilizar a fusão para garantir alguns avanços necessários na organização do setor de telecomunicações, como o compartilhamento de redes para aumentar a competitividade. Falco novamente rebateu afirmando que a partilha de infra-estrutura só funciona em países com malha de redes já instalada, como no caso da Inglaterra. "Tem que haver um equilíbrio entre compartilhamento de redes e desinibição de investimentos. Onde as redes não estão estruturadas, o compartilhamento pode desestimular os investimentos, o que é o caso do Brasil", comentou.

Mudanças no PGO

Um outro questionamento dos parlamentares ficou no ar: o anúncio da fusão antes da mudança do Plano Geral de Outorgas, cuja versão atual proíbe este tipo de operação entre empresas que exploram o mesmo serviço. "Vocês acreditam que seguiram os ritos corretos e foram transparentes o suficiente?", perguntou Julio Semeghini. "Duas companhias partem para processo de fusão dependendo de outras decisões, como a mudança do Plano de Outorgas e a anuência da Anatel. Vocês têm certeza que isso ocorrerá por quê?", emendou Ivan Valente.

O presidente da Oi alegou que opção foi uma aposta de risco. "Não temos nenhuma garantia de que o governo vai aprovar. Assumimos um risco, já investimos R$ 315 milhões e há uma multa de R$ 500 milhões. Se não sair a mudança do PGO nós vamos sair e vamos pagar a multa", disse. Nos bastidores, entretanto, sabe-se que há uma forte pressão para que esta norma seja alterada de maneira a garantir a validade da fusão entre as duas companhias.

Falco e os envolvidos na operação esperavam para hoje o anúncio da mudança pelo Conselho Diretor da Anatel, mas a instância adiou novamente a votação sobre a proposta. Não houve pedido de vistas, mas os quatro conselheiros preferiram realizar uma nova reunião para buscar um texto de maior consenso, que está sendo costurado pelo presidente da Agência, Ronaldo Sardenberg.

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