Jornalistas lançam Comissão pela Igualdade Racial no DF

A desigualdade racial, a violência enfrentada pelos afrodescendentes e os direitos das comunidades quilombolas ainda estão à margem da pauta dos meios de comunicação no Brasil. Para sensibilizar os profissionais de comunicação sobre esses temas, foi lançada esta semana a Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial do Distrito Federal (Cojra-DF).

Criada com o apoio do Sindicato dos Jornalistas, a partir da mobilização de profissionais negros, a comissão pretende formular propostas de inclusão racial nas próprias redações, promover cursos, apoiar estudos e destacar como fontes qualificadas de informação pesquisadores, lideranças e ativistas negros.

Um dos integrantes da comissão, o jornalista e professor do Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb) Sionei Leão, lembra que já existem duas comissões (São Paulo e Rio de Janeiro) e um núcleo (Rio Grande do Sul) atuando no sentido de envolver os profissionais e estudantes de comunicação na temática racial.

“Acreditamos que a criação da Cojira no DF, até pela proximidade do poder político, ajudará a nacionalizar esse esforço. É necessário que haja um contraponto à cobertura descontextualizada que vem sendo feita sobre ações afirmativas, racismo e luta das comunidades quilombolas”, defende Sionei Leão.

Integrante da Cojira de São Paulo, Paulo Vieira Lima propõe a realização de debates nos sindicatos dos jornalistas na Semana da Consciência Negra, em novembro. “Existe uma disposição da Federação Nacional de Jornalistas para colocar a temática racial em discussão e precisamos cobrar cada vez mais esse envolvimento”, diz Lima.

Representante do Núcleo de Jornalistas Afro-brasileiros do Rio Grande do Sul, Vera Dayse Costa afirma que os jornalistas estrangeiros, especialmente norte-americanos, estranham a desinformação dos profissionais brasileiros sobre a realidade da população negra. “Precisamos provocar essa discussão, é uma luta de todos”, lembra Vera Dayse.

De acordo com a representante da Cojira-RJ, Sandra Martins, os sindicatos dos jornalistas de Alagoas e da Bahia devem criar em breve centros ou núcleos de discussão sobre a temática racial. “Estamos dando passos lentos, mas muito firmes”, avalia Sandra. “Precisamos colocar o tema na agenda social. E, ao mesmo tempo, negociar, com as empresas de comunicação, cláusulas trabalhistas com enfoque racial.”

Para Ismael José César, da direção nacional da Central Única de Trabalhadores (CUT), a conscientização dos jornalistas sobre o racismo no Brasil é fundamental para que o país avance na discussão.

“A Globo cometeu um crime ao abordar a questão dos quilombolas de forma descontextualizada. Os protestos do dia 5 de outubro, quando a concessão da Globo vence, envolvem esse questionamento”, afirma o sindicalista. “Não vamos alcançar a democracia plena enquanto trabalhadores brancos tiveram salários maiores que trabalhadores negros, mais acesso à água potável e outros serviços públicos.”

Racismo discursivo

Em palestra realizada na Universidade Católica de Brasília (UCB) durante a semana de lançamento da Comissão de Jornalista pela Igualdade Racial do DF (Cojira-DF), o jornalista da TV Senado e pesquisador André Ricardo, integrante da comissão, apresentou os resultados de um estudo sobre a cobertura da imprensa a respeito das cotas nas universidades. 

“O foco das matérias está mais nas alterações que o vestibular passa a partir das cotas do que na explicação e no debate sobre políticas afirmativas e de reparação”, avalia André Ricardo, mestre em Comunicação e doutor em Lingüística pela Universidade de Brasília (UnB). “Na cobertura da cotas, a imprensa, de forma geral, não é neutra. Toma partido, faz uma intervenção conservadora, um racismo discursivo.”

Para o coordenador do Núcleo de Estudos sobre Questões Raciais (Neafro) da Universidade Católica de Brasília, Carlos Alberto Santos de Paula, a Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial no DF surge em um momento oportuno, no qual a temática racial encontra-se antipatizada na sociedade. “A mídia dos coronéis não tem interesse em pensar a pluralidade”, critica o pesquisador.

Editor do jornal Ìrohìn, Edson Cardoso afirma que representação feita pela imprensa do movimento social negro é distorcida. Segundo ele, coloca o movimento no campo da irracionalidade e da falta de objetivos. Na última edição impressa, o Ìrohìn critica as reportagens que atribuem às lideranças negras o início de uma guerra racial.

“As faculdades de comunicação devem repensar o pluralismo. Temos diversidade no nosso país, mas dificuldade de afirmar o nosso pluralismo. O racismo hierarquiza a diversidade”, avalia Edson Cardoso, ativista e mestre em Comunicação pela UnB.

“Enquanto no país existem descendentes de italianos que buscam a dupla-cidadania lá fora, a população negra, afrodescendente, vive uma situação de sub-cidadania. Enquanto os negros reivindicam o direito à vida, a reação alucinada das elites e dos setores médios, que a grande mídia representa, revela o abalo no edifício da dominação racial.”


* Juliana Cézar Nunes é jornalista, trabalha na Radiobrás, é colaboradora do Ìrohìn e faz parte da Cojira-DF.

  

Links
Cojira-DF : http://cojiradf.worpress.com

Cojira-SP: http://www.sjsp.org.br/cojira%20index.htm

Cojira-RJ: http://www.jornalistas.org.br/cojira.asp 

Núcleo de Jornalistas Afro-brasileiros do RS: http://www.jornalistas-rs.org.br/ 

Núcleo de Estudos sobre Questões Raciais da UCB: http://neafro-ucb.blogspot.com/

Ìrohìn: www.irohin.org.br 

Associação de Jornalistas Negros dos Estados Unidos: http://www.nabj.org/ 

Afropress: www.afropress.com

Active Image

0

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *