Entrevista com Carlos Alberto Afonso

Carlos Alberto Afonso é engenheiro, doutor em Pensamento Social e Político e diretor de planejamento e estratégias da Rede de Informações para o Terceiro Setor (RITS). Um dos pioneiros do desenvolvimento da internet no Brasil, criou o Alternex, primeiro sistema de informação e comunicação baseado em computador da América Latina, que era voltado para a atuação do terceiro setor. O sistema desenvolveu-se como o primeiro provedor de serviços internet do Brasil. Então funcionário do IBASE, trabalhou para a criação do CGI.br em 1995, para o qual também foi indicado membro (representante dos provedores). Em 2003, foi um dos participantes do movimento que fez a proposta de reestruturação do Comitê, com a votação por um colégio eleitoral dos 11 representantes não-governamentais. Foi eleito pelo segmento do terceiro setor em 2004, e hoje concorre à reeleição.

1. Como avalia o trabalho do CGI.Br até o momento?
Desde 1994, quando iniciei minha participação no processo de criação do CGI.br (oficializado em maio de 1995), foi percorrido um caminho na minha opinião pioneiro em relação à maioria dos outros países. Desde o início, uma das premissas é que o nome de domínio de país (ccTLD) e os endereços IP são um patrimônio da comunidade e não uma mercadoria –  essa premissa vem sido rigorosamente mantida e orienta as políticas de designação de nomes de domínio e números IP no país, missão central do CGI.br. No Brasil não há intermediadores comerciais de domínios nacionais (os "registrars"), ao contrário da maioria dos outros países – isso significa que o valor pago pela designação de um domínio é sempre o mesmo, atualmente uma anuidade de R$30,00. Essa contribuição anual de cada detentor de nome de domínio é que garante a operação e desenvolvimento de um serviço de gerenciamento de nomes e números que é considerado uma referência mundial de qualidade. O CG mantém um centro de operações de ponta, sediando os servidores-raiz do domínio ".br" – o funcionamento eficaz deste centro de operações garante que qualquer endereço ".br" é localizado instantaneamente de qualquer ponto da Internet. Aliás, o padrão de qualidade é tal que o CG sedia servidores-espelho de vários outros países (tal como sediamos espelhos
de nossos servidores em outros países, para garantir redundância em caso de falha).

Só isso já justificaria plenamente o trabalho do CG. No entanto, ao longo dos anos, houve vários avanços importantes, dando uso adequado aos recursos excedentes provenientes das anuidades. Se não são obrigatoriamente parte do mandato do CG, esses avanços no entanto cobrem lacunas fundamentais que o CG considerou estar em condições de preencher em benefício do desenvolvimento seguro da Internet no país. Entre estes avanços:

– O CG mantém um centro de segurança e resposta a incidentes (o CERT.br) que é considerado também uma referência mundial. O CERT.br mantém cursos especializados de segurança a operadores de serviços Internet, operadoras de telecomunicações, instâncias de combate ao crime (polícia, trabalhadores da justiça), monitora e localiza ataques, além de manter estatísticas desses incidentes. É um centro de apoio essencial no combate a crimes na Internet, pedofilia, fraudes etc.

– Mantém ainda um serviço online de referência sobre o "spam" (Antispam.br), para orientar os usuários sobre como proteger-se de ataques via emails não solicitados.

– Mantém também uma rede de pontos de troca de tráfego nas principais capitais do Brasil, os PTTs. O projeto PTT.br opera sem fins de lucro, permitindo que o tráfego entre as diferentes espinhas dorsais de cada cidade sejam intercambiados para otimizar o fluxo e reduzir os custos de banda Internet para os usuários.

– Mantém um pequeno centro de estudos sobre TICs (o CETIC.br), responsável pela produção de indicadores e estatísticas sobre a disponibilidade e uso da Internet no Brasil, divulgando análises e informações periódicas sobre o desenvolvimento da rede no país.

Em 2003 o CG teve uma reestruturação importante, por sugestão de um movimento que juntou a academia (especialmente a RNP) e entidades civis. Tive a honra de participar da elaboração dessa proposta, aceita pelo governo Lula, que significou a efetivação do pluralismo no conselho – até então, os membros não governamentais do conselho eram indicados pelo governo federal. Passou o CG a partir de 2004 a

2. Caso eleito(a), quais serão suas prioridades como membro do Comitê?
Seja eu ou qualquer outro o eleito, espero, em primeiro lugar, que essas conquistas acima descritas sejam preservadas, e que o CG avance ainda mais no uso dos recursos excedentes para apoiar projetos fundamentais de alavancagem das TICs para o desenvolvimento humano no país. O CG não pode resolver problemas cruciais, como a exclusão digital (em um país gigante de 183 milhões em que mais de 40% dos municípios ainda não têm acesso local à Internet), mas seus recursos excedentes podem apoiar projetos estruturantes que ajudem a aprofundar uma estratégia urgente de inclusão digital em todos os seus aspectos (acesso, capacitação, qualidade de serviço, produção de conteúdo etc). Isso já tem sido encaminhado através de comissões técnicas especiais criadas pelo CG para analisar estratégias específicas de apoio para cada setor (inclusão digital, universalização da banda larga, geração de conteúdos digitais, proteção a direitos etc) e precisa avançar ainda mais.

Espero ainda que o CG venha a ter um papel mais ativo na assessoria parlamentar -procurando auxiliar os congressistas na formulação de projetos de lei que sejam consistentes com a complexidade técnica que a Internet envolve cada vez mais, particularmente com a aceleração da convergência entre meios. É importante também que essa visão do CG colabore para a formulação de uma legislação que proteja os direitos básicos de acesso à informação, a liberdade do conhecimento e a proteção à privacidade, e ao mesmo tempo garanta instrumentos eficazes para o combate aos crimes via rede.

3. Caso eleito(a), como prestará contas à sociedade?
Tal como todos os conselheiros do terceiro setor já vêm fazendo: divulgando o trabalho do CG através de artigos, mensagens nas listas de discussão e em contato com as entidades civis de seus setores respectivos.

4. Na sua avaliação, qual deve ser o papel do CGI.Br na construção de um marco regulatório relativo à convergência tecnológica?
O CG tem um mandato claro, já descrito acima. Não tem poder de regulação ou decisão, exceto na alocação de nomes, números e protocolos de conexão e transporte de dados da Internet. Em todo o resto, o CG pode atuar através do apoio a projetos (tal como os exemplos acima e outros) e assessoria às instâncias de governo, dada sua expertise no ramo. É fato que, com a adoção de uma política de separação legal e regulatória entre telecomunicações e os serviços Internet ("serviços de valor adicionado", incluindo conexão, transporte e serviços de informação), há um vácuo legal relativo à convergência. O CG pode e deve contribuir procurando dar o apoio técnico devido e através do apoio a iniciativas específicas de estudo e proposição de marcos regulatórios que contemplem esses processos. Lembremos que a Anatel é um dos membros do CG por parte do governo e assuntos regulatórios são frequentemente debatidos neste.

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